Campus de São José do Rio Preto
Cohomologia de Grupos e Algumas
Aplica¸c˜
oes
Francielle Rodrigues de Castro
Orientadora:
Profa. Dra. Erm´ınia de Lourdes Campello Fanti
Disserta¸c˜ao apresentada ao Instituto de Biociˆencias, Letras e Ciˆencias Exatas da Universidade Estadual Paulista, Campus de S˜ao Jos´e do Rio Preto, para obten¸c˜ao do t´ıtulo de Mestre em Matem´atica.
S˜ao Jos´e do Rio Preto
Comiss˜
ao Julgadora
Titulares
Erm´ınia de Lourdes Campello Fanti
Professora Doutora - IBILCE - UNESP
Orientadora
Pedro Luiz Queiroz Pergher
Professor Doutor - UFSCar
1o Examinador
Maria Gorete Carreira Andrade
Professora Doutora - IBILCE - UNESP
2o Examinador
Suplentes
Tomas Edson Barros
Professor Doutor - UFSCar
1o Suplente
Edivaldo Lopes dos Santos
Professor Doutor - IBILCE - UNESP
“Quanto mais aumenta nosso conhecimento, mais evidente fica nossa ignorˆancia”
Agradecimentos
Primeiramente, agrade¸co aos meus pais e meu irm˜ao pelo carinho, pelos
con-selhos, pela confian¸ca e apoio que deles recebi durante todos os anos de minha
vida.
Agrade¸co `a Profa. Dra. Erm´ınia de Lourdes Campello Fanti, por me iniciar
no estudo da Topologia Alg´ebrica ainda no 3◦ ano de gradua¸c˜ao, pela amizade,
pela orienta¸c˜ao, paciˆencia e tempo dedicado a este projeto.
Agrade¸co a todos os professores que tive desde o col´egio, principalmente aos
professores de Departamento de Matem´atica do IBILCE, pela forma¸c˜ao acadˆemica.
Em especial, `a Profa. Dra. Maria Gorete Carreira Andrade, pela amizade.
Agrade¸co ao meu namorado Pablo, por todo amor, carinho, compreens˜ao e
apoio recebido durante os anos de gradua¸c˜ao e p´os-gradua¸c˜ao.
Agrade¸co `as queridas amigas Dayana, D´ebora e Tatiane, pelo agrad´avel
conv´ı-vio e momentos de descontra¸c˜ao durante os ´ultimos anos.
Agrade¸co tamb´em aos amigos de p´os-gradua¸c˜ao: Elen, Giovana, Fernanda,
C´atia, Tatiane, Michelle, Mirian, Anderson, J´ulio, Marcus e Rubens, pelos
mo-mentos dif´ıceis e de alegria vividos nesses dois ´ultimos anos.
N˜ao poderia esquecer de agradecer `a CAPES, pelo apoio financeiro,
impor-tante para a realiza¸c˜ao desse projeto.
Resumo
O objetivo principal deste trabalho ´e estudar a Teoria de Cohomologia de
Grupos visando apresentar de forma detalhada algumas aplica¸c˜oes dessa teoria na
Topologia e na ´Algebra, mais especificamente na Teoria de Grupos, com destaque
para o Teorema de Schur-Zassenhaus e o Teorema de Classifica¸c˜ao de p−grupos que possuem um subgrupo c´ıclico de ´ındice p(p primo).
Palavras-chave: Cohomologia de Grupos, Decomposi¸c˜ao de Grupos,
Abstract
The aim of this work is to study the Cohomology Theory of Groups in order
to present in detailed form some applications of this theory in Topology and in
Algebra, more specifically, in the Theory of Groups, with prominence for the
Schur-Zassenhaus Theorem and the Theorem of Classification ofp−groups which contain a cyclic subgroup of index p, where p is a prime.
Key words: Cohomology of Groups, Decomposition of Groups, Classification of
Sum´
ario
Introdu¸c˜ao 10
1 Preliminares 15
1.1 M´odulos Livres e Projetivos . . . 15
1.2 RG−M´odulos . . . 19 1.3 Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada . . . 24
2 Cohomologia de Grupos 31
2.1 Conceito e Resultados . . . 31
2.2 C´alculo da Cohomologia de Grupos Particulares . . . 34
2.3 Uma Interpreta¸c˜ao para H1(G, A) em Termos de Deriva¸c˜oes de Grupos . . . 38
3 Cohomologia de Grupos e Espa¸cos de Eilenberg-MacLane 44
3.1 G−Complexos Livres e Resolu¸c˜oes de Z sobre ZG . . . . 44
3.2 Uma Aplica¸c˜ao a Espa¸cos de Eilenberg - MacLane do Tipo (G,1) 54 3.3 Interpreta¸c˜ao Topol´ogica da Cohomologia de Grupos . . . 57
4 Cohomologia em Dimens˜oes Baixas, Extens˜oes de Grupos e
Aplica¸c˜oes 63
4.1 Extens˜oes de Grupos e A¸c˜ao Induzida da Extens˜ao . . . 64
4.4 Teorema de Schur-Zassenhaus . . . 90
4.5 Classifica¸c˜ao dosp−grupos com um subgrupo c´ıclico de ´ındicep, p
primo . . . 100
Introdu¸c˜
ao
A Teoria de Cohomologia de Grupos teve origem, de modo independente, na
Teoria dos N´umeros e na Topologia, e tem como base a ´Algebra Homol´ogica que
´e fundamental tanto na Topologia Alg´ebrica como na ´Algebra Comutativa. ´E
atualmente um campo f´ertil com inter-rela¸c˜oes entre importantes ´areas da
Ma-tem´atica, como Teoria de Homotopia, Teoria de Representa¸c˜ao Modular, Teoria
de Grupos, A¸c˜ao de Grupos e Teoria dos N´umeros.
O principal objetivo deste trabalho ´e, ap´os um estudo de Cohomologia de
Gru-pos, apresentar de forma bastante detalhada algumas aplica¸c˜oes da Cohomologia
na ´Algebra, mais especificamente na Teoria de Grupos, que est˜ao relacionadas
ao problema de classifica¸c˜ao de grupos (a menos de isomorfismos), com destaque
para (I) Teorema de Schur-Zassenhaus (Teorema 4.4.1)e (II) Teorema de
Clas-sifica¸c˜ao de p−grupos que possuem um subgrupo c´ıclico de ´ındice p (Teorema 4.5.1):
(I)Seja E um grupo finito de ordem k·m, onde mdc(k, m) = 1.Se E cont´em um subgrupo normal abeliano A de ordem k,ent˜ao a extens˜ao 0→A−→i E −→π E/A →1 (onde i ´e a inclus˜ao e π ´e a proje¸c˜ao natural) cinde, e assim E ´e um
produto semidireto de A por E/A e cont´em subgrupo de ordem m. Al´em disso,
quaisquer dois subgrupos de E de ordem m s˜ao conjugados.
(II) Seja G um grupo tal que |G|=pn+1 e G cont´em um subgrupo c´ıclico K
de ´ındice p. Ent˜ao, a menos de isomorfismos, G ´e um dos seguintes grupos: (1)Zpn+1, n≥0;
11
(3) Zpn ⋊ Zp, n ≥ 2, onde o gerador de Zp atua sobre Zpn pela multiplica¸c˜ao
por 1 +pn−1;
Se p= 2, existem trˆes grupos adicionais:
(4) D2·2n = Z2n ⋊ Z2, n ≥ 3, (2−grupos diedrais) onde o gerador de Z2 atua
sobre Z2n pela multiplica¸c˜ao por −1;
(5)Q4·2n−1, n≥2,(2−grupos quaterniˆonicos generalizados);
(6) Z2n ⋊ Z2, n ≥ 3, aqui o gerador de Z2 atua sobre Z2n pela multiplica¸c˜ao
por −1 + 2n−1.
Estas aplica¸c˜oes s˜ao fortemente apoiadas na rela¸c˜ao existente entre
cohomo-logia de grupos (em dimens˜oes baixas) e extens˜oes de grupos.
Ainda, visando ilustrar a conex˜ao entre Cohomologia de Grupos e Topologia,
definimos complexo de Eilenberg-MacLane do tipo (G,1) ou K(G,1)−complexo e apresentamos alguns resultados. Dentre eles, destacamos:
(III) Se G ´e um grupo que tem tor¸c˜ao ent˜ao n˜ao existe K(G,1)−complexo de dimens˜ao finita. Em particular, o espa¸co K(G,1) n˜ao pode ser variedade
(Corol´ario 3.2.1).
(IV) Os grupos de cohomologia de um grupo G com coeficientes num ZG−
m´odulo trivialA, “Hn(G, A)”, e os grupos de cohomologia de um espa¸co K(G,1)
com coeficientes em A, “Hn(K(G,1), A)”, s˜ao isomorfos (Teorema 3.3.1).
Mais especificamente, neste trabalho, apresentamos no cap´ıtulo 1 alguns
re-quisitos de fundamental importˆancia para os cap´ıtulos seguintes. Inicialmente,
introduzimos os conceitos de R−m´odulos, R−homomorfismos, m´odulos livres
e projetivos, e RG−m´odulos (onde R indica o anel Z ou Z2, e G um grupo
denotado multiplicativamente). Em seguida, definimos resolu¸c˜oes projetivas e
livres de R sobre RGe exibimos alguns exemplos, dentre os quais destacamos as Resolu¸c˜oes Padr˜ao, Bar e Bar Normalizada. A resolu¸c˜ao Bar Normalizada ´e ´util
na demonstra¸c˜ao de um resultado do cap´ıtulo 4 (Teorema 4.3.2). As referˆencias
para este cap´ıtulo s˜ao [1],[7] e [9]. ´
12
os Teoremas de Sylow, s˜ao tamb´em requisitos essenciais para o desenvolvimento
do trabalho (no cap´ıtulo 4). No entanto, n˜ao relacionamos aqui esses resultados.
Eles podem ser encontrados em [2] ou [3], e s˜ao, em geral, referidos no texto
oportunamente.
No cap´ıtulo 2, considerandoε :F →R uma resolu¸c˜ao projetiva de R (R=Z
ou Z2) sobre RG, com R visto comoRG−m´odulo trivial, e o complexo de
coca-deiasHomRG(F, A), ondeA´e umRG−m´odulo (`a esquerda), definimos, para todo n ∈Z (Defini¸c˜ao 2.1.1), on−´esimo grupo de cohomologia deG com coeficientes
em A,Hn(G, A) := Hn(Hom
RG(F, A)). Observamos que os grupos de
cohomolo-gia independem da resolu¸c˜ao projetiva escolhida (Observa¸c˜ao 2.1.1(1)). A seguir
caracterizamos os grupos de cohomologia no n´ıvel n= 0 e efetuamos os c´alculos dos grupos de cohomologia {Hn(G, A)}
n, para alguns grupos particulares, em
es-pecial para os grupos c´ıclicos. A partir do c´alculo dos grupos de cohomologia dos
grupos c´ıclicos finitos (Exemplo 2.2.3) deduzimos a n˜ao existˆencia de resolu¸c˜oes
projetivas de comprimento finito deZsobreZG1 seG1 ≃Zn,n ∈N∗(Proposi¸c˜ao
2.2.1). Para finalizar o cap´ıtulo, interpretamosH1(G, A) em termos de deriva¸c˜oes e deriva¸c˜oes principais. Al´em disso, calculamos H1(G, A) para grupos e m´odulos espec´ıficos usando essa interpreta¸c˜ao. Notemos que na defini¸c˜ao de cohomologia
de grupos consideramos A um RG−m´odulo, para R =Z ouZ2, no entanto, nos
cap´ıtulos seguintes trabalhamos apenas com ZG−m´odulos.
Nocap´ıtulo3 relacionamos a Teoria de Cohomologia de Grupos com a
Topolo-gia. Para isso, recordamos inicialmente alguns conceitos e resultados sobre
CW-complexos, definimos complexo de Eilenberg-MacLane do tipo (G,1) ouK(G,1)−
complexo, exibimos algumas resolu¸c˜oes livres de Z sobre ZG por meio de tais
espa¸cos topol´ogicos (Proposi¸c˜oes 3.1.2 e 3.2.1)e mostramos os resultados(III)e
(IV). ´E interessante observar que (III)´e conseq¨uˆencia da n˜ao existˆencia de
re-solu¸c˜oes projetivas de comprimento finito de Z sobre ZG1 para G1 c´ıclico finito,
fato esse obtido a partir do c´alculo da cohomologia dos grupos c´ıclicos finitos.
13
Como j´a mencionado, essas aplica¸c˜oes est˜ao apoiadas na rela¸c˜ao existente entre
cohomologia de grupos (em dimens˜oes baixas) e extens˜oes de grupos. O principal
problema no estudo de extens˜oes de grupos ´e classificar as extens˜oes de um grupo
Gpor um grupoN a menos de “equivalˆencia”. Grosseiramente falando, procura-se tentar entender todos os modos poss´ıveis de obter/construir um grupoE tendo
N como um subgrupo normal eGcomo um grupo quociente. Consideramos ape-nas extens˜oes em que N ´e um grupo abeliano (aditivo) denotado por A. Neste caso, toda extens˜ao de G por A d´a origem `a uma a¸c˜ao de G sobre A tornando
A um ZG−m´odulo. Primeiramente, introduzimos alguns conceitos como os de
extens˜oes de grupos, extens˜oes equivalentes, a¸c˜ao induzida por uma extens˜ao,
ex-tens˜oes cindidas, levantamento de uma extens˜ao e levantamentosA−conjugados, e provamos um resultado importante (Proposi¸c˜ao 4.2.1), bastante utilizado ao
longo do cap´ıtulo. Tendo isso, e considerando G um grupo e A um ZG−m´odulo
(logo, um grupo abeliano), exibimos uma bije¸c˜ao entre H1(G, A) e L(G, A), o conjunto das classes de A−conjuga¸c˜ao de levantamentos s : G → A⋊G da
ex-tens˜ao cindida 0 → A −→i′ A⋊G −→π′ G → 1, onde A⋊G indica o produto
semidireto de A e G (Teorema 4.2.1). A partir da´ı, fixado um ZG−m´odulo A,
analisamos apenas extens˜oes de G porA cuja a¸c˜ao induzida pela extens˜ao coin-cide com a a¸c˜ao dada pelo ZG−m´odulo. Provamos que, dados um grupo G e
um ZG−m´oduloA, existe uma bije¸c˜ao entreH2(G, A) e o conjunto E(G, A), das
classes de equivalˆencia das extens˜oes de GporAcuja a¸c˜ao deGsobreAinduzida pela extens˜ao coincide com aG−a¸c˜ao dada peloZG−m´oduloA(Teorema 4.3.2).
Em seguida, utilizando esses dois teoremas (4.2.1 e 4.3.2) e mais um resultado
de cohomologia de grupos (Proposi¸c˜ao 4.4.1), demonstramos o resultado (I)
Te-orema de Schur-Zassenhaus (caso abeliano)(Teorema 4.4.1), e para que o estudo
fosse mais abrangente, demonstramos tamb´em o caso geral (Teorema 4.4.2). ´E
interessante ressaltar que a prova, nesse ´ultimo caso ´e feita de modo a recair no
caso abeliano, e para isso alguns resultados da Teoria de Grupos (Teoremas de
14
classificamos os grupos de ordem pq, com p e q primos distintos, p < q (Co-rol´ario 4.4.1). Por ´ultimo, finalizando nosso trabalho, apresentamos o resultado
(IV)sobre classifica¸c˜ao dos p−grupos que cont´em um subgrupo c´ıclico de ´ındice
Cap´ıtulo 1
Preliminares
Neste cap´ıtulo apresentamos alguns requisitos de fundamental importˆancia
para os cap´ıtulos seguintes. Inicialmente, introduzimos os conceitos deR-m´odulos,
R-homomorfismos, m´odulos livres e projetivos, e RG-m´odulos (onde R indica o
anel Z ou Z2, e G um grupo denotado multiplicativamente). Em seguida,
defi-nimos resolu¸c˜oes projetivas e livres de R sobre RG e exibimos alguns exemplos, dentre os quais destacamos as Resolu¸c˜oes Padr˜ao, Bar e Bar Normalizada. A
resolu¸c˜ao Bar Normalizada ´e ´util na demonstra¸c˜ao de um resultado do cap´ıtulo
4 (Teorema 4.3.2). As referˆencias para este cap´ıtulo s˜ao [1],[7] e [9].
1.1
M´
odulos Livres e Projetivos
Nesta se¸c˜ao recordamos brevemente os conceitos de m´odulos, homomorfismos,
m´odulos livres e m´odulos projetivos. Para maiores detalhes sugerimos [1], [7] e
[9].
Defini¸c˜ao 1.1.1. Seja R um anel com unidade. Diz-se que um conjunto n˜ao
vazio A ´e um R-m´odulo `a esquerda (ou um m´odulo `a esquerda sobre R) se A ´e
um grupo abeliano em rela¸c˜ao `a uma opera¸c˜ao, que indicaremos por +, e est´a
definida uma lei de composi¸c˜ao externa que a cada par (α, a) ∈ R×A associa
1.1. M´odulos Livres e Projetivos 16
α1, α2 ∈Re todos a1, a2 ∈A, verifica: (i) α1(α2a1) = (α1·α2)a1
(ii) α1(a1+a2) =α1a1+α1a2 (iii) (α1+α2)a1 =α1a1 +α2a1 (iv) 1·a1 =a1.
Observa¸c˜ao 1.1.1. De forma an´aloga, pode-se definir R−m´odulo `a direita.
Exemplo 1.1.1. Todo espa¸co vetorial sobre um corpo K ´e um K−m´odulo.
Exemplo 1.1.2. Todo grupo abeliano G pode ser considerado como um m´odulo sobre o anel Z dos n´umeros inteiros definindo o produto de um inteiro n por um
elemento g ∈G por:
n·g =g+g +. . .+g (n vezes), se n >0,
n·g = (−g) + (−g) +. . .+ (−g) (|n| vezes), se n <0, e
0·g = 0.
Exemplo 1.1.3. Todo anelR com unidade ´e um R−m´odulo com a fun¸c˜ao
mul-tiplica¸c˜ao sendo a pr´opria multiplica¸c˜ao do anel.
Observa¸c˜ao 1.1.2. Um conjunto pode ser um R−m´odulo para v´arios an´eis
R distintos. Por exemplo, Zn (o anel das classes de resto m´odulo n) ´e um
Zn−m´odulo (n≥2) e ´e um Z−m´odulo; M2(R) (conjunto das matrizes de ordem
2 com coeficientes em R) ´e um M2(R)−m´odulo, umR−m´odulo e um Z−m´odulo. Neste trabalho, indicamos por Zn tanto o anel como o grupo aditivo das classes
de resto m´odulo n.
Defini¸c˜ao 1.1.2. Sejam A e B dois R−m´odulos. Uma fun¸c˜ao f : A → B
diz-se um homomorfismo de R−m´odulos ou simplesmente um R−homomorfismose,
para todos a1, a2 ∈A e todo r ∈R, tivermos: (i) f(a1+a2) =f(a1) +f(a2),
(ii) f(r·a1) =r·f(a1).
Denotamos porHomR(A, B) o conjunto de todos osR−homomorfismos deA
1.1. M´odulos Livres e Projetivos 17
Dado umR−homomorfismof :A→B, os conjuntosIm f ={b∈B| ∃a∈A
com f(a) = b} e Ker f ={a ∈A| f(a) = 0} chamam-se imagem de f e n´ucleo ou kernel de f, respectivamente.
Defini¸c˜ao 1.1.3. Um R−homomorfismo diz-se um R−monomorfismo ou um
R−epimorfismo se for injetor ou sobrejetor, respectivamente.
Proposi¸c˜ao 1.1.1. Seja f :A→B um R−homomorfismo. Ent˜ao,
(i) f ´e um R−epimorfismo se, e somente se, Im f =B.
(ii) f ´e um R−monomorfismo se, e somente se, Ker f ={0}.
Demonstra¸c˜ao : [7], proposi¸c˜oes 2.3 e 2.4, p.9.
Defini¸c˜ao 1.1.4. Um R−homomorfismo f :A → B diz-se um R−isomorfismo
se f ´e, simultaneamente, R−monomorfismo e R−epimorfismo.
Neste caso, dizemos queA e B s˜ao isomorfos e denotamos A≃B.
Observa¸c˜ao 1.1.3. E f´´ acil ver que HomR(A, B)´e um grupo abeliano (portanto,
um Z−m´odulo) com a opera¸c˜ao de adi¸c˜ao dada por ϕ +ψ : A → B tal que
(ϕ+ψ)(x) :=ϕ(x) +ψ(x),para todo x∈A e todoϕ, ψ∈HomR(A, B). E ainda,
para todos α ∈ R e todo ϕ ∈ HomR(A, B), considere a fun¸c˜ao αϕ : A → B
sendo (αϕ)(x) := αϕ(x), para todo x ∈ A. Se R for um anel comutativo,
pode-se verificar usando a comutatividade de R que αϕ ´e um R−homomorfismo do
m´odulo A no m´odulo B. Assim, µ : R× HomR(A, B) → HomR(A, B) que
a cada (α, ϕ) se associa αϕ ´e uma multiplica¸c˜ao por escalar no grupo abeliano
HomR(A, B).
Logo, no caso em que R´e anel comutativo, HomR(A, B) ´e um R−m´odulo.
Defini¸c˜ao 1.1.5. Quando R ´e anel comutativo, o R−m´odulo HomR(A, B) ´e
chamado de m´odulo de homomorfismos do m´odulo A no m´odulo B.
Observa¸c˜ao 1.1.4. Em geral, consideramosRanel com unidade(n˜ao
necessari-amente comutativo). O anel ZG (ver se¸c˜ao seguinte), que ´e bastante usado neste
1.1. M´odulos Livres e Projetivos 18
Defini¸c˜ao 1.1.6. UmR−m´odulo livre sobre um conjunto S ´e um R−m´oduloF
junto com uma fun¸c˜ao f :S →F tal que, para toda fun¸c˜aog :S→X, ondeX ´e um R−m´odulo, existe um ´unico homomorfismo h: F → X tal que a rela¸c˜ao de
comutatividade
h◦f =g
´e verdade no seguinte triˆangulo
S f // g
F
h
~
~
~~~~ ~~~
X
Exemplo 1.1.4. R ´e um R−m´odulo livre sobre S, onde R ´e um anel e S um
conjunto unit´ario.
Proposi¸c˜ao 1.1.2. Sejam R um anel com unidade, S um conjunto n˜ao vazio e
F ={Xs|s∈S} uma fam´ılia de an´eis isomorfos a R, isto ´e, com Xs≃R, para
todo s ∈S. Um R−m´odulo F ´e livre gerado pelo conjunto S (ou R−livre gerado
por S) se, e somente se, F ≃M
s∈S Xs.
Demonstra¸c˜ao : [7], corol´ario 4.4, p.28.
Defini¸c˜ao 1.1.7. Um R−m´odulo P ´e chamado projetivo se, e somente se, para todo homomorfismo f : P → B e para todo epimorfismo g : A → B de
R−m´odulos, existe um homomorfismo h:P →A satisfazendo g◦h=f.
P f
h
~~~~ ~~~
A g ////B
Proposi¸c˜ao 1.1.3. Todo R−m´odulo livre ´e projetivo.
Demonstra¸c˜ao : [1], I.7.2, p.22.
Exemplo 1.1.5. Todo anel R visto como R−m´odulo ´e R−projetivo pois ´e R−
1.2. RG−M´odulos 19
Proposi¸c˜ao 1.1.4. Seja P um R−m´odulo. As seguintes afirma¸c˜oes s˜ao equiva-lentes:
(i) P ´e projetivo;
(ii) P ´e isomorfo a um somando direto de um R−m´odulo livre.
Demonstra¸c˜ao : [1], I.8.2, p.27.
1.2
RG
−
M´
odulos
Na defini¸c˜ao de cohomologia de grupos (cap´ıtulo seguinte), considera-se como
coeficientes, m´odulos especiais, a saber, os RG−m´odulos (R = Z ou Z2). Esses
m´odulos s˜ao estudados nesta se¸c˜ao.
Defini¸c˜ao 1.2.1 (O AnelRG). SejaGum grupo denotado multiplicativamente. Considere o conjunto RGcujos elementos s˜ao somas formais X
g∈G
rgg comrg ∈R,
g ∈G onde rg = 0, para quase todo G (isto ´e, exceto para um n´umero finito de
elementos g em G). Em RG, as opera¸c˜oes s˜ao dadas por:
X
g∈G rgg
!
+ X
g∈G sgg
!
= X
g∈G
(rg+sg)g,
X
g∈G rgg
!
· X
h∈G shh
!
= X
g, h∈G
(rgsh)(gh) .
Tais opera¸c˜oes fazem de RG um anel com unidade 1RG = 1R1 (1: elemento
neutro de G) chamado anel grupo de G sobre R.
Defini¸c˜ao 1.2.2. Para qualquer grupo G, podemos definir o homomorfismo de an´eis ε : RG → R tal que ε(g) = 1, para todo g ∈ G. Este homomorfismo ´e denominado aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao.
1.2. RG−M´odulos 20
Proposi¸c˜ao 1.2.1. Sejam G=hti ≃ Z e ε :RG →R a aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao. Ent˜ao, o Ker ε ´e formado pelos m´ultiplos de t − 1 em RG, isto ´e, Ker ε = (t−1)·RG.
Demonstra¸c˜ao : Considere y ∈ Ker ε = {z ∈ RG| ε(z) = 0}. Ent˜ao, y =
r0tk+r1tk+1+. . .+rntk+n, k ∈Z, n∈N, r0 6= 0, rn6= 0 e ε(y) = 0.Da´ı, ε(y) = 0 =⇒ r0+r1+. . .+rn= 0 =⇒ rn=−r0−r1−. . .−rn−1. Assim, y=r0tk+r1tk+1+. . .+rntk+n=r0tk+r1tk+1+. . .+rn−1tk+(n−1)+ (−r0−r1−. . .−rn−1)tk+n=−r0tk(tn−1)−r1tk+1(tn−1−1)−r2tk+2(tn−2−1)−
. . .−rn−1tk+(n−1)(t−1) = (t−1)·[−r0tk(tn−1+tn−2+. . .+t2+t+1)−r1tk+1(tn−2+
. . .+t+ 1) −r2tk+2(tn−3 +tn−4 +. . .+t+ 1)−. . .−rn−1tk+(n−1)] = (t −1)· (−r0tk+(n−1)−r0tk+(n−2)−. . .−r0tk+2−r0tk+1−r0tk−r1tk+(n−1)−. . .−r1tk+2−
r1tk+1−r2tk+(n−1)−r2tk+(n−2)−. . .−r2tk+2−. . .−rn−1tk+(n−1)) = (t−1)·[−r0tk+ (−r0−r1)tk+1+(−r0−r1−r2)tk+2+. . .+(−r0−r1−. . .−rn−1)tk+(n−1)]∈(t−1)·RG.
Logo, Ker ε⊂(t−1)·RG.
Agora, seja y ∈ (t−1)·RG. Ent˜ao, y = (t− 1)·x, com x ∈ RG, isto ´e,
x=X
i
riti, ri ∈R e ti ∈G, para todoi.
Desse modo, y= (t−1)·X i
riti = X
i
(riti+1−riti) = X
i
riti+1− X
i
riti = X
i
ri−1ti−
X
i
riti = X
i
(ri−1−ri)ti.
Logo, ε(y) =ε X i
(ri−1−ri)ti !
=X
i
(ri−1−ri) = X
i
ri−1−
X
i
ri = 0.
Portanto, (t−1)·RG⊂Ker ε e assim, Ker ε= (t−1)·RG.
Observa¸c˜ao 1.2.2. (1) Mais geralmente, se G ´e um grupo gerado por um con-junto S ent˜ao os elementos s−1, s∈S, geram Ker ε (como um ideal).
(2) O conceito de anel grupo est´a intimamente relacionado com a¸c˜ao de
gru-pos, como veremos na proposi¸c˜ao 1.2.2.
1.2. RG−M´odulos 21
φ :G×A→A
(g, a) 7→g·a
satisfazendo, para todo a∈A, as condi¸c˜oes:
(1) 1·a=a (onde 1 denota o elemento neutro deG) (2)g1 ·(g2·a) = (g1g2)·a, para todosg1, g2 ∈G.
Equivalentemente, umaG−a¸c˜ao (`a esquerda) sobre A´e um homomorfismo:
ϕ :G→S(A)
g 7→ϕ(g) := ϕg :A→A
a7→ϕg(x) :=g·a,
ondeS(A) ´e o grupo das bije¸c˜oes de A. Neste caso, dizemos tamb´em queG atua sobre A e que A ´e um G−conjunto.
Se, na defini¸c˜ao acima, A tiver uma estrutura de grupo (aditivo), para que esta estrutura seja preservada pela G−a¸c˜ao, al´em das condi¸c˜oes (1) e (2) exige-se a seguinte condi¸c˜ao:
(3)g·(a1+a2) =g ·a1+g·a2, para todog ∈G e todos a1, a2 ∈A.
Observa¸c˜ao 1.2.3. (1) Define-se similarmente G−a¸c˜ao `a direita sobre X. (2) Note que, a partir de uma G−a¸c˜ao `a esquerda sobre X, podemos sempre definir uma G−a¸c˜ao `a direita sobre X, por considerar x∗g :=g−1·x.
Defini¸c˜ao 1.2.4. Seja X um conjunto no qual G atua. Dizemos que X ´e um
G−conjunto livre (ou que G atua livremente sobre X) se a a¸c˜ao de G em X ´e livre, isto ´e: g·x=x, para algum x∈X se, e somente se, g = 1.
Exemplo 1.2.1. Para todoX 6=∅´e poss´ıvel dar umaG−a¸c˜ao definindog·x=x,
para todo x ∈ X e todo g ∈ G. Tal G−a¸c˜ao ´e chamada G−a¸c˜ao trivial e X ´e chamado G−conjunto trivial.
1.2. RG−M´odulos 22
Observa¸c˜ao 1.2.4. O conjunto de todas asG−´orbitas deXformam uma parti¸c˜ao
de X, isto ´e, X =
[
xλ∈E
G(xλ) (reuni˜ao disjunta), onde E ´e um conjunto de
re-presentantes para as G−´orbitas de X.
Proposi¸c˜ao 1.2.2. Sejam G um grupo e A um conjunto n˜ao vazio. Ent˜ao, A ´e um RG−m´odulo (`a esquerda) se, e somente se, A ´e um R−m´odulo (`a esquerda)
munido de uma G−a¸c˜ao (`a esquerda).
Demonstra¸c˜ao : (=⇒) SeA´e um RG−m´odulo ent˜aoA ´e umR−m´odulo com
r·a:= (r·1)·a (onde 1 ´e o elemento neutro de G) e aG−a¸c˜ao ´e dada por:
g·a := (1Rg)·a (onde 1R´e a unidade de R).
(⇐=) Se A ´e um R−m´odulo e existe uma G−a¸c˜ao sobre A, ent˜ao podemos dar a A uma estrutura de RG−m´odulo da seguinte forma:
X
g∈G rgg
!
·a=X
g∈G
rg(g·a).
Corol´ario 1.2.1. A´e um ZG−m´odulo se, e somente se, A ´e um grupo abeliano
munido de uma G−a¸c˜ao.
Demonstra¸c˜ao : Segue da proposi¸c˜ao anterior e do exemplo 1.1.2.
Corol´ario 1.2.2. A ´e um Z2G−m´odulo se, e somente se, A ´e um Z2−m´odulo
(grupo abeliano em que todo elemento tem ordem 2) munido de uma G−a¸c˜ao.
Demonstra¸c˜ao : Segue da proposi¸c˜ao anterior e do fato que todo elemento de
A tem ordem 2, pois, para qualquer a ∈A,temos:
a+a= ¯1·a+ ¯1·a= (¯1 + ¯1)·a= ¯0·a = 0.
Observa¸c˜ao 1.2.5. (1) Segue dos corol´arios acima que todoZ2G−m´odulo ´e um ZG−m´odulo, mas a rec´ıproca obviamente n˜ao ´e verdadeira.
1.2. RG−M´odulos 23
Considerando X um G−conjunto e RX o R−m´odulo livre gerado pelos ele-mentos deX, podemos estender a a¸c˜ao de GsobreX a uma a¸c˜ao deGsobreRX
da seguinte maneira:
g · X x∈X
rxx !
:=X
x∈X
rx(g·x),
com g ∈G erx ∈R. Assim, temos o seguinte resultado:
Proposi¸c˜ao 1.2.3. Sejam X um G−conjunto livre e E um conjunto formado por um representante de cada G−´orbita em X. Ent˜ao, RX ´e um RG−m´odulo livre com base E.
Demonstra¸c˜ao : SejaE ={xj|j ∈J}um conjunto formado por um
represen-tante de cada G−´orbita em X. Ent˜ao, X =
[
xj∈E
G(xj). Assim,
RX =R
[
xj∈E
G(xj)
= M
xj∈E
R(G(xj)).
Agora, como aG−a¸c˜ao ´e livre, temos para cada xj, que a aplica¸c˜ao fj :G→G(xj)
g 7→fj(g) =g·xj
´e uma bije¸c˜ao. Da´ı,R(G(xj))≡RG.
Portanto, RX = M
xj∈E
(RG)xj.
Corol´ario 1.2.3. Se S ´e um subgrupo de G, ent˜ao RG ´e um RS−m´odulo livre
com base num conjunto E formado por um representante de cada S−´orbita em
G (que s˜ao as classes laterais `a esquerda de S em G), isto ´e, RG=M
g∈E
(RS)g.
Demonstra¸c˜ao : Temos que G´e um S−conjunto com a a¸c˜ao dada pela multi-plica¸c˜ao dos elementos de S por elementos de G(isto ´e,s·g :=sg) e esta a¸c˜ao ´e livre (pois s·g =g ⇔ s= 1).
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 24
1.3
Resolu¸c˜
oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜
ao
Bar Normalizada
O objetivo desta se¸c˜ao ´e definir resolu¸c˜oes projetivas e livres de R sobre
RG (R = Z ou Z2) e exibir alguns exemplos, dentre os quais destacamos as
Resolu¸c˜oes Padr˜ao, Bar e Bar Normalizada. A resolu¸c˜ao Bar Normalizada ´e ´util
na demonstra¸c˜ao de um resultado do cap´ıtulo 4 (Teorema 4.3.2).
Defini¸c˜ao 1.3.1. Uma seq¨uˆencia exata de m´odulos ´e uma seq¨uˆencia finita ou
infinita
. . .→X −→f Y −→g Z →. . .
de homomorfismos deR−m´odulos tal que a imagem do homomorfismo de chegada
coincide com o n´ucleo (ou kernel) do homomorfismo de sa´ıda em todo m´odulo,
exceto nos extremos da seq¨uˆencia (se existir). Assim, considerando o m´odulo Y, devemos ter Im f =Ker g.
Defini¸c˜ao 1.3.2. Toda seq¨uˆencia exata da forma
0→X −→f Y −→g Z →0 ´e chamada de seq¨uˆencia exata curta.
Exemplo 1.3.1. A seq¨uˆencia 0→ X −→f Y → 0 ´e exata se, e somente se, f ´e isomorfismo.
Defini¸c˜ao 1.3.3. Seja A um R−m´odulo. Uma resolu¸c˜ao projetiva (respectiva-mente, livre) de A sobre R, ´e uma seq¨uˆencia exata de R−m´odulos:
. . .→F2
∂2
−→F1
∂1
−→F0
ε
−→A→0 com cada Fi R−projetivo (respectivamente, R−livre).
Denotemos tal resolu¸c˜ao por ε:F →A.
Observa¸c˜oes 1.3.1. (1) Toda resolu¸c˜ao livre ´e projetiva, pois todo m´odulo livre
´
e projetivo (vide proposi¸c˜ao 1.1.3).
(2)Se existir um inteiron tal queFi = 0,parai > n,dizemos que a resolu¸c˜ao
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 25
0→Fn→. . .→F0 →A→0.
Proposi¸c˜ao 1.3.1. Dado um R−m´odulo A sempre podemos construir uma
re-solu¸c˜ao livre de A sobre R.
Demonstra¸c˜ao : Por [7], I.4.6, sabemos que todoR−m´odulo A ´e isomorfo ao
quociente de um R−m´odulo livre, isto ´e, existe um R−m´odulo livre F0 e um
isomorfismo ψ0 :A→
F0
Q0
.
Seja ˜ε :F0 →
F0
Q0
dada por ˜ε(x) =x+Q0 (proje¸c˜ao natural) e ε :=ψ−01 ◦ε.˜ Temos que ε ´e sobrejetora (pois ψ0−1 e ˜ε s˜ao sobrejetoras) eKer ε=Q0.
Analogamente, o R−subm´odulo Ker ε ´e isomorfo ao quociente de um R−
m´odulo livre, isto ´e, Ker ε ψ≃1 F1 Q1
, onde F1 ´e livre. Novamente, tome a proje¸c˜ao
natural ∂e1 : F1 →
F1
Q1
e ∂1 := i◦ψ1−1 ◦∂e1, onde i : Q0 = Ker ε → F0 ´e a inclus˜ao.
Ent˜ao, Im ∂1 = i(ψ1−1(∂e1(F1))) = i(ψ1−1(F1/Q1)) = i(Ker ε) = Ker ε e
Ker ∂1 = Ker∂e1 = Q1 (pois i e ψ1−1 s˜ao homomorfismos injetores). Assim, temos a seq¨uˆencia exata
F1
f
∂1
−→ F1 Q1
≃Ker ε=Q0
i
−→F0 e
ε −→ F0
Q0
≃ A→0
comF0eF1,R−m´odulos livres. Continuando o processo sucessivamente, obtemos uma seq¨uˆencia exata
. . .→F2
∂2
−→F1
∂1
−→F0
ε
−→A→0
onde cada Fi ´e livre.
Observa¸c˜oes 1.3.2. (1) Estamos interessados em resolu¸c˜oes projetivas (livres)
de A =R sobre R =RG onde R ´e visto como um RG−m´odulo com a G−a¸c˜ao
trivial.
(2)Segue, da proposi¸c˜ao anterior, que sempre existe resolu¸c˜ao projetiva(livre)
de R sobre RG.
Lema 1.3.1. Se ε :F →R e uma resolu¸c˜´ ao projetiva de R sobre RG e S ´e um
subgrupo de G ent˜ao ε : F → R tamb´em ´e uma resolu¸c˜ao projetiva de R sobre
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 26
Demonstra¸c˜ao : Seja
. . .→Fn→ . . .→F1 →F0 →R→0 uma resolu¸c˜ao projetiva de R sobre RG.
Cada RG−m´odulo Fi pode ser visto como um RS−m´odulo, uma vez que RS ⊂ RG (neste caso, diz-se que Fi ´e RS−m´odulo por restri¸c˜ao de escalares).
Devemos mostrar que Fi ´eRS−projetivo.
Como cadaFi ´e um RG−m´odulo projetivo ent˜ao, pela proposi¸c˜ao 1.1.4,Fi ´e
isomorfo a um somando direto de um RG−m´odulo livre. Assim,
Fi⊕Qi ≃ M
j∈J
(RG)j,
onde Qi ´e RG−m´odulo. Pelo corol´ario 1.2.3, temos que RG ´eRS−m´odulo livre
com base num conjunto E de representantes para as classes laterais `a esquerda de S em G, ou seja,RG ≃M
g∈E
(RS)g. Logo, substituindo obtemos:
Fi⊕Qi ≃ M
µ∈I
(RS)µ,
e, novamente pela proposi¸c˜ao 1.1.4, temos que Fi ´e umRS−m´odulo projetivo.
Portanto, ε:F →R ´e uma resolu¸c˜ao projetiva deR sobre RS.
ORG−m´oduloR pode admitir v´arias resolu¸c˜oes projetivas. No entanto, tais resolu¸c˜oes s˜ao “´unicas a menos de uma equivalˆencia de homotopia”como mostra
a pr´oxima proposi¸c˜ao. Isto ser´a importante para concluirmos que o conceito de
cohomologia de grupos (cap´ıtulo 2) independe da resolu¸c˜ao projetiva de R sobre
RG escolhida.
Proposi¸c˜ao 1.3.2 (Unicidade de Resolu¸c˜oes). Se ε : F → R e ε′ : F′ → R
s˜ao resolu¸c˜oes projetivas de R sobre RG ent˜ao existe uma aplica¸c˜ao de cadeias
τ : F → F′ preservando aumenta¸c˜ao (isto ´e, ε′ ◦ τ = ε), ´unica a menos de
homotopia e τ ´e uma equivalˆencia de homotopia.
Demonstra¸c˜ao : [1], I.7.5, p.24 ou [7], p.129.
Exemplo 1.3.2. Considere G={1}. Temos que RG≃R e 0→Rε=idR
−→ R→0
´
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 27
Exemplo 1.3.3. Seja G=hti ≃Zn (n ∈N∗) o grupo c´ıclico finito de ordem n. Considere a seq¨uˆencia
. . .→RG−→N RG −→t−1 RG −→N . . .−→t−1 RG−→ε R →0,
onde ε ´e a aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao, t−1 e N denotam, respectivamente, a mul-tiplica¸c˜ao de t−1 e 1 + t+. . .+tn−1 por cada elemento de RG e R ´e visto
como um RG−m´odulo trivial. Temos que cada RG ´e RG−m´odulo livre, ε ´e
sobrejetora e pode-se verificar que Ker ε = Im(t−1), Im N = Ker(t−1) e
Im(t−1) =Ker N.
Logo, a seq¨uˆencia acima ´e uma resolu¸c˜ao livre (e portanto, projetiva) de R
sobre RG.
Defini¸c˜ao 1.3.4. O homomorfismoN do exemplo acima ´e denominadooperador norma.
Exemplo 1.3.4. Seja G=hti ≃Z o grupo c´ıclico infinito. Considere a seguinte
seq¨uˆencia
0→RG−→∂ RG−→ε R →0,
com∂ a multiplica¸c˜ao dos elementos deRGport−1eε a aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao. Sabemos que cada RG ´e RG−m´odulo livre, ε ´e sobrejetora e pode-se verificar que ∂ ´e monomorfismo e Im ∂ = Ker ε. Assim, a seq¨uˆencia dada acima ´e uma resolu¸c˜ao livre (e portanto, projetiva) de R sobre RG.
Exemplo 1.3.5 (Resolu¸c˜ao Padr˜ao). Sejam G um grupo e Fn = RXn, o R−
m´odulo livre gerado porXn, comXn o conjunto das(n+ 1)−uplas(g0, g1, . . . , gn)
de elementos de G (n ≥ 0). Consideremos as seguintes aplica¸c˜oes definidas nos geradores por:
∂n : Fn → Fn−1 (n≥1)
(g0, . . . , gn)7→∂n(g0, . . . , gn) := n X
i=0
(−1)i(g
0, . . . ,gˆi, . . . , gn),
onde (g0, . . . ,ˆgi, . . . , gn) := (g0, . . . , gi−1, gi+1, . . . , gn);
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 28
e estendidas por linearidade.
Assim, temos o seguinte complexo:
F∗ :. . .−→Fn ∂n
−→Fn−1
∂n−1
−→. . .−→F2
∂2
−→F1
∂1
−→F0
ε
−→R −→0
A G−a¸c˜ao livre sobre Fn ´e obtida da G−a¸c˜ao livre sobre Xn (transla¸c˜ao `a
esquerda, isto ´e, g ·(g0, . . . , gn) := (gg0, . . . , ggn)). Da´ı, pela proposi¸c˜ao 1.2.3, Fn = RXn ´e um RG−m´odulo livre com base em um conjunto de representantes
para as G−´orbitas em Xn.
Agora, mostremos que o complexo F∗ ´e exato. Consideremos F−1 = R e
hn :Fn →Fn+1 dada nos geradores por:
hn(g0, . . . , gn) = (1, g0, . . . , gn), se n≥0,
hn(1R) = (1), se n=−1.
Aqui, vamos considerar F∗ como um complexo de R−m´odulos pois hn n˜ao ´e
aplica¸c˜ao de RG−m´odulos.
Efetuando os c´ alculos, obtemos:
ε◦h−1 =idF−1 =idF−1 −0
h−1◦ε+∂1◦h0 =idF0 =idF0 −0
hn−1◦∂n+∂n+1◦hn=idFn =idFn −0 (n ≥1),
ou seja, h ´e uma homotopia de cadeias entre idF e a aplica¸c˜ao nula.
Logo, as aplica¸c˜oes induzidas na homologia do complexo F∗ coincidem, isto ´
e, idHn(F∗) = Hn(idF∗) = Hn(0) = 0 ([1], p.5). Isto implica que, para todo n, Hn(F) = 0 e da´ı, Ker ∂n=Im ∂n+1 e Im ∂1 =Ker ε. Portanto, F∗ ´e exato.
Como Fn ´e RG−m´odulo livre e o complexo F∗ ´e exato, segue que
F∗ :. . .−→Fn ∂n
−→Fn−1
∂n−1
−→. . .−→F2
∂2
−→F1
∂1
−→F0
ε
−→R −→0
´e uma resolu¸c˜ao livre (e portanto, projetiva) de R sobre RG, denominada re-solu¸c˜ao padr˜ao.
Exemplo 1.3.6 (Resolu¸c˜ao Bar). Considere, na resolu¸c˜ao anterior, como
re-presentante da G−´orbita de (g0, g1, . . . , gn) o elemento g0−1 · (g0, g1, . . . , gn) =
(1, g0−1g1,
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 29
Vamos denotar um elemento(1, g1, g1g2, . . . , g1g2. . . gn)deFnpor[g1|g2|. . .|gn].
Esta nota¸c˜ao ´e denominada nota¸c˜ao bar.
Usando essa nota¸c˜ao, temos queFn´e oRG−m´odulo livre gerado pelos s´ımbolos
[g1|g2|. . .|gn] e ∂n([g1|g2|. . .|gn]) = n X
i=0
(−1)id
i([g1|g2|. . .|gn]), com
di([g1|g2|. . .|gn]) =
g1[g2|. . .|gn], se i= 0,
[g1|. . .|gi−1|gigi+1|gi+2|. . .|gn], se 1≤i < n,
[g1|. . .|gn−1], se i=n.
Como F0 ´e gerado pela 1−upla (1) temos, na nota¸c˜ao bar, que F0 ´e o RG−
m´odulo livre gerado pelo s´ımbolo [ ] ([ ]≡1) e assim, F0 ≃RG.
Por exemplo, temos:
∂2([g1|g2]) =d0([g1|g2])−d1([g1|g2]) +d2([g1|g2]) =g1[g2]−[g1g2] + [g1],
∂1([g1]) = d0([g1])−d1([g1]) =g1[ ]−[ ].
Quando usamos a nota¸c˜ao bar, a Resolu¸c˜ao Padr˜ao ´e muitas vezes chamada
Resolu¸c˜ao Bar.
Exemplo 1.3.7 (Resolu¸c˜ao Bar Normalizada). Agora, considere o complexo
F∗ :. . .−→Fn
¯
∂n
−→Fn−1 ¯
∂n−1
−→. . .−→F2 ¯
∂2
−→F1 ¯
∂1
−→F0
ε
−→R−→0,
onde F∗ =F∗/D∗ e D∗ ´e o subcomplexo (degenerado) do complexoF∗, com cada Dn, n ≥1,gerado pelos elementos (g0, g1, . . . , gn) tais que gi =gi+1,para algum i (0≤i≤n−1), e D0 ={0} (assim, F0 ≃F0 ≃RG e F−1 =R).
Considerando ent˜ao que gi+1 = gi, temos, como representante da G−´orbita
de (g0, g1, . . . , gi, gi, gi+2, . . . , gn) o elemento g0−1·(g0, g1, . . . , gi, gi, gi+2, . . . , gn) =
(1, g0−1g1, . . . , g0−1gi, g0−1gi, g0−1gi+2, . . . , g0−1gn) = (1, g1′, g1′g′2, . . . , g1′g2′ . . . gi′, g′
1g2′ . . . gi′, g′1g2′ . . . gi′gi′+2, . . . , g1′g2′ . . . gn′) tal que g′j =g −1
j−1gj, j = 1, . . . , n.
Na nota¸c˜ao bar, (1, g1, g1g2, . . . , g1g2. . . gi, g1g2. . . gi, g1g2. . . gigi+2, . . . ,
g1g2. . . gn) = [g1|g2|. . .|gi|1|gi+2|. . .|gn], ou seja, Dn (n ≥ 1) ´e gerado pelos
elementos [g1|g2|. . .|gn] tais que gs= 1, para algum s.
Assim, cada Fn = Fn/Dn (n ≥ 1) ´e um RG−m´odulo livre gerado pelos
elementos b´asicos [g1|g2|. . .|gn] +Dn, com gi 6= 1, para todo i, que por abuso,
1.3. Resolu¸c˜oes Livres e Projetivas - Resolu¸c˜ao Bar Normalizada 30
h[g]| g ∈ G, g 6= 1i. No caso em que n = 2, D2 = h[g1|1],[1|g2]i, g1, g2 ∈ G e
F2 =F2/D2 =h[g|h]| g, h∈G, comg, h6= 1i.
Para ver que o complexoF∗´e exato, ´e suficiente observar que o homomorfismo ∂ e a homotopia de cadeias h da resolu¸c˜ao padr˜ao levam D∗ nele mesmo, mais precisamente, ∂n(Dn) ⊂ Dn−1 e hn(Dn) ⊂ Dn+1, para todo n (o que ocorre
pois, dado x = (g0, g1, . . . , gi, gi, gi+2, . . . , gn) ∈ Dn, verifica-se facilmente que dj(x) ∈ Dn−1 se j 6= i ou j 6= i + 1 e, di(x) = di+1(x) donde (−1)idi(x) +
(−1)i+1d
i+1(x) = 0.Logo, ∂n(x) = n X
j=0
(−1)jdj(x)∈Dn−1. Al´em disso, temos que
h(x) = (1, g0, g1, . . . , gi−1, gi, gi, gi+2, . . . , gn)∈Dn+1). Assim, ficam bem definidas
as aplica¸c˜oes ∂¯n(x) =∂n(x) +Dn−1 e h¯n(x) =hn(x) +Dn+1, para todo x∈Fn e
todo n, e de maneira an´aloga ao exemplo 1.3.5, pode-se mostrar que a aplica¸c˜ao induzida ¯h ´e uma aplica¸c˜ao de cadeias entre idF∗ e a aplica¸c˜ao nula.
Desse modo, para todo n, tˆem-se Hn(F) = 0 e da´ı, Ker∂¯n =Im∂¯n+1. Logo,
F∗ ´e exato.
Portanto, o complexo F∗ ´e uma resolu¸c˜ao livre de R sobre RG, denominada
Resolu¸c˜ao Padr˜ao Normalizada.
Quando usamos a nota¸c˜ao bar para os elementos deFn,ent˜ao F∗ ´e chamada
Cap´ıtulo 2
Cohomologia de Grupos
O objetivo principal deste cap´ıtulo ´e definir cohomologia de grupos (mais
precisamente os “grupos de cohomologia {Hn(G, A)}
n”, onde G´e um grupo e A
umZG−m´odulo (Defini¸c˜ao 2.1.1)); calcular os grupos de cohomologia para alguns
grupos particulares, mais especificamente para os grupos c´ıclicos (Exemplos 2.2.2
e 2.2.3); deduzir a n˜ao existˆencia de resolu¸c˜oes projetivas de comprimento finito
de Z sobre ZG se G ´e c´ıclico finito (Proposi¸c˜ao 2.2.1); interpretar H1(G, A) em termos de deriva¸c˜oes e deriva¸c˜oes principais (Proposi¸c˜ao 2.3.1), e calcular
H1(G, A) para grupos e m´odulos espec´ıficos usando essa interpreta¸c˜ao. Note que, na defini¸c˜ao de cohomologia de grupos, consideramos A um RG−m´odulo, para R =Z ou Z2, no entanto, nos cap´ıtulos seguintes trabalhamos apenas com ZG−m´odulos.
2.1
Conceito e Resultados
Vamos apresentar agora o conceito de cohomologia de um grupo G com coe-ficientes em um RG−m´odulo A (R =Zou Z2).
Defini¸c˜ao 2.1.1. Sejam . . . −→ Fn ∂n
−→ . . . −→ F1
∂1
−→ F0
ε
2.1. Conceito e Resultados 32
HomRG(F, A) : 0 →HomRG(F0, A)
δ0
−→HomRG(F1, A)
δ1
−→. . .
com o operador cobordo dado porδn(f) :=f◦∂
n+1,para todof ∈HomRG(Fn, A).
On−´esimo grupo de cohomologia deGcom coeficientes emA´e, para todon∈Z,
definido por:
Hn(G, A) :=Hn(Hom
RG(F, A)) =
Ker δn Im δn−1. A cole¸c˜ao{Hn(G, A)}
n∈Z´e denominada cohomologia do grupo G com
coefici-entes em A.
Observa¸c˜ao 2.1.1. (1)Os grupos de cohomologia independem da resolu¸c˜ao
pro-jetiva escolhida. Mais precisamente, dadas ε : F → R e ε′ : F′ → R duas
resolu¸c˜oes projetivas de R sobre RG, sabemos, pela proposi¸c˜ao 1.3.2 (Unicidade de Resolu¸c˜oes), que existe uma equivalˆencia de homotopia τ :F →F′.
Conside-remos o funtor (contravariante)T =HomRG(−, A)da categoria deRG−m´odulos
na categoria de grupos abelianos e os complexos T(F) e T(F′), obtidos por
apli-car (termo a termo) T a F e a F′, respectivamente. Como T ´e aditivo (ou seja,
satisfaz T(β +β′) = T(β) +T(β′), com β e β′ homomorfismos) segue que T
preserva homotopia de cadeia, assim T(τ) ser´a uma equivalˆencia de homotopia entre T(F) e T(F′). Da´ı, Hn(T(F)) ≃ Hn(T(F′)) (por [1],0.2, p.5), ou seja, Hn(Hom
RG(F, A))≃Hn(HomRG(F′, A)), como desejado.
(2) Hn(G, A) = 0, para todo n <0.
(3) E usual denotar a cohomologia de um grupo´ G com coeficientes no ZG−
m´odulo trivial Z, H∗(G,Z), simplesmente por H∗(G).
Proposi¸c˜ao 2.1.1. Se A ´e um Z2G−m´odulo ent˜ao os grupos de cohomologia de
G (sobre Z2) com A visto como um Z2G−m´odulo e os grupos de cohomologia de
G (sobre Z) com A visto como um ZG−m´odulo s˜ao isomorfos como grupos.
Demonstra¸c˜ao : Segue essencialmente do fato que se ε : F → Z ´e uma
resolu¸c˜ao projetiva de Z sobre ZG ent˜ao ε′ : F′ = F ⊗Z Z2 → Z⊗Z Z2 ≃ Z2
2.1. Conceito e Resultados 33
A proposi¸c˜ao seguinte caracteriza os grupos de cohomologia no n´ıvel n = 0.
Para esse resultado e demais resultados e exemplos ao longo desse trabalho faz-se
necess´ario o conceito de grupo de (co)invariantes de um RG−m´odulo.
Defini¸c˜ao 2.1.2. SejamGum grupo eAumRG−m´odulo (`a esquerda). Ogrupo de invariantes de A, denotado por AG,´e definido por:
AG ={a∈A| g·a=a,∀ g ∈G},
e o grupo de coinvariantes de A, denotado por AG,´e definido por: AG=A/hg·a−a| g ∈G ea ∈Ai.
Observa¸c˜ao 2.1.2. (1) Se a a¸c˜ao deG sobreA´e a trivial, isto ´e, g·a=a, para todo a∈A e todo g ∈G, ent˜ao AG=A=A
G.
(2) Temos que toda G−a¸c˜ao sobre A induz a G−a¸c˜ao trivial sobre AG e A G
e assim, tanto AG quanto A
G s˜ao RG−m´odulos triviais. E ainda, AG ´e o maior
subm´odulo de A no qual G atua trivialmente e AG ´e o maior quociente de A no
qual G atua trivialmente.
(3)SeA ´e um RG−m´odulo, considerandoR comoRG−m´odulo trivial, pode-mos definir sobre HomR(R, A) uma G−a¸c˜ao (denominada a¸c˜ao diagonal) de
modo a torn´a-lo um RG−m´odulo da seguinte forma:
G×HomR(R, A)→HomR(R, A)
(g, f) 7→ g·f; (g·f)(m) =g·f(m), ∀ m ∈R.
Al´em disso, temos que (HomR(R, A))G =HomRG(R, A), pois:
g ·f =f ⇐⇒ (g ·f)(m) =f(m),∀ m ∈M ⇐⇒ g ·f(m) =f(m),∀ m∈ M Re RG´ −⇐⇒m´odulo trivial g·f(m) =f(g·m),∀ m∈R.
Exemplo 2.1.1. Se A ´e um RG−m´odulo e G = hti ≃ Zn, para algum n > 1,
ent˜ao AG = {a ∈ A| tk·a = a,∀ k = 1, . . . , n} = {a ∈ A| t·a = a}, ou seja,
para determinarmos AG quando o grupoG´e o c´ıclico finito basta sabermos quem
s˜ao os elementos de A fixados pelo gerador de G.
2.2. C´alculo da Cohomologia de Grupos Particulares 34
Demonstra¸c˜ao : Seja . . . −→ Fn ∂n
−→ . . . −→ F2
∂2
−→ F1
∂1
−→ F0
ε
−→ R → 0 uma resolu¸c˜ao projetiva de R sobre RG.
Como o funtor HomRG(−, A) ´e exato `a esquerda ([7], I.8.7), segue que a
seq¨uˆencia
0 //HomRG(R, A) ε ∗
/
/HomRG(F0, A) δ
0
/
/HomRG(F1, A) δ
1
/
/. . .
0
δ−1
O
O
´e exata `a esquerda e da´ı, ε∗ ´e um monomorfismo e Im ε∗ =Ker δ0.Assim,
H0(G, A) := Ker δ 0
Im δ−1 ≃ Ker δ
0 = Im ε∗ T eo. Iso.≃ HomRG(R, A) Ker ε∗
ε∗:monom. ≃
HomRG(R, A)
obs.2.1.2(3)
= (HomR(R, A))G ≃ AG (pois HomR(R, A) ρ
≃ A, com
ρ(f) :=f(1), ∀ f ∈HomR(R, A)).
Portanto, H0(G, A)≃ AG.
Corol´ario 2.1.1. Se A ´e um RG−m´odulo trivial ent˜ao H0(G, A)≃A.
Demonstra¸c˜ao : Segue da proposi¸c˜ao anterior e da observa¸c˜ao 2.1.2(1).
2.2
C´
alculo da Cohomologia de Grupos
Particu-lares
Exemplo 2.2.1. Sejam G = {1} e A um RG−m´odulo. Temos que RG ≃ R e j´a vimos, no exemplo 1.3.2, que 0→R idR
−→ R→0 ´e uma resolu¸c˜ao projetiva de
R sobre RG.
Aplicando o funtorHomR(−, A),obtemos o complexo0→HomR(R, A)→0.
Mas, HomR(R, A)≃A e da´ı, este complexo se reduz a 0→A→0. Logo,
Hi({1}, A)≃
A{1} =A, se i= 0,
2.2. C´alculo da Cohomologia de Grupos Particulares 35
Exemplo 2.2.2. SejamG=hti ≃Zo grupo c´ıclico infinito eAumRG−m´odulo. Vimos, no exemplo 1.3.4, que a seq¨uˆencia
0→RG−→∂ RG−→ε R →0,
com ε a aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao e ∂ a multiplica¸c˜ao por t −1, ´e uma resolu¸c˜ao projetiva de R sobre RG.
Aplicando o funtor HomRG(−, A), temos:
0δ−→−1=0HomRG(RG, A) δ0
−→HomRG(RG, A) δ1=0
−→0
com δ0 a multiplica¸c˜ao por t− 1, pois δ0(f)(x) = (f ◦∂)(x) = f((t −1)x) = (t−1)f(x),∀ f ∈HomRG(RG, A) e ∀ x∈RG.
Como HomRG(RG, A)≃A, a seq¨uˆencia anterior ´e equivalente a:
0δ−→−1=0 Aδ0−→=t−1 Aδ−→1=0 0.
Assim, H1(G, A) = Ker δ1
Im δ0 =
A
(t−1)A = AG e H
i(G, A) = 0, para i ≥ 2.
Logo,
Hi(G, A)≃
AG, se i= 0, AG, se i= 1,
0, se i≥2.
Calculemos os grupos de cohomologia de G≃Z para alguns m´odulos
particu-lares.
(a) Se A´e um RG−m´odulo trivial ent˜ao
H0(G, A) =A=H1(G, A) e Hi(G, A) = 0,∀ i≥2.
(b)SejaA =ZGvisto comoZG−m´odulo com aG−a¸c˜ao natural: tk·(rtk′
) :=
rtk+k′
,∀ tk, tk′
∈G e r ∈Z.
Ent˜ao, H0(G,ZG) = (ZG)G ≃0 (pois tk·tk′
6
=tk′
se tk 6= 1).
Determinemos (ZG)G. Denotemos por I = htk·z −z| tk ∈ G e z ∈ ZGi e x=x+I ∈ZG/I = (ZG)G.
Consideremosy =tk ∈ZGcomk >0.Comotk−1 = (t−1)(tk−1+. . .+t+1)∈
I segue que tk−1 = 0 e assim, y =tk = 1 em (ZG) G.
Agora, se y = t−k ∈ ZG com k > 0, tamb´em temos t−k = 1 (pois t−k =
2.2. C´alculo da Cohomologia de Grupos Particulares 36
Assim, para todox∈ZG, x=r0tk+r1tk+1+. . .+rntk+n comk ∈Z, n≥0 e
ri ∈Z, temos x= (r0+r1+. . .+rn) =r1 onde r=r0+r1+. . .+rn∈Z. Da´ı, H1(G,ZG)≃(ZG)
G ≃Z.
Portanto,
Hi(G,ZG)≃
0, se i= 0,
Z, se i= 1,
0, se i≥2.
Exemplo 2.2.3. SejamG≃Zn e Aum RG−m´odulo. Vimos, no exemplo 1.3.3, que a seq¨uˆencia
. . .→RG−→N RG−→t−1 RG−→N . . .−→t−1 RG−→ε R→0,
tal que ε ´e a aplica¸c˜ao aumenta¸c˜ao, e t−1 e N denotam, respectivamente, a multiplica¸c˜ao por t−1 e 1 +t+. . .+tn−1, ´e uma resolu¸c˜ao projetiva de R sobre
RG. Aplicando o funtor HomRG(−, A), obtemos:
0δ−→−1=0HomRG(RG, A) δ0
−→HomRG(RG, A) δ1
−→HomRG(RG, A) δ2
−→. . .
sendo que δn(f)(x) := (f ◦∂
n+1)(x) com ∂n+1 =t−1 se n ´e par e ∂n+1 =N se
n ´e ´ımpar.
Como HomRG(RG, A)≃A segue que a seq¨uˆencia acima ´e equivalente a:
0δ−→−1=0A−→δ0 A−→δ1 A−→δ2 . . .
onde δ2k=t−1 e δ2k+1 =N, k ≥0.
Portanto,
Hi(G, A)≃
AG, se i= 0,
Ker N Im(t−1) =
Ker N
(t−1)A, se i e´´ımpar, Ker(t−1)
Im N = AG
N ·A, se i e´par.
Em particular, temos:
(a) Se G=hti ≃Zn (n >1) eA ´e umRG−m´odulo trivial ent˜ao (t−1)·a=
t·a−a = 0 e (1 +t+. . .+tn−1)·a =a+t·a+. . .+tn−1·a =n·a,∀ a ∈A,
2.2. C´alculo da Cohomologia de Grupos Particulares 37
Hi(Z
n, A)≃Hi(G, A)≃
A, se i= 0, A
n·A, se i e´par, Ker N, se i e´´ımpar.
ConsiderandoA=Z, com a G−a¸c˜ao trivial, obtemos:
Hi(Z
n,Z)≃Hi(G,Z)≃
Z, se i= 0, Z
nZ ≃Zn, se i e´par,
0, se i e´´ımpar.
(b) Se G={1, t} ≃Z2 e A=Z´e visto como Z(Z2)−m´odulo com a G−a¸c˜ao:
1·r :=r e t·r :=−r,∀ r ∈Z, temos que (t−1)·r =t·r−r =−r−r=−2r e
(1 +t)·r=r−r = 0,∀ r ∈Z. Da´ı, Ker N =Z, Im(t−1) = (t−1)·Z= 2Z,
Ker(t−1) = 0 e Im N = (1 +t)·Z= 0. Logo,
Hi(Z
2,Z)≃
ZZ2 ={0}, se i= 0,
Z
2Z ≃Z2, se i e´´ımpar,
0, se i e´par.
Finalizando esta se¸c˜ao, apresentamos a seguinte aplica¸c˜ao `a teoria de grupos
c´ıclicos finitos:
Proposi¸c˜ao 2.2.1. Se G≃Zn ´e um grupo c´ıclico finito (n˜ao trivial) ent˜ao n˜ao
existe resolu¸c˜ao projetiva de Z sobre ZG de comprimento finito.
Demonstra¸c˜ao : Suponhamos que exista
0→Fk →Fk−1 →. . .→F1 →F0 →Z→0
resolu¸c˜ao projetiva de Z sobre ZG de comprimento finito. Ent˜ao, usando esta
resolu¸c˜ao, temos que Hi(G,Z) = 0, para i > k. Mas, vimos no exemplo 2.2.3(a),
que Hi(G,Z) ≃ Z
n se i ´e par, para todo i ≥ 2, o que nos d´a uma contradi¸c˜ao,
uma vez que a cohomologia do grupo G≃Zn independe da resolu¸c˜ao escolhida.