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“O Paradoxo de Atos e Negócios Jurídicos Válidos, mas Inoponíveis ao Fisco”, artigo para o livro “Direito, Razão e Argumento. A reconstrução dos fundamentos democráticos e republicanos do Direito Público com base na Teoria do Direito - em Liber Amicorum Professor Humberto Ávila”, Coordenadores: Daniel Mitidiero e Pedro Adamy, São Paulo: Jus Podium/Malheiros, 2021.

Autor: Ricardo Mariz de Oliveira

O PARADOXO DE ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS VÁLIDOS, MAS INOPONÍVEIS AO FISCO

De muitos anos para cá surgiu, e passou a ser aplicada, uma teoria segundo a qual negócios jurídicos (e também atos jurídicos em sentido estrito1) podem ser válidos perante o direito privado, mas podem ser inoponíveis ao fisco.

De pronto é preciso dizer que não se encontra em qualquer norma jurídica vigente uma disposição minimamente capaz de suportar tal afirmação, a qual, de resto, na ausência de uma norma geral antiabuso, pressupõe a existência de um direito especial para o fisco, autônomo do direito dos indivíduos, que existiria a despeito das prescrições contidas nos art. 109 e 110 do CTN, lei complementar da Constituição Federal, embasada no seu art. 146.

1 Para evitar eventual dúvida, convém registrar que o art. 185 do Código Civil manda aplicar aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, as suas disposições relativas a estes, inclusive suas normas gerais de validade e as pertinentes aos seus defeitos e invalidades, além de possuir nos art. 186 a 188 regras genéricas sobre ilicitudes dos atos. Também convém recordar que, dentro da classificação dos atos jurídicos “lato sensu” (fatos do direito em que há a participação humana), distinguem-se as espécies negócios jurídicos e atos jurídicos em sentido estrito. A distinção entre estas duas espécies, que se abrigam na mesma categoria ou gênero de atos jurídicos “lato sensu”

porque em ambas há manifestação de vontades, reside em que nos negócios jurídicos os efeitos deles derivados podem ser aqueles desejados e pactuados livremente pelas partes (com exceção das disposições de ordem pública, e observados os seus limites legais), ao passo que nos atos jurídicos em sentido estrito todos os efeitos são predeterminados pela ordem jurídica que os rege, sem possibilidade de alteração pela vontade das partes. A este respeito, consulte-se ABREU, José. O Negócio Jurídico e sua Teoria Geral. São Paulo: 1984, Saraiva, p. 9; e PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: 19ª ed., Forense, vol. 1, p. 303, para quem os efeitos do ato jurídico em sentido estrito decorrem de manifestação volitiva, mas são gerados independentemente de serem perseguidos pelo agente, que é obediente à lei, ao passo que nos negócios jurídicos as declarações de vontade são destinadas à produção de efeito.

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A fiscalização federal farta-se com o uso dessa afirmação, e são incontáveis os acórdãos da jurisprudência administrativa que a utilizam para confirmar autos de infração, quando os atos ou negócios jurídicos praticados pelos contribuintes não possam ser invalidados pela existência de algum defeito jurídico perante a respectiva disciplina legal, isto é, quando eles sejam perfeitamente válidos perante essas normas.

Sim, a teoria é necessária apenas quando os atos e negócios jurídicos estejam perfeitos, pois, quando viciados perante o direito privado, é o respectivo vício que embasa as acusações fiscais. Em outras palavras, segundo a teoria, e o que se verifica na prática, o direito privado não protege o contribuinte perante o fisco quando tenha sido cumprido, mas a recíproca não é verdadeira, pois ele protege o fisco quando descumprido! Só isto já traz à lume a falta de fundamento para a teoria, e, muito mais, seu viés arrecadatório destituído de base jurídica ou mesmo lógica.

Infelizmente para a segurança jurídica, tal teoria originou-se no âmbito da discussão de temas relacionados a planejamentos tributários, onde grassam ilegalidades de muitos matizes, praticadas conscientemente ou por ignorância jurídica.

Daí a se considerar planejamento tributário algo socialmente detestável e publicamente condenável, e a não se separar devidamente os casos de planejamentos válidos dos inválidos, foi apenas um passo no âmbito fazendário, para o que a teoria tornou-se útil ao fisco, quando este não encontre, ou não consiga encontrar, fundamentos válidos para atacar ações evasivas.

Não interessa, para o escopo deste trabalho, adentrar em questões paralelas, também existentes no trato do planejamento tributário, tais como a discussão em torno da existência ou não de razões negociais, ou sobre o objetivo tributário ser único ou preponderante, e muitas outras, inclusive mais recentemente a invocação de um dever fundamental de pagar impostos. Ou ainda sobre os argumentos da solidariedade social ou da isonomia, em contraposição aos fundamentos da legalidade, da liberdade de iniciativa, da propriedade privada e da sua função social, etc..

Não interessa entrar nessa seara porque, embora o tema deste artigo possa estar presente quando alguma planificação fiscal seja discutida, aqui não se pretende tratar de planejamento tributário, mas apenas dos efeitos dos atos e negócios

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jurídicos que tenham validade perante o direito privado, para demonstrar que eles necessariamente têm validade no campo tributário, seja para dar nascimento à obrigação tributária, seja não.

Quer dizer, por óbvio, todo planejamento tributário tem por objetivo verificar tributos potencialmente devidos e a possibilidade de evita-los ou diminuir sua onerosidade, do mesmo modo que o planejamento industrial ou de mercado visa menores custos ao lado de maiores receitas, mas para este trabalho os efeitos das normas de direito privado podem ser os mais onerosos, o que não mudará o enfoque que será dado e não interferirá com as respectivas conclusões. Como diz o povo, “doa a quem doer”, o resultado será o que advier do direito positivo.

Aqui também será preciso não fugir do foco pretendido, perdendo-se em discussões periféricas e às vezes exclusivamente teóricas, que amiúde se apresentam nos embates em torno do planejamento tributário, tais como as conjecturas sobre uma evolução da interpretação jurídica na era pós-positivista, ou sobre a inexistência de uma legalidade absoluta e de uma tipicidade fechada, ou sobre os fatos geradores dos tributos previstos na Constituição Federal serem tipos ou conceitos, etc. Também não se justifica discutir a legalidade sob o prisma do argumento de que o ordenamento jurídico está em constante ressignificação.

Pode-se prescindir de tudo isso sem que se trate de interpretação meramente literal e de excluir a exegese correta e fundamentada2, nem de pregar a inexistência da possibilidade de haver duas interpretações razoáveis, mas, sim, de observar as competências dos três poderes.

Aqui, tratando-se de um trabalho de cunho jurídico voltado para a prática não meramente acadêmica, apenas não se pode abrir mão do princípio da legalidade, sem necessidade de a legalidade ter apelidos ou qualificativos, cujo princípio parece não contar com opositores, e, se os houver, ou estarão se afastando da Constituição Federal e do Sistema Tributário Nacional em vigor no Brasil, ou estarão disfarçados, como aqueles que afirmam respeitar o princípio da legalidade, mas dão a ele tamanho grau de redução em relação às normas postas no ordenamento positivo, que ao fim e ao cabo verdadeiramente o desconsideram.

2 Até porque toda disposição legal requer interpretação.

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Todavia, legalidade é legalidade, não legalidade mitigada, legalidade flexibilizada, assim como não é meia legalidade ou legalidade e meia. Legalidade significa que a lei a ser aplicada é aquela editada pelo Poder Legislativo, e não pelo aplicador da lei, porque só assim qualquer pessoa pode saber de antemão e com segurança como deve se comportar. Não sendo assim, se a legalidade for aquela ditada pelo aplicador da lei, ainda que um juiz, este passará a ser o legislador3, e a sua lei será uma nova lei que, ademais, será retroativa (violência que nem o Poder Legislativo pode praticar) porque somente será conhecida no ato da aplicação sobre fato passado, surpreendendo aqueles que tiverem agido de acordo com a legalidade do parlamento, e impossibilitando toda e qualquer previsibilidade ínsita à segurança jurídica4.

Afinal, legalidade5 e segurança jurídica são inerentes ao Estado de Direito, o qual não existe sem elas. O indivíduo é livre dentro desse Estado, devendo praticar sua liberdade dentro dos limites legais, além dos quais pode invadir a área de direitos de outrem. Pode até fazer o que a lei não lhe proíbe, ao passo que o Poder Público, representante do Estado, somente pode atuar em conformidade com a lei, seja no âmbito geral (art. 37 da Carta Constitucional), seja no da tributação, no qual o primeiro dos limites ao seu poder de tributar é o da legalidade (art. 150, inciso I), significando, quanto aos tributos, que as competências estão devidamente delimitadas.

Aqui, apartados de ideologias que permeiam os debates em torno do planejamento fiscal e até impedem análises mais serenas, veremos apenas os fundamentos jurídicos que militam contra a dita teoria, demonstrando que o ordenamento jurídico brasileiro prescreve e exige afirmação diametralmente oposta a

3 O juiz, como qualquer intérprete, interpreta a lei que encontra no ordenamento positivo. Sua interpretação tem uma carga construtiva, no sentido de que julga os fatos e aplica a norma jurídica que interpreta, com isto gerando uma norma particular e concreta para as partes envolvidas na ação, mas não pode se desprender da norma abstrata existente no ordenamento. A propósito da carga construtiva, o MINISTRO MARCO AURÉLIO, conduzindo o Recurso Extraordinário n. 166772-9-RS, julgado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - Pleno em 12.5.1994 (no mesmo sentido há outros acórdãos, como no Recurso Extraordinário n. 153777-9-MG, julgado em 30.6.1994 pela 2ª Turma), afirmou: “Se é certo que toda interpretação traz em si carga construtiva, não menos correta exsurge a vinculação à ordem jurídico-constitucional em vigor. O fenômeno ocorre a partir das normas em vigor, variando de acordo com a formação profissional e humanística do intérprete. No exercício gratificante da arte de interpretar, descabe ‘inserir na regra de direito o próprio juízo - por mais sensato que seja - sobre a finalidade que ‘conviria’ fosse por ela perseguida’ - Celso Antonio Bandeira de Mello - em parecer inédito”.

4 Neste aspecto, a afirmação está relacionada à aplicação de alguma norma vigente, e não à situação de ausência de norma, para a qual o art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro prescreve os critérios em que o juiz deve se basear para decidir, e em cuja situação, tratando-se do direito tributário, as diretrizes para integrá-lo estão na norma especial do art. 108 do CTN, que, em conjunto com o art. 97, (e obviamente do inciso I do art. 150 da Constituição, do qual decorrem), veda a exigência de tributo não previsto e lei.

5 A legalidade exige aplicação das leis para o futuro, não retroativa, salvo para beneficiar.

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ela, pois diz quando os atos e negócios jurídicos são válidos e produzem efeitos perante o fisco.

Fixados, pois, os critérios metodológicos e as premissas que se pretende seguir, podemos passar a entender porque o direito privado sempre tem validade no âmbito das obrigações tributárias, ou melhor, sempre age sobre estas, inclusive participando da sua própria existência.

Entretanto, preliminarmente advirta-se para que outro debate dispensável no contexto do tema a ser aqui estudado, tema arcaico porém sempre posto em debate e ultimamente com a inversão de preponderâncias, é o da eventual autonomia do direito tributário, a par de uma suposta supremacia do direito privado.

Aquela autonomia é ideia superada desde os anos sessenta do século passado, e esta supremacia é combatida sem qualquer necessidade, porque ela não existe e nunca existiu.

Com razão, tal como será explicitado a seguir, cada grupo de normas se separa dos outros (plural, porque não se trata apenas de direito privado e de direito tributário) exclusivamente em função dos respectivos objetos de legislação, cada um servindo ao respectivo fim e sem que se possa enxergar qualquer prevalência de um sobre os demais. Não há qualquer critério científico ou qualquer disposição legal, inclusive na Constituição, que dê maior prevalência para um dos ramos do ordenamento em detrimento dos demais, e nenhuma dúvida pode existir de que a exegese jurídica dispensa qualquer pensamento neste sentido, assim como assegura que a totalidade das normas deve ser interpretada de modo sistemático e absolutamente harmônico.

Sabemos da divisão dos ramos do direito, que alguns aceitam para uso meramente didático, mas que verdadeiramente são delimitados pelos respectivos objetos, ou seja, atendo-nos apenas ao que ora interessa, o ramo do direito privado regula as relações jurídicas intersubjetivas, estabelecendo direitos e obrigações no âmbito patrimonial pessoal, e o ramo do direito tributário regula as relações jurídicas entre as pessoas naturais ou jurídicas e as pessoas jurídicas de direito público constitucionalmente autorizadas a cobrar determinados tributos.

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Destarte, perante esta separação de objetos das normas jurídicas, podemos refrasear e especificar a afirmação correta e contrária à teoria, dizendo que os e atos e negócios jurídicos do contribuinte (ou mesmo do não contribuinte), quando praticados validamente perante o direito privado, produzem efeitos perante o direito tributário e não podem ser ignorados ou desconsiderados pelo fisco. Se houver intenção de confrontar a teoria, pode-se dizer que os atos e negócios jurídicos válidos perante o direito tributário são, sim, oponíveis ao fisco, mas a verdade verdadeira, sem recursos retóricos, é que tais afirmações (tanto a da teoria quanto a que assim a contradite) não se compaginam com o direito vigente.

Realmente, os efeitos dos atos e negócios jurídicos válidos perante o direito privado podem ser favoráveis ou desfavoráveis aos interesses arrecadatórios, porque as normas do direito privado não visam efeitos tributários, eis que disciplinam tão-somente efeitos patrimoniais pessoais, e, portanto, os seus efeitos não são necessariamente contrários ao fisco, entendido este como entidade pública arrecadadora de tributos. Ao invés disto, os atos ou negócios podem dar nascimento a obrigações tributárias, como veremos, malgrado o que, a afirmação da sua inoponibilidade ao fisco somente existe porque posta em prática no campo minado das disputas em torno de elisão e evasão fiscal.

Porém, trata-se de adoção de uma premissa falsa, dado que as normas do direito privado não são, em si, contrárias ou favoráveis ao fisco, e é até por isto que este pode defender seus interesses com base nas invalidades prescritas pelo mesmo direito privado. “Mutatis mutandis”, quando os atos forem válidos perante este direito, eles obrigatoriamente são válidos face ao fisco, que deve respeita-los.

Na verdade, é meramente sofismática a afirmação de que o ato pode ser válido perante o direito privado, mas ser inoponível ao fisco, a começar porque não se trata de opor ou deixar de opor algo ao fisco, mas, sim e sempre, de se constatar a ocorrência ou não de eventos fáticos disciplinados pelo direito privado e a sua regularidade perante as normas deste, para a seguir se aplicar as normas tributárias a eles correspondentes.

Vejamos.

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Para começar, nada melhor do que ter em mente a função que o direito privado exerce na vida das pessoas, particularmente naquela parte da vida que tem a ver com seus patrimônios, ou seja, com suas relações dotadas de conteúdo econômico nas quais, portanto, situa-se o que no direito tributário se denomina “capacidade contributiva”.

E no vero começo do próprio começo do nosso estudo, a própria noção de patrimônio advém do direito privado. Nem poderia ser diferente no Estado de Direito, em que os direitos e as obrigações dependem de normas jurídicas, sendo que o patrimônio é constituído pelo conjunto de direitos e de obrigações com conteúdo econômico que uma pessoa tenha, a ela outorgados por atos ou negócios jurídicos segundo as respectivas disciplinas legais, ou mesmo a ela atribuídos diretamente por norma legal (a propósito, veja-se o art. 91 do Código Civil, cujas precisas palavras são:

“Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico”).6

E nada entra no patrimônio nem nada sai dele a não ser por atos e negócios jurídicos, ou por suas extinções, pois somente em situações não comuns algum direito pode nascer a partir de um fato natural, embora mesmo neste caso dependam de norma jurídica a existência do direito e a sua incorporação ao conjunto patrimonial do seu titular.

Isto no domínio das relações intersubjetivas, independentemente das consequências que tais eventos possam gerar em outras frentes, mas é nesse domínio que ocorrem as manifestações de capacidade contributiva tributária quando alguém compra, vende, doa ou recebe doação, herda por sucessão hereditária ou testamentária, mantém propriedades, etc..

Para cada uma dessas ocorrências pode haver a previsão constitucional de uma respectiva competência tributária (qualquer uma), a qual, contudo, somente pode ser exercida se as pessoas situadas na jurisdição do ente competente praticarem aqueles atos ou vivenciarem aqueles fatos.

6 Evidentemente, a despeito da sua importância, esse código não representa a inteireza do direito privado, que também compreende a lei das sociedades por ações e várias outras normas de leis esparsas.

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Ao contrário, se nada se fizer, nenhum tributo será devido, pois a competência tributária (qualquer delas, sem exceção) não significa a possibilidade de exigir tributo sem seu fato gerador, ou de exigir que alguém pratique qualquer fato gerador.

Dizendo de outro modo, sem alguém vender, por exemplo, não se tornam devidos os tributos que podem incidir sobre a venda propriamente dita ou sobre os seus efeitos econômicos. E, para haver venda, é necessário que entre duas pessoas haja concordância com os termos da conclusão desse negócio jurídico, o que somente pode ocorrer segundo as normas do direito privado aplicáveis a ele.

Portanto, o direito tributário depende do direito privado, sem o qual não se aperfeiçoam as situações necessárias e suficientes ao nascimento da obrigação tributária, segundo os dizeres do art. 114 do CTN.

Isto é assim muito nitidamente, e de forma direta, nos tributos cujos fatos geradores sejam situações jurídicas, tais como os impostos sobre a propriedade ou sua transmissão, para os quais o fato gerador somente se considera ocorrido desde que a respectiva situação esteja constituída de acordo com a norma de direito aplicável, que é norma do direito privado (é o que prescreve textualmente o inciso II do art. 116 do CTN).

Mas há fato geradores que não repousam sobre atos ou negócios jurídicos em si, os quais podem ser situações meramente de fato. O art. 116 do CTN, para contrapor tais fatos geradores aos que são situações de direito, declara no seu inciso I que se consideram ocorridos desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produzam os efeitos que normalmente lhes são próprios.

Nestes casos – em que o fato gerador não seja uma estrutura jurídica –, a lei complementar persegue os efeitos próprios de cada situação, os quais evidentemente são os efeitos econômicos, mas é imperioso perceber que as circunstâncias materiais produtoras de tais efeitos podem estar abrangidas por normas do direito privado.

Por exemplo, reconhecidamente o ICMS não incide sobre o negócio jurídico de venda ou outro qualquer especificamente considerado, motivo pelo qual não se submete ao inciso II do art. 116. Ao contrário, a situação que configura o fato

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gerador desse imposto é a circulação de mercadorias, não mera circulação física (que, aliás, não denotaria qualquer capacidade contributiva), mas circulação econômica que necessariamente é impulsionada por algum negócio jurídico, sem o qual ela não existe.

O mesmo ocorre com o imposto de renda, que incide sobre acréscimo patrimonial cuja disponibilidade econômica ou jurídica tenha sido adquirida, a qual, por sua vez, depende das normas do direito privado, pois somente é possível haver acréscimo ao patrimônio com a incorporação de um novo direito a ele, ou com a extinção de obrigações nele incluídas anteriormente.

Veja-se, portanto, que as situações de fato a que alude o inciso I do art.

116 do CTN não são meros fatos do mundo natural – como a passagem de um dia para outro, ou estar chovendo, ou andar a pé na Rua Direita – mas situações em que haja efeitos econômicos, as quais acabam por se envolver e depender do direito privado, embora não sejam os atos e negócios jurídicos por estes disciplinados que se constituam na situação configuradora de algum fato tributário.

Na mesma toada, antes de pactuar uma compra e venda, e antes de cumpri-la, a pessoa proprietária de determinado objeto tem sobre este os direitos inerentes à propriedade e que são assegurados pelo direito civil, com fundamento maior na Constituição, mas não é contribuinte de qualquer tributo cujo fato gerador seja a venda ou os efeitos da venda. Quando muito, essa pessoa é contribuinte de imposto sobre a propriedade, se o objeto for um veículo automotor ou um imóvel, mas não poderá ser denominada contribuinte de outros tributos.

Já quando tiver concluído um negócio de compra e venda daquele mesmo objeto, e o tiver cumprido, estando constituída a situação jurídica de acordo com as normas do direito civil, o antigo proprietário (agora titular do direito ao preço da venda), será contribuinte do imposto de renda que incida sobre seu ganho de capital acaso verificado, como também poderá ser contribuinte dos tributos que incidam sobre outros efeitos econômicos desse ato (por exemplo, o ICMS e contribuições sociais sobre a receita), e o adquirente poderá tornar-se contribuinte do imposto sobre a transmissão da propriedade (por exemplo, o imposto sobre a transmissão de direitos imobiliários “inter vivos”).

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Neste passo, não cabe invocar o art. inciso I do 118 do CTN, como tantas vezes é feito impropriamente, e afirmar que o fato gerador independe da validade dos atos e negócios jurídicos. Esta é uma leitura rasa do art. 118, sem qualquer apreciação crítica e sequer considerando a sua totalidade.

Na verdade, esse dispositivo da lei complementar preceitua que “a definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se (I) da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos, e (II) dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos”.

Vê-se que o art. 118 não disciplina o momento de ocorrência de qualquer fato gerador, nem os elementos constitutivos de qualquer um deles, mas contém norma sobre a definição do fato gerador em tese e em geral (pois as definições específicas e seus elementos estão em outros dispositivos), e, ao mesmo tempo que nessa definição o art. 118 despreza a validade jurídica dos atos (inciso I), também despreza os efeitos dos fatos (inciso II). Deste modo, se lido pura e simplesmente, sem preocupação crítica, inclusive sistemática, o dispositivo pode conduzir ao equívoco de se pensar ser necessário abstrair-se tanto de validade jurídica quanto de efeitos.

Destarte, os incisos do art. 118 somente fazem sentido se forem compreendidos e adotados paralelamente aos incisos do art. 116, vale dizer, o inciso I não pode ser referido aos fatos geradores que sejam situações jurídicas, porque iria contra o disposto no inciso II do art. 116, ou seja, o inciso I do art. 118 somente pode estar relacionado ao inciso I do art. 116, e o inciso II do art. 118 somente pode estar relacionado ao inciso II do art. 116, e não ao seu inciso I, ainda que muitas vezes os efeitos das situações de fato dependam das situações jurídicas.

Assim, quando o fato gerador for situação de fato, como ela deve produzir os efeitos que normalmente lhe são próprios, interessam apenas tais efeitos, mas não a validade jurídica deste ato ou negócio jurídico, somente deste modo sendo possível aplicar o inciso I do art. 116, e também os incisos I e II do art. 118. Isto é assim porque pode haver situações inteiramente de fato, como a entrada de mercadoria estrangeira no território nacional, ainda que em outras situações, consideradas de fato, porque o fato gerador não é o ato ou negócio jurídico propriamente dito, os efeitos econômicos promanem de atos ou negócios jurídicos.

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Assim, também, quando o fato gerador for situação jurídica. Como ela deve estar definitivamente constituída de acordo com a respectiva norma, desde o momento da sua constituição definitiva nasce a obrigação tributária, em geral independentemente dos seus efeitos, o que somente será relevante se a específica norma de incidência relacionar o fato gerador a determinado efeito do ato, isto é, se a específica norma de incidência incluir em seus elementos algum objeto específico ou algum efeito determinado7. Quer dizer, em geral a obrigação pode já existir desde a constituição definitiva do ato ou negócio jurídico, sem depender de qual seja seu objeto ou de que produza seus efeitos. Somente assim, se consegue dar aplicação ao inciso II do art. 116 e ao art. 118, sem se colidirem.

Esta breve incursão nos art. 116 e 118 do CTN, lembrando também do disposto no art. 117, nos leva a concluir ser impossível desconsiderar os fatos tais como eles são, não somente pelo que já foi dito, mas também se atentarmos para que os dois incisos do art. 118 dão ênfase a eventos efetivamente ocorridos, o inciso I ao falar em

“atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros”, e o inciso II mencionando os “efeitos dos fatos efetivamente ocorridos”.

Vale dizer, o fato gerador não é uma mera hipótese, ou alguma coisa construída abstratamente pelo aplicador da lei, mas algo efetivamente ocorrido, algo com consistência efetiva, que se costuma denominar “materialidade tributária” ou

“verdade material”.

Se adicionarmos a isto a primeira ação da atividade de lançamento, que é

“verificar a ocorrência do fato gerador” (art. 142), corroboramos que não é dado ao agente lançador efetivar o lançamento sobre fato diverso daquele que ele verificou ter ocorrido, com todos os elementos do seu conteúdo, inclusive os derivados do direito privado que forem integrantes da hipótese legal de incidência, à qual o agente está funcionalmente vinculado.

Por conseguinte, não é dado ao fisco, através de seus agentes, criar o fato gerador, mas apenas verificar a sua ocorrência, ao contrário do contribuinte ou outro sujeito passivo, do qual depende o nascimento da sua própria obrigação tributária8,

7 A ressalva é evidentemente cabível, pois os art. 116 e 118 são normas gerais, nada impedindo que normas especiais agreguem elementos não previstos nas gerais.

8 Esta dependência existe mesmo tratando-se de obrigação “ex lege”, porque esta espécie de obrigação é caracterizada por ter fonte na lei e não em contrato, o que não impede que ela dependa da existência de algum fato descrito na norma, a partir do qual esta incide e nasce a obrigação.

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seja porque este tem liberdade para praticar ou não este ou aquele ato, seja porque, tendo em mira o art. 118, o agente fiscal está adstrito aos atos e fatos efetivos, em clara percepção de que o fato gerador não tem geração espontânea, mas, sim, nasce a partir de práticas das pessoas.9

Neste cenário, pois, o fisco está amarrado às ocorrências efetivas que verificar, sem poder altera-las.

Por isso, do mesmo modo que ele não pode dizer que uma mercadoria entrada no território nacional é estrangeira, quando ela não é, ou dizer que uma mercadoria estrangeira entrou no território nacional, quando ela não entrou, não pode dizer que ocorreu uma venda ou uma renda quando venda ou renda não houve.

Também, pelas mesmas razões, não pode dizer que um contrato de venda é um contrato de locação, ou que um provimento de recursos para aumento de capital corresponde a um negócio jurídico de mútuo, etc..

Em poucas palavras, os atos e negócios jurídicos perfeitos e acabados, e os efeitos que produzem segundo a disciplina do direito privado, não podem ser desconsiderados ou requalificados pelo fisco.

Nem diverge disso, e de tudo quanto foi dito antes, o parágrafo único do art. 116, que, como se sabe, decreta o seguinte: “A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”.

Temos aí uma norma que autoriza as autoridades a desconsiderarem atos ou negócios jurídicos, porém apenas nas circunstâncias enumeradas, o que permite

9 CARVALHO, Paulo de Barros. Fundamentos Jurídicos da Incidência Tributária, 1996. Veja-se também, Direito Tributário – Linguagem e Método. São Paulo: 2008, Noeses, p. 169: “Não se dará incidência se não houver um ser humano fazendo a subsunção e promovendo a implicação que o preceito normativo determina”, acrescentando que “as normas não incidem por força própria”.); MACHADO, Brandão. Prefácio ao livro Imunidade Tributária, de José Wilson Ferreira Sobrinho, Sergio Antônio. São Paulo: Fabris, 1996, p. 50. Inspirado em Pontes de Miranda e tratando exatamente da incidência da norma tributária: “A grande verdade é que o homem, e somente o homem é quem decide se determinado fato produz, ou não, consequências jurídicas”; ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária.

São Paulo: 1990, Revista dos Tribunais, 4ª ed.: chama o contribuinte de “promovente ou idealizador” do fato gerador “o promovente ou idealizador do fato que suscitou a incidência (o contribuinte ‘stricto sensu’ - art. 121, parágrafo único, I, do CTN, o sujeito passivo ‘natural’ ou ‘direto’”) –, ou o “‘realizador’ do fato imponível”.

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estabelecer o pressuposto de que, fora dessas circunstâncias, não há autorização para a desconsideração.

Nesta senda, é impossível a desconsideração também dos efeitos próprios dos atos e negócios jurídicos validamente praticados, pois seria ilusória a inexistência de desconsideração do ato ou negócio se os efeitos que as normas legais lhes atribuem pudessem ser desconsiderados.

Aliás, se não fosse assim, a norma desse parágrafo estaria em colisão com todas as demais normas do mesmo código, inclusive com os dois incisos do próprio art.

116. Porém, ela não contradiz os dois incisos e as demais normas, porque somente permite a desconsideração dos atos ou negócios jurídicos que dissimulem a ocorrência do fato gerador, ou a dos atos e negócios jurídicos que dissimulem os elementos constitutivos da obrigação tributária.

Ocorre que, nas hipóteses em que a norma autoriza a desconsideração dos atos ou negócios jurídicos, estes não completam a ocorrência do fato gerador, tal como prescreve o inciso II do mesmo artigo, ou seja, pela nulidade derivada da dissimulação, não está definitivamente constituída a situação jurídica que corresponde ao fato gerador.

É o mesmo que se dá quando o fato gerador não for o ato ou negócio jurídico, mas um efeito seu, uma vez que a nulidade não permite que ele produza efeito.

É possível que se diga que, a ser assim, o parágrafo único do art. 116 seria inútil, salvo quanto à exigência de observância dos procedimentos a serem estabelecidos pela lei. De certo modo, tal dizer tem razão, pois simulações sempre interferiram nas relações tributárias inclusive antes do advento do parágrafo único, e continuam a interferir depois dele, mesmo sem a promulgação da lei ordinária procedimental a que alude. Mas isto decorre da inabilidade do legislador ao promulgar esse parágrafo.

Entretanto, com ou sem a ajuda do parágrafo único, o ordenamento vigente, considerado em seu todo, não agasalha as violações das suas próprias normas, o que seria autofagia sistêmica, e se encarrega de negar ou retirar efeito às ações contrárias a ele.

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E, por coerência e sobrevivência sistêmica, o ordenamento10 resguarda a validade e a eficácia das ações que tenham sido praticadas sob sua disciplina e sua tutela, o que tem consequências amplas, não somente quanto à existência e natureza dos atos e negócios jurídicos praticados, como também quanto a todos os seus elementos constitutivos e aos efeitos que produz no mundo econômico, onde há direitos e obrigação tanto privados quanto públicos.

Assim, se, por exemplo, ninguém duvida que a propriedade adquirida conforme o Código Civil seja direito “erga omnes”, inclusive perante as pessoas jurídicas de direito público, isto é, que estas não podem dizer que o direito decorrente da lei privada é válido, mas não lhes é oponível, por que seria diferente com outros direitos igualmente derivados na mesma lei privada?

Entre os elementos constitutivos dos atos ou negócios jurídicos, um que acarreta forte impacto nas relações jurídicas tributárias é o valor que as partes atribuem aos objetos daqueles atos e negócios, dado que tais valores, além do seu efeito e significado na esfera das partes segundo o direito privado, dão realidade à manifestação de capacidade contributiva emanada de cada um, quantificando-a devidamente para fins tributários.

Em decorrência, as bases de cálculo tributárias equivalem aos valores praticados nos atos e negócios, tanto quanto são eles as bases quantitativas pelas quais as partes exercem seus direitos ou cumprem suas obrigações decorrentes daqueles atos e negócios, ou seja, são eles os preços a serem cobrados e pagos, ou os montantes sobre os quais incidem juros por taxas igualmente pactuadas nos respectivos negócios, etc..

Daí que tais valores transpõem-se no domínio tributário para as bases de cálculo dos tributos devidos, e também por eles integram o patrimônio das partes, seja a título de entrada, seja de saída, somente sendo alterados quando alguma norma prescreva alguma revalorização para algum fim específico.

No direito privado há, por exemplo, a revalorização de alguns ativos e passivos para efeito de aferição do valor econômico de uma empresa. Outras vezes, valores econômicos são aferidos com a finalidade de estabelecer paridades patrimoniais, sem necessariamente representarem preços ou contraprestações de atos

10 Inclusive o art. 167 do Código Civil e o parágrafo único do art. 116 do CTN.

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jurídicos, tal como quando se avaliam (por qualquer critério ou método) patrimônios empresariais que se juntam, situações em que as avaliações visam estabelecer justas participações individuais dos sócios (as relações de substituição de títulos).

E igualmente, no campo das relações tributárias, os valores dos atos e negócios jurídicos são revalorizados apenas quando, excepcionalmente, alguma norma jurídica assim determine, em situações que podem ser subdividas em:

– bases de cálculo que se despreguem dos valores de atos ou negócios jurídicos porque a natureza dos respectivos tributos requer outro critério de valorização das respectivas bases de incidência, e assim é reconhecido pela lei: é o que ocorre com os impostos sobre a propriedade, que podem ser cobrados sobre o valor venal dos bens, com o qual não se confundem necessariamente os preços pelos quais os bens tenham sido adquiridos;

– bases de cálculo que deveriam corresponder ao valor dos negócios jurídicos, mas para os quais a lei estabeleça bases mínimas ou máximas com vistas a atender a praticidade de sistemas de arrecadação (como na substituição tributária), ou para estabelecer efeitos tributários de práticas não necessariamente ilegais, mas desinteressantes para a arrecadação (como nas hipóteses de distribuição disfarçada de lucros ou de preços de transferência);

– bases de cálculo arbitradas por não merecerem fé os valores documentados, ou se estes forem omissos.

Na prática, todos sabem que quaisquer dessas três disparidades entre valores documentais e bases de cálculo tributárias são fontes de litígios, a despeito de que a primeira delas teoricamente tenha forte fundamentação jurídica, girando as controvérsias em torno dos critérios e dos resultados da valorização quantitativa neste ou naquele caso.

A segunda situação requer comentários mais específicos em torno das normas antiabuso, não cabentes neste espaço, e a terceira é que nos interessa porque, na sequência do que estava sendo exposto, representa o antídoto que o ordenamento fornece para a sua própria proteção.

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Realmente, as relações jurídicas tributárias pautam-se pelos atos ou negócios jurídicos praticados segundo as respectivas disciplinas legais, inclusive considerando os seus elementos constitutivos, e dentre eles seus valores, mas o direito tributário se defende contra aqueles que contenham vícios capazes de invalida-los ou anula-los, tal como se dá com as simulações em geral e com as dissimulações em particular.

E, no tocante aos valores dos atos e negócios jurídicos, o antídoto contra possíveis inverdades está no art. 148 do CTN, segundo o qual, “quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial”.

Esta é uma faceta geralmente olvidada ou posta em segundo plano, mas, no contexto da presente exposição, vem confirmar como o direito tributário está atrelado ao que ocorre no direito privado, pois no particular aspecto – e aspecto de magna relevância – dos valores praticados ou documentados, sua desconsideração não está aberta ao arbítrio ou à discricionariedade do fisco, somente podendo ocorrer nas situações previstas no art. 148 da lei complementar, caso em que poderão ser substituídos mediante os procedimentos de cautela que ele mesmo estabelece.

Voltamos, assim, ao ponto acima exposto, segundo o qual o direito tributário depende do direito privado, “para o bem ou para o mal”, “para o bem do fisco ou do contribuinte”, porque os fatos geradores dependem dos movimentos econômicos praticados pelas pessoas em suas vidas patrimoniais, e esses movimentos são necessariamente praticados conforme o direito privado.

Isto não significa o primado do direito privado, ou sua superioridade perante o direito tributário, porque as normas de um e de outro atuam sobre os fatos e atos da vida com objetivos distintos.

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Não por outra razão a norma do art. 109 do CTN preceitua e prescreve com meridiana clareza e consistência sistemática que “os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”.

Veem-se nitidamente confirmados os objetivos e as finalidades das normas desses dois campos do direito positivo, o que se prolonga na norma explicitadora das competências tributárias, estabelecida no art. 110.

A inexistência de superioridade do direito privado, portanto, é nítida, e nem se abala ante o fato de que no plano lógico se pode estabelecer a necessária ocorrência primeiramente da situação jurídica regulada pelo direito privado, para que, a seguir, hajam os efeitos da norma tributária apropriada, seja o de incidência deste ou daquele tributo, seja o de não incidência de outros, ou mesmo o de uma isenção.

Com razão, no plano cronológico temporal, as duas normas (ou mesmo mais de uma) incidem sobre o ato ou negócio jurídico, ou seus efeitos, tão logo eles existam, todas ao mesmo tempo, mas logicamente podemos perceber que a norma tributária somente pode incidir e produzir efeito após a existência do fato, o qual pode ser um ato ou negócio jurídico. Em outras palavras, primeiro vem o fato e depois a norma jurídica incide sobre ele, de tal arte que, quando o fato for um ato ou negócio jurídico regido pelo direito privado, primeiro vem este, para que possa incidir a norma tributária destinada a ele.

Avançando na apreciação deste tema, outro aspecto que merece a maior consideração é o que diz respeito à natureza dos atos ou negócios jurídicos.

Na vida real, é comum a fiscalização, por exemplo, enxergar um determinado negócio onde ele não existe, tal como afirmar que determinado aumento de capital na verdade seria mútuo, e muitas outras alegações. Tais distorções não ocorrem apenas pelo lado do fisco, pois contribuintes também podem recorrer, e recorrem, a distorções na natureza jurídica deste ou daquele ato ou negócio jurídico.

Tudo isto se resolve não por afirmações retóricas, mas através de recurso aos meios que o próprio ordenamento jurídico provê, sendo importante não se deixar iludir por argumentos neste ou naquele sentido, esquecendo-se de que o direito privado não protege apenas as pessoas individualmente consideradas, mas se protege a

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si próprio. Uma boa evidência disto é que a atual codificação civil considera nula a simulação inocente, que é aquela não causadora de dano a alguém, mas que, a despeito disto, não produz efeitos pela simples ruptura que representa para a própria sanidade do sistema.

Nesta ordem de ideias, a solução para qualquer dúvida quanto a se tratar deste ou daquele ato ou negócio jurídico (e à sua própria existência) está na lei privada, e é esta que deve fornecer todos os fundamentos para a resolução dos conflitos.

Isto é assim porque atos e negócio jurídicos são criações de normas jurídicas, e, portanto, são o que são conforme as respectivas normas criadoras, e não o que se queira que sejam.11

Com razão, os seres em torno dos quais o direito gira podem ser, em suas concepções originais, seres naturais ou jurídicos. Todos os naturais podem passar a ser seres jurídicos quando forem juridicizados ao se tornarem objetos de mandamentos legais, mas os seres jurídicos já nascem dentro do direito, ainda que tenham por objeto coisas do mundo fenomênico.

Os seres naturais são identificados e distinguidos entre si por suas propriedades intrínsecas, a eles dadas pela natureza, propriedades estas que a ciência pode detectar e comprovar, além de que determinadas características são visíveis e podem ser apreendidas por qualquer homem sem necessidade de ser cientista. Em grandes questões, de enorme relevância para a humanidade, os testes de DNA fornecem as respostas necessárias12.

O direito tributário, quando a norma repousa sobre fatos da natureza, não pode ignorar o que eles são no mundo natural.13

11 A afirmação é feita para os atos e negócios jurídicos tipificados. Todavia, embora não muito comuns, existem e são legais (Código Civil, art. 425) os negócios jurídicos atípicos ou inominados, os quais têm sua identidade estabelecida pelas cláusulas que as partes livremente convencionem, desde que observem as normas gerais fixadas no código.

12 De uma maneira simples, o DNA (Ácido Desoxirribonucleico) pode ser definido como uma molécula presente no núcleo das células de todos os seres vivos e que carrega toda a informação genética de um organismo.

13 Como bem alertou o Ministro ALIOMAR BALEEIRO, transcrevendo trecho do acórdão recorrido no Recurso Extraordinário n. 70213-SC (1ª Turma, julgamento em 3.11.1970), “o produto é industrializado não porque a lei assim o determine, mas quando sofre um processo de industrialização que lhe altere a natureza, de modo a perder a qualidade de produto agrícola, pecuário ou extrativo para adquirir a de produto manufaturado. A lei não pode dizer que é produto industrializado, produto que não é. Se o faz, viola a Constituição, segundo o ensinamento de Pontes de Miranda”.

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Assim também é com os seres jurídicos, ou seja, com os atos ou negócios jurídicos, com a diferença de que suas características genéticas são estabelecidas pelas normas jurídicas que os criam e regulam, especialmente determinando os efeitos que produzem nas relações intersubjetivas. Quer dizer, a identidade de cada um corresponde à sua própria causa de existir.

O direito brasileiro reconhece na causa dos atos e negócios jurídicos a sua função social ou econômica, e assim estabelece a natureza jurídica de cada um deles, a qual se constitui na sua substância essencial. Os autores empregam diversas expressões para se referir à causa, tal como “causa de atribuição patrimonial”, “causa substancial”,

“causa jurídica”, “causa legal”, “causa típica”, “causa objetiva” e outras.

A causa de um ato ou negócio jurídico não se confunde com o motivo para a sua prática, ou à vontade de pratica-lo, mas exatamente à função que o ato desempenha dentro da sociedade jurisdicionada pela norma. No dizer de JOSÉ CARLOS MOREIRA ALVES, a causa é a “função prática” que o ordenamento jurídico confere a cada ato ou negócio jurídico quando o cria14, expressão também adotada por HELENO TAVEIRA TÔRRES15. A doutrina é pacífica a este respeito, valendo citar ORLANDO GOMES, para quem a causa desempenha a dupla função de tipificação dos negócios e de definição das vicissitudes da relação jurídica oriunda do negócio16. E todos os autores reconhecem a distinção entre causa e motivo17, a propósito do que um expressivo trabalho é o de FLÁVIO TUDISCO, que se reporta a Moreira Alves18, podendo-se citar, entre outros, também ORLANDO GOMES19, PABLO STOLZE GAGLIANO20 e AGOSTINHO ALVIM21, além de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, para quem, na caracterização da causa, é preciso expurga-la do que sejam meros motivos, e isolar o que ele denomina

14 ALVES, José Carlos Moreira. As Figuras Correlatas da Elisão Fiscal. Belo Horizonte: 2003, Editora Fórum, Revista Fórum de Direito Tributário, n. 1, p. 11; São Paulo: 2004, Pesquisas Tributárias – Nova Série – 10, Centro de Extensão Universitária/Revista dos Tribunais, p. 13.

15 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Tributário e Direito Privado. São Paulo: 2003, Revista dos Tribunais, p. 141 e 142.

16 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil, Rio de Janeiro: 1999, Forense, 14ª ed., p. 372.

17 Não é incomum encontrar alguém que confunda causa com motivo, e há até um detalhe pitoresco a este respeito: o art. 90 do Código Civil de 1916 dizia que a falsa causa viciaria o ato quando expressa como razão determinante ou como condição, mas o código de 2002 atentou para a impropriedade, passando a dispor, no art. 140, que o falso motivo vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante. A firmeza conceitual da lei em vigor manifesta-se pela harmonia entre seu art. 140 e o que ela determina no art. 149.

18 TUDISCO, Flávio. A Causa dos Negócios Jurídicos, a Prevalência da Substância sobre a Forma e o Direito Tributário Brasileiro. São Paulo: 2008, Instituto Brasileiro de Direito Tributário/Dialética, Direito Tributário Atual n. 22, p. 207.

19 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Rio de Janeiro: 1999, Forense, 14ª ed., p. 337.

20 GAGLIANO, Pablo Stolze. O Contrato de Doação – Análise Crítica do Atual Sistema Jurídico e os seus efeitos no Direito de Família e das Sucessões. São Paulo: 2007, Saraiva, p. 10.

21 ALVIM, Agostinho. Da Doação. São Paulo: 1980, Saraiva, 3ª ed., p. 10.

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“razão jurídica” do fenômeno, para abandonar aqueles e atentar nesta, esclarecendo textualmente que na causa há um fim econômico ou social reconhecido e garantido pelo direito, uma finalidade objetiva e determinante do negócio, que o agente busca além da realização do ato em si mesmo22.

Tratando-se de atos ou negócios jurídicos, a vontade consciente e livre de pratica-lo é requisito de validade, pois a vontade viciada por erro ou coação pode ser razão de anulabilidade do ato.

Mas o motivo, que impulsiona a vontade a querer praticar o ato ou negócio, é absolutamente irrelevante para a sua validade e para a identificação da sua natureza, dado que a causa não se altera em função do motivo, isto é, locação tem substância de locação porque sua causa é a entrega do uso de um bem, pelo proprietário a outrem, mediante retribuição de aluguel, e sempre será esta, seja o motivo do proprietário manter o imóvel ocupado com medo de invasões ou para lucrar os alugueis, do mesmo modo que nada se altera se o inquilino aluga porque quer usar ele próprio ou dar o uso a um familiar, ou para guardar suas coisas.

Neste sentido, o motivo somente invalida o ato ou negócio jurídico se for ilícito, for determinante da sua prática e for comum a ambas as partes (hipótese de nulidade segundo o inciso III do art. 166 do Código Civil), assim como, se o motivo for falso, vicia a declaração de vontade quando estiver expresso como razão determinante para o ato ou negócio (art. 149).

O código de 2002 refere-se à causa como “função” ou “fim” do ato ou negócio jurídico, como se lê nos art. 187 e 421, o primeiro a configurar como ato ilícito aquele em que o titular de um direito, ao exercê-lo, exceda manifestamente os limites impostos pelo fim econômico ou social desse ato ou negócio, e o segundo ao descrever a liberdade de contratar, para exigir que seja exercida em razão e nos limites da função social do contrato, valendo também lembrar que são lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes, além daquelas que privem de todo efeito o negócio jurídico ou o sujeitem ao puro arbítrio de uma das partes (art. 122).

22 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: 2014, Forense, vol. I, p. 424.

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Destarte, direitos em geral e direito de contratar em particular não têm validade quando exercidos com manifesto excesso em relação aos respectivos fins, isto é, às suas funções sociais ou econômicas (suas causas) estabelecidas pelas normas que lhes sejam aplicáveis, aquelas para as quais eles existem.23

Ao contrário, quando exercidos regularmente, isto é, quando praticados no exercício regular de um direito reconhecido, não se constituem em atos ilícitos (art.

188, inciso I).

Vê-se, pois, que a regra dominante é a liberdade, porque a regra geral é de que todas as condições são lícitas independentemente de expressa declaração legal, pois a lei, ao contrário, somente lista as que não têm validade, inclusive, por sua importância, as que sejam contrárias à ordem pública ou às normas gerais do Código Civil.

Outrossim, a liberdade de pactuar cláusulas que não contrariem disposições de ordem pública existe para todas as categorias de contratos – típicos e atípicos –, o que deixa no âmbito das tratativas “inter pars” uma extensa gama de possibilidades para definir os contornos desses contratos, pois, em qualquer caso, podem ir até onde não houver contrariedade com a ordem pública e as normas gerais do código, e seja observada a função específica a cada ato ou negócio.

Assim sendo, como a causa é a função econômica ou social do ato ou negócio jurídico, e corresponde à prestação e contraprestação do mesmo segundo sua disciplina legal (no exemplo da locação, é a entrega do uso contra o pagamento do aluguel), ao cabo se pode constatar a causa de cada ato ou negócio jurídico pelos efeitos que produz, isto é, pela prestação devida por uma das partes e pela contraprestação devida pela outra.

E assim se estabelece a identidade jurídica do ato ou negócio, a qual corresponde à sua substância, mas uma substância não diferente dos efeitos estabelecidos pela norma criadora do ato ou negócio jurídico.

23 Não se deve confundir função social do direito ou do contrato com função social da propriedade, tratada no art.

1228, nem com solidariedade social.

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Repita-se que a causa é identificável pelo conjunto da prestação e contraprestação de cada ato ou negócio jurídico, e que o conjunto de prestação e contraprestação é específico a cada um, tipificando-o e atribuindo-lhe sua verdadeira natureza jurídica. Neste sentido, atente-se para que a natureza jurídica, assim como a causa, deriva do conjunto de prestação e contraprestação, e não de apenas um desses elementos, pois um só não a completa, como se percebe confrontando o contrato de compra e venda com o de permuta, pois em ambos há transferência de propriedade, e a distinção entre eles (e suas causas) reside em que num a contraprestação é o pagamento do preço e no outro é a entrega de um outro objeto.

Isto – a substância – é tão importante que o Código Civil Brasileiro admite que nas dissimulações, isto é, nas simulações relativas, a nulidade do ato ou negócio simulado não impeça a subsistência do que estiver dissimulado, desde que seja válido na substância e na forma (art. 167).

Essa norma é outro mecanismo de autoproteção do ordenamento, pois, ao mesmo tempo em que fulmina de nulidade a simulação, resguarda o ato que se dissimulou, porque, se válido na substância e na forma, merece ser resgatado e preservado.

Pela mesma razão, apesar de que os atos e negócios nulos não sejam suscetíveis de confirmação (art. 169), se, porém, um deles contiver os requisitos próprios de outro, este outro subsistirá quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, caso tivessem previsto a nulidade (art. 170). Mas para tal subsistência, o art. 173 requer que o ato de confirmação contenha a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo.

Por fim, vale notar que substância jurídica não se confunde com forma jurídica, pois forma, embora muitas vezes seja palavra usada para se referir a um ato ou negócio jurídico, na verdade é o meio de expressão ou de prova do ato ou negócio, e somente passa a ser da substância do mesmo quando for celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, hipótese em que o art. 109 diz que este é da substância do ato. Afora isto, vigoram as regras gerais segundo as quais a validade do ato ou negócio requer forma prescrita ou não defesa em lei (art. 104, inciso III), e a validade de qualquer declaração de vontade não depende de forma especial, salvo quando a lei expressamente exigir uma determinada (art. 107).

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Em suma, a identidade de um ato ou negócio jurídico não é aferida pelo título que as partes deem a ele, mas, sim, por sua verdadeira substância emanada da sua regulação legal e da correspondência entre essa regulação e a prestação e contraprestação nela previstas. E, na sua aplicação prática em cada caso, a identidade do ato ou negócio realizado será constatada pelas cláusulas e condições nele inseridas, a serem confirmadas pela prática das partes submissas a elas.

Repetindo que esta maneira de identificar todo e qualquer ato ou negócio jurídico é verdadeira e correta independentemente das consequências tributárias que acarreta – pode ser o nascimento de determinada obrigação tributária, ou o nascimento de outra, ou o afastamento de outras ou mesmo de todas –, impõe-se que ela seja aplicada e sejam respeitados os seus efeitos – tanto no âmbito privado quanto no tributário – em obediência ao princípio da legalidade, que vale igualmente em ambos campos.

Assim se procedendo, no que diz respeito à qualificação dos atos e negócios jurídicos, não haverá tergiversações instigadas por quaisquer teorias ou interesses, porque cada um deles tem como que o seu próprio DNA estabelecido inquestionavelmente em lei, sendo assim insuscetível de ignorância ou requalificação ao abrigo de quaisquer argumentos, inclusive o a da prevalência da essência econômica sobre a “forma jurídica”, em voga com mais ênfase nas práticas contábeis introduzidas em 2008 para tentar harmonizar a contabilidade brasileira com a internacional.

Se algum dia o direito constitucional brasileiro for modificado na definição das competências tributárias, e também sua lei complementar, outro poderá ser o cenário, talvez mais próximo do modelo jurídico estrangeiro vigente nas jurisdições de onde vieram as diretrizes contábeis atuais.

Todavia, enquanto viger o atual Sistema Tributário Nacional, o direito civil (e o direito privado em geral) continuará a nele interferir, e nesse ramo a identificação de cada ato ou negócio jurídico é feita através da substância que a respectiva disciplina legal lhe dá, à qual se junta a forma que for exigida ou admitida para se realizar e ser provado.

Realmente, se as prescrições legais sobre a natureza e os efeitos dos atos e negócios jurídicos não forem observadas na aplicação das leis tributárias, o mundo verdadeiramente se verá de “pernas para o ar”, com total insegurança jurídica, mas na

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gênese dessa bagunça estará o descumprimento do princípio constitucional da legalidade (com sua caraterística vigência prospectiva), o qual, enfim, está na base do Estado de Direito.

Ainda não chegamos a este ponto, pois desconheço que alguém tenha deixado de recorrer ao registro de imóveis competente para conhecer e provar o direito de propriedade imobiliária, por preferir recorrer aos assentos contábeis de alguma pessoa jurídica. Também desconheço advogado que, para confirmar a viabilidade de algum negócio imobiliário, contente-se com lançamentos contábeis e dispense as certidões que juridicamente provam o estado da propriedade e do seu titular. Nem o fisco contenta-se em averbar a existência de seus créditos tributários na escrituração contábil de alguma pessoa jurídica, ao invés de fazê-lo perante o registro de imóveis competentes.

Mas, se assim se observa no domínio dos atos e negócios jurídicos, e também no das garantias fiscais, outro tem sido o cenário no campo das exigências das obrigações tributárias, onde lançamentos ilegais algumas vezes são confirmados em decisões administrativas nitidamente equivocadas, por exemplo, quando se baseiam, como pretenso fundamento, na teoria de que os atos ou negócios jurídicos podem ser válidos perante o direito privado, mas serem inoponíveis ao fisco, porta de entrada para o arbítrio, a “bagunça” institucional e a insegurança jurídica.

Referências

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