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A pontencialidade educativa da pena de prestação de serviços à comunidade

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Academic year: 2017

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MESTRADO PROFISSIONAL EM PODER JUDICIÁRIO FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO

GENICY DE ARAÚJO SENA

A PONTENCIALIDADE EDUCATIVA DA PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

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GENICY DE ARAÚJO SENA

A POTENCIALIDADE EDUCATIVA DA PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

Dissertação para cumprimento de requisito à obtenção de título no Mestrado Profissional em Poder Judiciário da Fundação Getúlio Vargas – Escola de Direito do Rio de Janeiro.

Área de concentração: Direito Penal

Orientador: Prof. Dr. Thiago Bottino

Rio de Janeiro

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Sena, Genicy de Araújo

A Potencialidade educativa da pena de prestação de serviços à comunidade

Genicy de Araújo Sena – 2012.

Dissertação (mestrado) – Escola de Direito

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MESTRADO PROFISSIONAL EM PODER JUDICIÁRIO FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO

Dissertação de Mestrado

A POTENCIALIDADE EDUCATIVA DA PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

Elaborado por Genicy de Araújo Sena

Professor Orientador Dr. Thiago Bottino

Aprovado e aceito como requisito para a obtenção do certificado de Pós-Graduação

Strictu Sensu , nível de Mestrado Profissional em Poder Judiciário.

Rio de Janeiro, ____/_____/ 2012.

Prof. Doutor

Prof. Doutor

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AGRADECIMENTOS

Ao Deus que habita no meu ser À Fundação Getúlio Vargas Ao meu orientador Thiago Bottino

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“A simples consciência, mas empiricamente determinada, da minha própria existência prova a existência dos objetos no espaço fora de mim”

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RESUMO

Este trabalho objetiva constatar se a pena de prestação de serviços à comunidade, quando aplicada, tem um papel educativo junto ao infrator beneficiário da medida, seja como substituta da pena privativa de liberdade, após a condenação, seja como medida alternativa, após transação penal em sede do Juizado Especial Criminal. Com base no conceito de educação apresentado pelo professor Paulo Freire, busca identificar, através de entrevistas com beneficiários, se existe um trabalho conscientizador ( mediante troca de experiências e atividades educativas) desenvolvido pelas instituições receptoras dos beneficiários da medida e, se a reinserção imediata do infrator na sociedade viabiliza essa conscientização sobre a sua conduta criminosa. Assim, pretende constatar se a referida medida tem apenas um caráter punitivo ou vem desenvolvendo uma função educativa durante a sua execução.

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ABSTRACT

This study aims to determine whether a sentence of community service, when applied, have an educational role by the offender as beneficiary or as a substitute for the sentence of imprisonment, upon conviction, either as an alternative, after transaction criminal headquarters of the Special Criminal Court. Based on the concept of education presented by Professor Paulo Freire, seeks to identify, through interviews with beneficiaries, if there is a work conscientizing (through an exchange of experiences and educational activities) developed by the institutions which are sent and if the immediate reintegration of the offender in society enables this awareness of their criminal conduct. So, you want to see if the measure has only a punitive or has developed an educational function during its execution.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

CAPITULO 1...13

1.1 A ESTRUTURA NORMATIVA DO SISTEMA PENAL...13

1.1.1 A operacionalidade racional das normas penais...13

1.1.2 Críticas ao discurso Jurídico –Penal...22

1.2 TEORIAS DA PENA...26

1.2.1 Teoria da retribuição...26

1.2.2 Teoria da prevenção...28

1.2.3 Teoria unificadora...31

1.3 CRITICAS ÀS TEORIAS DA PENA...33

1. 3.1 Crítica negativa/agnóstica da pena...33

1.3.2 Crítica materialista / dialética da pena...34

1.4. A CRISE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE...35

CAPITULO 2...41

2.1 O SURGIMENTO DAS ALTERNATIVAS PENAIS...41

2.1.1 Pena de prestação de serviços à comunidade...45

2.1.1.1 Aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade...47

2.1.1.2 Vantagens na aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade...49

2.1.2 Participação do Estado e da sociedade na execução da pena de prestação de serviços à comunidade...50

2.1.3 Decisões dos Tribunais Superiores e opiniões dos doutrinadores sobre a função educativa da pena de prestação de serviços à comunidade...54

CAPITULO 3...56

3.1 A CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO SEGUNDO PAULO FREIRE...56

3.1.1 A concepção do diálogo...59

3.2 O RESULTADO DA PESQUISA COM OS INFRATORES PRESTADORES DE SERVIÇOS À COMUNIDADE...65

3.3 A IMPORTÂNCIA DA PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE ANTE O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA...75

CONCLUSÃO...80

BIBLIOGRAFIA...83

ANEXO I...85

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo identificar a função educativa da pena de prestação de serviços à comunidade, aplicada aos infratores das normas penais como alternativa à privação da liberdade, durante o seu processo de execução.

Nesse sentido, procuramos demonstrar no primeiro capítulo, através de um manancial teórico, a estrutura da normatividade do sistema penal com a qual o legislador estabelece as formas de criminalização e punição, ou melhor, o porque punir, quando punir e como punir.

Para o alcance de tal objetivo, o texto foi embasado nos ensinamentos de Luigi Ferrajoli, que compreende a criminalização de condutas como uma tutela de bens que se delineiam sob interesses políticos e jurídicos, o que leva à criação de modelos de justiça justificadores das normas incriminadoras e das suas respectivas penalidades.

Em ato contínuo, apresentamos críticas à estruturação normativa do sistema penal, fundamentadas no pensamento de Eugênio Raul Zaffaroni, o qual considera o discurso jurídico-penal falso ao se dizer responsável pela paz social e pela garantia dos direitos dos homens, em razão da sua incapacidade de ser substituído por outro.

No intuito de complementarmos o referido arcabouço teórico, discorremos sobre as várias teorias da pena – retribuição, prevenção e unificadora - objeto de estudo e de severas críticas pelos teóricos do Direito Penal. Tais teorias demonstram a evolução pela qual a punição tem passado, de mera retribuição pelo injusto (mal) causado pelo criminoso até a prevenção e a hodierna humanização da punibilidade.

Nessa linha, vimos a necessidade de esclarecer a crise da pena privativa de liberdade, concebida pelos doutrinadores da área criminal como fracassada para a ressocialização do criminoso e o consequente surgimento das alternativas penais, entre estas, a pena de prestação de serviços à comunidade.

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que atenda a certos requisitos legais, o retorno imediato ao convívio social, mesmo que em fase de cumprimento de pena.

Em seguida, no segundo capítulo, direcionamos o estudo ao breve histórico da pena de prestação de serviços à comunidade, especialmente, no ordenamento jurídico brasileiro, analisando a sua aplicação disciplinada nos termos do Código Penal vigente e, com alicerce em concepções doutrinárias, referimo-nos às vantagens e à sua função educativa, ressalvando que pouco se tem aprofundado sobre o tema educação. Contudo, Cézar Roberto Bitencourt defende a existência de um caráter pedagógico e não apenas retributivo da medida.

Com base no conceito de educação do professor Paulo Freire, cujo objetivo do ato de educar é, primordialmente, a conscientização do indivíduo e a sua descoberta como agente integrado na sua realidade, que se torna capaz de transformá-la a partir de sua própria transformação, buscamos identificar, no terceiro capítulo, a existência de tal processo educativo durante a execução da pena de prestação de serviços à comunidade, mediante entrevistas com beneficiários prestadores nas instituições cadastradas no Poder Judiciário.

A pesquisa foi realizada em julho de 2011, junto ao III Juizado Especial Criminal e à Central de Penas e Medidas Alternativas, localizados no Fórum Central da Comarca do Estado do Rio de Janeiro, que nos forneceram os dados cadastrais dos infratores entrevistados.

Iniciamos a pesquisa no III Juizado Especial Criminal, onde examinamos autos de processos ( referentes ao ano de 2010 e o primeiro semestre de 2011) e colhemos dados no sistema desse Juízo sobre os beneficiários da medida alternativa. Os funcionários do cartório, escrivã, analistas e auxiliares foram muito atenciosos e colaboraram bastante. Em seguida, na Central de Penas e Medidas Alternativas (CPMA) obtivemos os endereços das instituições para as quais os prestadores de serviços foram encaminhados. Numa lista de dez nomes, conseguimos contactar cinco, que se encontravam em fase de cumprimento da medida.

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Em complementação aos comentários mencionados, discorremos sobre a importância da observação do princípio da dignidade humana e da valoração do trabalho do prestador de serviços à comunidade, relacionando-os com o processo educativo ministrado pelo professor Paulo Freire.

Finalmente, após a análise da pesquisa de campo e do estudo teórico sobre: a estrutura normativa do direito penal; as teorias da pena; a crise da pena privativa de liberdade e o surgimento das alternativas penais, bem como sobre a concepção de educação de Paulo Freire e o princípio da dignidade da pessoa humana, fizemos algumas considerações finais sobre a potencialidade educativa da pena de prestação de serviços à comunidade e a sua efetivação como medida capaz de reinserir o indivíduo infrator no seio comunitário, sugerindo uma relação de responsabilidade mútua entre Estado, Sociedade e infrator, para que este seja capaz de reconhecer-se sujeito transformador de seu meio, de forma consciente e racional.

CAPITULO 1

1. 1 .A ESTRTURA NORMATIVA DO SISTEMA PENAL

1.1.1 A operacionalidade racional das normas penais

A conduta criminosa de modo geral sempre é vista pelos demais indivíduos que compõem o corpo social como uma conduta que deve ser punida, seja por aquele que compõe a massa social, seja pelo que faz parte da cúpula social, isto é, os membros que se encontram na escala maior da organização social como membros do poder público (executivo, legislativo e judiciário).

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identificamos a problemática que se instaura quando refletimos sobre as formas de punição, ou melhor, sobre o porque punir, quando punir e como punir.

Nesse campo de reflexão buscamos embasamento no pensamento de Luigi Ferrajoli ( 2001, pp.325-326), que nos chama a atenção para o fato de que as condutas criminosas não são apenas condutas que se encontram previstas na legislação penal pelo simples sabor do legislador em criminalizar uns comportamentos e outros não.

Para o autor é necessário que se compreenda que a criminalização de condutas não se restringe à tipificação penal de acordo com a técnica e as formalidades exigidas pelo ordenamento jurídico. Entende Luigi Ferrajoli (2001, p.325) que a tutela dos bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal é uma tutela que se delineia sob interesses políticos e jurídicos.

A compreensão desses interesses nos faz compreender também a estrutura normativa do Estado de Direito, bem como a estrutura normativa do sistema penal, ou seja, permite-nos identificar modelos de justiça que justificam as normas incriminadoras e as suas respectivas penalidades, tanto no que tange ao campo estrito do Direito Penal, na positivação de suas normas, quanto às execuções penais administradas pelo Estado.

Segundo Ferrajoli (2001, pp.325-328) o porquê, o quando e o como punir passam por um processo cognitivo de definições de pena, delito e processo Penal a partir da diferenciação entre a legitimação externa e a legitimação interna estruturantes do Estado de Direito.

Considera o autor que, a partir do entendimento do significado da legitimação externa, pode-se identificar modelos de justiça, com a colaboração de doutrinadores que buscam justificativas de imposições em concreto das penas, de interesses que justificam ou não a proibição de certos comportamentos (delitos), e de justificativas das razões para o processamento penal judicial, ressaltando que o Estado de direito tem como característica ímpar a transformação de justificativas externas, para o quando e o como punir, em normas de justificação interna.

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a “ legitimidade externa como juízos de valor ou de dever ser e a legitimidade interna como juízos de fato” ( Ferrajoli, 2001, p.337 ).

Entretanto, no âmbito da legitimação externa os “ princípios e valores são metajurídicos, são juízos de valor ou de dever ser”, mas também são observadas as questões de ordem moral e de justiça( a concepção de justiça, os valores preservados e os costumes numa dada sociedade e num determinado momento histórico).

No que se refere à legitimação interna, as justificativas para as criminalizações e penalizações se encontram amparadas pelo direito positivo e pela validade das normas por ele dispostas, mas não apenas numa “concepção exclusivamente formal de validade.

Desse modo, o autor considera que tal entendimento representa uma “conquista fundamental do pensamento jurídico e político moderno” favorecendo modelos de direito mínimo e garantista.

Nesse contexto, situamos, por exemplo, a aplicação da pena de prestação de serviços à comunidade, cujo objetivo primordial é a punibilidade da conduta criminosa, mas de maneira que tal medida garanta a liberdade ao indivíduo, que é posto imediatamente no seu meio social.

Tal medida tem o escopo de fazer com que ele também contribua com a reprimenda penal, tornando-se, junto à sua comunidade, um participante responsável pela sua execução e fiscalização, e assim, venha a se efetivar uma política criminal mais adequada aos tempos atuais do Direito Penal, em que a leitura de suas normas deve estar submetida à análise dos direitos fundamentais garantidos pelo estado democrático de direito, subordinado aos preceitos e princípios constitucionais.

Assim, explica Luigi Ferrajoli (2001, p. 327) o equívoco do pensamento tradicional :

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direito “válido” e direito “como é”, ou se se prefere entre validade e positivismo do direito. E este equívoco está fundado em uma concepção simplificada da validade, que aplicada aos modernos Estados de Direito resulta, na minha opinião, inadequada.

Entendemos, com o pensamento de Luigi Ferrajoli, que a estruturação normativa de um Estado está calcada numa interação entre justificações de ordem política e justificações de ordem jurídica, tais justificações garantem a legitimidade organizacional do Estado, bem como refletem o tipo de Estado e de Poder exercido nas suas variadas esferas, inclusive penal.

Segundo o autor, no Estado Moderno a concepção das normas não se restringe ao campo formal, mas em razão da superioridade das normas constitucionais, o seu aspecto material tem relevância para regular a formalidade e limitar o conteúdo e o exercício do poder normativo.

Entendemos que a norma válida está fundamentada não apenas no respeito às formalidades para a sua elaboração, mas, também em valorações ético-políticas que deixaram de ser apenas situações fáticas, ou como chama o autor, “ normas fato” e foram pelo Estado de Direito incorporadas no Direito Interno, oferecendo legitimidade interna a estas normas fato, o que as transformou em princípios norteadores da elaboração das normas positivas, que por sua vez limitam a normativação daqueles valores éticos-políticos. Parece haver uma relação recíproca entre limitação normativa e principiológica.

Assim fala Ferrajoli (2001, pp. 329 – 331):

Nos modernos Estados constitucionais de direito, nos quais a validade das normas – assim como das leis, dos regulamentos, sentenças e atos administrativos – reside na sua correspondência não somente formal como também material com normas de categoria superior, que não só regulam as formas senão que estabelecem também limitações de conteúdo ao exercício do poder normativo...

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exatamente da valoração da correspondência do seu conteúdo com o “dever ser” jurídico estabelecido por normas superiores.

Não há apenas uma conferência ao poder Soberano para legislar, do contrário, há também uma limitação a esse Poder, buscando legitimidade às produções normativas.

Nos velhos Estados absolutistas e em muitos dos modernos Estados totalitários as normas acerca da produção de normas, que estão no vértice do ordenamento, limitam-se de fato a conferir ao poder soberano o poder de legislar: nestes ordenamentos seria válida, por exemplo, ainda que injusta, uma lei que conferisse ao soberano o poder arbitrário sobre a vida e a morte, da mesma forma que foram válidas, ainda que manifestamente injustas, as normas acerca dos tribunais especiais para a defesa do Estado criados na Itália durante o fascismo ( Ferrajoli, 2001, p.330).

Para Ferrajoli (2001, p. 326), no Estado de Direito “que possua Constituição rígida minimamente garantista”, as normas devem ser válidas e justas, respeitando os princípios constitucionais de direitos humanos, da igualdade e da estrita legalidade penal, por isso afirma que a validade das normas se estabelece sob condições de leis fundamentais que “incorporam não só os requisitos de regularidade formal, senão também condições de justiça material”.

Ressaltamos que Zafaroni (1989, p. 25-27) critica tal legalidade estrita, considerando-a desrespeitconsiderando-adconsiderando-a pelo direito penconsiderando-al num sentido considerando-amplo, quconsiderando-ando este deixconsiderando-a de tutelconsiderando-ar condutconsiderando-as “vigiadas” por órgãos do Sistema em prol de outras que refletem o interesse das justificações políticas.

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No que tange ao aspecto econômico, podemos dizer que o modelo econômico de um Estado pode influenciar a sua realidade jurídico-política, bem como influenciar o pensamento da sociedade civil, ou seja, a economia pode participar do fenômeno jurídico ( que abrange a positivação das normas a partir dos princípios e valores éticos, políticos, econômicos e culturais preservados por uma sociedade).

Quanto a isso, apresentamos exemplos de decisões e dispositivos legais que acompanham o percurso dos interesses políticos do Estado:

a) aplicação do princípio da insignificância ao crime de descaminho, (art. 334 caput do CP “iludir no todo ou em parte o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria: Pena- reclusão, de 1(um) a 4(quatro) anos.). O art. 20 da Lei 10.522/2002 prevê o arquivamento sem baixa na distribuição dos autos de processos cuja a dívida com o fisco não supera o valor de dez mil reais; além disso, o art. 18 do referido diploma legal estabelece que os valores até 100 reais não serão inscritos na dívida ativa, o que nos leva a crer que os interesses políticos do Estado passam também por questões econômicas e financeiras, uma vez que seus gastos seriam maiores para acionar a máquina do Poder Judiciário;

b) o lançamento definitivo do crédito tributário pela administração pública como elemento normativo do tipo e condição para a deflagração da ação penal nos crimes materiais previstos no art. 1º da lei 8.137/90, conforme dispõe a súmula vinculante n. 24, em decisão do Supremo Tribunal Federal, “ não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1° , incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo” ( Código Penal Brasileiro, 2011, p.1.238), permitindo ao infrator que pague o tributo, se for o caso, e evite as sanções penais, ou melhor, que o problema com o fisco seja resolvido na esfera administrativa, evidenciando também um interesse arrecadatório do Poder Público.

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A tutela do meio ambiente, através da lei 9605/98 que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, representa uma preocupação do legislador nesse sentido.

Ainda, Norberto Bobbio (1995, p. 6) se refere aos direitos humanos de quarta geração, decorrentes dos avanços no campo da engenharia genética, que podem por em risco a existência humana, através da manipulação do patrimônio genético, promovendo mudanças de concepções, inclusive sobre a própria origem do ser humano.

Nessa linha, o nosso ordenamento jurídico dispõe da lei de Biossegurança- 11.105/05, estabelecendo normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados, entre outras tutelas.

Mediante as referências acima mencionadas, ilustramos o quanto o fenômeno jurídico no Estado de Direito é complexo, por isso, não mais está restrito à positivação de normas, que se justifiquem apenas pelos conhecimentos do Direito no seu âmbito estritamente jurídico, isto é, nas justificações internas, porque próprias dessa área do saber.

O fenômeno jurídico vai além de uma simples positivação de normas, pois se encontra num universo mais abrangente, que inclui a figura humana e as variadas gravitações em torno de sua existência tais como, a sua interferência na natureza das coisas e as consequências dessa intervenção para a garantia de sua essência e existência.

Ao voltarmos os olhos para o Direito Penal, certamente, as condutas incriminadas sofrerão a influência dessa realidade externa ao seu campo de conhecimento. Como nos diz Bobbio ( 1995, p. 8), surgirão novos direitos, assim como novas condutas serão incriminadas para tutelar os bens que devem ser preservados para garantir a harmonia entre o Estado e a sociedade como um todo ( setores econômicos, sociais,políticos e culturais) e assim, serão elaboradas, por exemplo, normas para os crimes ambientais, para tutelar direitos dos consumidores, entre outras.

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Na concepção da tradição positivista, a validade da norma está inteiramente ligada à sua existência jurídica, ou seja, a norma válida é um ato normativo conformado com as normas reguladoras de sua produção. Existe, assim, maior preocupação com “as formas do ato normativo de produção” que com “ o significado ou conteúdo das normas produzidas” ( Ferrajoli, 2001, p. 327).

Assim sendo, a validade da norma é considerada no seu aspecto estritamente formal, o que se adequa a ordenamentos legalistas, no qual as normas válidas são aquelas emanadas, simplesmente, da vontade do legislador, isto é do “ legibus solutus ” (Ferrajoli, 2001, p.327).

Percebe-se, então, que a tradição positivista concebe a legitimidade interna das normas justificada por uma racionalidade jurídica, em que norma e validade se identificam no respeito à formalidade do processo de sua elaboração, o que confirma a sua existência jurídica.

Contudo, na concepção moderna do direito, ou melhor, nos Estados constitucionais de direito, a validade das normas não se restringe às formalidades de um processo de elaboração, isto é, estende-se ao reconhecimento da identificação material da norma “com normas de categoria superior, que não só regulam as formas senão que estabelecem também limitações de conteúdo ao exercício do poder normativo” (Ferrajoli, 2001,p. 329).

Essas normas de categoria superior, ou seja, as normas constitucionais respondem pelo dever ser ao qual o mundo do ser deve estar submetido, dando significado aos seus enunciados normativos.

Com o advento dos modernos Estados constitucionais o direito positivo incorporou conteúdos e valores, até então, não considerados na elaboração das normas, justificando-as politicamente:

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(ao trabalho, à saúde, à subsistência, à educação etc.) cujos os destinatários são os legisladores e os demais poderes públicos( Ferrajoli, 2001, p.328).

Desse modo, a legitimidade externa ou justificação política das normas tem destaque nos estados de direito, onde as normas constitucionais são garantidoras de direitos fundamentais, individuais e coletivos, frutos da luta social e política inaugurada com a revolução francesa e com a revolução industrial no século XVIII.

A importância de tal concepção nos remete à compreensão da eficácia e ineficácia das normas, pois como ensina o autor:

as normas vigentes num Estado de Direito podem ser assim, ademais de eficazes ou ineficazes, também válidas ou inválidas, quer dizer juridicamente legítimas, no plano formal, mas não no material... validade e vigência coincidem nos Estados absolutistas que têm como única norma acerca da produção normativa o princípio de mera legalidade... pelo contrário não coincidem nos modernos Estados de direito, que estão dotados de normas acerca da produção normativa que vinculam a validade das leis ao respeito das condições também substanciais ou de conteúdo, destacando-se dentre elas os direitos fundamentais... o Estado de direito caracteriza-se precisamente por esta possível divergência, que é conseqüência da complexidade estrutural das suas normas acerca da produção normativa ( Ferrajoli, 2001,pp. 333-337).

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Para alguns estudiosos, trata-se de um discurso elaborado aos moldes dos diversos interesses que norteiam a formação de um Estado político, o que deve ser visto com olhos críticos, para que possamos assimilar o modo como foi elaborado os seus objetivos e diretrizes.

1.1.2 Críticas ao discurso Jurídico -Penal.

Após a abordagem sobre o Estado de Direito e a sua estruturação voltada para a preocupação com os direitos fundamentais constitucionais como parâmetros e critérios de elaboração de suas normas, inclusive penais, no intuito de proteger e garantir direitos fundamentais como a dignidade humana, apresentamos a crítica de Eugênio Raúl Zaffaroni sobre o discurso jurídico penal que não dá conta dessas garantias.

Eugênio Raúl Zaffaroni (1989, p. 13) tece críticas ao discurso jurídico penal, considerando-o como um discurso falso no que se refere às reais tutelas de bens jurídicos protegidos pelo direito penal, que se diz responsável pela paz social e pela garantia dos direitos dos homens. Segundo o autor, “ o discurso jurídico penal falso é a incapacidade de ser substituído por outro ” .

Para o autor, o discurso garantista ( como forma de defesa dos direitos humanos) também pode ser falso – há um discurso jurídico penal falso quando não dá conta da realidade, onde as mortes, por exemplo, são frutos de ocorrências de situações onde há omissão estatal, do que mesmo resultado de homicídios (Zafaroni,1989,pp. 13-15). Contudo, tal discurso “ pode servir como fundamento para a defesa dos direitos humanos”

Zafaroni entende que o discurso penal está em crise, ou seja, é evidente a falsidade do discurso jurídico penal de tal forma que faz desabar o sistema penal, tal discurso não dá conta de sustentar o sistema, tendo-se como desacreditado. Todavia, parece haver uma incapacidade de substituí-lo, pois ele tantas vezes é o fundamento para a defesa de direitos humanos.

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considerado, ao olhar do sistema penal, pessoa que se autodetermina e ator principal do Sistema,

por pessoa deve-se entender a qualidade que provém da capacidade de autodeterminar-se em conformidade com um sentido ( capacidade que pode ser real ou potencial e, inclusive, pode limitar-se à reunião dos caracteres físicos básicos dos que podem exercê-la). Pessoa é o ator - a máscara do teatro grego o protagonista central da tragédia que decide sobre o “bem” e o “mal” (Zafaroni, 1989, p. 17).

Tais premissas dão coerência e racionalidade ao discurso jurídico penal, o que não ocorre quando se atribui ao sistema penal um exercício de poder desmensurado, pelo simples dizer da lei ou do legislador.

O discurso jurídico penal deve ser passível de realização, ou seja, socialmente verdadeiro, no seu nível abstrato e no seu nível concreto, isto é, o discurso deve apresentar uma adequação de meio e fim, bem como uma adequação operativa.

Significa dizer que, o discurso jurídico penal no seu plano de “dever ser” deve ser possível de “ser”. Não basta que se planifique condutas criminalizadas, é importante que o sistema penal exerça o seu poder de punir a partir de tais criminalizações de forma legítima e racional, e não se torne uma utopia que se restrinja ao plano da abstração do discurso.

Por isso o discurso jurídico Penal não deve ser apenas legal, confundido com um positivismo desprovido da coerência com o social.

Para Zaffaroni (1989, p. 16), “ o Sistema penal mostra-se como um exercício de poder planejado racionalmente, e tal exercício se constrói a partir do discurso jurídico penal, o que também é chamado por ele de “saber penal”.

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O sistema penal é amplo, mas é preciso ser passível de realização, ou seja, “socialmente verdadeiro” e nesse sentido o autor entende que dois níveis de verdade devem ser observados:

a) um abstrato, valorizado em função da experiência social, de acordo com o qual a planificação criminalizante pode ser considerada como o início adequado para a obtenção dos fins propostos ( não seria socialmente verdadeiro um discurso jurídico-penal que pretendesse justificar a tipificação da fabricação de caramelos entre os delitos contra a vida);

b) outro concreto, que deve exigir que os grupos humanos que integram o sistema penal operem sobre a realidade de acordo com as pautas planificadoras assinaladas pelo discurso penal ( não é socialmente verdadeiro um discurso jurídico-penal quando os órgãos policiais, judiciais, do ministério público, os meios massivos de comunicação social, etc. contemplam passivamente o homicídio de milhares de pessoas) (Zafaroni, 1989, p. 18).

Assim, resume o autor, que no discurso jurídico-penal socialmente verdadeiro o nível abstrato do requisito de verdade social poderia chamar-se adequação de meio e fim, ao passo que o nível concreto poderia denominar-se adequação operativa ínfima conforme planificação ( Zafaroni, 1989, p. 18-19).

Zafaroni (1989, p. 26) faz uma crítica ao sistema penal, considerando que este não atua com respeito à legalidade, uma vez que para o autor “ a operacionalidade real do sistema penal seria “ legal” se os órgãos que para ele convergem exercessem seu poder de acordo com a programação legislativa tal como a expressa o discurso jurídico-penal”.

Assim o autor subdivide o principio da legalidade em: legalidade penal e legalidade processual

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punibilidade ( com especial ênfase nos limites da tipicidade, a ponto de se tentar uma distinção entre “tipo sistemático” e “tipo garantia”);

b) legalidade processual ( ou legalidade da ação processual) exige que os órgãos do sistema penal exerçam seu poder para tentar criminalizar todos os autores de ações típicas, antijurídicas e culpáveis e que o façam de acordo com certas pautas detalhadamente explicitadas ( Zafaroni, 1989, p. 21-22).

Nesse sentido, entendemos que o autor nos ensina que há necessidade de uma complementariedade entre o discurso-jurídico penal formal, ou seja, suas normas positivadas e o discurso-jurídico penal socialmente verdadeiro, para que possa se inferir a legitimidade do sistema penal, não permitindo que tal legitimidade seja “ suprida pela legalidade” (Zaffaroni, 1989,pp. 24-27).

Na concepção de Zaffaroni o Sistema penal não é a única forma de controle social punitivo. Existem condutas não disciplinadas por normas penais formais que são controladas hodiernamente por outros órgãos do Poder Público, que fazem parte de um sistema penal à margem da legalidade exigida para as normas penais incriminadoras, condutas estas que também são estigmatizadas pelos controles sociais penais . Desse modo, o direito penal renuncia à legalidade, o que não é dito pelo discurso jurídico - penal.

a própria lei renuncia à legalidade”, pois “o saber jurídico só se ocupa da legalidade das matérias que o órgão legislativo quer deixar dentro de seu âmbito e, enfim, de reduzidíssima parte da realidade que, por estar dentro desse âmbito já delimitado, os órgãos executores decidem submeter-lhe (Zaffaroni, 1989, p. 22).

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ou discuti-las” são exemplos de condutas vigiadas e que podem ser punidas e estigmatizadas (Zaffaroni, 1989,pp. 23-24).

O discurso jurídico- penal que se diz abarcar as condutas criminosas, torna-se flexibilizado e falso, diante de uma realidade que inclui condutas não abrangidas pelo sistema penal estrito, pois este seletivamente planifica criminalizações permitidas por outros órgãos do sistema penal “amplo”, tais como:

do Executivo quando fiscaliza uma conduta transgressora no trânsito, a escola que discrimina por classificações de melhores alunos, os hospitais dos loucos postos para separá-los do convívio social não permitido pelo seu estado doentio e diferente da normalidade (Zaffaroni, 1989, p.27).

Com esse esboço teórico sobre a estrutura normativa do sistema penal, pretendemos enfatizar que as condutas criminalizadas são frutos de justificações externas (políticas) e internas (jurídicas) numa relação de complementariedade que influenciam as escolhas do legislador para a elaboração de tipos penais conformados com o momento histórico, político, econômico e cultural de dada sociedade.

Compreendemos, além disso, que a elaboração do discurso jurídico-penal está calcada nessas influências políticas e jurídicas e que não abarca as condutas criminosas como um todo, visto que o Direito Penal não dá conta de, por si só, exercer o controle da criminalidade, pois outros setores da sociedade podem desempenhar esse mister.

Assim sendo, o espaço oferecido às medidas alternativas, em especial, à pena de prestação de serviços à comunidade, vem validar um novo modo de ver a conduta criminosa e a sua punição, o que exploraremos em capítulos posteriores.

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1.2. TEORIAS DA PENA 1.2.1. Teoria da retribuição

A pena é uma sanção post delictum que legitima o direito penal “ é uma sanção cominada ab malum actionis “ , ou seja, é aplicável após a prática de um delito. A pena representa uma conseqüência do delito, por isso não se pode dizer que é uma medida preventiva, mas sim retributiva, não se caracteriza como “ um prius, senão um posterius”. (Ferrajoli, 2001, p. 239).

Para Hans Kelsen existe um “ nexo conseqüencial entre ilícito e sanção”, ou seja , há uma relação de imputação ( Ferrajoli,2001,p. 238) que, a nosso ver, parece silogística, pois a relação de imputação é uma relação causal, no sentido de que a conduta criminosa gera um efeito jurídico , que é a pena.

Por isso, a máxima do direito penal nulla poena sine crimine, isto é, a premissa para a aplicação da pena é a existência de um delito. Esse é o seu sentido retribucionista e também garantista, segundo Ferrajoli, pois numa leitura inversa de tal princípio, extrai-se a norma prescrevendo que, somente se existir uma conduta criminosa é que se deve aplicar uma pena.

Porém, o autor nos ensina que o entendimento sobre a teoria retributiva da pena passa pela compreensão da definição de delito, isto é, “ o quando punir desemboca consequentemente na da definição de delito, ou na das condições de uso e aplicação do conceito de “delito” (Ferrajoli,2001, p. 340).

Para o autor, de acordo com a concepção formalista, os delitos são aqueles previstos na lei, conforme o princípio nullum crimen sine lege e são os pressupostos da pena, isto é, são quia prohibita. Na concepção substancialista o delito é não apenas oriundo de uma previsão legal, mas também está relacionado a elementos extrajurídicos, de tipo moral e social, por exemplo, o que o autor chama de quia peccata. (Ferrajoli,2001, p. 342).

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para a existência de um delito e para a aplicabilidade de uma pena é certamente necessária a previsão de um e de outra por parte da lei penal, e, mais precisamente, a proibição do primeiro e a prescrição da segunda, de acordo com os três princípios clássicos nulla poena sine crimine, nullum crimen sine lege e nulla poena sine lege ( Ferraloli, 2001 p. 344).

Para Ferrajoli tal teoria caracteriza a pena como um dever metajurídico, ou seja, está fundamentada em si mesma, representando uma reação ou retribuição ao delito cometido, no sentido de castigar o indivíduo delinqüente.

Nesse contexto, a função da pena é de realizar a justiça, devolvendo ao autor do delito um mal proporcional à sua conduta criminosa, pois assim expiará a sua culpa, visto que o homem precisa ter a capacidade de discernir o justo e o injusto. Assim, a pena gera um sofrimento que parece penitenciar um pecado cometido pelo homem, o que Ferrajoli chama de quia peccatum.

O filósofo Hegel, defensor da referida teoria, entendendo que a pena representa a negação da negação, ou seja, o sujeito ao delinqüir nega a ordem social e jurídica, ele deve ser reprimido de maneira que se restabeleça a ordem negada, ordem esta que representa a vontade geral.(Cirino, 2008 apud Hegel p.463).

Todavia, há quem entenda que a pena como retribuição de um mal, ou injusto penal, no sentido de expiação de culpa, representa uma crença , um ato de fé, e o Direito Penal num Estado Democrático de Direito deve tutelar e garantir bens jurídicos e não se apresentar como um meio de vingança. A culpa não tem que ser penitenciada, pois ela é o limite da aplicação da pena, isto é a culpabilidade não deve ser o fundamento do atuar punitivo do Estado e sim limitar essa atuação como forma de garantir os direitos fundamentais do indivíduo frente ao Estado( Cirino, 2008, p. 459-464 ).

1.2.2 Teoria da prevenção

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O poder punitivo do Estado absolutista que se centrava no corpo do infrator cede lugar para a punição “sobre a alma, sobre o psique”. Assim, a coação psicológica (intimidação) ou física ( segregação) busca atingir a razão do sujeito infrator de maneira que seja capaz de controlar os seus impulsos ao crime, identificando as vantagens e desvantagens da prática do delito (Bitencourt apud Bustos Ramirez e Hormazabal Malarée, 2006, p 128).

Feuerbach foi um dos representantes da teoria relativa ou preventiva, entendendo que a pena tem uma função intimidatória e segregadora. Significa dizer que o Estado tem o dever de promover a segurança da sociedade e para isso, diante das condutas criminosas usa de seu poder de coação psicológica (intimidação) ou física (segregação), fazendo com que a pena sirva de intimidação para outras condutas delituosas, dirigida assim para a sociedade como um todo, e aplicada diretamente ao infrator, também com a finalidade de prevenir uma nova conduta criminosa (Cirino, 2008, p. 467).

Conforme ensinamento do professor Cezar Roberto Bitencourt a finalidade precípua da pena nesta teoria é preservar o grupo social, isto é, a aplicação da pena previne a pratica de novos delitos e inibe a reincidência, caracterizando-se como útil à ordem social (Bitencourt, 2006, p.121).

As teorias relativas da pena apresentam considerável diferença em relação às teorias absolutas, na medida em que buscam fins preventivos posteriores e fundamentam-se na sua necessidade para a sobrevivência do grupo social. Para as teorias preventivas, a pena não visa retribuir o fato delitivo cometido e sim prevenir a sua comissão. Se o castigo ao autor do delito se impõe, segundo a lógica das teorias absolutas, quia peccatum est, somente por que delinquiu; nas teorias

relativas à pena se impõe ut ne peccatur, isto é para que não volte a delinqüir

(Bitencourt, 2006, p. 121).

A teoria da prevenção apresenta duas funções específicas da pena, a prevenção geral e a prevenção especial.

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liberal, onde neste pugnava-se pela não intervenção do Estado na sociedade, o que abriu espaço para o individualismo exarcerbado e impulsionado para a “irracionalidade nas relações sociais”. (Bitencourt, 2006, p. 124).

Juarez Cirino dos Santos ( 2008, p. 466) nos diz que a prevenção geral como função da pena visa evitar futuros crimes, ou seja, o Estado atua diante da conduta criminosa de maneira que a punição se torne um exemplo para toda a sociedade e que os indivíduos sejam desestimulados a praticarem crimes pelo fato de serem ameaçados pela aplicação de uma pena. Alerta, o autor, sobre a existência de uma dimensão negativa e positiva da prevenção geral.

Na sua dimensão negativa há uma forma tradicional de conceber a sua função, que coagindo psicologicamente o infrator, intimida-o diante das praticas delituosas(Cirino apud Feuerbach, 2008, p. 467).

No que concerne a prevenção geral positiva, trata-se de uma visão pós-moderna sobre a função da pena, que se define como “integração/prevenção”. Segundo Juarez Cirino dos Santos existem duas concepções importantes sobre a prevenção geral positiva, de Roxin e de Jakobs ( Cirino, 2008, p. 467):

ROXIN define a chamada integração/prevenção como demonstração da inviolabilidade do Direito, necessária para preservar a confiança na ordem jurídica e reforçar a fidelidade jurídica do povo, destacando uma tríplice

superposição de efeitos político-criminais: primeiro, o efeito sócio-pedagógico de exercício em fidelidade jurídica, produzido pela atividade da justiça penal;

segundo, o efeito de aumento da confiança do cidadão no ordenamento jurídico

pela percepção da imposição do Direito; terceiro, o efeito de pacificação social

pela punição da violação do Direito e, portanto, solução do conflito com o autor.(Cirino,2008,p. 468).

JAKOBS ...a pena criminal definida como prevenção geral positiva realiza a

função de afirmar a validade da norma penal violada; por outro lado, a norma

penal reafirmada pela pena criminal, é definida como bem jurídico – penal ...demonstração da validade da norma, manifestada através de reação contra a

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seres humanos, como exercício (a) de confiança na norma, necessário para saber o que esperar na interação social, (b) de fidelidade jurídica pelo reconhecimento da pena como efeito da contradição da norma e, finalmente (c) de aceitação das conseqüências respectivas, pela conexão do comportamento criminoso com o dever de suportar a pena. (Cirino, 2008,p. 468).

No dizer de Jescheck, a pena confirmaria a vigência da norma penal, pois teria o escopo de “ neutralizar o efeito do delito”, ou seja, o injusto causado à comunidade e assim, o sentimento de justiça daqueles que cercam o delinquente estaria satisfeito ( Franco apud Jescheck, p. 889).

Quanto à função de prevenção especial da pena, tal concepção preponderou no Direito penal nos séculos XIX e XX. O direcionamento da pena voltou-se, especialmente, para o delinqüente, buscando prevenir a sua reincidência.

A prevenção especial se define no momento em que o juiz mediante uma sentença criminal aplica a pena, respeitando os requisitos estabelecidos no direito penal ( art. 59 CP) para o estabelecimento da medida punitiva necessária e suficiente para a prevenção do crime, que será executada, objetivando a integração harmônica do condenado. (Cirino,2008, pp. 464-465).

No entendimento de Juarez Cirino dos Santos, da mesma maneira que a prevenção geral, a prevenção especial também pode ser concebida numa dimensão negativa e positiva.

A função de prevenção especial da pena na dimensão positiva encontra-se assentada no objetivo de ressocialização do sujeito infrator, no intuito de readaptá-lo à sociedade. Seria uma função corretiva do criminoso “ realizada pelo trabalho de psicólogos, sociólogos, assistentes sociais...durante a execução da pena”. (Cirino, 2008, p.465).

Na dimensão negativa, a prevenção especial está voltada para a intimidação do sujeito infrator, objetivando que nele seja despertado o desejo de não mais delinqüir. A função de prevenção especial negativa da pena tem como escopo “a neutralização ou inocuização” do criminoso. A privação de liberdade do condenado, por exemplo, seria uma forma de neutralizá-lo, promovendo segurança social ( Cirino,2008, p. 465).

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1.2.3 Teoria unificadora

As teorias mistas ou unificadas representam teorias modernas da pena criminal, combinando as teorias, da retribuição e da prevenção no sentido de superar as falhas ou deficiências de cada uma dessas teorias, estudadas isoladamente.

Assim, a pena representaria (a) retribuição do injusto realizado, mediante compensação ou expiação da culpabilidade, (b) prevenção especial positiva

mediante correção do autor pela ação pedagógica da execução penal, além de prevenção especial negativa como segurança social pela neutralização do autor e,

finalmente (c) prevenção geral negativa através da intimidação de criminosos

potenciais pela ameaça penal e prevenção geral positiva como manutenção/reforço da confiança na ordem jurídica etc.” (Cirino apud Hassemer, 2008 ,p. 470).

Segundo Juarez Cirino dos Santos, há certa predominância das teorias unificadas tanto na jurisprudência quanto na literatura penal ocidental, mas que, conforme o entendimento do autor, representam uma “síntese moderna de uma antiga posição de compromisso entre partidários das teorias da retribuição e das teorias da prevenção”, encerrando controvérsias entre concepções das escolas penais clássicas e positivistas. ( Cirino,2008, p. 470).

Ocorre que, segundo a análise desse autor, adotar as teorias unificadas significa dar ênfase em certos momentos à retribuição e em outros à prevenção, ou seja, uma não exclui a outra.

Para quem entende que “a unidade das funções repressivas e preventivas da pena” previne futuros crimes, como a ameaça de aplicação da pena, ressaltará a pena como retribuição. Por outro lado, os defensores das normas penais como protetoras “ da liberdade individual e da ordem social, adotarão as teorias preventivas unidas, usando a teoria da retribuição, como um critério limitador da pena”. ( Cirino apud Jescheck/Weigend e Roxin,2008, p. 471).

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outras maneiras de se reagir às condutas criminosas e que podem ser eficazes, é o entendimento do penalista Muñoz Conde:

existem outras formas de reacción social a La criminalidad no oficiales, pero a veces más eficaces que lãs ofciales propriamente dichas, de forma que, igual que sucede con El concepto de criminalidad, El concepto de reacción social frente a La misma excede, por lo menos em La Criminologia, Del plano estrictamente legal para incluirse em un marco más amplio de control social, en El que lo que no se vê ( o no se dice) ES quizás lo que mas importa(Hassemer Winfried y Muñoz Conde, Francisco Introdución a La Criminologia . p. 226).

1.3. Críticas às teorias da pena

As teorias da retribuição e da prevenção da pena representam o discurso oficial sobre as teorias da pena, todavia tal discurso é criticado pelas teorias negativa/agnóstica e pela teoria materialista/dialética da pena, defendidas por Raúl Zaffaroni e Nilo Batista e por Pasukanis, Rusche/ Kirchheimer, Melossi/Pavarini e Baratta (Cirino, 2008, p. 472).

1.3.1 Crítica negativa/agnóstica da pena

Segundo essa teoria no interior do Estado moderno encontram-se os modelos ideais de estado de polícia e de estado de direito, que se excluem reciprocamente.

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A teoria agnóstica enfatiza a negação das funções declaradas pelo discurso oficial sobre a pena, pois para os seus defensores a pena se limita a neutralizar a conduta criminosa, quando da atuação do estado de polícia.

Portanto, há que se definir a pena como um ato de poder político, onde deve se fazer presente a política criminal que objetive “ampliar a segurança jurídica de todos os habitantes”(Cirino,2008, p.474) e essa ampliação passa pelo reconhecimento do delito que se manifesta numa realidade social de luta de classes, ou seja, a política criminal da pena deve estar atenta a articulação das forças produtivas materiais, nas quais estão inseridos os indivíduos produtores de fenômenos sociais, tais como as condutas criminosas.

Nesse sentido, o direito penal não seria único meio de controle social, e talvez não seria o mais eficaz, pois se o poder estatal se estabelece verticalmente, penalizando os indivíduos e renunciando a cognição dos objetivos de ampliação da segurança jurídica de toda a sociedade, apenas aumenta o seu estado de polícia e não dá conta da ressocialização desses indivíduos, por exemplo.

Entretanto, se o estado se coloca numa relação de horizontalidade e democracia, considerando os indivíduos como detentores de direitos humanos que o próprio estado de direito os reconhece como fundamental para a harmonia social, a partir do reconhecimento de suas relações sociais, seja como forças produtivas seja como determinantes de relações de produções históricas, ou seja, indivíduos que são responsáveis pela economia do estado, quando fazem ou poderiam fazer parte das relações produtivas do estado, bem como são produtores do histórico social quando estabelecem suas relações sociais, sendo a conduta criminosa uma dessas formas de se relacionar com a sociedade e com o estado.

1.3.2 Crítica materialista / dialética da pena

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Para os que professam a crítica dialética da pena, a retribuição da pena é um fenômeno das sociedades capitalistas, onde o poder estatal a partir do seu sistema de produção busca os fundamentos para as penas correspondentes às suas relações produtivas, ou seja, o sistema penal atua de maneira que as forças produtivas do estado sejam preservadas de acordo com seus interesses, assim caracteriza-se o sistema punitivo como um fenômeno social ligado ao processo de produção(Cirino,2008, pp. 477- 479).

A prevenção especial negativa de neutralização do condenado mediante a privação da liberdade, por exemplo, representa a seleção do indivíduo incapacitado para fazer parte do processo produtivo nos padrões admitidos pela sociedade capitalista, o que pode influenciar negativamente a vida real do condenado, pois há sobre ele uma “desclassificação social objetiva”. Há uma “desintegração social do condenado, com a perda do lugar de trabalho, a dissolução dos laços familiares, afetivos e sociais, além do estigma social de ex-condenado”( Cirino,2008, p. 484).

Em relação à prevenção geral da pena, a teoria dialética, entre outras questões, explica que a referida prevenção desestimularia crimes tais como, crimes econômicos, ecológicos ou tributários, mas “ não teria qualquer efeito em crimes impulsivos (violência pessoal ou sexual, por exemplo), próprios da criminalidade comum...”(Cirino,2008, pp. 488-499).

Enfim, segundo essa teoria a determinação da pena está centrada nos objetivos específicos da sociedade capitalista de modo que os meios de produção sejam preservados e as forças produtivas sejam controladas dentro dos padrões estabelecidos pelo sistema econômico, que por sua vez seleciona as condutas a serem penalizadas pelo direito penal. Como exemplo, o tráfico de drogas, onde as forças produtivas desse “comércio” se encontram à margem das forças produtivas padrões reconhecidas pelo nosso sistema econômico.

Percebemos que as críticas às teorias da pena suscitam reflexões sobre os reais objetivos punitivos do Direito Penal em relação aos objetivos políticos, que buscam a sustentação do Estado punitivo, mas também, político e econômico, que subordinam a conduta dos indivíduos aos seus parâmetros e padrões comportamentais.

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1.4. A Crise da pena privativa da liberdade1

A história conheceu inúmeras penas, com o objetivo de castigar e intimidar o condenado. Essas penas, caracterizadas pela barbárie e crueldade, quando aplicadas, serviam também de exemplos para a sociedade e àqueles que pretendessem ou tentassem enveredar pelo caminho do crime. As penas de galés, as torturas, os açoites, os trabalhos forçados e o banimento são exemplos de penas que, desde os tempos mais remotos da história da humanidade, foram infligidas sobre o corpo do apenado. Contudo, a pena de morte era a pena aplicada por excelência (Cordeiro, 2003, pp.1-3)

Pedro, discípulo de Jesus, afirma aos juízes da Palestina: ‘havendo eu recebido autorização dos sacerdotes, encerrei muitos dos santos nas prisões; e contra estes dava meu voto quando os matavam ( AT. 26, 10 ).’ (NOVO Testamento: Atos, 26 -10)[Damiens fora condenado, em 2 de março de 1757], a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris [aonde devia ser] levado e acompanhado numa carroça, de camisola, carregando uma tocha acesa de duas libras; [ em seguida ], na dita carroça, na praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será atenazado nos mamilos...(Foucault, 2003, p. 9).

As mudanças sócio-políticas e econômicas na história das sociedades promoveram evoluções no pensamento humano,2 e essas evoluções, por sua vez, promoveram

1 O texto referente a este tópico foi retirado, com algumas modificações, da monografia apresentada, pela autora

deste trabalho, no Bacharelado de Direito da UCP (Universidade Católica de Petrópolis).

SENA, Genicy de Araújo. Prestação de Serviços à comunidade: novos valores, novas condutas. Monografia para conclusão do Bacharelado em Direito – UCP, 2006, pp 6-12.

2 A partir do Iluminismo, com a propagação dos ideais de democracia, liberdade e dignidade humana, e com o

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consideráveis transformações na concepção punitiva do Poder, ou seja, a relação dialética, entre sociedade e produção de conhecimento, acarretou, gradativamente, novas formas de punir. A prisão foi ganhando espaço e se tornando o novo modelo de punição no lugar da vingança privada. Os ideais que nortearam a nova forma de punir tiveram como base, inicialmente, os princípios do isolamento e da disciplina. O condenado passou a ser controlado e vigiado permanentemente (Foucault, 2003, p.194)

Em Vigiar e Punir, Michel Foucault critica o poder de punir, observando que o objeto da punição deixou de ser o corpo do condenado e passou a ser a sua alma e que a prisão veio representar um novo mecanismo de punição legal que justifica o Poder do Estado sobre os indivíduos. John Howard3 (1726-1790) sugeriu o isolamento noturno e a religião como instrumentos regenerativos do apenado; Jeremy Bentham4 (1748-1832), em 1791, propôs a construção do Panóptico5 que, segundo Foucault, representa as bases arquitetônicas das prisões modernas ( Foucalt, 2003, pp. 195 – 214).

O jornalista Luís Francisco Carvalho Filho, na sua obra A Prisão, menciona, como exemplos importantes da estrutura prisional, dois sistemas penitenciários desenvolvidos nos Estados Unidos no final do século XVIII e nas primeiras décadas do século XIX: a Penitenciária da Filadélfia e a Penitenciária de Auburn. A primeira, impunha aos prisioneiros o isolamento na cela 24 horas por dia, objetivando estimular o remorso, o arrependimento, a meditação e a oração, pois a única leitura permitida era a da Bíblia; a segunda, impunha aos condenados o isolamento celular noturno, mas com trabalho diurno e refeições em comum. O silêncio era absoluto e a vigilância permanente: os presos estavam proibidos de conversar entre si e trocar olhares; só podiam se dirigir aos guardas depois de autorizados e em voz baixa. Acreditava-se que, a imposição de rotinas, o estímulo à reflexão, ao trabalho e ao arrependimento, bem como a imposição de disciplina e o castigo físico para quem Montesquieu (1869-1755), com a obra O Espírito das Leis, sistematizou a teoria da divisão dos Poderes do Estado; John Locke (1632-1704), no Segundo Tratado do Governo Civil, ofereceu base para a elaboração da Constituição dos EUA; Jean Jaques Rosseau (1712-1778), no Contrato Social, criticou a burguesia e a propriedade privada, como raízes da infelicidade humana” - Educar: programa de estudo e pesquisa. São Paulo: Difusão Cultural do Livro, 2003, p. 233-234.

3 “com experiência pessoal de xerife na Grã-Bretanha e de visitante de muitas prisões européias, formula em

1777 uma série de críticas à realidade da época. Propõe a criação de estabelecimentos especiais para o

cumprimento das penas”. CARVALHO FILHO, Luís Francisco. A Prisão. São Paulo: Publifolha, 2002, p.23.

4“Filósofo inglês, fundador do utilitarismo. Para Bentham, o utilitarismo é a doutrina que, do ponto de vista moral, considera a utilidade como o principal critério da atividade”. MARCONDES, Danilo; JAPIASSU, Hilton.

Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996, p.23.

5 Em Vigiar e Punir

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desobedecesse às regras do confinamento, contribuiriam para a reconstrução do caráter do delinqüente (Carvalho, 2002, pp. 21-23).

Segundo o jornalista, mais tarde, desenvolveu-se na Europa o sistema progressivo do cumprimento da pena privativa de liberdade. O delinqüente preso se beneficiava da quantidade de trabalho realizado no dia para a duração de sua pena. Tal sistema serviu de modelo para outros ordenamentos jurídicos.

O Brasil, durante a colonização, submeteu-se, inicialmente, às legislações oriundas de Portugal denominadas Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. Nesse período, a pena de prisão era apenas uma medida cautelar e não uma sanção autônoma. Aplicava-se, como definitiva, as sanções corporais e a pena de morte.

Nas cidades e vilas, as prisões se localizavam no andar térreo das câmaras municipais e faziam parte constitutiva do poder local. Serviam para recolher desordeiros, escravos fugitivos e, evidentemente, criminosos à espera de julgamento e punição. Não eram cercadas por muros e os presos mantinham contato com transeuntes. Através das grades, recebiam esmolas, alimentos e informações (Carvalho, 2002, p. 36).

A Constituição de 1824 aboliu as penas corporais, permanecendo apenas para “casos de homicídio, latrocínio e insurreição de escravos” ( Carvalho, 2002, p. 37). Determinou também que:

(...) as cadeias fossem seguras e limpas, e a criação de diversas casas para a separação dos réus de acordo com a natureza dos seus crimes”.

(...)

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Brasil na era da modernidade punitiva, as Casas de correção, no Rio de Janeiro e em São Paulo, inauguradas respectivamente em 1850 e 1852.

(...)

“Com o Código Penal Republicano de 1890 foram criadas outras medidas privativas da liberdade: reclusão, para crimes políticos (em fortalezas, praças de guerra ou presídios militares); prisão disciplinar, para menores vadios até a idade de 21 anos, em estabelecimentos industriais; e prisão com trabalhos, para vadios e capoeiras, em penitenciárias agrícolas (...) Em 1940 é editado o Código Penal (DL 2.848, de 7.12.40), atualmente em vigor (Carvalho, 2002, pp. 37-43).

Assim como em outros países, no Brasil as vagas nas prisões foram se tornando escassas. Um Símbolo dessa realidade:

é a Casa de Detenção de São Paulo, no Carandiru, chegando a hospedar mais de 8 mil homens, apesar de só ter 3.250 vagas. Inaugurada em 1956 para presos à espera de julgamento, sua finalidade se corrompeu ao longo dos anos, pois a Casa de Detenção passou a abrigar também condenados. O governo estadual anunciava desativá-la em março de 2002. Batizou a iniciativa de ‘fim do inferno’ e prometia remover mais de 7 mil presos para 11 novos presídios, menores e longínquos (Carvalho, 2002, pp. 43-44).

Essa casa ficou conhecida, mundialmente, segundo o jornalista, “pela miséria de seu interior e pela extensa coleção de motins, fugas e episódios de desmando e violência, sobretudo o massacre dos 111 presos em 1992, pela Polícia Militar” (Carvalho, 2002, p. 44).

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questões criminológicas, que buscaram pesquisar métodos para um novo sistema de penas, adequadas aos diferentes tipos penais e aos variados tipos de infratores.

Cesare Beccaria, na sua obra Dos Delitos e das Penas, já havia criticado a parca dedicação ao exame e combate à crueldade das penas e irregularidades dos procedimentos criminais e os diversos problemas relacionados com a prisão, as torturas e a desproporção entre o delito e a pena. Considerando o fracasso dos propósitos da pena privativa de liberdade, na ressocialização do infrator (Beccaria, 1999, pp. 11-29), o mestre Beccaria concluiu que:

A pena não deve ser a violência de um ou de muitos contra o cidadão particular, devendo ser essencialmente pública, rápida, necessária, a mínima dentre as possíveis nas circunstâncias ocorridas, proporcional ao crime e ditada pela lei (...). É necessário evitar associar à palavra Justiça a idéia de algo real, como força física ou ser vivo. Ela é mero modo de conceber dos homens, o que influencia infinitamente a felicidade de cada um (Beccaria, 1999, p. 28).

O Direito Penal moderno acreditou na prisão como uma forma mais eficaz de realizar todas as finalidades da pena, isto é, penalizar o apenado retribuindo-lhe o mal cometido com a prática do delito, bem como reabilitá-lo. No entanto, segundo Cezar Roberto Bitencourt, esse mal necessário e principal resposta penológica atrai as críticas e posições pessimistas sobre os seus resultados, pois a prisão está em crise e “abrange também o objetivo ressocializador da pena privativa de liberdade...a sua absoluta ou relativa impossibilidade de obter algum efeito positivo sobre o apenado”( Bitencourt, 2002, p. 1-2).

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As reprovações iniciais fazem-se somente contra as penas de curta duração e tiveram seu marco fundamental com o Programa de Marburgo de Von Listz, em

1882. Sua incapacidade para exercer influxo educativo sobre o condenado, sua carência de eficácia intimidativa diante do delinqüente entorpecido, o fato de retirar o réu de seu meio de vida, obrigando-o a abandonar seus familiares, os estigmas que a passagem pela prisão deixam no recluso são alguns dos argumentos que apóiam os ataques que se iniciam no seio da União Internacional de Direito Penal

( Congresso de Bruxelas de 1889) ( Bitencourt, 2000, p. 2)

CAPITULO 2

2.1 O SURGIMENTO DAS ALTERNATIVAS PENAIS

Em 1926 a Rússia dispôs em seu Código Penal a prestação de serviços à comunidade, representando esta uma das primeiras penas alternativas. A pena de trabalhos correcionais (código russo de 1960), é um outro exemplo, cujos trabalhos eram cumpridos no domicílio do condenado, com a fiscalização do órgão de execução penal (Bitencourt, 2000, p.67).

A Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948, proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, reconhecendo a existência de direitos inerentes ao homem e garantidores de sua dignidade, num sentido amplo e transcendente à sua própria natureza. Na concepção de Luiz Flávio Gomes, a Declaração de 1948 constitui-se uma verdadeira Constituição Ética Universal (Gomes, 1999, p.18). Ratificando a consagração dos valores éticos proclamados pela Declaração dos Direitos Humanos, o disposto no artigo 5º, inciso III, da nossa Constituição, “ninguém será submetido à tortura, nem tratamento ou punições cruéis, desumanas ou degradantes”, é considerado direito fundamental (Gomes, 1999, p. 20).

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fracionada da pena privativa de liberdade ( no Principado de Mônaco, em 1967). Contudo, a Inglaterra se destacou com a pena de serviços comunitários:

O mais bem-sucedido exemplo de trabalho comunitário foi dado pela Inglaterra com o seu Community Service Order, em vigor desde a Criminal Justice Act de 1972, que teve, por sua vez, uma pequena reforma em 1982, diminuindo,

inclusive, para dezesseis anos, o limite de idade dos jovens que podem receber essa sanção penal. O êxito obtido pelos ingleses influenciou inúmeros países, que passaram a adotar o instituto, ainda que com algumas peculiaridades distintas, como, por exemplo Austrália (1972), Luxemburgo (1976), Canadá (1977), Dinamarca e Portugal desde 1982, França, desde 1983 ( Bitencourt, 2000, p. 74).

Outras sociedades da Europa se preocuparam com medidas que representassem uma forma de punir e ao mesmo tempo uma maneira de humanizar a aplicação da pena, no intuito de suprir a deficiência da prisão em ressocializar o delinquente.

A Alemanha revolucionou com ousadia o seu projeto alternativo na reforma de seu ordenamento penal de 1975, apresentando como medidas alternativas: suspensão condicional da pena, admoestação com reserva de pena, dispensa de pena e declaração de impunidade e livramento condicional, além da aplicação de multa. “A prestação de serviços em benefício da comunidade, que não é prevista como pena, é admitida, sem embargo, como condição do sursis, assumindo, em outras palavras, uma forma de execução da pena privativa de liberdade suspensa” (Bitencourt, 2000, p. 75).

A Itália se posicionou sobre o assunto com maior cautela, mas incluiu no Código Zanardelli de 1889 a pena de prestação de obra a serviço do Estado. Contudo, nos dias atuais, as medidas alternativas são previstas fora das normas do Código Penal. Entre tais medidas citamos: prestação de serviço social, regime de prova, regime de semi-liberdade e liberação antecipada.

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às regras no seu modo de vida; na Espanha o arresto de fim de semana em vigor desde 1996, que inicialmente nos anos 70 era apenas uma medida de segurança, passou a ser aplicada como pena autônoma e substitutiva da pena de prisão até 1 ano e mais recentemente, aplicada com o objetivo de “eliminar a prescrição obrigatória de regime de isolamento celular; suprimir a possibilidade de sua conversão em simples prisão domiciliar e impedir a substituição por pena de multa” (Bitencourt, 2000, p. 78).

Como podemos constatar, várias sociedades da Europa se movimentaram e demonstraram a preocupação com a crise da pena de prisão, principalmente, no que tange ao alcance dos seus principais objetivos, punir de forma humanizada, isto é, separando-o do seu meio social, para que pudesse sentir a reprovação de sua conduta e, assim, disciplinar o seu comportamento, ressocializando-se. Como já mencionado, anteriormente, a prisão representou para a modernidade a humanização da pena frente à barbárie dos tempos antigos e medievais.

No Brasil, a reforma do Código Penal de 1940 por intermédio da Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984, viabilizou as alternativas à pena privativa de liberdade, propondo a substituição de penas detentivas por restritivas de direito, modificando-se o art. 43 do Código Penal, isto é, inserindo-se as penas alternativas de prestação de serviços à comunidade, limitação de fim de semana e interdição temporária de direitos. Segundo Cezar Roberto Bitencourt, a Reforma de 1984, ao adotar medidas alternativas para as penas de prisão de curta duração, apresentou avanços elogiáveis na busca da desprisionalização (Bitencourt, 2000, pp. 24-25).

A ONU, em 14 de dezembro de 1990, pela Resolução 45/110, recomendou a adoção das Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não-Privativas de Liberdade – as Regras de Tóquio ( Gomes, p.1999, 22).

Referências

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