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4. METODOLOGIA E ANALISE

4.3.2 Wakanda

Figura 19

No primeiro capitulo do arco (Página 01 da edição #01) somos levados para o século 5 D.C. em plena savana africana. Neste cenário, guerreiros de uma tribo africana mesclam-se ao ambiente para surpreender e combater outra tribo: os Wakandas. Em formação de batalha, os membros do grupo são alertados pelo seu líder (Figura 20)

Temerosos pelo ataque, os guerreiros são surpreendidos por armadilhas que se encontram na vegetação. Com isso, saem da formação de batalha, mostrando-se no terreno de combate. Sem dar ouvidos aos apelos de seu líder, caem em outras armadilhas que se encontram no chão, sendo também alvejados por flechas e lanças pelo ar. O único sobrevivente, totalmente aterrorizado pelo ataque dos Wakandas, foge apavorado tendo ao fundo uma voz misteriosa que apenas diz (Figura 21)

Figura 21

Na página 08, somos levados para outro momento histórico. No século XIX, em meio a expansão dos Bôeres ao interior do continente africano em busca de Ouro e outras riquezas, uma expedição colonialista aproxima-se do território wakandiano. Mesmo com os seus escravos (formados por nativos do sul da África) abandonando a expedição, o líder Bôer não se intimida com possíveis superstições e avança para missão.

Chegando aos arredores da tribo Wakanda, a tropa logo visualiza ornamentos de ouro nas construções locais. Preparando-se para invadir o local, os Bôeres são surpreendidos por um homem encapuzado na companhia de um objeto futurista, que interfere nas armas de pólvora, destruindo-as.

Frustrados pela perda de seu armamento, o grupo de exploradores hesita um segundo ataque usando um arcaica metralhadora, desobedecendo assim o líder da tropa, que, completamente irritado e bradando palavras sobre a superioridade branca, acaba sendo vitima de sua própria ganância ao ser pego na explosão que destrói o canhão. Numa ultima cena da página 12, o restante do grupo expedicionário pede clemência por suas vidas ao misterioso encapuzado, agora acompanhado de vários soldados armados de lanças e escudos.

Em mais uma quebra de narrativa, o cenário é a Casa Branca, sede do governo norte-americano, que em uma reunião de emergência da alta cúpula dos Estados Unidos não consegue compreender o isolamento diplomático de Wakanda em pleno século XXI. (Página 18).

Neste ambiente, temos três personagens de destaque. O primeiro deles é o “General Wallace”, que de forma imperativa e eloqüente, afirma não compreender como uma nação de um continente “atrasado” pode desafiar os Estados Unidos, proibindo o uso do seu espaço aéreo para manobras militares norte-americanas. Demonstrando falta de conhecimento e completo despreparo diplomático, acaba sendo preconceituoso em seu discurso enraivecido, sendo repreendido subjetivamente pelos participantes da reunião. Essa repreensão é ocasionada não por um sentimento de desaprovação ao comentário do militar, e sim pelo temor para com o segundo personagem destacado desse cenário: a secretaria de estado “Dondi” Reese.

A Srta. Reese é de fato uma analogia a republicana Condoleezza “Condi” Rice. Ambas são de origem afro-americana, sendo que a personagem foi criada no mesmo período em que a Srta. Rice exercia o cargo de secretaria de estado dos Estados Unidos. Reese é a figura central da reunião, e tenta compreender qual o papel de Wakanda no panorama mundial. Ao ouvir o General tratar os wakandianos como “Macacos Selvagens”, o olhar repreendedor da Secretaria constrange o militar, que tenta se desculpar, mas não tem sucesso.

O terceiro personagem é o senhor Everett Ross, membro da inteligência do governo e único capaz de descrever Wakanda para os membros da reunião. Ao falar do pai enfatiza, alem da superioridade tecnológica, o fato de nunca terem sido dominados por nenhum povo estrangeiro, nem por nenhuma religião externa ou ideologia política. Alem disso, sempre foram auto-suficientes em matéria prima - como o “vibranium” e petróleo – mas preferem não usa-los como fonte de energia, escolhendo alternativas renováveis como luz solar e hidrogênio.

Em toda primeira edição, temos a historia de Wakanda contada por vozes que se encontram fora do país. Tanto os membros da reunião, como os dois misteriosos personagens que refletem sobre as histórias ancestrais da nação africana (página 7) não escondem o temor de uma terra mítica e utópica que desafia a ordem mundial.

Figura 22

Na edição #3 em diante, entendemos o país africano pelo olhar do seu próprio povo. Para os wakandianos, a sua terra é um lar de paz e prosperidade, sendo cobiçada pelos povos estrangeiros de forma mesquinha e imperialista. Para eles, os governantes do mundo exterior prezam apenas por interesses próprios, sem se preocupar com a população de suas nações. Isso é o suficiente para que não exista relações entre seus povos.

Porem, em algumas passagens da história, percebemos que tentativas de aproximação foram criadas no passado recente. No numero #03 temos 2 exemplos distintos de momentos diplomáticos de Wakanda. Na pagina 07, no recordatório do

mercenário Ulisses Klaw, conhecemos o assassinato do Rei T´Chaka, antigo soberano wakandiano e pai de T´Challa.

Convidados pela mesa de chefes do G-7, a família real wakandiana comparece a reunião, apenas para ouvir dos lideres mais ricos do mundo a proposta de venda do Vibranium contido nas terras africanas. Enfurecido pela falta de respeito pelo seu povo e seu país, o Rei T´Chaka acaba por destratar o conselho, alegando que conversações sustentadas apenas por ganância e poder, demonstram como o Ocidente esta atrasado em relação ao bem estar humano. Logo após o encontro, o regente acaba sendo assassinado por um grupo de mercenários contratados pelos membros da reunião

Figura 23

Em outro momento histórico, temos outro exemplo da diplomacia wakandiana. Na página 18, após se tornar o novo rei de Wakanda, o Príncipe T´Challa delega novas funções para o conselho real. Enquanto decide quem será o novo embaixador

wakandiano na ONU, o seu secretario avisa sobre a ligação do Presidente Nelson Mandela.

Figura 25

Na breve conversa, fica registrado como Wakanda teve um papel importante para todo o continente na época do Apartheid. Nota-se que mesmo escolhendo o caminho da neutralidade, o país esta alinhado com os problemas da África e de sua população. A diferença para a forma de diplomacia exercida, por exemplo, pelos países ocidentais ocorre no fato dos wakandianos não usarem do poder bélico como forma de defender seus interesses e impor sua filosofia. Exemplo disso pode ser percebido com a relação do país com vizinhos como a nação de Niganda.

Antagônica a Wakanda, Niganda é governada pelo ditador M´Butu. Niganda é uma ditadura militar sustentada pelos governos do ocidente, sendo uma analogia aos governos ditatoriais que surgiram na África após a independência das colônias. O próprio M´Butu em todo seu comportamento arrogante lembra um dos maiores déspotas do continente: o ex-presidente Mobutu Sese Seko do Zaire (hoje Republica Democrática do Congo)

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Figura 26

Mesmo com a tensão diplomática entre as duas nações, Wakanda continua a exercer sua política de não interferência. É somente graças a uma invasão de Niganda ao país vizinho (orquestrada por uma coligação de vilões liderada por Ulysses Klaw) que o Pantera Negra reage para uma retaliação.

Figura 27

Falar de Wakanda é tocar em uma nova forma de reimaginar a África, mesmo num sentido ficcional. É criar uma metáfora moderna, um mito. Se Wakanda não existiu, trás pelo menos a lembrança das historias alternativas do mundo real. O país em sua nova interpretação comporta-se como uma Etiópia idealizada, uma terra que nunca foi conquistada e que representa a esperança de uma contra hegemonia para o mundo contemporâneo.

Para Reginald Hudlin, esse cenário torna-se fértil para trabalhar conceitos pertinentes a construção hibrida do herói, pois o Pantera Negra como líder de uma nação livre em um continente arrasado, simboliza a luta contra as falidas instituições que existem na África. Sendo assim, como ele pode exercer um papel de liderança fugindo da idéia ocidental de imperialismo? Onde acaba o mito e começa o tirano?

Para Stuart Hall, a reimaginação da África por aqueles que praticam a cultura, é uma atitude valida para preparar o terreno histórico, levando sentido ao campo

simbólico de nosso campo cultural. Tornando o “invisível visível”, existe o combate na construção da matriz dos significados coloniais, que barram e rejeitam o engajamento com as “rotas” culturais alternativas (HALL, 2000).

Isso se deve ao processo de “tradução cultural” (HALL, 2000) onde os agentes culturais – ou tradutores, como lembra Sarat Maharaj – transportam grandes parcelas de sentido para uma nova linguagem, reimaginando-os de forma eficaz neste novo terreno. Reginald Hudlin admite que ter a oportunidade de trabalhar com o Pantera Negra e seu cenário mitológico em uma época como a nossa, ajuda a repensar os valores que a África representa no nosso imaginário coletivo.

O Pantera Negra é um líder nacional forte em um continente em crise. Qual deve ser a sua resposta? Wakanda tem tomado uma abordagem muito isolacionista no passado (...) Mas isso significa virar as costas às pessoas que precisam? Ou deve realmente resolver o problema, levando a uma guerra mundial?

(HUDLIN, 2007)

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