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VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES NEGRAS NO ESTADO DO AMAZONAS

Karen A. dos Santos1, Dorli J. C. Marques2, Elisângela L. de Oliveira3

RESUMO: Este artigo tem a finalidade de analisar os impactos do racismo na violência contra a mulher, visto que dados mostram que o índice de violência contra as mulheres negras aumentou e o índice de violência contra as mulheres brancas diminuiu, tanto em escala federal quanto no Estado do Amazonas. Tratar a discriminação de sexo/gênero e suas consequências isoladas da discriminação de raça/cor não é eficaz para todas as mulheres. Diante disso, a pesquisa questiona o que falta para que as medidas de segurança a favor das mulheres sejam favoráveis às mulheres negras de maneira concreta no Brasil e no Amazonas.

Palavras-chave: Mulheres. Violência. Racismo. Amazonas.

ABSTRACT: This article has a purpose of analysing the racism's impact in violence against women, once statistical data shows us that the index of violence against white women has decreased and the index of violence against black women has increased, as much in federal scale as in Amazonas state. Therefore, putting gender discrimination and it consequences isolated from race/color discrimination is not effective for all women. Thus, this research looks for what is lacking for the security measures to women become effective to all women, including the black ones, in a concrete way in Brazil and in the state of Amazonas.

Keywords: Women. Violence. Racism. Amazonas.

1 INTRODUÇÃO

Nota-se que a violência contra a mulher é muitas vezes normalizada devido ao machismo enraizado na sociedade. Para a mulher negra é duas vezes pior, pois além de sofrer com o sexismo, misoginia e machismo, sofre com o racismo. Há diferenças nas formas de violência que atingem as mulheres devido às várias maneiras de discriminação que, juntamente ao machismo, aumentam o risco. Esse é o caso das mulheres negras, as quais

1 Estudante de Graduação em Administração da Universidade do Estado do Amazonas – UEA. Email:

alvesdskaren@gmail.com

2 Professor Adjunto da Universidade do Estado do Amazonas – UEA, doutor em Biotecnologia pela Universidade Federal do Amazonas. Email: dorlimarques@yahoo.com.br.

3 Professora Assistente da Universidade do Estado do Amazonas – UEA, mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. Email: elisangelaleitao2010@hotmail.com.

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não somente sofrem por viverem numa sociedade patriarcal, mas numa sociedade racista patriarcal. Enquanto as mulheres brancas lutavam pelo direito de trabalhar e votar, as mulheres negras lutavam para serem consideradas pessoas. E essa diferença reflete até os dias atuais.

A partir disso, esta pesquisa visa analisar os impactos do racismo na violência contra as mulheres negras tratando a questão de sexo/gênero e cor/raça de forma conjunta dando destaque aos dados de violência contra as mulheres negras do Estado do Amazonas.

Na primeira fase, exploratória, buscou-se conhecer o assunto de forma profunda através da revisão bibliográfica dos estudos clássicos sobre violência contra a mulher, racismo, políticas públicas adotadas pelo Estado (Federal, Estado do Amazonas e Municípios do Estado do Amazonas) e do levantamento de dados junto às diferentes bases de dados sobre o objeto de estudo. Em seguida, os dados e informações foram levantados e os marcos teóricos e conceituais, agrupados e categorizados para se obter um melhor entendimento da temática.

Na terceira fase, explicou-se o fenômeno. Visualizou-se como explicativo pelo fato de examinar o contexto histórico do racismo e machismo, como ele está inserido na sociedade, como influência nas violências sofridas pelas mulheres negras e a importância da informação e conhecimento para eliminar o problema.

As bases teóricas e conceituais utilizadas neste estudo foram Bourdieu (1930); Giffin (1972); Angela (2016); Fernandes (1964), Arraes (2014), entre outros. Vale ressaltar que o termo negro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), engloba aqueles que se consideram pretos e pardos e os dados são baseados nesse conceito. No restante da pesquisa o termo se refere a todos aqueles que se consideram afrodescendentes.

2 VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES

De acordo com Giffin (1994), a violência é algo muito profundo e nas relações de poder, as quais são baseadas em sexualidade, sexo, gênero, autoidentidade e nas instituições sociais, possui raízes profundas. Em várias sociedades a dominação dos homens é vista como a essência da masculinidade.

Existem diversas formas de violência contra a mulher, como: agressão física, violência psicológica, estupro, homicídio, feminicídio, entre outros. A mulher sofre apenas por ser mulher em inúmeros países, não importa a idade, raça, cor, etnia ou religião. Apesar de as causas derivarem conforme as características, contexto social e cultura, todas são atingidas.

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A inscrição dos gêneros – feminino ou masculino – nos corpos é feita, sempre, no contexto de uma determinada cultura e, portanto, com as marcas dessa cultura. As possibilidades da sexualidade – das formas de expressar os desejos e prazeres – também são sempre socialmente estabelecidas e codificadas. As identidades de gênero e sexuais são, portanto, compostas e definidas por relações sociais, elas são moldadas pelas redes de poder de uma sociedade (LOURO, 1997, p.11).

Conforme Díaz (2007,p.128):

O gênero é um dos fatores medulares na construção de desigualdades. Para além das diferenças biológicas, foram estruturadas distinções sociais e culturais entre homens e mulheres, dentro das quais se estabelecem hierarquias de poder, de status e de renda. Finalmente, os atributos individuais constroem-se socialmente como resultado de processos históricos (DÍAZ, 2007, p.128)

Os autores acima destacam o que é gênero, como ele está inserido na sociedade e como esta é afetada. A violência contra mulher é uma das consequências desses conceitos que provocam desigualdade e ocorre retroalimentação conforme as outras questões, como a raça por exemplo.

A força da ordem masculina pode ser aferida pelo fato de que ela não precisa de justificação: a visão androcêntrica se impõe como neutra e não tem necessidade de se enunciar, visando sua legitimação. A ordem social funciona como uma imensa máquina simbólica, tendendo a ratificar a dominação masculina na qual se funda: é a divisão social do trabalho, distribuição muito restrita das atividades atribuídas a cada um dos dois sexos, de seu lugar, seu momento, seus instrumentos; e a estrutura do espaço [...] (BOURDIEU, 2005, p.15).

Há uma construção de comportamentos sociais, impostos desde antes do nascimento para homens e mulheres, os quais formam padrões e dão espaço para a violência. Existem as características naturais, biológicas e as impostas culturalmente que é o caso da masculinidade e feminilidade. Muitas vezes a mulher é vista como sexo frágil, submissa e com pouca inteligência, já o homem como forte, inteligente e autônomo. Isso ocorre devido às raízes machistas e sexistas impregnadas na sociedade o que consequentemente perpetua e alimenta a violência que um sofre em virtude dos privilégios do outro.

No Brasil, a violência contra as mulheres é uma realidade prevalente e vergonhosa.

Diversas mulheres são sujeitas à violência e humilhações diariamente, na maioria das vezes dentro da própria casa. De acordo com o Atlas da Violência (2017), entre os anos de 2005 e 2015, a taxa de homicídios de mulheres brancas teve redução de 7,4%, enquanto a taxa de mortalidade de mulheres negras aumentou 22%.

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Tabela 1 – Taxa de homicídio de mulheres por 100 mil mulheres – Brasil, 2005 a 2015 Taxa de Homicídio de Mulheres (por 100 mil) no Brasil

Ano 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 Todas as

Mulheres 4,1 4,2 3,9 4,1 4,3 4,4 4,4 4,6 4,6 4,6 4,4 Mulheres

Negras 4,3 4,6 4,3 4,6 4,9 5,2 5,3 5,5 5,4 5,4 5,2 Mulheres

Não Negras 3,3 3,3 3,0 3,2 3,3 3,2 3,1 3,2 3,3 3,3 3,1 Fonte: IPEA; Fórum brasileiro de segurança pública com adaptações.

Tabela 2 – Taxa de homicídio de mulheres por 100 mil mulheres – Amazonas, 2005 a 2015 Taxa de Homicídio de Mulheres (por 100 mil) no Estado do Amazonas Ano 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 Todas as

Mulheres 3,0 3,2 3,1 3,6 3,8 3,6 4,4 6,3 5,0 4,1 5,9 Mulheres

Negras 3,2 2,7 3,4 4,3 4,4 4,4 4,9 6,5 5,1 4,4 6,4 Mulheres

Não Negras 2,0 4,6 1,5 1,6 1,7 1,1 3,0 5,7 4,3 2,6 3,9 Fonte: IPEA; Fórum brasileiro de segurança pública com adaptações.

Segundo o Panorama da violência contra as mulheres no Brasil: indicadores nacionais e estaduais feito pelo Observatório da Mulher contra a Violência, ligado ao Instituto de Pesquisa DataSenado (2016), a porcentagem de homicídios de mulheres brancas residentes no Amazonas diminuiu em 29% (de 2,8 a 2,0 para cada 100 mil mulheres) e a taxa de homicídios de mulheres negras aumentou em 63% (de 2,7 a 4,4) entre 2006 a 2014. O Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência (2017) revela que as mulheres negras, no Amazonas, com idade entre 15 e 29 anos têm 6,97 mais possibilidades de serem mortas do que em relação às mulheres brancas com o mesmo intervalo de idades. O Atlas da Violência (2017) mostra que em relação à taxa de homicídios de mulheres negras, o Amazonas apresentou

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crescimento de 102,8% em dez anos, saindo de uma média de 3,2 a cada 100 mil habitantes para 6,4.

Tabela 3 – Taxa de Homicídio de Mulheres (por 100 mil) – Amazonas, 2006 e 2014 Taxa de Homicídio de Mulheres (por 100 mil) no Estado do Amazonas

Ano 2006 2014

Mulheres de todas as

raças 3,2 4,1

Mulheres brancas 2,8 2,0

Mulheres pretas e

pardas 2,7 4,4

Fonte: Observatório da mulher contra a violência; Instituto de Pesquisa DataSenado (2016) com adaptações.

Tabela 4 – Taxas de homicídios de mulheres jovens negras e brancas por 100 mil habitantes no Estado do Amazonas – 2015

Taxas de homicídios de mulheres jovens negras e brancas por 100 mil habitantes

Unidade da Federação Brasil Amazonas

Jovens Negras 7,8 12,3

Jovens Brancas 3,6 1,8

Risco Relativo 2,19 6,97

Fonte: IVJ – Violência e desigualdade racial (2017); Fórum brasileiro de segurança pública com adaptações.

Grande parte do homicídio de mulheres concebe feminicídio, ou seja, crime sofrido pela mulher por sua condição de mulher, devido ao machismo e misoginia. Levando em conta que a maioria desses homicídios é contra mulheres negras, pode-se afirmar que há grande influência do racismo.

2.1 Medidas de proteção para mulheres no Estado do Amazonas

A Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340) foi criada em 2006 para represar a violência e proteger a vítima. Ela possui vários mecanismos, dentre eles as medidas protetivas e a ronda

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Maria da Penha, a qual funciona com o auxílio das Policias Civil e Militar, as quais fazem o acompanhamento de mulheres vítimas de violência doméstica que solicitam as medidas protetivas de urgências. Em 3 de Abril de 2018, a Lei 13.641 tornou crime o seu descumprimento. Para Pasinato e Santos (2008) o decreto da Lei Maria da Penha simboliza uma fase institucional de “absorção/tradução ampla das demandas por serviços integrados reivindicados pelas feministas desde o início da década de 1980”.

As experiências desenvolvidas em vários estados e municípios brasileiros desde a segunda metade dos anos 80, quando as primeiras políticas públicas em resposta à violência nas relações de gênero foram dadas empiricamente. [...] Tornou-se necessária a articulação de todos os esforços, públicos, privados e comunitários para enfrentar um fenômeno social e cultural (NEGRÃO, 2004, p. 239)

Em Manaus, capital do Estado do Amazonas, há a Delegacia Especializada em Crimes Contra A Mulher – DECCM e segundo o site servicos.blog.br, há delegacias especializadas de atendimento à mulher nos municípios de: São Gabriel da Cachoeira, Itacoatiara, Lábrea, Parintins, Tabatinga, Eirunepé, Tefé, Manacapuru, Coari, Humaitá e Manaus.

Como a violência contra mulher não diminuiu, em 2015, a Lei do Feminicídio (13.104) foi sancionada, a qual considera o crime como homicídio qualificado e considera-o crime hediondo. Esta lei é importante pois evidencia que as mulheres morrem apenas por serem mulheres.

Segundo a Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (SEJUSC):

A Secretaria Executiva de Políticas para as Mulheres – SEPM, criada pela Lei nº 3.873, de 20 de março de 2013, transferida para a estrutura da Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania, através da Lei Nº 4.163, de 09 de março de 2015, tem por finalidade planejar, coordenar e articular a execução de políticas públicas para as mulheres.

Essa secretaria está presente nos seguintes municípios: Anori, Borba, Canutama, Careiro Castanho, Coari, Eirunepé, Itamarati, Itapiranga, Santa Isabel do Rio Negro, São Gabriel da Cachoeira e Manaus. À vista disso, não em todos os 44 municípios do Estado.

Porém, desde 2013, em parceria com o Governo Federal, promove atendimento em Unidades Móveis à mulher vítima de violência do campo e da floresta.

No site da Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (SEJUSC) do Governo do Amazonas, encontram-se opções para a realização de denúncias sobre violência contra a mulher, as quais podem ser feitas através dos: Disque 100; Disque 180, Disque 181; SEJUSC – 92 3632-0554; SEPM – 92 3583-9022; CERDH – 92 3131-2301/2302.

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Em 2017, segundo a mesma fonte, porém na aba estatísticas de atendimento, observou-se que ocorreram 7.219 atendimentos à mulher, contando com retornos e reincidências, pelo Serviço de Apoio Emergencial a Mulher (SAPEM), Casa Abrigo e Centro Estadual de Referência e Apoio à Mulher – CREAM.

Uma das ferramentas utilizadas para o combate de violência é o “Alerta Mulher”, o qual funciona como uma espécie de “botão do pânico” para as vítimas de violência doméstica.

Segundo o portal Acrítica.com (2018), 2,6 mil medidas protetivas foram solicitadas à Justiça por meio da Delegacia Especializada em Crimes Contra a Mulher (DECCM). Débora Mafra, titular da Delegacia da Mulher do Parque Dez, afirmou que é possível, através desse aplicativo, visualizar o histórico do agressor e, se a mulher não estiver com o telefone ou sem internet, pode ligar diretamente para o 190 e informar que participa do programa.

3 RACISMO NO BRASIL

A abolição da escravatura não ocorreu de modo eficaz no Brasil. Após a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, nenhuma atitude foi tomada em prol das condições de vida dos que eram escravizados. Os libertos foram morar em condições precárias, sem emprego e sofrendo preconceito, uma vez que assinar uma carta não abolia também o sentimento de superioridade da raça dominante e nem seus mecanismos discriminatórios. A falta de planejamento e amparo aos negros causou a institucionalização da desigualdade racial.

A desagregação do regime escravocrata e senhorial se operou, no Brasil, sem que se cercasse a destituição dos antigos agentes de trabalho escravo de assistência e garantias que os protegessem na transição para o sistema de trabalho livre [...] O liberto se viu convertido, sumária e abruptamente, em senhor de si mesmo, tornando- se responsável por sua pessoa e por seus dependentes, embora não dispusesse de meios materiais e morais para realizar essa proeza nos quadros de uma economia competitiva. Essas facetas da situação humana do antigo agente do trabalho escravo imprimiram à Abolição o caráter de uma espoliação extrema e cruel (FERNANDES, 1964, p.15).

Foi implantada uma ideia de paraíso racial no país devido às misturas de raças na sua nacionalidade. Porém, a miscigenação aconteceu através de estupros – na época da colonização e escravidão – nos quais homens brancos se sentiam no direito sobre o corpo das mulheres negras e indígenas, as quais eles consideravam inferiores.

Após a abolição, a miscigenação apareceu como solução para resolver a questão dos negros, pois, segundo as teorias europeias, uma população repleta de pessoas com uma raça

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inferior estaria fadada ao atraso e péssima imagem. De acordo com eles, o gene branco

“limparia” o preto através do branqueamento.

Este projeto de branqueamento da população brasileira representa a outra face da ideologia da mestiçagem. Ideologia que sustenta o mito do encontro das três raças fundadoras da população brasileira e que se traduz numa celebração abstrata Características Étnico-raciais da População: Classificações e identidades da interpenetração das culturas (CARVALHO, 2004), mas que nega, na prática, a possibilidade de expressão legitima das identidades raciais negra e indígena. Por outro lado, em qualquer hipótese o mestiço era admitido apenas como elemento transitório que levaria à constituição de uma nação de brancos (COSTA, 2006). Tendo em conta a participação deste argumento na formulação das políticas oficiais de imigração, segundo Camargo (2010), não é arriscado dizer que a racialização estatística era a expressão do branqueamento na mediação simbólica da nação (SABOIA; PETRUCCELLI, 2013, p. 23)

A partir dessa ideologia, propagou-se um mito de que, no Brasil, havia uma democracia racial, onde todos eram tratados igualmente e o país era um paraíso de diferentes raças. Com o branqueamento, o negro adquiriu a necessidade de aproximação com a raça branca. Isso acontece através da busca por parceiros brancos e a própria negação de si.

No Brasil, o racismo acontece devido às características do fenótipo de um indivíduo.

Quanto mais traços não brancos, mais racismo a pessoa sofre, assim como quanto mais escura ela for etc. Uma pessoa vista como branca, mesmo que tenha gene negro, não sofrerá essa discriminação. Isso ocorre devido a hegemonia branca, a qual coloca sua raça como normal e pura e trata as outras como inferiores. Algumas teses defendiam que o homem branco europeu era o belo, saudável, competente, civilizado e as demais raças, assim como tudo relacionado a elas, como características físicas e culturais, eram ruins.

3.1 Mulheres negras na sociedade

No período da escravidão, as mulheres negras passaram por várias humilhações, torturas e violências físicas, sexuais e psicológicas. Elas eram vistas primeiramente como trabalhadoras e, neste quesito, não havia distinção de gênero, tanto homens quanto mulheres trabalhavam, apanhavam, sofriam punições, entre outros. Segundo Angela (2016), “as mulheres escravas eram primeiro trabalhadoras a tempo inteiro para o seu dono e depois apenas incidentalmente uma esposa, uma mãe, uma dona de casa.”. A autora afirma que os senhores as exploravam de todas as formas convenientemente, por isso também sofriam pelas suas "condições de fêmea". Por exemplo, o estupro, onde os homens brancos alegavam serem vítimas do corpo, visto como promíscuo, da mulher negra.

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A partir da falta de suporte após a abolição da escravatura, os negros tiveram que recorrer a trabalhos informais, artesanato etc. As mulheres tinham mais facilidade para conseguir emprego como empregadas domésticas, quitandeiras, entre outros, mas sem nenhuma assistência, sofrendo discriminação e frequentemente violência por causa da raça/cor, classe e sexo/gênero.

Para a escrava, a principal preocupação era a liberdade, para as mulheres livres e pobres, a sobrevivência era a questão fundamental, e para as mulheres de elite, o alvo a ser alcançado real de independência e autonomia (COSTA, 2007, p. 515)

No final dos anos 70 o feminismo negro cresceu no Brasil. Enquanto o objetivo das mulheres brancas era igualar seus direitos civis com os homens brancos, mulheres negras sofriam as consequências da escravatura, ainda vistas como subordinadas; porém, essa subordinação não se referia apenas à figura masculina, pois a mulher negra continuava em posição servil perante a mulher branca. (Arraes, 2014).

Bairros (1995) diz que para a teoria do ponto de vista feminista "a experiência da opressão sexista é dada pela posição que ocupamos numa matriz de dominação onde raça, gênero e classe social interceptam-se em diferentes pontos". Ou seja, segundo a autora apenas o feminismo clássico não era suficiente para suprir as causas da luta das mulheres negras já que mulheres brancas também eram racistas.

Segundo Carneiro (2011), a militância das mulheres negras é dupla e se mostra a elas como forma de garantir que os êxitos na questão racial sejam apagados pelas constâncias das desigualdades de gênero. Desse modo, o feminismo não luta apenas a favor das mulheres brancas e engloba a influência da cor na discriminação que as mulheres negras sofrem.

4 CONCLUSÃO

A violência contra mulheres negras vem aumentando mesmo com várias medidas de proteção às mulheres. Logo, é notável que haja outros fatores envolvidos, sendo o principal deles o racismo, o qual em conjunto com o machismo desfavorece ainda mais as mulheres negras. As estatísticas de cor e raça elaboradas pelo IBGE mostram que, por mais que haja leis e medidas, o Brasil ainda está muito longe de ser um lugar onde todos possuem os mesmo direitos. Os indicadores socioeconômicos da população não branca quase sempre são bem desvantajosos em relação à população branca.

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Conforme os indicadores nacionais e estaduais feito pelo Observatório da Mulher contra a Violência (2016), a porcentagem de homicídios de mulheres brancas residentes no Amazonas diminuiu em 29% e a taxa de homicídios de mulheres negras aumentou em 63%, entre os anos de 2006 a 2014. Quando se trata de mulheres jovens, entre 15 a 29 anos, os índices continuaram desfavoráveis às mulheres negras. De acordo com o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência (2017), no Amazonas, elas têm 6,97 mais possibilidades de serem mortas do que em relação às mulheres brancas. Por fim, o Atlas da Violência (2017) mostrou que o Amazonas apresentou crescimento de 102,8% em dez anos em relação à taxa de homicídios de mulheres negras. Dessa forma, a desigualdade é evidente, a combinação de racismo, sexismo, misoginia e machismo provoca violência e coloca a mulher negra em uma situação extremamente cruel.

A falta de consciência racial – consequência da miscigenação como forma de embranquecer a população – em muitos dos brasileiros dificulta a mulher negra a perceber que talvez a violência sofrida tenha relação com o racismo. Cabe ao Estado o reconhecimento de que as diferenças existem e que são necessárias políticas públicas voltadas para elas. Não tem como conseguir, de forma eficiente e eficaz, resolver o problema da violência contra mulher num país diversificado tratando todas de maneira igual. Nesses casos, mais que igualdade é de extrema importância a equidade e o reconhecimento das consequências históricas. Leis aprovadas não resolverão o problema se as pessoas, inclusive as vítimas, não entenderem a realidade racial do país e a sua própria. A consciência pública, o reconhecimento e a não tolerância ao racismo são fundamentais para que as políticas públicas se tornem favoráveis às mulheres negras.

REFERÊNCIAS

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Referências

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