Raquel Machado Marques Pereira
TRÊS PODERES:
A ARQUITETURA CÍVICA PAULISTA, 1950-1970
TRÊS PODERES:
A ARQUITETURA CÍVICA PAULISTA, 1950-1970
Dissertação apresentada ao programa de
Pós-Graduação em Arquitetura e
Urba-nismo da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, como requisito à obtenção do
título de Mestre em Arquitetura e
Urba-nismo
Orientadora: Profª. Drª. Ruth Verde Zein
P436t Pereira, Raquel Machado Marques
Três Poderes: a arquitetura cívica paulista, 1950-1970. / Raquel Machado Marques Pereira – 2012.
230 f. : il. ; 30cm.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012.
TRÊS PODERES:
A ARQUITETURA CÍVICA PAULISTA, 1950-1970
Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo
Aprovado em
BANCA EXAMINADORA
Profª. Drª. Ruth Verde Zein – Orientadora Universidade Presbiteriana Mackenzie
Prof. Dr. Rafael da Cunha Perrone Universidade Presbiteriana Mackenzie
Aos meus maravilhosos pais Oduvaldo e Regina Célia,
a meu amado marido Fabio Gabriel
e meus queridos irmãos Patrícia e Oduvaldo Júnior
Pelo sustento, contínuos incentivos, confiança total, pelas demonstrações de carinho,
apoio incondicional e muito amor.
Obrigada por tudo.
Auxílio Financ
Fundação de Amparo à Pesquisa do Esta
(Bol
Processo n
MAC
Fundo Macke
Processo no NUCO
anceiro:
FAPESP
Estado de São Paulo
(Bolsa de Mestrado)
sso no 2010/13387-2
MACKPESQUISA
ckenzie de Pesquisa
(Reserva Técnica)
UCOI-FMP-412/2011
Agradecimentos.
A Deus, pela presença sempre constante ao meu lado durante esta caminhada
concedendo-me saúde, força, coragem, paciência e sabedoria. A Ele toda glória,
honra e louvor.
À Universidade Presbiteriana Mackenzie por me proporcionar uma excelente
formação acadêmica no Stricto Sensu.
À Professora Ruth Verde Zein, pelos ensinamentos e por ter possibilitado a realização
desta dissertação.
Aos meus pais, Professores Oduvaldo C. Marques Pereira e Regina Célia M. Marques
Pereira, pelas sugestões, orientações e correções feitas neste trabalho.
Ao meu marido Fabio Gabriel da Silva pelo constante incentivo e contribuição na
elaboração da minha dissertação.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela Bolsa de
estudo de Mestrado e pela Reserva Técnica para o desenvolvimento do projeto.
Ao Fundo Mackenzie de Pesquisa (MACKPESQUISA) pelo auxílio de Reserva Técnica
.
À Fernanda Freire, secretária da Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, pela
amizade e auxílio no período do Mestrado.
Aos amigos da Pós-Graduação pela convivência, apoio e incentivo.
Talvez, o maior papel dos arquitetos nesta nossa época, seja
construir os novos espaços de encontro e convivência para as
Resumo.
Análise e estudos de casos de projetos arquitetônicos de edifícios públicos de uso
político-administrativo realizados nos anos 1950 a 1970, com foco nos conjuntos de
edifícios públicos situados no ambiente paulista e destinados aos Três Poderes,
inseridos no processo de modernização sócio-econômica e intenso fomento do
Estado de São Paulo. A pesquisa buscou estabelecer um panorama de projetos e
obras da arquitetura cívica paulista através de um amplo levantamento de
informações em várias fontes, sistematizadas de maneira a definir casos em que, de
alguma maneira, os projetos buscassem ativar um espaço cívico que extrapolasse a
simples necessidade funcional e programática dos edifícios, em busca da
configuração de um ‘Coração de cidade’. Entende-se que essas obras de caráter
cívico, no Estado de São Paulo, nas décadas de 1950 e 1960, revelam propostas que
visaram ativar a idéia do ‘Coração da cidade’, então em debate no panorama da
arquitetura e urbanismo daquele período, consolidando e abrindo novos caminhos
para a produção da arquitetura moderna brasileira, afinados com os debates
internacionais da época e participando da renovação dos centros urbanos em que se
inserem. Pela análise e comparação das diferentes obras, tanto no âmbito nacional
quanto no internacional, deste período, constata-se que as estratégias projetuais
adotadas nesses projetos, os aspectos inovativos, conceituais e técnicos, buscando a
possível ativação do ‘Coração da cidade’ através de arquiteturas cívicas e
monumentais.
Palavras-chave: Arquitetura Cívica. Arquitetura paulista. ‘Coração da cidade’. Estudos
Abstract.
Analysis and case studies of architectural projects of public buildings for
political-administrative use during the years 1950 to 1970, focusing on sets of public buildings
located in Sao Paulo and intended environment for the Three Powers, inserted in the
process of modernization and socio-economic intense development of the State of
Sao Paulo. The research provides an overview of projects and works of the State of
Sao Paulo civic architecture through a broad survey of information from various
sources, a systematic way to define cases in which, somehow, the projects seek to
enable a civic space that surpass the simple functional and programmatic need of the
buildings searching the configuration of a 'Heart city'. Understand that these works of
civic character, in São Paulo State, in the 1950s and 1960s, reveal proposals which
aimed to enable the idea of 'Heart of the City,' then under discussion in the
panorama of architecture and urbanism at that period, consolidating and opening
new ways for the production of Brazilian modern architecture, in tune with
international discuss of the time and participating in the renewal of urban centers in
which they operate. By analysis and comparison of different works, both nationally
and internationally, of this time, it was found that the projetual strategies adopted in
these designs, innovative aspects, conceptual and technical adopted, with a view to
make possible the activation of the 'Heart of the City 'through civic and monumental
architecture.
Lista de Ilustrações.
Ilustração 01 _ Proposta do Centro Cívico para Cidade Universitária ... 28
Ilustração 02 _ Implantação das propostas premiadas do concurso de Brasília ... 30
Ilustração 03 _ Implantação da proposta de Lucio Costa ... 31
Ilustração 04 _ Implantação da proposta de Boruch Milmann e equipe; perspectivas e
Centro Governamental e Cultural ... 32/33
Ilustração 05 _ Implantação da proposta de Rino Levi e equipe; Setor de Habitação
intensiva e centro urbano ... 35
Ilustração 06 _ Implantação da proposta de M. M. M. Roberto ... 36
Ilustração 07 _ Implantação da proposta de Henrique E. Mindlin e Giancarlo Palanti;
Capitólio: implantação e perspectiva ... 37/38
Ilustração 08 _ Implantação da proposta de Carlos Cascaldi, João Vilanova Artigas,
Mário Wagner Vieira da Cunha e Paulo de Camargo e Almeida ... 40
Ilustração 09 _ Implantação da proposta de Construtécnica S. A.; Zona central e
perspectiva da Praça Cívica ... 41/42
Ilustração 10 _ Implantação de Brasília ... 44
Ilustração 11 _ Foto Aérea de Brasília ... 44
Ilustração 12 _ Foto Aérea parcial (Praça dos Três Poderes e na Esplanada dos
Ministérios) ... 45
Ilustração 13 _ Foto parcial do Eixo Monumental de Brasília ... 46
Ilustração 14 _ Fotos Palácio da Alvorada, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal
Ilustração 16 _ Fotos do Supremo Tribunal Federal ... 50
Ilustração 17 _ Fotos do Congresso Nacional ... 51
Ilustração 18 _ Distribuição Setorial de Investimentos do Plano de Ação ... 55
Ilustração 19 _ Fotos do Centro Cívico de Santo André ... 62
Ilustração 20 _ Proposta para Centro Cívico de Medellín ... 64
Ilustração 21 _ Maquete do concurso do Centro Cívico de Santo André ... 65
Ilustração 22 _ Foto aérea do Centro Cívico de Santo André ... 66
Ilustração 23 _ Implantação do Centro Cívico de Santo André ... 66
Ilustração 24 _ Corte geral do Centro Cívico de Santo André ... 67
Ilustração 25 _ Foto do paisagismo do Centro Cívico de Santo André ... 68
Ilustração 26 _ Foto da construção e perspectiva do New City Hall de Toronto ... 68
Ilustração 27 _ Fotos do New City Hall de Toronto ... 69
Ilustração 28 _ Fotos do Fórum de Santo André ... 69
Ilustração 29 _ Plantas da Câmara Municipal de Santo André ... 70
Ilustração 30 _ Cortes e elevações da Câmara Municipal de Santo André ... 70
Ilustração 31 _ Fotos da Câmara Municipal de Santo André ... 70
Ilustração 32 _ Fotos da Prefeitura de Santo André (três acessos) ... 71
Ilustração 33 _ Fotos do Centro Cultural de Santo André ... 72
Ilustração 34 _ Implantação do Centro Cívico de Santo André ... 73
Ilustração 35 _ Térreo Superior do Centro Cívico de Santo André ... 73
Ilustração 36 _ Planta Térreo Central do Centro Cívico de Santo André ... 74
Ilustração 38 _ Elevação geral do Centro Cívico de Santo André ... 75
Ilustração 39 _ Fotos da Prefeitura e acesso ao Centro Cívico; Teatro e praça; eixo monumental com Fórum, Prefeitura e Câmara Municipal em Santo André ... 75
Ilustração 40 _ Perspectiva da maquete do Centro Cívico de Curitiba ... 77
Ilustração 41 _ Implantação do Centro Cívico de Curitiba ... 78
Ilustração 42 _ Foto do Paço Municipal de São Bernardo ... 80
Ilustração 43 _ Implantação inicial do Paço Municipal de São Bernardo ... 82
Ilustração 44 _ Foto Aérea do Paço Municipal de São Bernardo ... 82
Ilustração 45 _ Perspectiva do Paço Municipal de São Bernardo ... 83
Ilustração 46 _ Fotos do Paço Municipal de São Bernardo ... 83
Ilustração 47 _ Implantação do Paço Municipal de São Bernardo ... 84
Ilustração 48 _ Corte do embasamento do Paço Municipal de São Bernardo ... 84
Ilustração 49 _ Pavimento Térreo do Paço Municipal de São Bernardo ... 85
Ilustração 50 _ Planta da torre Prefeitura de São Bernardo ... 87
Ilustração 51 _ Imagens dos projetos premiados no Concurso do ‘New City Hall’ de Toronto ... 89
Ilustração 52 _ Imagens da construção do ‘New City Hall’ de Toronto ... 89/90/91 Ilustração 53 _ Foto do ‘New City Hall’ de Toronto ... 91
Ilustração 54 _ Implantação / Planta Pav. Térreo do ‘New City Hall’ de Toronto …… 92
Ilustração 55 _ Acesso do ‘New City Hall’ de Toronto e Hall da Memória ... 93
Ilustração 56 _ Detalhes do piso e forro do ‘New City Hall’ de Toronto ... 94
Ilustração 58 _ Fotos da Câmara da Assembléia Legislativa do ‘New City Hall’ de
Toronto ... 95
Ilustração 59 _ Fotos das Torres do ‘New City Hall’ de Toronto ... 96
Ilustração 60 _ Fotos do Embasamento do ‘New City Hall’ de Toronto ... 96
Ilustração 61 _ Imagens da Praça Nathan Phillips do ‘New City Hall’ de Toronto ... 97
Ilustração 62 _ Fotos da Praça Nathan Phillips do ‘New City Hall’ de Toronto …..…… 97
Ilustração 63 _ Foto Aérea do Paço Municipal de Marília ... 98
Ilustração 64 _ Foto do Paço Municipal de Marília ... 99
Ilustração 65 _ Implantação do Paço Municipal de Marília ... 100
Ilustração 66 _ Maquete do Paço Municipal de Marília ... 101
Ilustração 67 _ Foto Aérea do Paço Municipal de Franca ... 102
Ilustração 68 _ Maquete do Paço Municipal de Franca ... 103
Ilustração 69 _ Elevações e Cortes do Paço Municipal de Franca ... 104
Ilustração 70 _ Fotos do Centro Cívico de San Juan (Argentina) ... 105
Ilustração 71 _ Planta do Conjunto do Centro Cívico de San Juan ... 106
Ilustração 72 _ Perspectiva do Centro Cívico de San Juan (etapa 1) ... 108
Ilustração 73 _ Foto da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo ... 110
Ilustração 74 _ Foto aérea da Assembléia Legislativa de São Paulo ... 111
Ilustração 75 _ Implantação Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo ... 112
Ilustração 76 _ Fotos Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo em 1968, destaque para os mastros ... 112
Ilustração 77 _ Plantas, corte, elevação e fotos da Câmara de Santo André ... 113
Ilustração 79 _ Elemento vazado na fachada do Palácio 9 de Julho ... 114
Ilustração 80 _ Plantas do Palácio 9 de Julho ... 115
Ilustração 81 _ Fotos acesso principal, de público e funcionários da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 1968 ... 116
Ilustração 82 _ Fotos acesso principal, de público e funcionários da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 2010 ... 116
Ilustração 83 _ Fotos do Hall monumental da ALESP ... 117
Ilustração 84 _ Fotos do Plenário Juscelino Kubtschek ... 118
Ilustração 85 _ Foto aérea de 1958 e foto aérea recente ... 118
Ilustração 86 _ Plantas do Palácio do Congresso em Brasília/DF – nível intermediário e superior; e fotos ... 120
Ilustração 87 _ Fotos do Parlamento de Chandigarh na Índia ... 121
Ilustração 88 _ Corte e plantas do Parlamento de Chandigarh na Índia ... 122
Ilustração 89 _ Perspectiva externa do Palácio da Inconfidência (MG) ... 123
Ilustração 90 _ Perspectiva externa do Palácio da Inconfidência (MG) ... 123
Ilustração 91 _ Foto aérea do Fórum de Itapira ... 125
Ilustração 92 _ Fotos do Fórum de Itapira ...126
Ilustração 93 _ Corte do Fórum de Itapira ... 127
Ilustração 94 _ Planta Pav. Térreo do Fórum de Itapira ... 127
Ilustração 95 _ Planta Pav. Superior do Fórum de Itapira ... 127
Ilustração 96 _ Foto aérea do Fórum de Avaré ... 129
Ilustração 97 _ Maquete e Fotos do Fórum de Avaré ... 129
Ilustração 99 _ Fotos do Fórum de Avaré ... 131
Ilustração 100 _ Foto aérea do Fórum de Araras ... 132
Ilustração 101 _ Ilustração da praça coberta do Fórum de Araras ... 133
Ilustração 102 _ Maquete do Fórum de Araras ... 134
Ilustração 103 _ Fotos do Fórum de Araras ... 134
Ilustração 104 _ Implantação e corte do Fórum de Araras... 135
Ilustração 105 _ Maquete do Fórum de Piracicaba ... 136
Ilustração 106 _ Foto aérea do Fórum de Piracicaba ... 136
Ilustração 107 _ Corte do Fórum de Piracicaba ... 137
Ilustração 108 _ Foto aérea do Fórum de Rio Claro ... 138
Sumário.
Introdução. _________________________________________________________ 01
Capitulo 01.
01.01 _ Bases conceituais, definição dos termos e delimitação temporal dos
centros político-administrativos _________________________ 06
01.01.01 _ ‘O Coração da cidade’ ___________________________ 10
01.01.02 _ A Monumentalidade dos edifícios _________________ 18
01.01.03 _ Considerações sobre as bases conceituais ___________ 23
Capitulo 02.
02.01 _ O Panorama Cultural e Arquitetônico Internacional ____________ 25
02.02 _ O Panorama Cultural e Arquitetônico Nacional ________________ 27
02.02.01 _ O Concurso de Brasília __________________________ 29
02.02.02 _ Brasília: O Projeto de Lucio Costa _________________ 43
Capitulo 03.
03.01 _ A Arquitetura Cívica no Estado de São Paulo __________________ 52
03.01.01 _ Plano de Ação do Governo Carvalho Pinto ___________ 53
Capitulo 04.
04.01 _ Estudo de Casos: critérios de seleção e periodização ___________ 61
04.01.01 _ Centro Cívico de Santo André _____________________ 62
04.01.02 _ Paço Municipal de São Bernardo do Campo _________ 80
04.01.03 _ Paços Municipais: Marília e Franca ________________ 98
04.01.04 _ Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo _____ 110
04.01.05 _ Fóruns do Estado de São Paulo __________________ 125
04.02 _ Análise comparativa dos casos estudados: características gerais das
arquiteturas cívicas paulistas 1950-1970 _________________ 141
Conclusões. _______________________________________________________ 145
Referências Bibliográficas. ___________________________________________ 149
Anexos. __________________________________________________________ 154
Ficha 01. ___________________________________________________ 156
Ficha 02. ___________________________________________________ 160
Ficha 03. ___________________________________________________ 164
Ficha 04. ___________________________________________________ 169
Ficha 05. ___________________________________________________ 173
Ficha 06. ___________________________________________________ 176
Ficha 07. ___________________________________________________ 181
Ficha 08. ___________________________________________________ 183
Ficha 09. ___________________________________________________ 190
Ficha 10. ___________________________________________________ 193
Ficha 11. ___________________________________________________ 198
Ficha 12. ___________________________________________________ 201
Ficha 14. ___________________________________________________ 207
Ficha 15. ___________________________________________________ 214
Ficha 16. ___________________________________________________ 217
Ficha 17. ___________________________________________________ 220
Ficha 18. ___________________________________________________ 223
Introdução.
O objeto de estudo constituiu-se na análise de projetos internacionais, nacionais e
regionais, através dos Estudos de Casos, contextualizados na Arquitetura Moderna
Brasileira, no momento da construção de Brasília (1956-1961) e do Plano de
Desenvolvimento do governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) em âmbito
nacional e do Plano de Ação do Governo Carvalho Pinto (1959-1966) no aspecto
regional, além de seu relacionamento com o tema de centros cívicos internacionais,
que vinham sendo discutidos nos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna,
CIAM, por vários arquitetos, entre os quais Sert, Leger, Giedion, Rogers, Tyrwhitt, etc.
Amparado nas pesquisas já realizadas em relação a estes dois temas sobre o ‘Coração
da cidade’ e da Monumentalidade dos edifícios, o foco ocorreu nos Estudos de Caso
situados na produção Cívica Paulista, identificando o que cada um destes conjuntos
arquitetônicos trouxe de contribuição para esse debate e para a consolidação da
estrutura urbana moderna, em que as esferas política e cultural da vida pública
almejavam não apenas abrigar suas atividades, mas igualmente, criar um novo centro
para a cidade.
Entendeu-se aqui por Arquitetura Cívica aquela destinada a abrigar as funções cívicas
governamentais, ou seja, os equipamentos necessários ao exercício dos Três Poderes
da república em todas as instâncias – Federal, Estadual e Municipal; cujo projeto
freqüentemente buscou configurar um novo setor na cidade, um agrupamento de
novos conjuntos de edifícios constituindo marcos na paisagem, representando o
poder e a organização dos municípios, dos estados e da união federativa; conjuntos
que freqüentemente incluíram e combinaram espaços abertos e/ou fechados para
lazer e cultura.
A presente pesquisa partiu da elaboração de uma listagem de projetos e obras de
Arquiteturas Cívicas Paulistas (ou seja, situadas no estado de São Paulo), a qual
englobou o material disponível em periódicos de época, livros, dissertações, sites,
especial agradecimento ao material fornecido pelo Prof. Dr. André Augusto de
Almeida Alves. Essa listagem permitiu constatar que, nas décadas de 1950 e 1960, no
ambiente paulista, foram realizados um número considerável de projetos e obras
destinadas a equipamentos cívicos, incluindo Fóruns1 (poder judiciário), além das
Câmaras e Assembléias (poder legislativo municipal e estadual) e edifícios
administrativos municipais e estaduais (poder executivo). Estes edifícios podem ou
não estar agrupados constituindo Centros Cívicos completos – com os Três Poderes
somados a equipamentos culturais – ou incompletos – com apenas alguns deles
representados, mas quase sempre buscavam, de alguma maneira, ativar um espaço
cívico que extrapolasse a simples necessidade funcional e programática do edifício,
em busca da configuração de um “Coração de cidade” – tema de grande importância,
discutido em intensos debates desde meados da década de 1940.
O presente estudo propôs a realização de alguns Estudos de Caso de projetos e obras
destinados à arquitetura cívica paulista; e para poder melhor compreender sua
inserção no panorama de debates da época, alguns Estudos de Caso de obras
internacionais e nacionais. As obras internacionais destacadas no período proposto,
bem como projetos e obras brasileiras concomitantes as paulistas, foram objeto dos
Estudos de Caso desta pesquisa, englobando a análise dos aspectos construtivo,
formal, compositivo, e demais características pertinentes, enfatizado na análise como
cada uma dessas obras “extrapolou” ou “ultrapassou” o simples atendimento
funcional-programático em busca da criação de monumentalidade, de sentido cívico,
e/ou da criação de um espaço cívico coletivo, seja aberto como praças ou fechado
como museus, auditórios, etc.
Foram destacados para estudos alguns projetos internacionais de arquiteturas
cívicas, tais como: o Plano Diretor de Medellín2, a Assembléia de Chandigarh3, o New City Hall de Toronto4 e o Centro Cívico de San Juan5. Estas obras realizadas ao redor
1
57 novos Fóruns no I Plano de Ação do Governo Carvalho Pinto (PAGE) e 56 novos Fóruns no II PAGE.
2
Plano Diretor de Medellín, Colômbia em 1949.
3
do mundo, mas principalmente escolhidas nas Américas do Norte e Sul, são os
exemplos concomitantes à produção brasileira e paulista, na produção da arquitetura
cívica.
A partir de uma revisão sobre arquitetura cívica realizada nas décadas de 1950 e
1960 no Brasil, no panorama cultural, político e arquitetônico, foram destacadas
algumas obras que se inserem neste estudo, tais como: o caso de Curitiba, a
Assembléia Legislativa de Minas Gerais, e comparecendo, com especial destaque, no
concurso de Brasília, que possivelmente é um dos exemplos mais relevantes que
exemplificam os debates já referidos sobre o ‘Core’, a Monumentalidade dos
edifícios e os locais de reunião da comunidade: o Concurso Nacional do Plano Piloto
da Nova Capital do Brasil.
Sendo o mais representativo, entretanto o caso de Brasília não é o único, havendo
nesse período várias propostas de arquiteturas cívicas em todo o Brasil. No estado de
São Paulo houve também várias propostas de arquiteturas cívicas, em diversas
cidades, projetadas e/ou realizadas e com programas nem sempre completos, ou
seja, com a presença dos Três Poderes e a agregação de equipamentos culturais.
O ‘Plano de Ação’ (PAGE) no governo Carvalho Pinto (1959-1963 e 1963-1966) 6 no
estado paulista, ocorreu tendo como pano de fundo a política desenvolvimentista
patrocinada pelo Plano de Metas no âmbito nacional, no governo de Juscelino
Kubitschek. O incentivo na construção de equipamentos e edifícios públicos na área
de justiça e segurança pública veio de encontro aos ideais nacionais de integração e
de modernização institucional, pois eram financiados com os recursos do Instituto de
Previdência do Estado de São Paulo (IPESP) e de Fundos especiais, dentre outros.
Com a introdução deste plano de ação de ideais modernizadores, o PAGE
proporcionou aos jovens arquitetos, um campo para cultivar os ideais de uma nova
arquitetura, onde as obras forenses puderam renovar a linguagem arquitetônica dos
edifícios do Judiciário, propugnando novos objetivos, pois o programa do governo
não era apenas uma questão de desenvolvimentismo, mas também uma
5
Centro Cívico em San Juan, Argentina. Projeto de Antonio S. Antonini, Juan M. Llauró, Gerardo S. Shon, José A. Urgell e Eduardo A. Zemborain em 1971.
6
oportunidade que os arquitetos que realizaram os projetos aproveitaram para
exercitar os ideais acima expostos como o ‘Coração da cidade’, os Centros Cívicos
internacionais, os locais de reunião da comunidade, etc. em seus projetos. 7
Foram selecionados para os Estudos de Caso desta pesquisa, projetos de Centros
Cívicos completos (ou seja, que incluem edifícios destinados aos Três Poderes
representados) – como, por exemplo, os Centros Cívicos de Santo André, de São
Bernardo e de Franca - e Centros Cívicos incompletos – ou seja, conformados por
edifícios isolados para um ou dois dos Poderes Cívicos - como é o caso dos Paços
Municipais de Bauru, de Marília, de Campinas e do Guarujá, dos Fóruns de
Promissão, de Itapira, de São José dos Campos, de Avaré, de Socorro, de Porto Feliz,
de Rio Claro e de Piracicaba e das Assembléia Legislativa de São Paulo e Secretarias
da Fazenda e da Agricultura de São Paulo.
Entende-se que esses edifícios não devem ser compreendidos de maneira isolada,
mas como tentativas, ainda que incompletas, de realizar espaços cívicos significativos
para as cidades em que se inserem. De fato, a maioria deles procurou de alguma
maneira exceder sua função programática (Fórum, Assembléia, Centros Cívicos,
Paços Municipais e outros), tanto pelo seu aspecto formal monumental como por
buscar, quase sempre, transbordar-se em espaços de uso coletivo; inclusive muitas
vezes incorporando atividades extras de cunho cultural, como auditórios, teatros e
galerias de exposição.
Os projetos cívicos, em sua maioria, buscaram expressar a representatividade das
instituições que abrigaram pelo emprego de estratégias de monumentalização de
seus edifícios e dos espaços públicos por eles gerados, estabelecendo relações de
contraste com as atividades cotidianas. Os projetos dessa época (anos 1950-1970)
também propuseram o favorecimento de uma estrutura urbana moderna, onde as
integrações das esferas políticas e culturais da vida pública almejavam ativar a idéia
de ‘Coração da cidade’ com a criação de um novo centro para uso da sociedade;
dando assim seqüência aos debates internacionais então em curso sobre esse tema.
7
FAU-Ao longo de sua existência, algumas destas obras tiveram seus usos modificados,
algumas vezes ampliando seu papel cívico e cultural, o que foi possível uma vez que a
proposta de seus espaços públicos ultrapassava de muito as necessidades estritas de
seus programas político-administrativos, graças em geral à sua implantação generosa
destinada ao uso da população. É o caso, por exemplo, do Fórum de Araras com
projeto arquitetônico de Fábio Penteado e do Fórum de Itapira, de Joaquim Guedes,
os quais deixaram de ser usados como edifícios representativos do Poder Judiciário, e
foram reciclados para abrigar atividades de cunho cultural.
Embora o fomento do Estado de São Paulo para a construção dessas obras não
previsse o uso cultural para os edifícios do Judiciário, este permitiu que ele ocorresse,
através da iniciativa dos arquitetos, que possivelmente procuravam sintonizar-se
com os debates sobre o ‘Coração da cidade’, do espaço cívico e da Monumentalidade
que então estavam ocorrendo em todo o mundo.
Uma abordagem panorâmica inicial das obras cívicas, realizadas no período das
décadas de 1950 a 1970, ajudou a compreender como o panorama das obras
paulistas, realizados por distintos arquitetos, com materiais e formas construtivas
próprias, também participava do mesmo cenário cultural internacional. Nem sempre
as preocupações sociais, expressas nos debates internacionais foram plenamente
atingidas. Porém, essas arquiteturas paulistas se aproximaram das questões
socioculturais e dos princípios e interpretações da Arquitetura Cívica e dos conceitos
teóricos discutidos nesse período, o que permitiu considerar que essas obras
também foram embasadas nos conceitos e ideais do ‘Coração da cidade’, do centro
cívico, do local de reunião da comunidade, etc., e mesmo quando, nesses projetos,
Capítulo 01.
01.01
_ Bases conceituais, definição dos termos e delimitação temporal doscentros político-administrativos:
O Capítulo 1 teve por finalidade desenvolver conceitualmente os termos ‘Coração da
cidade’ e Monumentalidade do edifício, delimitados temporalmente no panorama da
Arquitetura Cívica.
Uma revisão teórica sobre o panorama cultural, político e arquitetônico dos anos
1940-60 revelou a importância do debate sobre o tema do ‘Coração da cidade’ e por
extensão, dos Centros Cívicos. A partir de 1943 a Carta de Atenas, elaborada no IV
CIAM de 1933 e posteriormente revisada e publicada por Le Corbusier, começou a
receber algumas criticas que buscavam expandir seu significado e considerar outras
questões também relevantes para o desenho das cidades.8 No Manifesto de 1943
“Nove Pontos da Monumentalidade” escrita por Siegfried Giedion, José Luis Sert e
Fernand Léger e publicada em formato de artigo para a American Abstract Artists, foi abordada a questão da Monumentalidade dos edifícios e espaços públicos, tema a
seguir retomado nos debates do oitavo CIAM cujo tema foi justamente o ‘Coração da
Cidade’. Esses debates tiveram importantes repercussões no urbanismo e na
Arquitetura Cívica internacional e brasileira, sendo os anos 1950-60 o momento da
construção de muitos centros cívicos em todo o mundo, assim como no Brasil.
Com a disseminação e expansão da arquitetura moderna no pós 2ª Guerra, um novo
cenário de trabalho, com novos horizontes e possibilidades foram proporcionados
para os arquitetos no campo projetual. Nos anos de 1950 a 1970 verificou-se um
incremento de projetos em vários programas, inclusive o de arquiteturas cívicas, aqui
entendidas em amplo senso – ou seja, englobando centros político-administrativos,
equipamentos públicos (praças, teatros, bibliotecas, espaços para exposições, dentre
outros) e instalações para o Poder Executivo, Legislativo ou Judiciário; cujas
propostas quase sempre se mostravam interessadas não apenas em atender os seus
respectivos programas funcionais, mas igualmente, em ativar o potencial desses
projetos como fator de renovação dos centros urbanos, onde o Centro Cívico teria
também o papel de resgatar a centralidade e dar vida para ao coração do conjunto
urbano.
Constatava-se então um processo de descentralização, de perda do sentido e da
existência de um ‘Coração de cidade’; processo que se desejava interromper, ou ao
menos reequilibrar, e para isso, se propunha ativar uma corrente contrária,
enfatizando o processo de recentralização, tornando novamente o núcleo central
(original e histórico, ou planejado e moderno) da cidade, um verdadeiro coração
físico da comunidade, especialmente destinado a abrigar os edifícios representativos
da sociedade democrática e igualmente, um lugar para a livre manifestação da
comunidade social.
Em 1943 Giedion, Sert e Léger já haviam abordado em seu manifesto o tema da
Monumentalidade no marco da arquitetura e urbanismo modernos, onde: “As pessoas querem que os edifícios que representam sua vida social e comunitária possam dar-lhes uma satisfação funcional maior. Querem satisfazer sua aspiração à monumentalidade, à alegria, ao orgulho e à comoção.” 9Desta forma, a dimensão
artística tratada na reorganização da vida comunitária, moldava a vida emocional das
massas, participando na construção de centros cívicos e comunitários, como espaços
qualificados para a ação coletiva. É nesse sentido – de representação de uma
comunidade fundada nos ideais democráticos – que Giedion recupera e reintroduz,
com valor positivo, a noção de ‘Monumentalidade’, nos debates da modernidade dos
anos 1945-1970. Nesse sentido, buscava também a interação entre as esferas
públicas, como o espaço civil, com a sociedade, transformando o ‘Coração da cidade’
como um novo centro para a comunidade.10
9
SERT, J. L. (1943) apud FRAMPTON, K. História crítica da Arquitetura Moderna. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2003. 1aedição, p.329
10
Os debates sobre o Core das cidades, nos projetos de Centros Cívicos, ocorreram em um período em que a arquitetura moderna já havia ultrapassado seu momento inicial
de vanguarda e se encontrava em um momento posterior de crescimento e
consolidação. “(...) a idéia de que ‘já havia uma arquitetura moderna’ permeava, sem muitas dúvidas, o ambiente arquitetônico do imediato pós-segunda Guerra. Esse otimismo entusiasmado, estimulado pela dificuldade de uma visão mais crítica em face da proximidade dos fatos, permitia fazer florescer a crença de que a tarefa a realizar-se não era a de estabelecer a modernidade, mas de dar continuidade a algo que já existia, preferentemente sem desvios de rumos, e com vistas tão somente à sua expansão.” 11
O oitavo CIAM ocorrido em 1951 em Hoddesdon – Inglaterra, cujo tema foi “O
Coração da cidade: por uma vida mais humana da comunidade”, tratou através de
uma extensa variedade de discursos e debates, contrapondo idéias e ideais, em
buscar soluções para os problemas da arquitetura e do urbanismo que os arquitetos
modernos passaram então a enfrentar, buscando entendê-los como aspectos
distintos de uma questão única. Segundo Giedion, em resumo ao oitavo CIAM, havia
a preocupação de tratar do equilíbrio no mundo do indivíduo e na coletividade. Foi
preferida a palavra inglesa ‘Core’ para dar o significado desejado, que segundo definição do CIAM, é considerado “o elemento que faz de uma comunidade uma comunidade e não simplesmente um conjunto de edifícios.” 12
Nos anos 1940-50 as cidades já consolidadas da Europa estavam descentralizadas, os
centros em estado de abandono e sua situação crítica acentuada com a destruição
promovida pela 2ª Guerra Mundial. A oportunidade da reconstrução ativou os
debates em torno de se promover a necessária integração e coordenação de todas as
atividades urbanísticas, a fim de evitar o crescimento desordenado das mesmas. A
necessidade de concretização de novas práticas para a recentralização ativou a idéia
11
BASTOS, M. A. J.; ZEIN R. V. Brasil: arquiteturas após 1950. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2010, p.25.
12 GIEDION, S.
da “criação de novos centros comuns, de novos Corações que venham substituir os que foram destruídos pelo crescimento desordenado”13 das cidades.
O mesmo princípio também pareceu ganhar importância na reorganização de novas
cidades, inclusive no continente americano. Embora distintas das cidades européias,
estas também passavam por um intenso processo de expansão e crescimento, com
conseqüente periferização e igualmente com o abandono ou relativa decadência de
alguns centros.
Nos anos 1950 a idéia de planejamento urbano ganhou importância, e algumas
administrações municipais passaram a adotar a aplicação da noção funcionalista
promovida pela Carta de Atenas em 1933, a qual sugeria a organização urbana
segundo quatro funções básicas: habitar, trabalhar, circular e espairecer. A
classificação e subdivisão em setores relativamente estanques estabeleceram
centros e núcleos setoriais, para onde o ‘Coração da cidade’ ou o Centro Cívico
resgatasse o papel de dar vida ao conjunto urbano.
Esta necessidade de se propor um Centro Cívico concebido como a ‘quinta função’ foi
uma das propostas que nasceram no período do Pós-Segunda Guerra. Ampliação
essa que se fazia necessária, como apontava José Luis Sert em seu texto introdutório
“Centres of Community Life”, porque era preciso que a arquitetura e o urbanismo modernos propusessem “(...) um entorno físico especialmente concebido para expressar o sentido de comunidade, em cinco níveis de ordenação coletiva, desde o povo da metrópole, passando pelo bairro residencial e a cidade.” 14
Temas como os CIAMs, a Monumentalidade e os Centros Cívicos foram abordados
neste capítulo, a fim de justificar e embasar o porquê do grande fomento público em
transformar edifícios político-administrativos em obras que se transformassem em
marcos na paisagem a fim de criar locais de reunião para a sociedade civil. Desta
mesma forma, as dilatações do arco temporal foram pertinentes para a pesquisa.
13
SERT, J.L. Centros para la vida de la comunidad. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.04.
14
01.01.01
_ ‘O Coração da cidade’:Com o Congresso Internacional de Arquitetura Moderna – CIAM realizado em
Frankfurt em 1929, os arquitetos e estudiosos presentes concluíram que os
problemas da arquitetura moderna estavam diretamente relacionados aos
problemas da urbanística, sendo inadequado separá-los. A partir de então, todas as
reuniões dos CIAMs passaram a tratar a arquitetura e a urbanística como unidade.
Novos estudos sobre habitação no CIAM de Bruxelas, em 1931, levaram em
consideração o aproveitamento do terreno, os serviços comuns e a circulação, bem
como a análise de sua inserção na cidade em seu conjunto. Em 1933 formulou-se a
Carta de Atenas, que foi posteriormente revisada por Le Corbusier, cuja proposta era
dar parâmetros urbanísticos para as cidades modernas. A conclusão dos membros e
grupos de arquitetos do CIAM em reunião na cidade de Bridgwater em 1947, no
Pós-Segunda Guerra, foi que a arquitetura e a urbanística estavam mais do que nunca
ligadas entre si, pois o enfrentamento no momento era com os problemas da
reconstrução das cidades destruídas na guerra e a criação de novas regiões para
abrigar novas comunidades urbanas.
Os CIAMs do Pós-Segunda Guerra contavam com a participação crescente não
somente de profissionais vindos da Europa, mas também de arquitetos da Ásia,
América do Sul, África, oriundos de cidades também em pleno desenvolvimento. José
Luis Sert, neste momento, buscou captar o clima de debates então em curso, voltado
para “a necessidade de integrar e coordenar todas as atividades urbanísticas, a fim de evitar e parar o caótico crescimento das cidades.” 15 Além de combater o crescimento desordenado, propôs também a promoção em cada cidade de um
Centro Cívico, cuja meta seria ativar a reconstrução do ‘Coração da cidade’.
“O CORAÇÃO DA CIDADE trata dos problemas urbanísticos dos setores urbanos que são lugar de congregação de massas, centros da vida coletiva e, ao mesmo tempo, símbolos da própria cidade. São também centros de reunião das artes, onde os principais monumentos se agrupam ao redor das praças públicas e passeios, visitados pelos turistas, orgulho dos cidadãos. Dão personalidade própria a cidade, que não
15
pode concebê-lo sem eles. Representam nossa cultura com paisagens cívicas, onde a criação do homem, o artificial, predomina sobre o natural.” 16Este ‘Coração’ não foi somente o centro comercial da cidade, mas o centro das relações humanas mais
intensas, como a conversa, a discussão, o passear e o ócio, que satisfizessem o corpo
e o espírito.
As características destes novos Centros Cívicos foi o tema escolhido e desenvolvido
no oitavo CIAM (ocorrido em 1951 em Hoddesdon – Inglaterra), o qual recebeu o
título “O Coração da cidade: por uma vida mais humana da comunidade”. Propôs que um projeto arquitetônico e urbanístico poderia tornar-se um instrumento de
requalificação das cidades, não apenas espacialmente, mas também socialmente.17
O conceito de Centro Cívico corroborou e acentuou a idéia de ‘O Coração da cidade’
reconhecendo o valor das ‘pré-existências’ e do ‘caráter do lugar’.18 Resgatava o
papel da ‘história’ e do ‘passado’, o qual se colocava como importante forma de
recuperação da vida nos centros das cidades, deterioradas em conseqüência da
Segunda Guerra Mundial ou das próprias reformas urbanas executadas na era
industrial, ou ainda do crescimento expansivo e desordenadas das novas cidades.
O ‘Coração da cidade’ tratava de Centros Cívicos como o núcleo da cidade, mas para
Ernesto N. Rogers a palavra ‘núcleo’ (parte da fruta que contém a semente, que é a
energia potencial do organismo) ou simplesmente ‘centro’ também poderia ter sido
usada. Mas a palavra ‘coração’ na linguagem da técnica urbanística ganhou força,
pois ela é mais palpitante e denota valores fisiológicos e biológicos do sentimento.
“O Coração é o centro integral para uma sociedade de indivíduos unidos entre si por sua vida de comunidade.” 19
16
SERT, J. L. Prólogo a la edición española. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Hoepli, 1955, p.V.
17
ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Hoepli, 1955.
18
MAYUMI, L. A Cidade Antiga nos CIAM, 1950-59. p.02
19
O ‘Coração da cidade’ seria o centro da vida comum e se fazia necessária a
reconstrução destas zonas centrais, pois segundo Sert e os arquitetos da época, estas
já estavam estéreis e caducas, e quase se desintegrando, por várias razões, como a
expansão da periferia, à medida que se facilitava o acesso aos subúrbios através dos
novos meios de transporte; e ainda pelo crescimento industrial trazendo o aumento
especulativo dos terrenos mais centrais, e tendendo à descentralização das cidades.
Nesse processo, em muitos casos o centro passou a ser um local somente de
trabalho. Novos centros de negócios e comércio se desenvolveram ao longo de novas
artérias e ruas principais, congestionando estas vias e causando a decadência destas
áreas. 20
Para interromper este processo de descentralização, ou ao menos reequilibrá-lo, se
propôs ativar uma corrente contrária, o processo de recentralização. “Este plano exige a criação de novos centros comuns, de novos Corações que venham a substituir os que foram destruídos por aquele crescimento desordenado.” 21Fazendo do núcleo da cidade o coração físico da comunidade, esta área tornou-se um ambiente físico
especial destinado à manifestação da sociedade.
No oitavo CIAM, o arquiteto J. L. Sert declarou que a arquitetura moderna estava
diretamente ligada à urbanística, pois as cidades eram um conjunto de habitações,
um lugar de manifestações civis e um espaço para funções públicas. Nas cidades
existentes, a modernidade poderia se manifestar de maneira taxativa pela criação de
novos centros que criariam, ou revitalizariam, o ‘Coração da cidade’ substituindo os
centros tradicionais que foram destruídos pela guerra e/ou pelo crescimento
desordenado.
Para definir as áreas das cidades, foi necessária a classificação e divisão em setores,
estabelecendo núcleos para cada um deles, conferindo qual a função real dos
centros. Estes setores são agrupamentos de edifícios públicos de distintas classes que
se tornavam pontos de reunião do povo, criando áreas de convívio e adicionando aos
pedestres a preferência sobre o tráfego. “A função social destes novos centros ou
20
núcleos é fundamentalmente a de unir as pessoas e facilitar os contatos diretos e o intercâmbio de idéias que estimulem a livre discussão.”22
Os centros de reunião da sociedade podem ser em locais pouco favoráveis para a
troca de idéias, bem como em locais devidamente organizados, que conferiram a
este novo espaço uma vida social com espírito cívico, criando um marco na paisagem.
Estes locais de reunião oferecem para a comunidade, além de diversão, espetáculos,
informação cultural e outras oportunidades gerais de reunião. A função social destes
novos centros tem que considerar a forma e estrutura de seus edifícios, pois estes
foram encontrados em projetos onde os Centros Cívicos e a vida social tem como
objeto a proporção entre os espaços abertos destinados ao público e os espaços
destinados à habitação.23
Outra questão que favoreceu estes centos do governo foi o financiamento público
das obras, tendo ela sido Federal, Estadual ou Municipal, pois a especulação privada
neste momento não se fazia fundamental, uma vez que o poder público injetava
capital para construir novos centros e conjuntos de edifícios, a fim de dotar estes
espaços monumentais como áreas para a inclusão da nação.
Esses centros foram a principal expressão da cidade ou da metrópole, ou ainda do
conjunto que se inseriu, formando o ‘Coração da cidade’ que não obrigatoriamente
coincidia com o centro geográfico, histórico ou funcional da cidade. Deviam existir
centros em cada zoneamento funcional do solo (industrial, comercial, residencial) e
no centro da cidade o ‘Coração’ principal.
O conceito de ‘Centro’ teve dois princípios neste momento, um geométrico, que
respeitava um determinado desenho urbanístico e outro funcional, que respeitava o
destino e uso. Ambos puderam estar presentes no ‘Coração da cidade’, seu centro,
mas não como regra definitiva, pois freqüentemente existiram novos centros que se
consolidaram fora do centro geométrico. O centro funcional foi o local onde se
22
SERT, J. L. Centros para La vida de La comunidad. In: ROGERS, E. N.; SERT, J. L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.08.
23
desenvolveu a vida em relação aos indivíduos de uma comunidade, ou seja, os
centros de reunião.24
Para isto, um requisito para estes Centros de vida comunitária foi a separação de
pedestres e automóveis. Os meios de transportes motorizados deveriam circular em
todo o perímetro desta zona até os estacionamentos, e o interior do terreno se
destinaria exclusivamente aos pedestres. No interior dos centros deveriam
encontrar-se árvores, plantas, água, sol e sombra, e todos os elementos naturais
agradáveis aos homens, harmonizando-os com os edifícios e suas formas
arquitetônicas, seus valores plásticos e suas cores, pois a paisagem tem um
importante papel, resultado este que agrada ao homem.
Adicionalmente, o CIAM não colocou o estudo do ‘Coração’ apenas como elemento
urbanístico, mas como um novo campo da Arquitetura Moderna, no qual “Uma nova abordagem entre as artes plásticas enriquecerá a linguagem arquitetônica, e esta colaboração ajudará a própria arquitetura desenvolver maiores valores plásticos, maior qualidade escultórica.”25
Neste momento, a função do arquiteto foi de conservar, mover, restabelecer,
vivificar ou simplesmente inventar o Coração, em lugares distintos e circunstâncias
diversas, a partir do ponto de vista social, estético, técnico e psicológico, criando no
campo cultural um ambiente artístico que expresse a realidade, mas que pudesse
trazer à tona o conceito de Centro como local de reuniões da comunidade. 26
Os Centros Cívicos compuseram fisicamente os ‘Corações das cidades’, pois foram
conjuntos de edifícios e espaços destinados a abrigar e potencializar a vida cívica,
incluindo a Prefeitura, Governo Estadual ou Presidência da República (Poder
Executivo), a Câmara de Vereadores, Assembléia Legislativa ou Congresso Nacional
24
ROGERS, E. N. El Corazón: problema humano de las ciudades. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Hoepli, 1955, p.69.
25
SERT, J. L. Centros para La vida de La comunidad. In: ROGERS, E. N.; SERT, J. L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.14.
26
(Poder Legislativo) e os Fóruns ou os Tribunais de Justiça (Poder Judiciário), mas
puderam ainda conter diversos componentes para fins culturais como biblioteca,
auditório, teatro, praça de eventos, dentre outros.
As edificações públicas que compuseram o Centro Cívico refletiam o modo de
organização pública, caracterizavam o lugar e a representação desta organização
política – baseados nos Três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário – além de
constituir um espaço urbano qualificado para a cidade. Estas obras cívicas
aumentaram a relação entre arquitetura e organização política.
Conforme a definição do Diccionario de Arquitectura de La Argentina, Centro Cívico é um “conjunto de edifícios institucionais e administrativos, concebidos segundo um projeto arquitetônico unitário, com o objetivo de formar um marco construído significativo, destinado a classificar tanto atividades alojadas como o centro urbano em que se situa.” 27
O conceito ‘Centro Cívico’ foi utilizado pela primeira vez no final do século XIX e tem
antecedentes no denominado “City Beautiful” – movimento norte-americano – com a finalidade de unir a representabilidade do poder com as necessidades
administrativas, ou seja, a preocupação em ‘embelezar’ as áreas centrais e construir
grandes conjuntos de edifícios públicos, buscando unidade e harmonia na
composição arquitetônica.
O oitavo CIAM viu o ‘Coração da cidade’ como novo campo da Arquitetura Moderna,
por isso não se interessou somente como elemento urbanístico, mas também como
meio de exploração da arte associada à arquitetura, seja pela escultura ou pintura,
valorizando a liberdade plástica. Estes novos meios de expressão mostravam um
caminho mais completo na arquitetura, pois a cor, a textura e os valores escultóricos
poderiam desempenhar um importantíssimo papel. As artes plásticas só
enriqueceriam a linguagem arquitetônica, e esta colaboração só ajudaria no
desenvolvimento plástico da obra e sua qualidade escultórica.
“... a gestão dos grupos de edifícios públicos e dos espaços abertos com eles relacionados requer colaboração das artes para alcançar uma expressão plástica de
27
maior sucesso. Ao conceber os centros de uma vida comum em uma cidade, o arquiteto-urbanista se depara com um projeto cívico que associa a urbanística com a arquitetura.” 28Esta interação arquitetura e arte foram demonstradas historicamente nos locais de reunião da comunidade – o ‘Coração da cidade’.
No Brasil, o tema Centro Cívico teve sua definição pela união dos Três Poderes de
organização de uma cidade, simbolizando o poder dessa nação, ou seja, dominação e
organização do Estado.
Os agrupamentos de edifícios administrativos formavam os Centros Monumentais de
diferentes características, que requalificavam o espaço urbano, sugerindo novos
padrões de conduta e convivência urbana, além de sediarem o poder ali
representado.
Os Centros Cívicos constituíram locais destinados a efetivação das condições de
cidadania, onde a noção de civismo foi determinante do caráter arquitetônico e
urbanístico. Como instrumento, os Centros Cívicos determinaram a unidade nacional,
nos termos da administração pública, com base nos Três Poderes: Executivo,
Legislativo e Judiciário, e também na organização do Estado em sua três esferas:
Federal, Estadual e Municipal.
Segundo Denise Guedes Zurron29, o conceito de Centro Cívico a partir do ponto de
vista administrativo, além de configurar o espaço que abrigava as instituições
públicas, teve por finalidade a reunião dos principais órgãos administrativos
municipais num mesmo local.
Desta forma, neste momento a função do arquiteto-urbanista foi de construir um
marco que tivesse condições de desenvolver a vida na comunidade, dando forma
concreta à cultura cívica. No entanto, a vida cívica não dependeu somente da
existência de um marco favorável, mas da estrutura política, social e econômica de
cada comunidade. Esta estrutura devia permitir o livre e democrático intercâmbio de
28
SERT, J.L. Centros para La vida de La comunidad. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.14.
29
idéias, conferindo aos Centros Cívicos a consolidação do governo democrático. Para
isto, a criação destes novos centros foi tarefa do Governo (Federal, Estadual e
Municipal), sendo financiados com fundos públicos.
Assim, vários centros poderiam existir em uma única cidade, desde que o centro
principal fosse a expressão da cidade ou da metrópole em seu conjunto, ou seja, o
01.01.02
_ A Monumentalidade dos edifícios:A Monumentalidade que os edifícios adquirem está diretamente relacionada à
função, forma e estrutura dos prédios político-administrativos, os quais criam um
marco na paisagem, pois os centros de reunião da sociedade conferem a estes
edifícios o seu caráter monumental, pois longe ou perto, esta figura faz-se dominante
ao marcar o local e torná-lo único.
Os novos centros do período em estudo tiveram uma função social adquirida, pois
pessoas se deslocaram aos locais de reunião para ver e serem vistas, para encontrar
amigos, namorar, discutir política, esportes, conversar, dentre outros, pois “toda comunidade, grande ou pequena, tem a necessidade de se reunir.” 30
Os centros também tiveram a função de apresentar obras de inventores e artistas
que puderam servir de vitrine para o mundo, através de exposições nas praças,
transformando os lugares de reunião em anfiteatros, contemplados por todo o
mundo. Estes centros de reunião da comunidade, quando organizados, constituíram
um marco na paisagem desta nova vida social, com um espírito cívico saudável, onde
os edifícios ali contidos deveriam sempre levar em conta a função social, oferecendo
para a comunidade: diversão, espetáculos, informação cultural e reuniões em geral.31
No entanto, para que a vida cívica pudesse ocorrer, esta não dependia
exclusivamente da existência de um marco favorável, mas que estivesse ligado à
estrutura política, social e econômica de cada comunidade.32
O tema da Monumentalidade dos edifícios também se fez presente no oitavo CIAM 33
(Hoddesdon - Inglaterra em 1951), conferindo à obra o valor de marco arquitetônico
que ela representava, juntamente com a associação da arquitetura com as artes.
Neste momento, a função do arquiteto-urbanista foi a de construir um marco que
30
SERT, J.L. Centros para La vida de La comunidad. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.08.
31
IDEM.
32
tivesse condições de desenvolver a vida na comunidade, dando forma concreta a
cultura cívica, fazendo da vida cívica um livre e democrático intercâmbio de idéias,
conferindo aos centros cívicos a consolidação do governo democrático.
Esta espontaneidade, que nos anos 1940-1960 foi inteiramente oculta, se tornou
parte das necessidades humanas, que foram sendo respeitadas e utilizadas para
transformar a comunidade através da arquitetura cívica que contemplava a forma, a
estrutura, bem como a razão social pela qual se originou a intenção de reorganizar
ou criar um novo centro, com vida para a sociedade.
Em 1943, José Luis Sert, Fernand Léger e Siegfried Giedion decidiram abordar um
único tema que fosse de interesse destes, a partir de seus próprios campos de
atividade: um arquiteto e urbanista, um pintor e um historiador de arquitetura. O
tema foi a Monumentalidade, e os três resumiram seus pontos de vista coletivos no
polêmico manifesto intitulado “Nine Points on Monumentality”.34
O texto aborda em seu manifesto o tema da Monumentalidade no marco da
arquitetura e urbanismo modernos, onde: “As pessoas querem que os edifícios que representam sua vida social e comunitária possam dar-lhes uma satisfação funcional maior. Querem satisfazer sua aspiração à monumentalidade, à alegria, ao orgulho e à comoção.” 35
Desta forma, a dimensão artística tratada na reorganização da vida comunitária,
moldava a vida emocional das massas, participando na construção de centros cívicos
e comunitários, como espaços qualificados para a ação coletiva.
No manifesto de 1943 a proposta foi de ‘Nove Pontos para a Monumentalidade’ 36
como meio para atingir a nova monumentalidade cívica. Os pontos tratados foram:
1) Monumentos são marcos humano que devem ser criados como símbolos de
seus ideais, objetivos e ações;
34
SERT, J. L. “Arquitecto en Nueva York”, Barcelona: Editora Actar, 1997, p.27.
35
IDEM, p.17.
36
GIEDION, S.; LEGER, F.; SERT, J. L. “Nine Points on Monumentality”, Nova York, 1943. In GIEDION, S.
2) Monumentos são a expressão das mais nobres necessidades culturais;
3) Monumentos só são possíveis em períodos em que existam uma consciência
e uma cultura unificadoras;
4) O último século presenciou uma desvalorização da monumentalidade;
5) O declínio e o mau uso da monumentalidade são a principal razão pela qual
os arquitetos modernos deliberadamente abandonaram a idéia de
monumento e se revoltaram contra ele;
6) Uma nova etapa se apresenta, a nova economia do pós-guerra mudou a
estrutura das nações reorganizando a vida comunitária;
7) As pessoas desejam edifícios que representem suas vidas comunitárias;
8) Locais para monumentos precisam ser planejados e
9) O uso de materiais modernos e novas tecnologias.
A monumentalidade cívica enfatizava Monumentos como marcos que o homem criou
para serem símbolos de seus ideais, objetivos e ações, tornando-os patrimônios para
as gerações futuras, criando assim uma conexão entre o passado e o futuro. Estes
símbolos expressavam os sentimentos e pensamentos da força coletiva através das
necessidades culturais da população, as quais possibilitavam a criação de
monumentos duradouros, em tempos onde a autêntica vida cultural marcava sua
história.
Estes monumentos tiveram que representar de algum modo o espírito e o
sentimento coletivo dos tempos modernos, a fim de não se tornarem locais vazios.
Para solucionar este abandono, os arquitetos passaram a abordar relações que não
podiam ser isoladas: a arquitetura e o urbanismo.
Com o desejo da sociedade em ter edifícios que representem sua vida social e
coletiva, a satisfação do povo veio com a monumentalidade, a alegria, o orgulho e a
esperança, pois os locais escolhidos para receber estes monumentos precisavam ser
planejados para dar a visibilidade devida ao marco. Estes edifícios deviam estar em
ambientes abertos, envoltos por praças com árvores e plantas, almejando novos
Um dos primeiros requisitos a serem cumpridos por estes centros de vida
comunitária foi a separação de pedestres e automóveis37, pois a valorização do
interior dos centros deveria ser de árvores, plantas, água, sol e sombra, e demais
elementos agradáveis aos homens, harmonizando estes elementos com os edifícios e
suas formas arquitetônicas, seus valores plásticos e suas cores. O paisagismo vinha
para estabelecer uma relação de escala com o lugar e com os edifícios auxiliares.
No entanto, todos estes centros deveriam ter espaços abertos para o público, tais
como praças e ruas, uma tendência de criação de praças públicas e de zonas
destinadas aos pedestres, conferindo a física separação entre automóveis e
pedestres. Desta forma, as pessoas passavam de simples espectadores para
participantes ativos na vida social que a cidade oferece. O direito do pedestre foi
assim respeitado no sentido de poder transitar livremente, sempre em locais
adequados, espaços abertos e sem a influência de automóveis, principalmente nos
novos centros.
Outro assunto também abordado na monumentalidade do edifício foi a forma. A
relação centro e entorno gerou a diferença na proporção e altura dos edifícios.
Temos os prédios de dois ou três andares, com escadas e que cobrem grande parte
do terreno, mas também os de gabarito mais alto, com elevadores, que fizeram o
contraste entre o alto e o baixo, as torres e os pátios, os espaços abertos e os
fechados, e que deram a noção de animação volumétrica dos diversos setores do
‘Coração da cidade’, conferindo-lhes a monumentalidade pretendida.38
Além destes contrastes, temos a relação de espaço e função entre os grupos de
edifícios e os espaços abertos para o uso público. As funções sociais e cívicas que
estes edifícios trouxeram aos centros expressavam a nossa cultura, os
conhecimentos técnicos e um novo sistema de vida, que contavam com edifícios
políticos, administrativos e de equipamentos públicos para conceber a
monumentalidade, que foi a valorização do sentimento coletivo referente aos
Centros Cívicos que representavam o ‘Coração da cidade’.
37
SERT, J.L. Centros para La vida de La comunidad. In: ROGERS, E.N.; SERT, J.L.; TYRWHITT, J. (org.). El corazón de la ciudad: por una vida más humana de la comunidad. Barcelona: Ed. Hoepli, 1955, p.11.
38
Para alcançar a monumentalidade cívica, foi necessária a colaboração de paisagistas,
pintores, escultores, arquitetos e urbanistas, além de espaços especialmente
concebidos para receber os monumentos, suficientemente amplos e rodeados por
espaços abertos, bem como o uso de novos materiais e técnicas, elementos móveis,
projeções de luz, cor e elementos da paisagem natural. Todos estes elementos deram
vida a estes ambientes, trazendo à tona o sentimento coletivo de valor ao marco
arquitetônico, pois a construção de grandes Centros Cívicos e comunitários foi não
somente uma tarefa arquitetônica, mas também o elemento mais importante de
uma cidade para Sert.39
01.01.03
_ Considerações sobre as Bases Conceituais:José Luis Sert, então presidente dos CIAM, em sua oitava reunião, resumiu as
preocupações centrais deste Congresso e qual seria a proposta desenvolvida pelo
grupo de arquitetos, a fim de sanar o problema da desintegração da vida nas cidades,
tendo como tema o ‘Coração das cidades’ e acreditando num processo de
recentralização das mesmas.
O oitavo CIAM abordou o ‘Coração da cidade’ como um novo campo da Arquitetura
Moderna, por isso não interessava somente o ponto de vista como elemento
urbanístico, mas também como meio de exploração da arte associada à arquitetura,
seja pela escultura ou pintura, valorizando a liberdade plástica. Estes novos meios de
expressão mostravam um caminho mais completo na arquitetura, pois a cor, a
textura e os valores escultóricos puderam desempenhar um importantíssimo papel.
As artes plásticas só enriqueceram a linguagem arquitetônica, e esta colaboração só
ajudou no desenvolvimento plástico da obra e sua qualidade escultórica,
proporcionando a Monumentalidade desejada da edificação pública e de seu entorno
– os centros – que é local de reunião da comunidade.
“... a gestão dos grupos de edifícios públicos e dos espaços abertos com eles relacionados requer colaboração das artes para alcançar uma expressão plástica de maior sucesso. Ao conceber os centros de uma vida comum em uma cidade, o arquiteto-urbanista se depara com um projeto cívico que associa a urbanística com a arquitetura.” 40Esta interação arquitetura e arte foram demonstradas historicamente nos locais de reunião da comunidade, ou seja, no ‘Coração da cidade’ como marco
arquitetônico no local em que se inseriu.
Considerando-se a arquitetura como arte social, os projetos de Centros Cívicos –
edifícios institucionais, de caráter social – realizados no Brasil em um momento em
que a arquitetura moderna já havia se firmado, contribuíram para o avanço da
mesma, a qual teve como proposta uma interação das atividades cotidianas com a
esfera política, administrativa e cultural da vida pública, transformando este novo
centro no ‘Coração da cidade’.
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Portanto, sejam os Centros Cívicos representantes dos edifícios
político-administrativos, os quais configuravam o espaço que abrigava as instituições
públicas, o centro geográfico e/ou o centro funcional na cidade, local onde se
desenvolveu a vida em relação aos indivíduos de uma comunidade, constituiu os
centros de reunião. Estes centros conferiram a este novo espaço uma vida social com
espírito cívico, criando um marco arquitetônico na paisagem e fazendo do ‘Coração
da cidade’ um instrumento de requalificação, não apenas espacialmente, mas