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O corpo e os processos de subjetivação: um estudo sobre o ensino da biologia

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Academic year: 2017

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ARIANNE TOGASHI GONÇALVES

O CORPO E OS PROCESSOS DE

SUBJETIVAÇÃO: um Estudo sobre o

Ensino da Biologia

Rio Claro 2009

LICENCIATURA E BACHARELADO CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”

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ARIANNE TOGASHI GONÇALVES

O CORPO E OS PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO:

Um Estudo sobre o Ensino da Biologia

Orientador: Prof. Dr. Romualdo Dias

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - Câmpus de Rio Claro, para obtenção do grau de Licenciatura e Bacharelado em Ciências Biológicas.

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O corpo e os processos de subjetivação : um estudo sobre o ensino da biologia / Arianne Togashi Gonçalves. - Rio Claro, SP : [s.n.], 2009 47 f. : il.

Trabalho de conclusão de curso (Licenciatura e Bacharelado -Ciências Biológicas) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro

Orientador: Romualdo Dias

1. Biologia - Estudo e ensino 2. Subjetividade no ensinar ciência. 3. Universidade. 4. Vivissecção. I. Título.

G635c

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Dedicar meu trabalho.

Quão injusto seria citar nomes.

Se neste falo sobre a subjetividade, da constituição do meu ser, só poderia dedicar a cada ser que passou pela minha vida. Cada amigo, e muito mais, os “inimigos”. Cada um que passou e ficou pelo tempo que deveria, para deixar um pouco de si em mim, e talvez de mim neles.

Cada sorriso, cada abraço de acolhimento para os conflitos que nós mesmos criamos. Muito mais que palavras, agradeço aos ouvidos, porque palavras muitas vezes foram desnecessárias, na verdade sempre foram.

À vida, à família que construí e aos momentos que vivi nestes anos de Rio Claro, que antes pareciam tão longos, mas hoje sinto que foram curtos demais. Aqui descobri um novo significado de casa e família, pois pude ser quem sou nua e sem máscaras.

Agradeço ao melhor presente que poderia receber: a lembrança. A lembrança de viver cada momento aparentemente tão simples: Acordar cedo para ir à aula, e perceber que a melhor aula que tive, foi aquela que sai da sala com o amigo e passei o tempo inteiro desta conversando, sem nem perceber as horas passando, porque para mim esse é quem possui o conhecimento: Quem vive o que fala!

Agradeço a oportunidade de estar e viver o maior e melhor centro de produção de conhecimento: o mundo.

À academia, por ter sido o cenário de todos esses encontros.

À família que desde o princípio dessa caminhada sempre me fortaleceu com palavras, paciência e amor. Pelo respeito em aceitar minhas escolhas, por mais que meus caminhos não foram como os sonhados. Aqui aprendi o valor da vida, aprendi a respeitá-la, independente da forma com que se apresenta no mundo.

Àquele que sempre, sempre mesmo, esteve do meu lado, fisicamente e espiritualmente. Quem me mostrou a vida e o mundo como é, quem abriu as portas da minha gaiola, e me ensinou o prazer de viver a vida como ela é, sem me proteger, e assim descobri o que é amar. Cada conforto e cada confronto que me proporcionou. Por ser amigo, companheiro, confidente e amante.

À minha filha, uma gatinha vira-lata que sem nunca ter dirigido uma palavra a mim, com seus olhares sempre impôs suas vontades e insatisfações, e a todos os bichos que convivi que me ensinaram ao longo de minha vida que os humanos estão longe de ser o animal mais evoluído.

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Sumário

Resumo ... 4

Apresentação ... 5

Introdução ... 6

O Projeto Arquitetônico de Biologia Institucional ... 9

A Taxonomia ... 11

A Fisiologia... 12

O Sensível de Biologia e os cientistas de Alma ... 14

A Medicina ... 14

A Medicina Antroposófica, A Homeopatia e o Vitalismo ... 15

Crer e Saber... 17

Objetos de Estudo/Vítimas da Ciência ... 17

Simulações: Projetos de Pesquisa e Objetos de Estudo ... 18

A Vida Transgênica ... 20

Transformar ou Conservar ... 22

Conclusão ... 23

Referências Bibliográficas ... 25

ANEXOS ... 26

Depoimento Aluno A ... 27

Depoimento Aluno B ... 35

Depoimento Professor A ... 40

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Resumo

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Apresentação

Considero importante, para início de conversa, expressar a motivação em realizar esta discussão, uma vez que questionamos sobre a impessoalidade e rejeição da subjetividade no processo de ensinar e executar a ciência.

Este trabalho é resultado de esforços de pensamentos a partir de uma inquietação, um desconforto que me acompanhou por todos os longos anos de graduação. Muitas vezes isso ocorreu sem perceber o que estava realmente errado, talvez fosse por estar sentindo ao invés de racionalizar.

O que me motivou a estudar Biologia se mostrou um empecilho a realizá-la com o bom desempenho esperado. Meu amor pela vida, por um animal, por uma planta gerou desconfortos, para mim, conseqüentemente para alguns professores e muitas discussões com colegas, uma vez que minha intencionalidade era incoerente com a verdade da ciência, a verdade comum. Coloquei-me a questionar muitas vezes minhas dificuldades, mas hoje acredito que muitas destas não eram por incompetência de habilidades, mas sim por uma incapacidade de me adequar, me moldar aos padrões exigidos de um biólogo, um cientista racional desprovido de qualquer influência de sua vida pessoal, de sua história, de seus amores. Fiz biologia por que amo a vida, e qualquer forma de vida, não hierarquizei o valor desta a partir de sua espécie e por um fim científico. Sou apaixonada pela vida e não pela ciência que a estuda através da morte.

Escrever este trabalho foi um desafio. Permeia as idéias geradas por sensações. Acredito que esta busca de uma razão, seja diferente das muitas outras razões vistas na ciência. É a razão com a raiz na emoção, que procura uma compreensão para buscar novos modos de se relacionar com ela.

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Introdução

As inquietações, os desconfortos sentidos na pele, o não se sentir “em casa”, o questionar e procurar esclarecer, buscar e se reinventar, todos estes aspectos nos acompanham em nossos estudos sobre as implicações que uma determinada concepção de corpo, empregada nos métodos didáticos, tem para o processo educacional. Tomar consciência de que somos feitos de muito mais do que imaginamos ser, e muito além do que nos ensinam na escola se constitui em um desafio para quem transita nestas fronteiras de estudos interdisciplinares que aqui propomos realizar.

Tudo que se é se perde quando meu corpo, este que é finito, padece? Nossas relações, nossas experiências construída por toda uma vida, permanece para constituição de si, para que então, possamos permanecer imortais em cada uma das nossas relações. É o infinito dentro do finito, são sentimentos dentro de um corpo, é a mente e o corpo que não se pode distinguir, separar, classificar, dizer onde começa ou termina.

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Em tempos do mundo global, a busca por uma identidade, nos torna suscetíveis às intenções das máquinas produtoras de signos, moldando as relações e as reduzindo a formas pré-estabelecidas, tornando assim, o consumidor uniforme, fácil de ser manipulado e persuadido a consumir produtos, marcas, imagens e comportamentos. A intenção destes mecanismos é a de produzir a ilusão de inclusão no mundo atual. Regina Favre, expressa este “empobrecimento da biodiversidade subjetiva” como fast forms, nos poupam tempo, esforço e angústia de buscar quem e como ser e viver no mundo a partir da nossa relação com os acontecimentos.

A Biologia em sua visão mecanicista, também estabelece sua relação com o animal (não humano), de forma instrumental: ratos de laboratório, sapos, cães e gatos, instrumentos de aula prática, rompe-se aqui a alteridade com outras formas de vida, rebaixando-as à uma involuntária devoção aos interesses do homem. Como os alunos, recebem essa metodologia de ensino “prático”? O quanto ela é prática e eficaz? Essas metodologias usadas a milhares de anos vêm sendo reproduzidas, sem mais serem questionadas, é a reprodução do pré-estabelecido. Guattari critica esses mesmos procedimentos, no corpo da psicanálise, diz que é necessário reorientar conceitos e práticas para fazer deles outro uso, para desenraizá-los de seus vínculos pré-estruturalistas com uma subjetividade totalmente ancorada no passado individual e coletivo. É preciso reinventar novos métodos de ensinar a

Biologia (do Grego: bíos, vida + lógos, tratado) sem ser através da morte, de forma

que estas experiências práticas se corporifiquem no aluno de modo eficaz e não agressivo, fazendo-se assim presente no estudo biológico o uso da ecosofia, proposta por Guattari, onde trata de possibilitar novos valores rompendo com a subjetividade capitalista.

A intenção deste trabalho é enriquecer o debate do porque do modo de vida humano individual e coletivo, permanecer “ossificado” por uma espécie de padronização de comportamentos. “É a relação da subjetividade com a exterioridade

– seja ela social, animal, vegetal, cósmica – que se encontra assim comprometida

numa espécie de movimento geral de implosão e infantilização regressiva. A alteridade tende a perder toda a aspereza” 1. Como, por exemplo, a prática de

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O projeto arquitetônico da Biologia institucional

“A individualidade do corpo aberto perde-se e se dispersa na pluralidade dos órgãos.” (Michel Tibon-Cornillot)

A Biologia moderna, institucional, desenvolveu-se nos moldes da teoria mecanicista da vida, inspirado em René Descartes, no século XVII. Esta teoria visando à análise científica racional afirma que as plantas, animais, inclusive os corpos humanos são autômatos, como máquinas semelhantes ao relógio. Na quinta parte do Discurso do Método, ele faz uma descrição fisiológica - o corpo é uma máquina de terra, e suas funções dependem das funções dos órgãos. Supunha-se que a mente se comunicava com o corpo-máquina por uma glândula cerebral, estabelecendo assim a interação entre espírito e matéria.

Outra forte influência de Descartes na biologia acadêmica foi a do método reducionista, em que a compreensão de um fenômeno ou a solução de um problema estava ligada a necessidade de dividir as dificuldades em quantas partes fosse necessária para resolvê-las, além de conduzir com ordem os pensamentos, começando com os mais simples e seguindo para os mais complexos e então fazer uma síntese da realidade complexa, que foi decomposta em partes menores. A última etapa consiste em fazer toda enumeração, classificação e revisões para nada se omitir.

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aceitação da realidade de algo “misterioso” ou “místico” na esfera da vida implique o

abandono das certezas laboriosamente adquiridas pela ciência. ”2

O todo não é somente a soma das partes, existe algo de não palpável ou visível à racionalidade humana, que liga estas partes dando o que chamamos de vida. É como se partes de um corpo seccionado, uma vez remontado pudesse ser chamado de corpo, de vida novamente. Então, como podem biólogos, quererem compreender a vida, se para realizá-la fazem em suas práticas perder-se o fenômeno que buscam estudar? Não é possível ciência nenhuma explicar a vida, pois esta não consiste somente em um funcionamento sistêmico de diversos órgãos trabalhando juntos, mas também de uma vida subjetiva, ainda que a busca de uma explicação para a vida funcional seja através de práticas que fazem que o foco de estudo se perca pelo método realizado. Como estudar a vida através de vivisseções? Desmontar animais e plantas pode dar uma vaga noção das estruturas materiais que sustentam a vida, mas nunca provaram e nunca irão provar através

destes métodos o verdadeiro significado de vida. “A natureza é feita de organismos,

não de máquinas. E não só apenas os organismos vivos, mas também os sistemas não biológicos, como as moléculas, as galáxias, o cosmos.” 3

Através da fragmentação, o método reducionista, facilita a quebra na relação de subjetividade do pesquisador com a vida, uma vez que manipular estruturas (órgãos, tecidos, células) cada vez mais específicas o distancia de um questionamento ético em relação ao seu “objeto” de estudo. O problema é posto ao acreditar que os resultados obtidos nos extratos inferiores possam possibilitar uma compreensão dos níveis mais complexos. Cada nível inaugura um funcionamento, um conhecimento específico. “Pode dizer-se num certo sentido que a fronteira que separa o vivo da matéria é feita de uma série de fronteiras que se articulam entre si num sistema de encaixamento cujo conhecimento de conjunto poderia permitir a definição do vivo.” 4

A partir disso, vemos, hoje, os estudos biológicos erguidos e sustentados sob as idéias reducionistas, mecanicistas e antropocêntricas.

2 Sheldrake, R. Página 20

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A TAXONOMIA

Todo o estudo da biologia desenvolveu-se graças à taxonomia, uma tentativa de por ordem ao caos, pois acreditavam que sem ela não poderia haver ciência ao contrário, cada estudo se limitaria a desenvolver um saber para cada indivíduo. É nesse sentido que “Buffon afirma: de fato, na natureza só há os indivíduos; e os gêneros, as ordens e as classes só existem na nossa imaginação.” 5

Carl von Linné, no século XVIII durante a grande expansão da história natural, buscou classificar os seres vivos em uma hierarquia. Linné pesquisou o caráter constituinte, a marca própria da planta e animais. Segundo Cornillot, „tratava-se na verdade de caracterizar as propriedades comuns a certos indivíduos, através das quais eles se distinguem dos outros. Ao aplicar este processo de classificação, os biólogos passaram a reduzir o ser vivo, à seu caráter. ‟6

“Ao só considerar um caráter, ao nomeá-lo, ao retê-lo sozinho no espírito; em suma, ao reduzir a planta ao caráter, o pensamento liberta-se do caos das imagens sensíveis. Pode então efetuar o seu trabalho de classificação. (...) É reduzindo o campo perceptivo, concentrando a atenção em um caráter, que num mesmo movimento se privilegia uma seqüência perceptiva, e se forja um conceito classificatório” 7. Esta é a verdade aplicada na ciência, que diz sempre basear-se em

fatos e provas. A “manipulação da verdade” é sempre omitida ou justificável aqueles que crêem nela! Onde a ciência se diferencia dos mitos religiosos?

A taxonomia começa, portanto, a ordenar o visível a partir de uma procura dos elementos hierarquicamente mais fundamentais, num movimento de redução que passa do conjunto individual ao estudo das suas partes.

Para ordenar o visível, fez-se importante o estudo das partes, as características visíveis dos seres vivos, é este ramo da pesquisa biológica que vai fazer nascer a fisiologia “e dominará o fim do século XVIII” 8

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A FISIOLOGIA

Neste processo de classificação da vida em grupos que possuíam UMA ou poucas características em comum, teve como conseqüência a análise das características destes indivíduos.

A fragmentação do organismo vivo em órgãos, tecidos, células, cromossomos e genes, permitiu que os reducionistas estabelecessem uma continuidade fundamental entre a matéria e o vivo. “Procuram a partir dos elementos fundamentais do vivo, agir sobre eles, a fim de provar experimentalmente a justeza das hipóteses iniciais, orientar a sua dinâmica para objetivos científicos, técnicos ou econômicos.” 9

Algo que chamou muito minha atenção nos anos de estudo na graduação foi perceber a contradição de hábitos pessoais e as práticas profissionais, de alguns de meus professores, que em muitas conversas mais individuais, íntimas, percebia a influência religiosa de seus discursos, mas a partir do momento em que são professores ou pesquisadores, deixam de lado suas crenças, suas ideologias e vestem as verdades da ciência.

Em uma primeira aula prática, de uma disciplina, em meu último ano de graduação, lembro-me do professor explicando o procedimento do experimento de aula, em que animais seriam submetidos a uma prática vivissecionista, foi quando percebi que mais uma vez, teria que explicar meu posicionamento perante a prática a ser realizada.

Após o término da explicação, procurei o professor em particular para explicar minha posição não favorável à prática executada em aula. Procurei ser educada e não ofensiva como muitos em minha posição seriam, e como Newton já havia dito, “toda ação tem uma reação”, e mesmo que nossas relações não possam ser colocadas em fórmulas acredito que não foram de mesma intensidade, antes mesmo que pudesse explicar meus motivos o professor se armou contra mim, a ponto de eu já sensibilizada com a situação começar a chorar. Neste ponto, já não tinha mais razão que me colocasse a altura de uma argumentação de meus pontos. Então, fui obrigada a me sentar com colegas e realizar o experimento, neste momento a única coisa que conseguia fazer era chorar. Chorava, por me sentir frágil e impotente por

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não fazer na prática o que acredito, sei que poderia ter me recusado, mas minha fragilidade e muitas outras coisas influenciavam aquele momento, aquele rebaixamento de meus princípios. Aquela contradição interna e externa, que me remoia em meus sentimentos e em meus pensamentos. E esta experiência se mostrou exemplo da inutilidade desta prática, nenhum aprendizado pode ser fixado, pois estava tão nervosa que não conseguia me concentrar nos conhecimentos que o professor quis transmitir.

Aulas práticas, em geral, devem ser estudas e realizadas com cautela para não causarem efeito contrário ao desejado! E simplesmente, por uma aula não ter sido realizada com giz e lousa, não quer dizer que seja prática. Uma aula prática tem de promover uma vivência positiva no desenvolvimento do estudante e não ser uma alternativa para entreter o aluno ou para preencher uma aula que o professor não pode comparecer.

Mas esta história ainda tem outro ponto importante a ser discutido. O professor, em meio a sua euforia, pensou que meus motivos eram religiosos e disse: “Eu também sou católico, mas o que posso fazer? Esse é meu trabalho!”. O que posso eu fazer ao ver tanta incoerência? Porque tantas máscaras? “Quando quis tirar a máscara, Estava pregada a cara” 10. É isso que acontece, procuramos

máscaras que combinem com a “roupa” 11 que usamos. Os cientistas não percebem

as diferenças e particularidades de cada indivíduo, tanto fisiologicamente, quanto psicologicamente, mas se diferenciam quanto indivíduos pessoais e profissionais, são pessoas diferentes com histórias diferentes. O contexto de cada lugar dita as regras de como devem se comportar.

É para isso que servem as máscaras e as roupas: elas nos permitem vestir diferentes subjetividades, vestir a alma com novos trajes, ser o que for mais aceitável ser em cada contexto social. A subjetividade não está sendo entendida aqui como coisa em si, essência imutável e centralizada no indivíduo, mas como produção social. “Ela é essencialmente fabricada e modelada no registro do social e assumida por indivíduos em suas existências particulares.” 12 O pesquisador se

fragmenta em profissional e pessoal, deixa em casa seus valores seus princípios e ao vestir seu jaleco, veste também a racionalidade científica.

10 Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), A Tabacaria, 1928. 11 Barcelos, T. M., 1999.

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O sensível da Biologia e os cientistas de alma.

“Cada pessoa que passa em nossa vida, passa sozinha, é porque cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e

não nos deixa só porque deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós. Essa é a mais bela responsabilidade da vida e a prova de que as pessoas não se encontram por acaso” – Charles Chaplin

MEDICINA

“Nos cosmos antigos e medievais, o corpo humano foi o mais das vezes concebido como um microcosmo ligado ao mundo, ao macrocosmo, formando com ele uma totalidade inseparável. (...) Com efeito, como a Lua influencia tudo o que sobre a Terra releva do úmido, um cirurgião que se atrevesse a incisar um corpo quando a Lua se levanta correria o risco de não conseguir parar a hemorragia.” 13

Culturas antigas, não se colocavam a parte da natureza, percebendo a confluência entre fenômenos naturais e as respostas de seus corpos. „Hoje, a natureza é

ensinada como algo verde e distante, quando na verdade somos nós!‟14

Intervir sobre, e no corpo, era assim intervir num sistema de força transcendente. Hoje, a maioria dos bebês são encaminhados ao mundo de forma impositiva, nem mesmo em um primeiro contato com a nova vida, respeitam nosso tempo natural. Por que tantos nascimentos de crianças sadias, de mães sadias, são feitas através de intervenções médicas? Quais as razões? Mulheres se anestesiam para não sentir o nascimento de seus filhos, submetem-se a um procedimento cirúrgico, marcam data.

“Durante milhares de gerações, os homens não escolheram nem o dia do nascimento dos seus filhos, nem a sua organização genômica. Podiam, é certo, suprimi-los à nascença, ou pouco depois (nunca se privaram dessa prerrogativa),

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mas estas duas marcas do destino, o nascimento e a constituição biológica, estavam fora do alcance. Agora, deixou de ser assim.” 15

A natureza, o cosmo, as forças externas ao nosso poder (que a ciências nunca aceitou), tem cada vez mais perdido espaço e importância nas vidas das pessoas. Não queremos participar nem mais do nascimento de nosso próprio filho.

Esta é mais uma forma de mecanizar e mercantilizar a vida.

A MEDICINA ANTROPOSÓFICA, A HOMEOPATIA E O VITALISMO

Podemos perceber que os saberes tradicionais sob as plantas curativas, popularizadas como simpatias ou mesmo magias, foram distanciadas dos modelos e práticas científicas, desvinculando-as de um saber institucionalizado. O conhecimento intrínseco (inerente), ou a sensibilidade do ser curandeiro, xamã ou mago, para com estes elementos, foram rebaixados pela formalização da ciência. No entanto, os estudos de fármacos, à medida que aperfeiçoa os métodos de análise, estão sendo levados ao conhecimento tradicional de plantas medicinais e descobrem nelas os efeitos já antes previstos pelos curandeiros.

“Para Paracelso (1493-1541), a análise terapêutica das plantas se baseia numa teoria geral de correspondências de sinais, caracteres, tintas, que se inscreve numa harmonia universal, o princípio trinário divino com as três divisões do universo – mundo inferior, astral, divino –, as três partes do homem – espírito, alma, corpo -, as três forças constitutivas –enxofre, mercúrio, sal.” 16.

Esta situação pode ser muito bem exemplificada através da Medicina Antroposófica, sendo na maioria das vezes, aplicada pela Homeopatia.

Assim como Paracelso, Haller (1708-1777) via o ser humano como um

composto trimembrado, formado pelo corpo, pela força vital17 e por uma alma

espiritual pensante. A idéia se opunha ao mecanicismo já então hegemônico, que apresentam a vida como fruto da organização dos sistemas materiais que lhe servem de base.

Haller a partir de sua idéia de força vital deu base para que Samuel Hahnemann (1755-1845), no seio do romantismo Alemão, origina-se a Homeopatia.

15 Tibon-Cornillot, M. Página 248 16 Tibon-Cornillot, M. Página 80

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A grande arte da homeopatia consiste em encontrar o padrão de força vital natural que possa agir de forma singular e terapêutica sobre a força vital do paciente: o medicamento único. „Há aqui a afirmação enfática do indivíduo, da

individualidade. Cada indivíduo tem um medicamento. ‟ 18 No intuito de encontrar o

medicamento único específico para cada indivíduo, Hahnemann, seguiu o

pensamento de Hipócrates, o pai da medicina: Similia similibus curentur (os

semelhantes curam os semelhantes). Este pensamento, de uma forma diferente, já era muito antes aplicado pelos curandeiros de comunidades tradicionais que acreditavam que “os benefícios para o homem procurados nas plantas podem deduzir-se da sua semelhança com o homem, com o seu corpo, com o seu aspecto, assim com as patologias que o deformam.” 19

Já a Medicina Antroposófica explica essa „atuação do medicamento semelhante a partir da inversão do processo da substância material através da sua

dinamização. Uma substância que contrai, faz expandir, se dinamiza – ou vice-versa.

Steiner (1980) observou que qualquer substância, ao ser dinamizada, vai libertando as suas forças formativas. Nas dinamizações baixas, manifestam-se aquelas forças comuns de coesão da matéria. ‟ 20

A conquista da Homeopatia por um espaço na medicina foi de grande importância, pois resgatou e reinventou uma ciência que atribui valores subjetivos ao corpo e à vida, respeita a individualidade de cada doença e não a reduz ao mau funcionamento de um órgão, uma “peça”, mas estabelece uma relação emocional, espiritual da cura com a enfermidade, esta que muitas vezes está muito mais relacionada ao ritual da cura do que no próprio principio (ativo).

Remédios alopáticos funcionam como as medidas política. Ambos procuram mascarar a real causa da doença tratando os sintomas e não a causa dos sintomas, isso por que não conseguem enxergar (literalmente) o que liga a vida ao corpo material.

O objetivo da descoberta já mudou de foco, não é mais a busca descoberta da cura, pelo conhecimento, mas sim pela glória e status que a descoberta traz.

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CRER E SABER

“Há milênios o homem faz biologia sem o saber. Os gestos do cultivador, do horticultor, a reprodução por estaca, o alporque, a enxertia ou também os do criador surgiram com a civilização e aperfeiçoaram-se com o progresso dos seus meios e necessidades. Os antigos souberam rapidamente tirar partido das fermentações para preparar o vinho, o pão, os queijos. Aprenderam a utilizar o sal, o fumeiro, o frio

para preservar os seus alimentos e dar-lhes mais gosto e realce” 21

Somente agora, e bem devagar, a ciência começa a dar valor ao conhecimento tradicional. Este conhecimento tem um poder transformador na ciência, pois trás ao meio científico um aprendizado desenvolvido ao redor de uma história, uma subjetividade de cada observador aprendiz. Que através de práticas tradicionais, no convívio familiar aprende muito mais que informações técnicas. Não se limita a acreditar em uma verdade dita, mas observa, vivencia cada novo aprendizado, é essa emoção, essa vivência que falta no biólogo, no cientista, que mais acredita do que sabe.

Essa diferença entre crer e saber coloca a ciência como qualquer religião, pois ela não sabe, crê. Por exemplo, qualquer pesquisador que usa o conhecimento ou informações de outra pesquisa feita, toma por base, conclusões alcançadas por outro cientista, mesmo que ele não a tenha realizado, vivenciado. Ela ambiciona alcançar o saber a partir da crença em teorias e métodos que por muitas vezes o torna fragmentado. O argumento contrário diz sobre a imutabilidade das verdades religiosas mas então a verdade da ciência, não pode ser chamada assim, pois esta é imutável. São sempre hipóteses. A verdade é uma percepção sobre algo, que tem sua validade em um determinado espaço e tempo.

OBJETOS DE ESTUDOS / VÍTIMAS DA CIÊNCIA

O modelo cartesiano emergente influenciou o início dos estudos biológicos e o desenvolvimento da ciência. Este decompõe, desmonta, o que acreditavam serem máquinas, já não sabiam olhar a totalidade do ser estudado, e é ainda hoje visto

como objeto de estudo. “As ciências ocidentais apareceram num contexto em que a

ruptura entre o vivo humano e os outros vivos era uma evidência. Os animais e vegetais podem e devem ser instrumentalizados.” 22

21 François Gros,

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O cientista trata a vida como objeto para separar a vida subjetiva, do corpo material, assim o reduz a um corpo-objeto com função de servir a ciência.

Estranho é viver em épocas de intensas e rápidas transformações tecnológicas e sociais, e ainda ter padrões de pesquisa tão antigos, precários e ineficientes. Tantas substituições tecnológicas são feitas no mercado, por que não aprimorar, inovar, reinventar um recurso de pesquisa tão utilizado? Será porque atribuímos um valor financeiro a vida de uma cobaia? E ele vale muito menos que inovações tecnológicas?

O objetivo da descoberta já mudou de foco, não é mais a busca descoberta da cura, pelo conhecimento, mas sim pela glória e status que a descoberta traz.

SIMULAÇÕES: PROJETOS DE PESQUISA E OS OBJETOS DE ESTUDO

“A fragilidade dos sentidos que participam na percepção do mundo exterior já fora analisada numerosas vezes pelos filósofos antigos: a dificuldade de distinguir a alucinação, a miragem, o simulacro, o logro, da realidade perceptiva foi compreendida há muito tempo. (...) A ciência cria situações perceptivas ilusórias cuja qualidade seja suficientemente consistente para provocar a adesão do julgamento que conceda a tais recepções perceptivas um estatuto de realidade. (...) Trata-se de levar até aos sujeitos perceptivos acantonados na particularidade da sua visão e do seu corpo, a multiplicidade de outras visões e de outros mundos nos quais podem finalmente participar” 23

O imaginário é tão consistente (convincente) que o ilusório se torna real. Na ciência a simulação tomou a forma dos projetos científicos, e a simulação não atravessa a possibilidade da realidade. Trabalhos científicos bem elaborados, premiados, mas que são incompatíveis com a realidade do meio social e político envolvido (inseridos). Qual é o papel da ciência dentro da realidade vivida? Para quem essa ciência é exercida?

Mais uma vez, simulações, o imaginário da ciência no paradoxo dela mesma. Pesquisa de medicações, manipulações genéticas e outras “maravilhas” da medicina experimental realizadas em animais não humanos, com fins humanos.

Somos iguais a um rato? Não somos iguais a nos mesmos, seres humanos.

Então como podemos especular resultados em seres tão diferentes de nós? A

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ciência perde sua eficácia na generalidade que impõem entre os corpos. Há cientistas que afirmam que estudos feitos comprovam que determinadas experiências se assemelham em ratos e em seres humanos. Mas para chegar a tal conclusão, então realizaram experiências e testes em outros seres humanos! Mas e então, testes em seres humanos não são éticos! Caímos novamente no mesmo ponto... A ética. Não são só os animais não humanos que são submetidos a tais testes. Hoje já não é mais segredo saber de testes de remédios feitos em seres humanos! E quem são esses seres humanos? Acredito não ter de responder a pergunta feita, pois quem vive sabe ou imagina.

Como aplicar para o ser humano uma verdade obtida através de simulações em ratos? “Isto torna o corpo humano um dos privilegiados de tais domínios, tanto para benefícios terapêuticos, como para a fuga de um questionamento ético.” 24 Uma

vez que a ciência moderna é fruto da racionalização ocidental que por sua vez tem a fundação no mito do Deus como imagem e semelhança do homem. Levando-o a subjugar a vida os demais seres vivos para justificar e avançar em suas pretensões científicas. “A criação do mundo de Deus é o antropocentrismo radical, em que toda criação foi feita para o homem e para que ele o domine, como as plantas e os “outros” animais. ”25

Um exemplo pode ser citado, como um dos capítulos mais negros da história da indústria farmacêutica: a Talidomida. Lançada no mercado europeu em 1957 como a „pílula de dormir do século‟, a droga logo virou Best Seller. Imediatamente foi marqueteada por 14 companhias em 46 países como a pílula que solucionava a insônia, as tensões decorrentes do estresse e as náuseas desagradáveis das grávidas. Tudo a custo zero, isto é, sem efeitos colaterais. Mas não era bem assim.

A conseqüência dessa irresponsabilidade foi a geração de 12 mil crianças européias com gravíssimas deformações. Nasceram sem braços, ou sem pernas, ou cegas, ou surdas, ou com órgãos internos lesionados. E ficaram conhecidos como „Filhos da Talidomida‟.

E não pensem que isso ocorreu por não ter sido feito um estudo científico. A droga foi lançada no mercado logo após serem testadas em ratos. Somente em 1960 é que foram descobertas os efeitos teratogênicos provocados pela droga, quando consumida por gestantes.

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A Vida Transgênica

O prefixo “trans” explica muito bem esse novo conceito. Numa primeira análise, remetemos ao significado do prefixo “trans”, do grego “ir além de”: ir além da gênese no sentido de não só integrar, mas também ressignifica, com um toque de

transformação, essa conhecida vida mais uma vez manipulada.

Ao invés de criar vidas transgênicas, deveríamos investir em ampliar nossos conceitos transexuais, transraciais, transespecistas. Somos seres vivos independente, de nosso sexo, escolha sexual, da cor de nossa pele, de que espécie pertecemos, estes conceito criado pelo ser humano e por seu imaginário.

A construção de novos conceitos biológicos é feita agora através da manipulação da vida para criar a vida artificial, transgênica. O pesquisador já não se

contenta com somente conhecer e localizar os seus “objetos”, mas visa também

transformá-los. “O aparecimento destes novos seres vivos transgênicos, inscreve-se

num antropocentrismo violento, (...) em que animais e vegetais podem e devem ser instrumentalizados” 26

“A vasta empresa de correção já começou. As terapias genéticas foram oficialmente permitidas. Exames pré-natais permitem conhecer o cariótipo do embrião. Abortos terapêuticos que eliminam os portadores de mutações inválidas

tornaram-se um ato padrão. A fecundação in vitro. Cada uma delas tem suas

justificativas, contudo, o conjunto destas ações constitui progressivamente um contexto muito novo em que uma parte do destino dos homens é transformado pelos poderes de controle que os mesmo deram a si mesmos. (...) abrem um campo de ação que intervém ativamente num universo indefinido de combinações genéticas possíveis, a fim de determinar a configuração virtual do genoma que se quer trazer ao mundo.” 27

Mas como deixar de apreciar o valor terapêutico destas técnicas? A ferida é exposta quando ocorre a certeira banalização das descobertas científicas, sempre

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de início com uma proposta revolucionária com a finalidade da salvação, mas sempre terminam como produto do mercado estético ou promovendo a discriminação (e perpetuação) dos favorecidos financeiramente. É na verdade uma disputa de ego, uma corrida pela ascensão de status e dinheiro.

O ser humano criado através destas técnicas científicas é ausente da influência cósmica que o geraria. É ausente das influências paterna e materna, ausente de uma história, de uma magia que as ciências nunca poderão criar. A magia do encontro, dos sorrisos e toques que a história de um novo ser vivo pode ter começado. Seu criador é um desconhecido de jaleco branco igual a todos que virá a ver no decorrer de sua vida, sua história começa dentro de potinhos de vidro. Sei que nem todas as relações têm histórias romantizadas, mas isto ainda reforça outra idéia: Por que tanto preconceito contra o desejo de uma mulher que deseja realizar um aborto? E uma ciência que apóia o aborto de uma criança, que nasceria com alguma deficiência? Será uma questão financeira que diferencia estes processos? Não pode ser uma questão de avaliar a quais motivos são mais importantes, a partir do ponto de vista de quem são feitos estes julgamentos?

Que impacto ao ambiente e dano à saúde é capaz de produzir a planta transgênica? A polêmica instaurou-se desde o momento em que ouviram-se vozes contra e a favor dessa mutação artificial praticada em laboratório, é claro que as pesquisas mostraram não haver nenhum dano a saúde, mas será que daqui alguns anos não teremos os „filhos dos transgênicos‟ 28? Já a questão ambiental, desde já

mostra os efeitos dessas modificações.

O que leva o homem a desafiar a natureza e seus elementos, somente para

saciar seu apetite pelo poder, não importando o que aconteça, nem que danos cause a outro ser, à própria natureza e às gerações futuras? Põe-se a destruir o que levou milhares de anos para ser construído e lapidado, pondo em xeque a extinção não somente de espécies, mas também alterando o fluxo dinâmico natural da existência. “Estas técnicas permitiram aos homens aumentar seu domínio sobre o meio ambiente, invadir nichos ecológicos cada vez mais numerosos e expulsar ou sujeitar os seres vivos que os ocupam” 29

28Faço aqui uma referência ao caso já citado anteriormente sobre os „filhos da Talidomida‟.

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A ciência tenta driblar a ética religiosa com a criação destes transgênicos, podendo então colocar em prática abusos sob as vidas instrumentalizadas, uma vez que este novo ser é criado pelo homem; não é um ser divino. A ciência cria vida para poder tirá-las sem a culpa da violação do sagrado. Transgênico é a tentativa transformação do vivo em máquina.

TRANSFORMAR OU CONSERVAR?

“O desenvolvimento das transformações do corpo, que se manteve à escala do tempo geológico, e o desenvolvimento das transformações dos utensílios, ligado ao ritmo das gerações sucessivas. Este processo pelo qual as técnicas autonomizadas, permitem aos homens manterem a sua integridade corporal << o homem de carne e osso, verdadeiro fóssil vivo, imóvel a escala histórica>>“ 30,

percebemos aqui que a evolução das técnicas não foi no sentido de uma transformação corporal, mas na direção inversa, a da conservação.

Este processo se deu graças a outro movimento no qual o ser humano distinguiu-se fora de si, e projetou-se em utensílios, máquinas, animais domésticos, tudo que lhe permitiam o aumento de suas performances.

Podemos nos questionar da intenção desta transformação, mecanização do corpo, que na verdade parece buscar manter a integridade dos corpos atuais, preservar o ritmo evolutivo geológico ao qual está sujeita a espécie humana. A busca das técnicas nas ciências se orienta irresistivelmente para uma transformação

profunda do Homo Sapiens, tendência cada vez mais forte para o não mudar.

“Temos de reconhecer que nossos desenvolvimentos levam a resultados contraditórios: diferentes das ciências nas suas finalidades e relações com os corpos humanos, responsáveis pela preservação da integridade da nossa espécie desde há milênios, as técnicas participam agora de forma privilegiada na sua transformação.”31

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Conclusão

O reducionismo em Biologia não só inspirou o método científico desta disciplina, contribuiu para as mudanças da visão a propósito do vivo, como permitiu sua reconstrução. Por de trás da noção de experimentação aplicável sistematicamente ao vivo, progredindo ao ritmo da simplificação dos objetos aos quais ela se aplica, ganha corpo um projeto coletivo de reconstrução do vivo, do real em geral.

A mecanização dos corpos e da vida. Corpos mecanizados pela ciência e a vida mecanizada pela rotina.

Apesar de todo meu texto basear-se na crítica da estruturação da ciência, não revogo a importância desta, acredito que muitos benefícios e “milagres” foram extraídos dela e que existem muitos biólogos, médicos, cientistas, que não se encaixam na maioria aqui citada (para nosso consolo). Só quero com esse texto tentar levantar, cutucar pontos muitas vezes negligenciados ou deixados de dar a devida importância. Somente a incentivar a visão crítica, a criar seu próprio ponto de vista perante “verdades quase que absolutas”. Nunca é fácil, não tem de ser fácil, é assim que construímos quem somos de verdade. Muito mais pelo o que não queremos e não acreditamos, do que ter a certeza de algo que nunca vai ser certo. Não sei ainda quem sou, o que vou fazer, não tenho certeza para onde vou (mesmo fisicamente), mas sei onde não quero estar, o que eu não quero ser. Não ter ao certo para onde ir e ser, aumentam minhas opções de escolhas, aumentam minhas

chances de me desfazer e refazer. Porque „eu prefiro ser essa metamorfose

ambulante‟32

Como reconstruir, renovar padrões de moralidade? São passos. Para reconstruir algo, o primeiro passo é a destruição. Temos que demolir as estruturas de pensamentos construídas em moldes tão precários, tão exauridos, para que então possamos começar a construir as novas propostas, a nova ciência, a nova

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biologia, os novos indivíduos (não transgênicos, mas transcendentais33), para então

quem sabe possibilitar uma nova sociedade.

Poderíamos citar muitas minorias, suas lutas, o processo de ter seus ideais sendo ridicularizados publicamente ou mesmo, e principalmente, dentro de sua própria casa, mas vou me deter aqui aos mais comentados como, os negros, as mulheres e os homossexuais que hoje mesmo que aos poucos ganham espaço, ganham atenção, em suas casas, em suas famílias, em seu trabalho, na mídia, nem sempre são respeitadas como deveriam, mas aos poucos trazem ao mundo novas propostas, novas maneiras de se relacionar com este e tudo que esperamos, é sermos visto sem pele, sem sexo, sem espécie, pois por baixo de toda essa “roupa” percorre uma mesma vida coletiva, mesmo que esta possua peculiaridades tão únicas, tão especiais, são todas VIDAS para serem vividas, hoje! Um dia nós

animais34 seremos vistos e ouvidos, assim mesmo, sem ter de distinguir humano ou

não humano. Estamos todos juntos na classificação que nós mesmos (humanos) criamos! Vamos libertar e deixar ser libertados! Libertarmos de nós mesmos das grades que criamos, das grades que aprendemos a construir. E agora é a hora da destruição. Vamos destruir o conceito pejorativo de destruição! Vamos destruir todas as grades mentais, transcendentais e físicas! Esse é o meu convite!

33 Ultrapassa a vida. Rompe limites da formalidade.

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Bibliografia

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Programa de Pós graduação em Psicologia Clínica, 1999.

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LEVAI, T. B. Vítimas da Ciência: Limites éticos da experimentação animal.

Campos do Jordão, Editora Mantiqueira, 2001.

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MORAES, Wesley Aragão. Medicina Antroposófica: um paradigma para o século XXI. São Paulo: ABMA – Associação Brasileira de Medicina Antroposófica, 2007. SHELDRAKE, R. O Renascimento da Natureza. São Paulo, Editora Cultrix, 1993.

SHELDRAKE, R. Sete experimentos que podem mudar o mundo. São Paulo.

Editora Cultrix, 2001.

TIBON-CORNILLOT, M. Os Corpos Transfigurados - Mecanização do vivo e

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DEPOIMENTO ALUNO A

A MOTIVAÇÃO

Sempre gostei muito da parte de ecologia, da relação do bicho com o ambiente e com o homem, e fazendo biologia acreditava que realmente assim, poderia fazer algo melhor, para mudar o mundo, bem essa visão utópica mesmo.

Entrei na biologia com a intenção de fazer limnologia, pois no fundo da minha casa tem um rio e quando era pequena aprendi a nadar nele. Agora está

extremamente poluído, não dá mais para nadar, então pensei: “Eu quero pesquisar.

Fazer alguma coisa para limpar o rio.” E esse é, ou era um dos sonhos da minha vida. Eu acreditava que entrando na faculdade eu iria conseguir isso.

RELAÇÃO DO BIÓLOGO COM A VIDA

Antes eu acreditava que o biólogo (todos os biólogos) tinha a intenção de melhorar a qualidade de vida dos animais, mas percebi que a maioria dos alunos

não se importa. Eu nunca imaginava que o biólogo iria “abrir” centenas de bichos,

sendo que na verdade, não precisaria matar nenhum. Realizam um trabalho que têm que matar um monte de bicho, quando poderia ter sido feito outro de igual relevância, em que não seria necessário matar nenhum.

Eu acho estranho, porque foge muito da minha concepção inicial do biólogo. Logo no primeiro ano de graduação temos de matar minhocas, baratas e ratos, e então pensei: “Será que tudo isso é realmente necessário? Será que uma

prancha que você observar, não seria mais eficiente?”.

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Onde já se viu! Você não vai aprender fisiologia animal sem abrir bicho!” Naquela hora pensei: “Nossa, semestre que vem vou ter fisiologia humana. Então, beleza! Vamos ter que abrir uma pessoa viva, ou, ao contrário, não vou aprender fisiologia humana”. Mas fiquei quieta, pois se expressasse minha opinião, não teria sido aprovada em nenhuma matéria.

Eu acredito que a imagem do biólogo está muito deturpada, virou uma coisa assim: pesquisar para publicar. Como o exemplo de um aluno que está estudando a diabetes em ratos. Perguntamos a ele se o estudo era relevante para o estudo do ser humano, se seria possível extrapolar os resultados obtidos no rato, para o ser humano. E ele falou que não, que não era aplicável. Questionei-me do porque então realizar tal prática, submeter um rato a uma condição que não é a dele.

Existem tantos campos para serem pesquisados e tantas coisas interessantes para serem descobertas sem que seja preciso abrir bichos. Além do que, há outros métodos alternativos, mas a academia é muito fechada, querem sempre a mesma coisa. Usam métodos de cem anos atrás, e o mundo continua, sendo que este está em constante transformação, e continuam os mesmos métodos de sofrimento. Tantos avanços tecnológicos são alcançados, haja visto em parques de diversão onde participamos de simulações extremamente reais. Talvez se as pessoas que pesquisam matando bicho se dedicassem a inventar novos métodos, o estudo seria muito mais útil e aplicável do que o conhecimento experimentado no animal para aplicação humana, mas que dificilmente alcança essa extrapolação.

SENSAÇÃO DE REALIZAR UMA VIVISSECÇÃO

A primeira experiência foi abrir minhocas e baratas. Tive que jogá-las no álcool para elas morrerem. Foi muito triste e me colocou a questionar o porquê estava fazendo aquilo. Mas aí pensei, “quando se pesca, a minhoca morre também”, então achei que não teria problema. A barata foi mais ou menos a mesma coisa, eu vi e fiz, mas preferia não ter feito.

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Enquanto assistíamos o desespero do ratinho, a professora avisava que ele poderia acordar de repente no meio da abertura da barriga dele e que o tubo respiratório estaria completamente corroído pelo éter, então comecei ao mesmo tempo, desejar que ele morresse logo, e que aquilo não estivesse acontecendo.

Se soubesse que enfrentaria tudo isso na biologia, que teria que passar por isso SOZINHA, eu teria feito ecologia, teria desistido da biologia. Porque é uma concepção totalmente diferente da que eu acredito de como um biólogo se relaciona com a vida.

Nesse dia, o da dissecação do rato, o pessoal da minha sala começou a pegar o rabo do rato e colocar na boca dele depois de morto, agir de uma forma completamente infantil e antiética. E eu não falava nada. Porque era trinta e nove contra uma.

Alguns aparentemente não tinham gostado. Um colega desmaiou quando abriu o rato dele, e eu não parei de chorar um minuto. É muito triste. Chorava convulsivamente, eu enxugava o olho e caia mais lágrima e mais, e mais e não parava. Foi realmente muito, muito triste. Acho que essa foi a experiência mais marcante. Antes eu até gostava da genética, eu pensava, de repente em seguir a área de genética, mas isso foi tão chocante, tão marcante, tão deprimente na minha vida, que eu desisti. Pensei: “Não! Vou para área de botânica, para qualquer outra área em que eu não tenha NUNCA que sair matando os bichos!” Isso foi a coisa mais marcante.

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Tinha a questão da prova alternativa ao insetário no meu ano. Ainda bem que teve a prova para fazer, alguns meninos do noturno fizeram, mas eu fiquei inibida porque era só eu na minha sala, me bateu um medo de represália do professor e eu era “bixete”. Eu fiquei com muito medo. Então fiz com uma amiga e avisei que os insetos que coletaria, iriam ser só os que eu encontrasse já mortos, e no fim acabei matando somente um bicho, um pulgão. Mas de resto, minha colaboração para o insetário foi tudo de insetos já mortos. E pensei: “Temos que pegar 40 insetos, se eu pegar 10 já mortos, então os que teriam de ser mortos seriam 30, assim já é algo bem válido.”

Eu preferia realmente não ter feito o insetário. Inclusive, estava fazendo uma entrevista com um colega da ecologia, e soube que eles não têm que fazer insetário. Agora está fazendo pesquisa com ecologia do inseto. Na entrevista perguntei se ele sentiu falta de algum conhecimento para o estágio, por não ter feito o insetário, que é a justificativa que as pessoas usam, mas ele não aprendeu desse modo e está trabalhando com isso. Ele relatou que sabe, tanto quanto os estagiários da biologia. Para fins de pesquisa eu não tenho muito definido qual seria o limite do uso de animais em experiências. Eu preferia que não usassem nada e para fins didáticos eu acredito que não deveriam usar bicho nenhum, por que pelo menos pela minha experiência, nenhuma das aulas de abrir bichos foram úteis para mim. Com o insetário eu não aprendi nada! Não me lembro das classificações, porque eu “embirrei” com o tema. Fiquei muito incomodada em fazer o trabalho desse jeito, ser obrigada a fazer, mesmo que tivesse a prova, sabe, mas o que era a prova? Tinha que decorar tudo. A prova era feita de uma forma para que ninguém optasse por ela.

A outra matéria foi fisiologia animal, e lembro que o mais marcante para mim foi uma experiência em que um peixe foi entubado e inoculavam gás carbônico e oxigênio, para observar a diferença no batimento do opérculo, só que para isso tiveram que colar o tubo, e eles estavam em um espaço muito pequeno: eram três tilápias, todas entubadas.

Fiquei olhando para aqueles peixes e pensava que aquele não era o lugar em que deveriam estar. Nem precisávamos ver aquilo, era totalmente dedutível, qualquer livro traz essa informação, que por sinal é bem óbvia e fácil de entender - se aumenta o gás carbônico, ele tenta respirar mais e assim abre mais o opérculo.

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menina da minha sala levantou imediatamente e foi abrir a rã. Eu não consegui entender a visão dela de bióloga, que acredita que biólogo de verdade é o que fica abrindo os bichos. Para mim, o biólogo que estuda a vida, é quem deve tentar melhorar a vida das árvores, dos bichos e dos seres não humanos, principalmente. Agora, a medicina é que deve tentar entender e melhorar a vida dos seres humanos. E você viu algum médico que quer abrir uma pessoa? Eu acho que o último procedimento que ele vai fazer é abrir uma pessoa. Acho que o que acontece é que as pessoas descontam suas frustrações nos seres mais indefesos, num bicho. Então, você abre o bicho vivo, para ver o coração batendo, espeta a pata do bicho, de barriga para cima e abre com uma gilete.

O que aconteceu foi que fiz um pacto com o professor depois que ele me humilhou na frente da sala inteira e sai chorando da aula. Na frente da sala inteira, o

professor de pé, falando alto, e me xingando! Imagina? E no final, disse assim: “Não,

tudo bem! Vou quebrar um galho para você!”. Com essa intenção, sabe? Ele se

sentiu fazendo um favor para mim. “As aulas que tiver que abrir bicho, eu aviso você,

você não vem, eu não te dou falta e você não perde nota!” Então pensei que assim seria tranqüilo, mas tem gente na minha sala que QUER abrir bicho, que não abre mão. Desde então, alguém sempre me mandava um bilhetinho um dia antes da aula avisando que aconteceria a dissecção ou vivissecção. Foi aí que me deu essa vontade, de estudar muito fisiologia animal, só para mostrar que não precisa de aula prática para aprender. E realmente minha nota foi uma das maiores da sala e tudo sem abrir nenhum bicho.

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que ele se cansasse logo, para terminar o trabalho mais rápido. E além de tudo isso, ficavam xingando o rato de todos os nomes, foi horrível ficar vendo o que faziam e ainda escutando “RATO, FILHO DA MÃE!” (Não era filho da mãe), “AFOGA LOGO!”, gritado desse jeito. Pessoas que são muito humanas, nunca fariam mal para um ser humano, mas então você vê esse lado biólogo delas, que deveria ser um diferencial das outras pessoas, que elas amassem os bichos, e se decepciona. Na apresentação do trabalho ainda disseram que pretendiam realizar esse experimento novamente para conseguir mais dados, e publicar, ou seja, iriam ser mais três ratos sofrendo daquele jeito, só para tentar publicar um artigo.

Então, ficou mais claro o que digo da imagem deturpada do biólogo. Tivemos a opção de escolher qualquer metodologia, qualquer estudo fisiológico, e a maioria optou por esses métodos mais invasivos. Acho que esse experimento nem deveria ser obrigatório, tendo a alternativa de um trabalho escrito, algo nesse sentido.

Há outras coisas que marcam. Uma aluna da ecologia contou-me que o professor dela mostrou uma figura de um rato batido no liquidificador. E novamente fiquei me perguntando do por quê que alguém bateria um rato no liquidificador.

Os conhecimentos de fisiologia humana são os mesmos ou até maiores do que os de fisiologia animal. Mas os meios são tão diferentes. Porque com o bicho tem de ser diferente do homem, sendo que as pessoas usam o bicho como modelo do homem? Eles são vivos do mesmo jeito, eles sentem do mesmo jeito que nós. Eu acho que é meio um sarcasmo humano. É pura maldade.

Na minha sala, essas meninas pareciam sentir um prazer mesmo de ver o bicho afogando. Não têm a capacidade de se colocar no lugar de outro ser. Eu acho que é um traço meio psicótico mesmo das pessoas.

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Eu perguntei para meu dentista, se ele aprendeu a extrair dente em algum bicho. E ele disse que aprendeu com modelos, e depois com operação dirigida por um professor. Quando se trata de seres humanos, você pode ver que são super cuidadosos.

Se cinco pessoas do curso inteiro seguir a área de fisiologia, acredito que é muito. Poderiam restringir para os que querem seguir esse caminho, e então pelo menos reduziria o número de sacrifícios. Eu não gosto de ser obrigada a assistir esse tipo de aula, que por mim não existiria, e não participaria de nenhuma aula desse tipo. E acho que só atrapalha o processo de aprendizagem, porque pelo menos para mim acabou fechando portas, como essa parte de genética mesmo. Eu gostaria de trabalhar nessa área, só que a experiência que tive em aula me causou um trauma que eu não me interesso mais, passei a não gostar de genética. No meu caso, não serviu para abrir portas, para eu aprender técnicas, só restringiu meu campo de atuação.

O que poderia ser feito, é juntar o pessoal do noturno e do integral, assim, de repente, somente um rato teria de ser sacrificado. O ideal seria não matar, mas se você consegue reduzir, já é alguma coisa. Um amigo deu uma boa idéia também de que o insetário poderia ser feito em no mínimo quatro pessoas.

Outro fato que me incomoda é o IBAMA. A UNESP tem licença do IBAMA para fazer os insetários, e é uma coisa que me deixa muito triste, porque eles são um órgão de defesa, de preservação.

Quem tem realmente interesse no assunto, pode procurar os estagiários e acompanhar o trabalho de levantamento e identificação que fazem. Com certeza iriam aprender melhor, algo muito mais concreto, e não precisaria ficar matando esse tanto de insetos. É muito difícil.

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Uma coisa que sempre me falaram é que eu estava no curso errado, que deveria ir para ecologia, pois não tinha a cara de biologia. Para mim “ter cara de biólogo” não é gostar de abrir bichos, pelo contrário é preservar a vida destes.

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DEPOIMENTO ALUNO B

MOTIVAÇÃO

Eu acho que eu comecei a fazer biologia, pela zoologia. Por paixão aos animais, para compreender, entender. Então quando eu entrei aqui, isso ampliou um pouco, eu ainda sou um zoólogo convicto, só que não está sendo só isso, está sendo a compreensão de como a vida funciona, então acho que são esses dois motivos principais. Entender a vida, e dentro dela entender os animais.

RELAÇÃO DO BIÓLOGO COM A VIDA

Acho que antes de tudo, eu me vejo como parte da vida. Porque também parto do seguinte princípio: “Nós humanos somos apenas animais, com uma capacidade incrível de usar ferramentas, acima da média da maioria dos primatas, e nada mais do que isso.” Então, se eu estou estudando biologia, estudo tudo que tem vida, e não posso me excluir disso, por motivo óbvio. Então, o estudo de biologia, pode ser um estudo de si mesmo e a relação que tenho com ela. Quanto mais aprendo sobre o mundo vivo, mais aprendo sobre nossa própria espécie, e cada vez mais vejo nosso papel no mundo como “mais uma espécie” que tem sua população, tem suas doenças, tem seus ciclos biológicos.

USO DE MODELOS EXPERIMENTAIS VIVOS

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vai matar um animal e não vai ser recriminado por isso, porque ele precisa comer. Nós também precisamos comer. Muitos de nós matamos bovinos, galinhas, para se alimentar, só que nós também temos essa necessidade intrínseca, que é o conhecimento. Então, se eu matar um animal para conhecer o funcionamento o organismo dele, eu estarei suprindo uma necessidade natural, então é perfeitamente justificável o uso desses animais para o suprimento dessa necessidade humana, desde que feito com respeito, provocando o menor sofrimento possível, para não cair no sadismo.

SENSAÇÃO DE REALIZAR UMA VIVISSECÇÃO

Bom, eu encaro com naturalidade um sacrifício bem feito. E por exemplo, tenho a impressão que os meus colegas que são mais voltados para zoologia, também levam o fato com mais naturalidade. Eu não fico com sentimento de dó ou de nojo. Eu encaro como algo perfeitamente natural. Não vou dizer que me divirto com a morte de um animal, apenas acho que é um procedimento padrão. Tão natural quanto comer carne e eu sou um carnívoro convicto também!

Agora, os meus amigos que são zoólogos convictos, por terem um campo de estudo diferente, mais voltado para ecologia, para outras áreas que não aquela zoologia tradicional, estes já têm um pouco mais, não sei se seria dó ou se seria uma forma de respeito, mas eles têm mais dificuldade de encarar esse tipo de situação.

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um direito, inclusive previsto por lei, pode alegar objeção de ideologia35, só que você

vai sair com uma formação incompleta, não vai saber lidar com o ser vivo real, quando ele cair em suas mãos.

MÉTODOS ALTERNATIVOS

Tudo o que falei, eu acho que se enquadra tanto para aula quanto para pesquisa. A diferença é que na aula você não precisaria usar tanto quanto para uma pesquisa. Não faria sentido sacrificar dez animais, em uma aula prática. Você pode fazer isso, em um número bem reduzido e já explicar para todo mundo. Eu sei que existem as alternativas como os vídeos, os modelos, modelos físicos mesmo, só que eu acharia vergonhoso você passar a sua graduação estudando com modelos. Porque você é um BIÓLOGO, você estuda seres vivos e não bonecos. E quanto ao vídeo eu já falei do problema, as alternativas existem, mas não são válidas, isso do meu ponto de vista. Eu não concordaria em aprender com base em modelo. Agora, no caso de pessoas que se recusam a todo custo, por causa de ideologias próprias, acho que têm o direito de ter uma aula baseada num modelo ou num vídeo. Isso seria uma coisa para, com algum esforço, tentar implementar nas universidades.

Outra coisa que acho importante é sempre estar batendo nessa tecla: Nós somos BIÓLOGOS, estudamos coisas vivas e a vida não tem um padrão, tem plantas que são autótrofas, tem animais que se alimentam do que der para se alimentar, dependendo do ambiente, tem bactérias que respiram enxofre, que é algo totalmente absurdo, foge de qualquer padrão, então não podemos definir um padrão para um ser vivo, exceto um, que eu até costumo fazer uma brincadeirinha meio sarcástica, “Ser vivo é aquele que tem a capacidade de morrer.” Então, a morte é parte da vida, se nós estudamos a vida, nós também temos que ter algum contato com a morte, eu acho que seria uma parte importante. O insetário foi um bom exemplo disso, lidar com o animal vivo, com a morte desse animal e com a preparação do animal morto. Acredito que tudo isso faz parte do processo de aprendizagem sobre a vida.

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TESTES EM ANIMAIS PARA FINS HUMANOS

Às vezes um remédio que é perfeito para mim, pode dar uma reação alérgica para outra pessoa, e nós somos da mesma espécie. Então, minha opinião é que usam ratos porque seria plenamente inaceitável, do ponto de vista social, usar humanos. Mesmo porque tem pessoas que se tornam voluntários por serem apaixonados, fanáticos pela ciência, e segue a idéia: “Tudo pelo bem da ciência”. Doam seu corpo para os testes ou então, é aquele cara que está desesperado por dinheiro, por mais que, pela lei, os serviços de cobaia de uma pessoa não possam ser cobrados, com certeza isso aconteceria. Então, o ideal seria testar remédios humanos, em humanos, só que como isso é totalmente inaceitável, utilizam outros mamíferos que são mais próximos do organismo humano e eu acho que não usam macacos porque também iria afetar do ponto de vista ético. Assim, acredito que é o que temos, mas eu ainda acho que o ideal seria fazer teste em humanos voluntários, mesmo por uma questão de realismo, a não ser que sejam remédios baseados em processos muito universais, por exemplo, o funcionamento do sistema nervoso de um rato, que se eu não me engano, não tem praticamente diferença nenhuma com o funcionamento de um sistema nervoso humano, exceto pela complexidade do nosso telencéfalo, que é bem maior, enfim, depende muito do remédio. Um remédio de pele, já seria complicado, teria propriedades fusivas de pele humana para pele de rato. Enfim, é uma técnica que precisa ser aprimorada.

PRÁTICAS DE DISSECÇÃO EM ESPECIALIZAÇÕES

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acabar sendo professor uma vez na vida, tem que ter sim, um conhecimento prático, por mais que não goste, por mais que não vá trabalhar com isso.

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DEPOIMENTO PROFESSOR A

CRONOGRAMA DAS AULAS

O Programa segue o livro de Schimt-Nielsen. Os alunos têm uma aula teórica, pois tentamos fazer com que a aula teórica preceda a parte prática. A aula teórica agora tem duração de duas horas, e a aula prática tem duração de quatro horas.

As aulas práticas são terríveis. Faz dez anos que a gente está aqui e a cada ano tentamos algo diferente, porque não dá para dar a aula com o material que tínhamos.

Desde o ano que eu entrei, pedimos equipamentos e finalmente esse ano chegou um kit que vai ser um salto tecnológico imenso. Mas então, é um kit e você tem cinco grupos, assim as aulas vão ser bastante demonstrativas, não vai dar para cada grupo ter uma situação para trabalhar.

No ano em que eu cheguei não tinha nada, fizemos aulas práticas que vinham sendo feitas há anos e foi um desastre, porque já não eram mais aplicáveis, eram aulas fadadas ao fracasso, extremamente trabalhosas. Tínhamos que montar, emendar fiozinhos, colocar pesinho, coisas muito improvisadas; tinha peças de piano, bobina de carro, artifícios para você tentar estimular o nervo. Não foram feitos para estudar fisiologia. Já tentamos fazer trabalhos práticos maiores, mas mantivemos o trabalho de metabolismo, porque achamos interessante.

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trabalho que queriam para apresentar, e foi super produtivo porque tinham trabalhos sobre “Eco locação em golinhos”, “Percepção visual em borboleta”, “Orientação diamagnética em pingüim”. Foi super diversificado e tive a chance de ler um monte de trabalhos que normalmente eu não leria, e os alunos se interessaram porque eram coisas nas quais já tinham um interesse. Então esse ano foi o melhor por mais que não seja o objetivo da prática apresentar seminários, mas funcionou bem.

O kit de equipamentos, que conseguimos não tem a mesma precisão de um equipamento de pesquisa, eles ficam um pouco abaixo. E eles são montados por

companhias de pesquisa, por exemplo, a companhia “Baiopec”, e têm módulos de

aula. Sobre a respiração, eles têm três aulas montadas com equipamentos básicos que preciso para ter uma aula de respiração. Tem também o sistema de aquisição de dados: transistores de pressão, eletrodos, uma série de coisas para aplicar em aulas montadas. Tem a flexibilidade de montar a aula do seu jeito, mas eles dão um pacote básico, para montar uma aula prática em fisiologia animal. O ideal é que tivesse cinco, porque seria um para cada grupo de aluno, mas já é uma coisa extremamente difícil porque para funcionar precisamos de um computador. Isso já foi um grande salto na parte de equipamento, mas de laboratório é terrível, então, teria que mexer na estrutura física do laboratório, ter computadores para poder conectar tudo, demonstrar os programas, e seria ideal que todos os computadores estivessem em rede, assim, se alguém tem um dado interessante, todos podem observar mesmo em diferentes situações.

Este é o melhor equipamento para fisiologia animal, e se formos para a Inglaterra, Canadá, ou qualquer outro lugar do mundo, esse vai ser o pacote que estarão usando.

USO DE MODELO EXPERIMENTAL VIVO

Referências

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