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A VISÃO DA ENB EM RELAÇÃO AO PATRIMÓNIO CULTURAL

Sabemos que os bens culturais são geralmente únicos, complexos e possuem múltiplos valores, existindo grande dificuldade em qualificar e quantificar o valor de cada bem. É sabido que os recursos disponíveis são habitualmente poucos, nomeadamente ao nível do tempo para o desenvolvimento de inventariação, planificação e implementação, com limitação de pessoas técnicas, especializadas com dedicação full-time a esta causa e como não poderia deixar de lhe estar associado, dotadas de uma componente financeira sustentável para o desenvolvimento deste trabalho de sapa.

Na verdade sabemos também que os piores eventos podem ser imprevisíveis, nomeadamente os de origem natural, como por exemplo os sismos. Atualmente o mundo tem sido marcado por trágicos eventos, recordemos pois os últimos grandes incên- dios rurais na região centro em 2017, um dos quais decorreu no dia imediatamente a seguir ao encontro Luso-Espanhol, dia 15 de Outubro. Foi este incêndio que numa velocidade e fúria vertiginosa matou 45 pessoas, destruiu não só a floresta como também perto de 1.500 casas e cerca de meio milhar de empresas, in Lusa 13 de janeiro de 2018 às 09:24.

Importa então realçar que devem ser previstas medidas mitiga- doras para reduzir todos os tipos de riscos relacionados com o património, seja eles naturais, tecnológicos ou antropogénicos.

Os sinistros podem ser imprevisíveis e rapidamente tornarem-se em catástrofes, mas com a implementação de procedimentos, formação apropriada, preparação e treino das equipas e com equipamentos adequados, desenvolver-se-á uma resposta pronta e correta para quando as circunstâncias o exigirem. Desde o gestor do património, ao responsável de segurança do edifício, passando pelos seus funcionários e não esque- cendo a intervenção dos bombeiros, estar preparado para as emergências será sempre a melhor forma de garantir que o impacto dos sinistros nos bens será menor, as consequências menos destrutivas e a recuperação mais rápida e eficaz. Ao nível da formação e treino, a inexistência da mesma nesta área específica, a dificuldade numa correta análise do risco e a ausência de um planeamento eficaz com a inclusão da componente operacional faz com que em caso de incêndio ou emergência a probabilidade de haver maiores danos no património afetado seja maior. Desta forma, importa imple- mentar uma avaliação do risco adequada a cada bem patri- monial, seja ele imóvel ou móvel, para que desde o início os bens estejam devidamente alinhados com o planeamento a desenvolver e o plano a executar.

Este trabalho requer equipas multidisciplinares empenhadas num só objetivo, a salvaguarda de vidas e bens dado que os eventos do passado evidenciam o papel fundamental da prepa- ração na redução dos impactos perante um evento no futuro. De uma forma genérica, o risco de incêndio (Ri) pode ser dado pelo produto da probabilidade de ocorrência (Po) de um incêndio pela medida de severidade das suas consequências (Sc), ou seja: Ri = P0 * Sc

Para reduzir este risco a um nível aceitável, é fundamental que as instituições criem, implementem e reforcem medidas de Prevenção e Proteção (físicas e humanas), promovendo a Sensibilização, Educação e Formação dos seus profissionais e intervenientes no processo e através do cumprimento dos

aspetos Técnicos e Regulamentares, garantir uma Organização e Planeamento sustentada na Interligação com os agentes de Proteção Civil e demais entidades envolvidas.

Em relação ao património imóvel é fundamental efetuar um estudo patológico do edifício para que oportunamente seja feita uma correção atempada dos seus danos estruturais, bem como uma preparação de medidas de estabilização provisórias, fazendo formação, simulacros e um planeamento de logística adequado. Além do estudo patológico do edifício, importa abordar e analisar o Regime Jurídico da Segurança

Contra Incêndio em Edifícios (RJSCIE), decreto-Lei n.º 220/2008,

de 12 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de Outubro, onde no seu artigo 4.º define os princípios gerais, ou seja a preservação da vida humana, do ambiente e do património cultural. No entanto e perante a importância do património foram previstas as exceções no artigo 3.º relativo aos imóveis classificados, referindo e bem, que quando o cumprimento das normas for desproporcionado podem ser adotadas medidas compensatórias de autoproteção adequa- das, após parecer da Autoridade Nacional de Proteção Civil. Importa também referir que o RJSCIE no seu artigo 14ºA remete-se aos edifícios existentes, deixando em aberto a possibilidade de dispensa da aplicação de algumas dispo- sições do regulamento técnico quando a sua aplicação seja manifestamente desproporcionada pelas suas características construtivas, arquitetónicas, ou de funcionamento e exploração dos edifícios e recintos, desde que implementadas medidas compensatórias e tenham aprovação da ANPC. No entanto não dispensa para nenhum edifício as medidas de autoproteção, sendo estas medidas importantíssimas na preservação dos bens. Assim, diz-nos no artigo 22º que as medidas de autopro- teção aplicam-se a todos os edifícios e recintos, incluindo os existentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei. Não obstante os objetivos individuais, deve ser encontrado um objetivo comum, a preservação da história com uma segurança

aceitável, encontrando assim um equilíbrio entre a continui- dade do património edificado e a intervenção de condições aceitáveis de segurança contra incêndios. Sabemos pois que apesar de todas as medidas existentes, uma das preocupações principais na área do património é a conservação, preservação e salvaguarda dos edifícios históricos perante uma situação emergência, pelo que a forma mais segura de garantir a sua integridade é através da articulação entre todos os atores que intervêm no património cultural.

Relativamente ao património móvel, a sua preservação em caso de incêndio assume uma preocupação ainda mais relevante, dado que a sua segurança estará dependente das medidas ativas e passivas contra incêndios existentes no edifício assim como o contributo que os produtos resultantes da combustão, nomeadamente fumo, gases e a temperatura poderão influir direta e indiretamente no aumento dos danos nestes bens. Deste modo para reduzir a um nível aceitável o risco de danos no património móvel, é fundamental implementar planos de emergência específicos formando o público-alvo que habitual- mente e em caso de emergência intervêm e mobilizam esses bens, nomeadamente funcionários, técnicos e bombeiros para que seja assegurado os cuidados adequados durante a evacuação dos bens em caso de emergência.

A criação de protocolos de evacuação do património móvel, incluindo listas de evacuação prioritária e logística de armaze- namento provisório é essencial. Será através destes protocolos que as equipas intervenientes tomarão as melhores decisões, fazendo a evacuação dos bens por ordem de prioridade e garantindo que a sua manipulação não provocará maiores danos que a emergência. Do mesmo modo o bem deverá ser preservado nas melhores condições e transportado para o depósito definido em segurança. Na verdade este ponto assume um papel vital nos bens, pois em caso de emergência e sem um guião adequado, será certamente difícil escolher

qual o bem, como retira-lo e manipula-lo, dado que em caso de emergência a melhor decisão pode não ser a decisão acertada. Assim sendo as instituições responsáveis pela gestão do património devem ter planos de emergência adequados e atualizados, incluindo procedimentos para a salvaguarda e evacuação do património móvel. Este ponto encontra-se regulamentado no Regulamento Técnico de Segurança Contra

Incêndios em Edifícios (RTSCIE), portaria n.º 1532/2008 de 29

de dezembro no seu artigo 198, ponto 2 referindo que “nos imóveis de manifesto interesse histórico ou cultural ou nos espaços que contenham documentos ou peças com esse interesse, as medidas de autoproteção devem incluir os pro- cedimentos de prevenção e de atuação com o objetivo de os proteger”, logo urge elaborar a inventariação do património e implementar o referido plano.

No entanto para que o plano seja operacional deve ser for- matado e pensado para a emergência, devendo ser prático e garantir uma pesquisa rápida dos seus conteúdos, pelo que se entende que o mesmo deva estar disponível em mais do que uma ferramenta de trabalho, quer por segurança, quer por redundância.

Atualmente a tecnologia está disponível em qualquer momento e com uma facilidade de utilização simples e segura, havendo inclusive a possibilidade de imergir no próprio edifício percor- rendo os seus espaços e catalogando o seu património. Este é no nosso ponto de vista um processo fulcral nos planos de emergência. A catalogação, inventariação e priorização dos bens é um processo imprescindível para que o Comandante das Operações de Socorro (COS) em sintonia com o responsável de segurança possam decidir bem, escolhendo quais os bens moveis a ser evacuados. No entanto não deve ser esquecido o processo físico, nomeadamente fichas em papel, devendo ser garantido o plano neste formato.

A este respeito, um sistema de informação desenvolvido para dar resposta à emergência será uma ótima solução no sistema de apoio à decisão, no entanto necessita de ser dotado de uma base de dados constituída por documentação de todos os espaços interiores dos edifícios que disponham bens cultu- rais, bem como dos espaços exteriores pela importância que os mesmos possam vir a ter na organização da intervenção e evacuação dos bens pelas equipas internas de intervenção.

PLANOS DE EMERGÊNCIA PARA O PATRIMÓNIO