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Whitney e as mudanças nas línguas

3. Outros conceitos

3.2. Whitney e as mudanças nas línguas

Como se disse anteriormente, Whitney se ateve ao contex-to da língua materializada. Ele buscou as explicações para a evolução ou as mudanças nas línguas nas próprias deficiências do sistema. As mudanças nas línguas são sempre ocasionadas por atitudes dos falantes, ou são obras do próprio discurso. Na verdade, o indivíduo tem sempre um comportamento de negação do esforço, numa inconsciente defesa contra a fadiga.

De outra forma, existe uma instigante colaboração do sis-tema no sentido de incentivar e aceitar essa forma racional de abreviar a duração do trabalho físico. Assim, o indivíduo e a língua colaboram para concretizar objetivos num tempo mais curto com o mínimo de fadiga. O movimento linguístico ten-de para ten-determinadas simplificações na pronúncia, que são modificações que acontecem em função de uma generaliza-ção ou diminuigeneraliza-ção das diferenças entre os sons.

Uma imensa quantidade de palavras sofre mutilações em seus finais por força do comportamento humano, bastante comum, de abreviar as palavras. Essa é uma maneira muito frequente de modificação na forma das palavras, em função de uma redução em seu tamanho. Whitney, em todo o seu texto, deixou claro que o ser humano tende para a redução do esforço. A lei do menor esforço acontece porque o indiví-duo, ao continuar o que aprendeu pelo processo de repetição, quase nunca é crítico quanto à qualidade dessa repetição.

É quase irresistível não procurar uma razão para essa lei de menor esforço na agitada realidade da vida cotidiana em sociedade. Na verdade, existe uma evidente tentativa de abreviar o tempo despendido na produção linguística, que parece ser uma característica humana. Porém, Whitney ex-plicou desse modo os fatores da modificação nas línguas não por acaso: a sociedade em que ele viveu já havia entrado no processo mecanizado de produção, em que tempo é dinheiro, e menos tempo é mais eficiência.

Esses fenômenos de mudanças estão imbricados nos há-bitos nacionais. Cada povo age no contexto de seu idioma de uma determinada maneira, sendo que esses comportamentos nacionais podem ser esquematizados de forma clara. Para esquematizar esse comportamento basta estudar a língua ao longo de sua história.

Essas alterações nas palavras, genéricas nas línguas, são feitas pelo falante para sua comodidade e podem ser associadas a muitas outras alterações semelhantes no contexto da língua.

A grande tendência das mudanças linguísticas está muito mais concentrada nas formas das palavras que no conteúdo. Nenhuma estrutura de palavra é definitiva, porque os seres humanos tendem a acomodar os elementos para facilitar o desenvolvimento linguístico. Whitney esclareceu que isso acontece, não só por razões de economia, mas também por preguiça. Assim, as palavras são abreviadas quando são es-critas, os nomes são reduzidos a formas simbólicas, etc. Esse comportamento em nada prejudica o sentido das palavras, comprovando a independência entre a forma e o sentido. Evidentemente, essa grande lei linguística está apoiada no comportamento geral dos homens e em nada prejudica o de-senvolvimento da humanidade. Segundo Whitney, o atalho é mais curto e o resultado é o mesmo.

De qualquer forma, por mais estranhas e diferentes que as mudanças possam parecer, facilmente pode ser

encontra-da uma lei que interfere de modo constante na língua: toencontra-das as mudanças são realizadas de maneira característica, se-guindo o padrão instituído na língua desde sua origem.

As palavras são mantidas em uso nas línguas e são trans-mitidas de geração em geração por um sistema de repetição e cópia dos comportamentos tradicionais. Nesse consenso entre os falantes, sentidos e formas são perpetuados por via da tradi-ção. Se nenhum movimento contrário acontecer, essas formas são eternizadas na língua. Porém, sempre ocorre que, soluções de continuidade fazem com que palavras desapareçam. O de-saparecimento de palavras ocorre por causa da mesma razão que gera a continuidade. Portanto, continuar ou desaparecer depende da escolha que uma comunidade linguística faz em certos momentos, por certos aspectos da sua linguagem.

A principal justificativa ou o objetivo geral dos acréscimos ou das transformações que as línguas sofrem é o de aperfei-çoar a expressão do pensamento. É dessa forma que as novas ideias desenvolvidas na língua precisam de signos também novos que alcancem o sentido exato que elas necessitam. Por outro lado, velhas ideias são mais valorizadas quando são al-cançadas pelo espírito com melhores meios de expressão.

Em todas as situações de transformação, o espírito mo-vimenta o sistema da língua e as palavras sempre têm seus significados afetados, ou seja, seus limites e sua mobilidade são sempre alterados de alguma forma. As mudanças acon-tecem intensamente em toda a língua: agem como uma onda que atinge todo o sistema, incorporando e modificando sig-nificações de algumas palavras, transformando-as em outras. Tudo isso resulta do desenvolvimento ininterrupto do pensa-mento humano. Assim, toda a sociedade, a cada período de tempo, sofre uma total transformação – isto é, todo material acumulado em forma de conhecimento é destruído e recons-truído. O pensamento humano age de modo revolucionário, subvertendo e redefinindo conceitos e redimensionando

va-lores. Todos esses acontecimentos exigem uma adaptação do pensamento e da língua em geral.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a língua se molda às necessidades dos indivíduos quando a situação exige adaptação a novas realidades. Em segundo lugar, é o pensamento do indivíduo que sempre vai além, em sua cria-tividade, daquilo que é habitual na língua. Dessa forma, exis-te uma correspondenexis-te relação de adaptação entre língua e pensamento. Nesse contexto, pode-se afirmar que é o indi-víduo que causa as modificações na língua. Porém, conside-rando o que Whitney afirmou, é a sociedade que modifica a língua: as transformações ocorrem quando a coletividade ou a sociedade assimila uma contribuição de um de seus falan-tes. Whitney, nessa afirmação, demonstrou que a posição do indivíduo perante a sociedade é sempre de rebeldia e que a sociedade necessita dessa objeção a suas instituições para se manter atualizada. A língua, como uma das principais insti-tuições da sociedade, é uma das que mais necessitam dessa rebeldia dos indivíduos, porque são os atos individuais de fala que mantêm ativas e ajustadas as formas da língua.

Quando falou em mudança linguística, Whitney estava descrevendo seu próprio pensamento a propósito da lingua-gem. As transformações que são desenvolvidas no pensamen-to de forma coletiva têm efeipensamen-tos imediapensamen-tos ou concomitantes na língua. Assim, pode-se notar que, quando Whitney intitu-lou seu livro de The Life and Growth of Language (A vida e o desenvolvimento da linguagem, tradução nossa) ou La vie du langage (A vida da linguagem ), ele não estava dizendo apenas que ia estudar a história da linguagem, mas que a linguagem possui um movimento parecido com o movimento dos seres que possuem vida — ou seja, ele estava falando da “linguagem com vida”. Esse movimento animado caracteriza a presença do elemento humano no contexto linguístico. As constantes modificações nas línguas revelam mais a

instabili-dade do produtor que a do produto. É evidente que Whitney estava inspirado pelos elementos do mundo em que estava inserido. No século XIX, as mudanças sociais exigiram que o homem pensasse na reorganização de sua vida, tanto do espaço físico quanto do espaço psicológico. A Linguística o acompanhou, não só se tornando mais prática, mas também assimilando essa metodologia de trabalho: a de resolver os problemas que atingiam a coletividade. Ela deixou de ser fi-losofia pura e ganhou elementos voltados para o uso prático.