• Nenhum resultado encontrado

QUESTÃO AGRÁRIA E SERVIÇO SOCIAL

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2023

Share "QUESTÃO AGRÁRIA E SERVIÇO SOCIAL"

Copied!
10
0
0

Texto

(1)

QUESTÃO AGRÁRIA E SERVIÇO SOCIAL: as categorias de análise da realidade e os fundamentos sócio históricos para a compreensão do rural

Bruna Michele Engel1

Resumo: O artigo aborda as categorias de análise da realidade e os fundamentos sócio-históricos para compreensão do rural.

Apresenta elementos de discussão de um pesquisa no âmbito da iniciação científica, fundamentada no método crítico dialético.

No seu desenvolvimento, destaca-se a análise sócio histórica da configuração do espaço agrário no Rio Grande do Sul, que é feita de forma a materializar a proposta defendida.

Palavras-chave: Questão Agrária; Fundamentos sócio históricos; Rural.

Abstract: This article approaches categories of reality analysis and sociohistorical fundamentals to understand the rural situation. It apresents discussion elements of a search in the scope of scientific initiation, based on critical-dialectical method.

In its development, highlights the sociohistorical analysis of the agrarian space configuration in Rio Grande do Sul, which is done to materialize the defended proposal.

Keywords: Agrarian question; Historical social fundamentals;

Rural

1 Graduanda em Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Integra o Núcleo de Estudos e Pesquisas Terra, Trabalho e Política Social, onde desenvolve pesquisa no âmbito da Iniciação Científica. Email: brunaaengel@gmail.com

(2)

1 INTRODUÇÃO

O rural brasileiro tem sido pauta de debates e estudos do Serviço Social de forma ainda tímida, apesar de haver demandas profissionais provenientes desse espaço, muitas das quais chegam nos serviços e equipamentos urbanos. Por outro lado, é certo também que nas últimas décadas o rural da classe trabalhadora se tornou mais visível no plano das políticas públicas – e neste momento, ao que a conjuntura aponta, novamente perderá visibilidade –, o que fez com que o tema começasse a aparecer mais, embora, ainda assim, considera-se tímida a sua visibilidade.

Por trás deste quadro está a conjuntura geral da sociedade capitalista brasileira e internacional e, fundamentalmente, está a estrutura de produção e exploração capitalista. Ora, ajustando o foco de análise neste sentido, nota-se que o capitalismo se apropriou do espaço agrário e nunca o abandonou, sendo sua essência o interesse econômico e o modo de produção instalado para atingi-lo. Além disso, a histórica concentração de terras, associada aos interesses dos monopólios transnacionais, continuam produzindo desigualdades sociais no campo e também na cidade, com especificidades distintas.

Também estas especificidades entre o rural e o urbano são invisibilizadas pela sociedade e pelos mais diversos profissionais, o que certamente inclui o Serviço Social. Um dos dilemas profissionais é a “tendência a considerar a sociedade brasileira numa ótica meramente urbana. Dificilmente, em nossos debates, os processos sociais agrários aparecem articulados à questão urbana, correndo o perigo de reincidirmos no velho dualismo rural urbano” (IAMAMOTO, 2007, p. 152). A autora evidencia a fragmentação na leitura da realidade e, ainda, algum distanciamento do Serviço Social em relação ao rural, o que ratifica a invisibilidade das demandas provenientes daquele espaço.

Mas, o que é o espaço rural? Como identifica-lo no debate teórico: espaço rural ou agrário ou ainda campo? E quem são os sujeitos que o constroem e constituem:

agricultores ou camponeses ou pequenos produtores, colonos no sul, caipiras no sudeste, sitiante no nordeste outras tantas identificações?

Para aproximar este debate, propõe-se este artigo, que tem por objetivo apresentar brevemente a discussão de algumas categorias fundamentais para compreensão da realidade rural, a fim de aproximar o Serviço Social com a temática.

Mas o que é realidade? Considera-se realidade como um todo estruturado dialético, contraditório e historicamente constituído, que se desenvolve de forma contínua e processual. É na realidade que as coisas existem, e assim, a realidade é a totalidade concreta.

(3)

É na realidade e a partir dela que um fato qualquer pode vir a ser racionalmente compreendido (KOSIK, 2002).

Desse modo, as categorias de compreensão da realidade, ou seja, os conceitos relativos à realidade concreta – historicamente construídos e preenchidos de significado –, são imprescindíveis para a realização da mediação entre o movimento do real concreto para o real pensado. Destarte, o real mediado; “[...] é o real reproduzido e interpretado no plano do ideal [...]” (NETTO, 2011, p 21).

Assim, esse artigo tem por finalidade trazer elementos que possibilitem uma breve análise do espaço agrário, reconhecendo as demandas profissionais existentes para o Serviço Social, evitando a fragmentação da leitura da realidade, bem como, o dualismo rural urbano.

Essa discussão decorre de uma pesquisa no âmbito da iniciação científica no Serviço Social, cuja perspectiva teórica aporta-se no materialismo histórico dialético, com abordagem qualitativa sobre o tema, que foi desenvolvida com base nas pesquisas bibliográfica e documental. Na pesquisa foram desenvolvidos debates que não poderão ser tratados com detalhes neste artigo, devido à redução do espaço.

O desenvolvimento do artigo está organizado em duas seções, nas quais se discute primeiramente as categorias fundamentais de análise da realidade agrária, e posteriormente, essas categorias são evidenciadas na formação sócio histórica do Rio Grande do Sul.

2 CATEGORIAS DE ANÁLISE DA REALIDADE RURAL

Para compreender as múltiplas realidades existentes o campo, é fundamental entender alguns conceitos que exprimem essa relação do homem com a terra. As relações sociais e produtivas no espaço rural são diversas. Isso evidencia que há diversas ruralidades resultantes do uso, da posse e da propriedade da terra, em determinado tempo histórico (STEDILE, 2012, p. 641).

Primeiramente é importante demarcar que há diferença entre os conceitos de uso, posse e propriedade. Eles são conceitos que não aparecem isolados na realidade, eles manifestam-se de forma conjunta, como por exemplo, pode-se fazer uso da terra, sem ter posse ou propriedade, ou pode-se ter posse, mas não a propriedade e nem fazer uso. De forma simples, o uso da terra está relacionado a forma de uso da natureza e ao destino dado aos produtos agrícolas no atendimento das necessidades sociais dos indivíduos. Já a posse da terra refere-se às relações sociais das pessoas que vivem na terra e seu modo de vida. E

(4)

a propriedade diz respeito às questões jurídicas, surgidas com o capitalismo, que garantem a propriedade privada, transformando a terra em uma mercadoria (STEDILE, 2012, p. 641).

Como se pode observar, apesar da separação dos conceitos para fins de definição, esses elementos estão atrelados quando o tema é a realidade rural e ademais são transversais nas relações sociais do campo. Um exemplo desse aspecto é que muitos camponeses tem o uso e a posse da terra, em decorrência da plantação e dos modos de vida rural, no entanto, não possuem a terra como sua propriedade, atuando nela através da venda da sua força de trabalho.

A agricultura, de forma geral, tem sido abordada como a forma de ‘cultivo’ no campo, para fins de produção agrícola. Especificando o olhar, percebe-se a existência de vários tipos de agricultura, que basicamente se diferenciam pelos seus objetivos distintos, pela forma de relação com a natureza, pela aplicação de recursos e pelo tipo de emprego da força de trabalho.

A agricultura camponesa é uma forma de viver o rural e fazer agricultura. Ela apresenta uma “racionalidade distinta daquela das empresas capitalistas, que se baseiam no assalariamento para a obtenção de lucro”, (CARVALHO, COSTA, 2012, p. 26), pois o uso, a posse e a propriedade da terra não tem por finalidade o lucro.

Na agricultura camponesa a produção de gêneros agrícolas não se separa do modo de viver das famílias. Dessa forma, a mão de obra predominante é a familiar. Entre seus vários aspectos, contam com o auxílio vicinal em tempos, por exemplo, de colheita, evidenciando uma solidariedade comunitária. A “[...] relação social que constrói esse espaço (território camponês) é o trabalho familiar, associativo, comunitário, cooperativo, para qual a reprodução da família e da comunidade é fundamental” (FERNANDES, 2012, p. 744).

É o campesinato, considerado aqui como sujeito coletivo, que constitui e confere forma à agricultura camponesa. Ele também apresenta uma relação cuidadosa de preservação com a natureza. Buscando o equilíbrio natural, caracteriza-se como um vínculo espiritual com a terra. Há diversos ritos de preparação da terra, semeadura, colheita, usando, inclusive, símbolos musicais, roupas, orações, ervas, entre outros. E nesse contexto que surgem as festividades de comemoração ou de pesar de momentos importantes.

Ademais, há na agricultura camponesa uma diversidade de cultivos para suprir as necessidades da família e/ou da comunidade. Esse cultivo tem, por práticas de produção, saberes tradicionais vindos do senso comum, de informações hereditárias e da prática que orientam as famílias nas decisões a serem tomadas. Desse modo, o camponês faz críticas às inovações tecnológicas, como agrotóxicos e transgênicos, recusando a sua utilização.

O resultado da produção da agricultura camponesa é destinado, muitas vezes, para consumo próprio, sendo caracterizada como agricultura de subsistência. No entanto, é

(5)

preciso destacar que os camponeses estão inseridos no capitalismo e, dessa maneira, tem relação de troca com o mercado na obtenção de produtos que não são cultivados em suas terras. Além disso, os produtos excedentes de seu cultivo também tem por destino o sistema de mercados. Portanto, “[...] os grupos camponeses [...] estão sempre inseridos em sistema de mercado, participam do mercado de terras, do mercado de produtos, do mercado de trabalho; há sistematicamente venda e compra de mercadorias” (GARCIA JUNIOR, HEREDIA, 2009, p.223).

Esse modo de agricultura de resistência ao capital é desenvolvido, especialmente, nas organizações dos movimentos sociais rurais, pois é nesse espaço que o agricultor consegue ter, em seu minifúndio ou média propriedade, uma autonomia relativa resultante da resistência coletiva. A ocupação de terras é uma das principais ferramentas coletivas na busca pela reforma agrária. Por isso, o campesinato tem o desafio de manter seu território, através de sua autonomia, enfrentando a hegemonia do capitalismo (FERNANDES, 2012, p. 746).

Assim, para o campesinato a terra tem significado de uso, posse e propriedade diverso do que para o capital, visto que, é seu lugar de produção, de moradia, de vida, de cultura; o que para o capital é apenas um lugar de produção de mercadorias para a obtenção de lucro.

Outro modo de produção agrícola é a agricultura familiar. Esse conceito generalizou-se, principalmente na década de 1990, com a atuação do movimento sindical de trabalhadoras e trabalhadores rurais e institucionalizou-se com o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Decreto nº 1946, de 28 de junho de 1996), que usa esse termo para definir a filiação de produtores. Dessa forma, esse termo é institucionalizado pelo Estado para designar a amplitude de agricultores que se encaixam em determinada política pública.

Essa forma de agricultura tem por característica principal a organização do trabalho e da produção tendo por mão de obra os membros da família. Há também o emprego do trabalho assalariado, em períodos de produção mais intensa dentro da unidade e propriedade familiar. Além disso, tem-se a venda de mão de obra nos períodos de pouco trabalho.

Diferentemente, do campesinato, há uma relativa dependência nessa realidade entre indústria e agricultura. Um exemplo desta relativa dependência na agricultura familiar ocorre principalmente no sistema de integração ou parceria, isto é, estabelecimento de contrato entre agroindústria e agricultor, que garante ao produtor capital, mercado e tecnologias relativamente estáveis.

O contrato de integração funciona da seguinte maneira:

(6)

[...] a empresa adianta o capital (na forma de insumos e tecnologia) e assistência técnica, e os agricultores, em geral pequenos (produtores), produzem em suas unidades matéria-prima que será coletada, transportada e processada por unidades industriais (CHRISTOFFOLI, 2012, p.75).

A utilização de sistemas de integração limita a diversidade de cultivos, uma vez que, o objetivo da colheita é a destinação a indústria, ou seja, ao mercado. Dessa forma, há o incentivo a monocultura, sob a justificativa de evitar a contaminação de pragas, por exemplo.

Essa estrutura de produção agrícola, se comparada ao campesinato, demonstra-se mais capitalizada, mas ainda assim não portadora de grandes capitais. Isso, pois, o agricultor destina seus produtos quase que diretamente ao mercado, tento que obter muitas das mercadorias para seu consumo de forma industrializada.

A agroindústria é um processo de industrialização da agricultura. Surgiu com a expansão capitalista do século XVII e XIX (CHRISTOFFOLI, 2012, p. 72). Tem por principal mecanismo, como explicado anteriormente, o sistema de integração ou parceria. Esse mecanismo fornece matéria prima para a indústria que coleta, processa e destina e destina o produto final ao mercado. O contrato de integração assegura a indústria “[...] matéria prima padronizada, a custos controlados, sem incorrer nos riscos diretos de produção (pois esses ficam por conta dos agricultores) e nas amarras e peso da legislação trabalhista”

(CHRISTOFFOLI, 2012, p.75).

Em reação ao crescimento das agroindústrias, camponeses e movimentos sociais criaram as agroindústrias cooperativas e associativas, tento por objetivo a resistência ao capital. Elas buscam “incentivar a agroecologia e a produção em pequenas escalas”.

(CHRISTOFFOLI, 2012, p.75).

Na fase de expansão do capitalismo atual, surgiu o termo agronegócio. Ele designa “as relações econômicas (mercantis, financeiras e tecnológicas) entre o setor agropecuário e aqueles situados na esfera industrial [...], comercial e de serviços” (LEITE E MEDEIROS, 2012, p. 79). Nesse modo de agricultura não há diversidade de cultivos, havendo apenas a monocultura e sua produção de agrícolas tem por destino majoritário a exportação, sendo controlada por empresas multinacionais estrangeiras. Este tipo de produção agrícola exige áreas extensas de terra, chamadas latifúndios, devido à lógica de produção em larga escala e de expansão do capital.

Sua produção de agrícola é feita por meio de altas tecnologias como agrotóxicos, fertilizantes, transgênicos, equipamentos e maquinários computadorizados, entre outros. Não há nesse caso, grandes preocupações com o meio ambiente, pois o objetivo principal é a obtenção do lucro, independentemente da relação que é estabelecida entre o homem e a natureza. Verifica-se que sua mão de obra é predominantemente mecanizada. No entanto, há também o emprego de trabalho braçal, por meio assalariamento temporário e permanente.

(7)

Esse trabalho ocorre tanto de forma que assegura direitos dos trabalhadores, quanto de forma degradante análoga à escravidão. Desse modo, sua orientação política evidencia as forças sociais e rurais em disputa, tornando-o o braço direito do capitalismo financeiro e industrial, assim, contrapondo-se à agricultura camponesa.

As desigualdades histórias de divisão de terras no Brasil podem ser percebidas na definição dos conceitos discutidos anteriormente. Isso exige trabalhar alguns outros conceitos, dentre os quais o de estrutura fundiária, que “refere-se ao perfil de distribuição das terras numa dada sociedade. Assim, quanto mais desigual a distribuição de terras, mas concentrada será a estrutura fundiária” (ALENREJANO, 2012, p. 353). Portanto, verifica-se que há muitos agricultores com poucas terras para produção (minifúndios e médias propriedades), e poucos agricultores tem muitas terras (latifúndios), frequentemente destinadas à pecuária extensiva de exportação, confirmando que no Brasil, uma característica predominante no meio rural é a concentração de terras destinadas a obtenção de lucro.

Esse processo de concentração fundiária, de renda e de riquezas, que em contrapartida, produz miséria, pauperismo, desigualdade e resistência no campo, como foi apresentado ao longo deste texto, constitui o que se convenciona designar por questão agrária. Esta expressão resulta das contradições do capitalismo que se manifestam no campo e decorre, inclusive, da apropriação capitalista da terra. Para compreender a relação da questão agrária com a questão social, é preciso considerar a dimensão de totalidade, desfazendo a dicotomia entre rural e urbano, e percebendo que ambas compõe uma totalidade mais ampla, ou seja, são decorrentes do processo capitalista. Dessa forma, a questão agrária é uma expressão histórica, cultural e social, da questão social, uma vez que, questão social é o conjunto das expressões de desigualdade social e resistência, decorrente da contradição capital e trabalho. (IAMAMOTO, 2007).

Enfim, esses conceitos fundamentais expressam a diversidade do campo e auxiliam na compreensão dessa realidade social. Através deles, é possível entender a relação de forças que atua na realidade do campo e esse movimento é imprescindível para reconhecer as demandas do assistente social.

3 ANALISE SÓCIO HISTÓRICA DO RIO GRANDE DO SUL

Em decorrência da formação sócio histórica do Rio Grande do Sul, contendo traços dos camponeses caboclos, das correntes migratórias, de povoamento pelos portugueses, forçadas no caso dos escravizados, e de desenvolvimento capitalista no caso dos europeus, determinam o desenho atual da agricultura gaúcha, e assim, entende-se que há diversos rurais e ruralidades no Estado.

(8)

No que tange à agricultura dos migrantes colonos europeus, no século XIX e XX, estava estritamente ligada à ideia de desenvolvimento, de progresso e de capitalismo. A chegada de italianos, alemães, poloneses, judaicos, entre outros ao Rio Grande do Sul, através de programas de incentivos do governo, que com seu modo de vida, forma de produzir e inserção no mundo capitalista, satisfaziam os interesses do Estado. Esses benefícios para o Estado estavam relacionados ao povoamento por meio da instalação de pequenas propriedades de produção agrícola, ao centro e norte, com força de trabalho familiar, comunitária, e esporadicamente por meio de contratos de trabalho; e a produção destinada ao mercado interno.

A colonização europeia significou, assim, a circulação de capital e a obtenção de lucro, isso em decorrência da comercialização de terras para a formação das colônias. Essa acumulação de capital das empresas colonizadoras possibilitou e intensificou o desenvolvimento industrial do Estado, formando as principais “dinastinas germânicas”, como as empresas Gerdal e Renner.

Os caboclos, por sua vez, tinham por modo de produção o sistema de queimadas, herdados dos indígenas e a migração para novas terras, conforme a fertilidade, visando a sua produção para consumo. No Norte do Rio Grande do Sul, sua sobrevivência era decorrente, principalmente da extração de erva-mate, da agricultura de subsistência, da coleta, da caça e da pesca, evidenciando responsabilidade para com a natureza. Nas áreas onde não havia a possibilidade de extração da erva-mate, os camponeses caboclos vendiam sua força de trabalho para grandes fazendeiros ou para o Estado, na condição de agregados ou posseiros.

(ZARTH, 2009). Eles se instalaram nas terras devolutas na região central e norte do Estado, uma vez que na região sul estavam as grandes estâncias de gado. Com isto, as companhias de colonização tiveram dificuldades de dividir lotes no norte do estado, destinados aos imigrantes europeus, em virtude dos movimentos de resistência e do grande número de caboclos que ocupavam e viviam nas terras. Foi preciso uma intervenção do governo, que ao limitar as áreas terra em lotes para cada família, fez com que o colono caboclo perdesse a abundância de terras virgens, que lhe conferiam liberdade de deslocamento e produção. Logo, as formas de fazer agricultura dos camponeses caboclos sofreram modificações fundamentais no uso, posse e propriedade da terra devido ao interesse de produção do capital que perduram até hoje.

Atualmente no Rio Grande do Sul, há o rural da concentração fundiária e da grande produção capitalista e, dialeticamente, há o rural das ocupações e assentamentos agrários.

Ao sul e oeste do Estado, predominam a concentração de grandes áreas de terras, ou seja, os latifúndios, destinados à produção de gado. São espaços agroindustriais com altas tecnologias, com uso de diversos equipamentos, com produção quase totalmente

(9)

maquinizada, e com emprego de agrotóxicos. Não havendo preocupações ambientais, a não ser aquelas determinadas por lei (quando muito), uma vez que o objetivo é a obtenção de lucro.

Nas regiões Centro e Norte, há o predomínio das pequenas produções familiares capitalizadas e as produções camponesas de resistência, isto é, os minifúndios. Destaca-se nessa região o sistema de integração ou parceria. Principalmente na região Serrana e região Norte, onde predomina a agricultura familiar capitalizada, principalmente italiana, que se consolidou com o desenvolvimento da agricultura voltada para a produção de uvas e vinhos e que, posteriormente, especializou-se também no turismo ligado a este tipo de agricultura e agroindústria.

Desse modo, nota-se que a atual configuração fundiária do Estado está permeada pela lógica produtivista do capital que perpassa, todas as ruralidades, implicando o acesso diferenciado aos bens de consumo, modos de fazer agricultura, uso, posse e propriedade da terra, produção de desigualdades e de pauperização.

4 CONCLUSÃO

Estes breves apontamentos levantados no decorrer deste artigo possibilitaram perceber, através da análise da realidade rural, os diferentes modos de vida, de trabalho, os tipos de agricultura, a forma de relação com a natureza, as relações de força que atuam no campo, e a diversidade agrária do Rio Grande do Sul, um dos maiores estados do Brasil.

Foi possível compreender, que esta questão precisa ser tomada como objeto de discussão mais ampla pela profissão, devido às suas competências e atribuições, resultantes de uma formação que se assume a partir de uma matriz teórica que exige um olhar totalizante da realidade concreta. Além disso, deve-se considerar que a questão agrária é uma expressão da questão social e, por isto, objeto de trabalho dos assistentes sociais.

Estas reflexões tiveram a intenção de fazer algumas considerações breves sobre o tema sem a pretensão de esgotá-lo neste espaço. Com isto, não se pretende concluir o debate, mas almeja-se provocar novas reflexões profissionais sobre o tema em questão.

5 REFERÊNCIAS:

ALENTEJANO, Paulo. Estrutura Fundiária. In: CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 353-358.

(10)

BRASIL. Decreto nº 1946, de 28 de junho de 1996. (Vide) Cria o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF, e dá outras providências. Decreto nº 1946, de 28 de junho de 1996. BRASÍLIA, Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d1946.htm>. Acesso em: 01 abr. 2017.

CARVALHO, Horácio Martins de; COSTA, Francisco de Assis. Agricultura Camponesa. In:

CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 26-32.

CHRISTOFFOLI, Pedro Ivan. Agroindústria. In: CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 72-79.

FERNANDES, Bernardo Mançano. Território Camponês. In: CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 744-747.

GARCIA JUNIOR, Afrânio Raúl; HEREDIA, Beatriz Alasia de. Campesinato, família e

diversidade de explorações agrícolas no Brasil. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo. Diversidade do campesinato: expressões e categorias VII. São Paulo, Brasília: Editora Unesp, 2009. p. 213-242.

IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 13. ed, São Paulo: Cortez, 2007.

KOSIK, Karel. Dialética do Concreto. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 7ª ed, 2002.

LEITE, Sergio Pereira; MEDEIROS, Leonilde Servolo de. Agronegôcio. In: CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 79-85.

NETTO, José Paulo. Introdução ao estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011. 64 p.

STEDILE, João Pedro. Questão Agrária. In: CALDART, Roseli Salete et al. Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 639-644.

ZARTH, Paulo Afonso. Colonos Imigrantes e Lavradores Nacionais no Sul do Brasil: projetos de ocupação da terra em conflito. In: MOTTA, Márcia; ZARTH, Paulo. (org.) Formas de resistência camponesa: visibilidade e diversidade de conflitos ao longo da história.

São Paulo, Brasília: Unesp, 2009. Vol II. p. 223-24.

Referências

Documentos relacionados

O presente Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em Serviço Social: “Mapa e Análise Sócio Espacial da Evasão Escolar No Distrito Federal e Entorno”, teve