..
N9
32ABRIL
1985FAMERJ versus BNH: um estudo de caso sobre movimentos sociais urbanos*
Araci Machado** Silvia Porto***
Sylvia Constant Vergara****
*Trabalho realizado para a disciplina Política Social, do CUrso de ~strado
em Administração PÚblica da Escola Brasileira de Administração PÚblica {EBAP) da Fundação GetÚlio Vargas, ministrada pela
Pro#
Sonia Mlria Fleuty Teixeira. As autoras agradecem a importante colaboração do Sr. Jó Rezende. Presidente daFederação das Associações de M:>radores do Estado do Rio de Janeiro (FAM3RJ). não só no que se refere às infonnações que foram prestadas, coro também pela possibilidade de interpretação dos fatos. à luz de novas linhas de análise.
**Professora da Secretaria de Cultura da Bahia. (Endereço da autora: R. das Margaridas, 239/102 - Pituba - Salvador - Bahia).
***Técnica da Seguridad Social da Argentina. (Endereço da autora: Gal1e e Li-sandro de la Torre, 1978 (1636), Vicente Lope, Buenos Aires, Argentina).
RJ)-:-P~G.
-I - INTRODUÇÃO .••••••..•.••••...••••• .,... 01
11 - A QUESTÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS •.•••.•• 01
111 - O BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO .••.•.•....•.•.•..• 12
IV - A FAMERJ e a política Nacional de Habitação ••••• lS
o objetivo deste trabalho elaborado em agosto de 1984
-é analisar o esforço reivindicatório da FAMERJ em relação à polf
tica habitacional desenvolvida pelo Banco Nacional de
Habita-ção - BNH. Para tanto, consideramos útil:
a) caracterizar os movimentos sociais urbanos (MSU), especialme~
te as associações de bairro;
b) historiar ações e problemas do BNHi
c) analisar
o
caráter político dos MSU em geral e da FAMERJ emparticular.
A
luz da análise então desenvolvida, apresentamos, aofi-nal, nossas conclusões.
2. A QUESTÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS
2.1. Identificação dos Movimentos Sociais Urbanos
MSU sao movimentos que emergem da sociedade civil e cujo
conteúdo básico se dá ao nível de reivindicação, ao Estado, no
sentido de melhores condições de vida urbana. Constituem-se de
pessoas que se agrupam em torno de um elemento de identidade (uma carência compartilhada e percebida corno injusta) e se mani-festam através de ações coletivas, corno possibilidade das
clas-ses populares se fazerem presentes diante da classe dominante
abrindo, para si, um espaço político de atuação. são, pois,
Para Castclls(l), são movimentos resultantes de conjunturas a-través das quais" tlamplos setores da população que não.
necessa-riamente ocupam a mesma posição que a- .classe ope~âria
tradicio-nal na divisã-o social do trabalho, se :unem e se a.rticulam,
vi-sando a defesa de um modo de vida e de. um espaço ~ípicOt ameaç!
do pela voracidade do capital e o burocratismo da
administra-ção" •.
Para Offe(2) , são uma prática e um processo de participação e representação política que, como o corporativismo e a repressão,
vêm substituindo ::l forma de participação política das ma.ssas,
fundamentada e c~nalizada no sistema partidário, já que-este,
por força da comretição política. tem sua .ideologia desradical!
zada, suas bases desativ~das e sua identidade coletiva erodida.
A origem dos MSU é tema de controvérsia entre os autores.
Castells(3). - um dos que mais estudaram essa questão - aponta os seguintes fatores como determinantes do surgimento dos MSU:
a) A concentração do canital e, como ~onseqUincia, a
concentra-ção e centralizaconcentra-ção das unidades e gestão dos meios de produ ção, que concentraram a força de trabalho nas grandes
metró-poles e. conseqüentemente, seus meios de reprodução, isto
é,
os meios de ·consumo.
Há, como resultado desta concentração, uma dependência
crescen-te do consumo ~ndividual em relação ao consumo coletivo. Em
outras palavras: a reprodução da fODça de trabalho já não se di mais em termos individuais. mas em term0S coletivos. Por
exem-plo: a questão do saneamento já não pode ~er resolvida
abrindo-se uma fossa, mas requer uma rede de esgotos;
?
problema detransporte já não pode ser resolvido com a aquisição de um auto ,
-móvel, mas requer a existência de um sistema viárIo •• Em nossa s.2, cicdade, esses meios de consumo coletivo (transporte,
saneamen-I - Veja M. Castells. Crisis urbana y cambio social. México,
Siglo
XXI
Ed., 1981. p.56.
2 - Para uma análise .das causas do declínio do sistema partidário
e sua sub~tituis.ã<? por 0l!-tras práticas de participação e r~
p!esentaçao pol1t1ca, veJa Claus Offe. A democracia parti-daria competitiva e o Welfare State Keynesiano: fatores de·
estabilidade e desorganização.
In:
Revista Dados, Rio deJa
neiro, 26 (1) :35-37, 1983.
to, educação, etc.) estão a cargo do Estado, através de suas p~
líticas sociais.
b) A necessidade do Estado compatibilizar oferta e demanda, o
que, de outra forma, não aconteceria.
Para neutralizar a baixa tendencial da taxa de lucro(4) , é cessário estimular o consumo. Neste sentido, a publicidade,
ne-os
mecanismos de crédito, a elevação do poder aquisitivo e uma
certa organização dos meios de consumo coletivo são
instrumen-tos fundamentais utilizados pelo Estado para o crescimento do
consumo individual.
c) A qualificação da força de trabalho, imposta pela evolução
das forças produtivas estruturadas por relações sociais cap! talistas.
Na medida em que à extração da mais-valia exige trabalhadores
cada vez mais qualificados, fica reforçado o papel estratégico dos meios coletivos de reprodução da força de trabalho (educa-çao, assistência médica, etc.).
d) A mudança de necessidade e expectativas da classe trabalhado ra que altera seu próprio consumo.
o
desenvolvimento das lutas de classes ampliaram as aspiraçõesdos trabalhadores e as reivindicações que lhe sucederam. Em ou
tras palavras: a socialização do consumo trouxe crescente mobi-lização reivindicatória das classes populares no que se refere
ao"s meios coletivos de consumo~ dirigida aos setores
encarrega-dos de sua gestão. especialmente a nível municipal.
Como se pode depreender pela análise de Castells(5) , já que não se pode resolver problemas originados pela sociedade
capitalis-4 - Sobre a baixa tendencial da taxa de lucro e a intervenção do
Estado para neutralizá-la, leia Vicente de Paula Faleiros. A
política social do estado capitalista. são Paulo, Ed. Cor~
tez, 1980. pp. 59-62.
ta a nível individual, a açao toma forma social, para obter os
meios de consumo coletivos. O Estado teria, então, de assumir e~
ses meios: serviços de infra-estrutura, serviços de saúde, esco-las, creches, áreas de lazer, moradia etc. Todavia, o Estado es
tá
também comprometido com o processo de acumulação do capital.Aconseqüência é que, nessa contradição entre reprodução da força
de trabalho e necessidade de acumulação, o Estado responde com
a subordinação da primeira à segunda. Assim, os investimentos pú
blicos são preferencialmente dirigidos para os setores necessi~
rios ~ produção, relegando a nível inferior os serviços
necessá-rios ~ satisfação das necessidades de consumo das classes popul~
res, entendidas como tais o proletariado e outras classes.
Na América Latina, os MSU encontraram grande eXDressao e Evers e
r6J .
outros l . levantam duas hipóteses paTa o fenêmeno: uma, do ponto
de vista econ5mico, e outra, do ponto de vista político.
Do ponto de vista economlCO, a América Latina, além de ser uma
sociedade capitalista, é também dependente. Essa circunstância
faz com que o processo de acumulação tenha características difrentes do processo dos países centrais. Nestes, o capitalismo e-liminou as formas de produção pré-capitalista. Nos países depen-dentes, tais formas de produção pré-capitalista estão preserva-das, criando-se, contudo, novas formas de produção.
Os países dependentes foram industrializados já na era do capit~
lismo monopolista, e não na fase concorrencial. Como expressou Bendisc(7) , a "revolução industrial só ocorreu 'uma vez". Assim, os
países dependentes já começaram sua industrialização numa época
de mais-valia relativa, que não implica mais em extensão da jC1r-nada de trabalho, mas em alta taxa de produtividade, mão-de-obra especializada, baixa absorção de mão-de-obra etc., o que os levou a incorporar tecnologia :r;oupadora de mão-de-obra, cuj a conseqUêg
6 - Veja Evers et alii. In: Mois€s, J. A. Cidade, povo e poder. Rio de Janeiro, Centro de Estudos de Cultura Contemporanea/ Ed. Paz e Terra, 1982.
7 - R. Bendix cunhou essa expressão in Estado Nacional y
cia foi a geraçao da marginalidade urbana. A cidade nao tem con
dições de absorver a mão-de-obra que chega, atraída pelas
ex-pectativas que a comunicação de massa nela desenvolve.
Se a classe trabalhadora
é
heterogênea, a sua unidade, naesfe-ra política, dá-se pela identidade popular, não a nível de sin-dicato, mas a nível de movimentos sociais.
Do ponto de vista político, como a burguesia não tem hegemonia, há necessidade de aliança com as classes populares que são cha madas a colaborar, mas como massa, e não como trabalhadores com consciência de classe. O populismo fomenta a participação e as
classes populares desenv~lvem, então, processos de
reivindica-ção, tendo o Estado como alvo.
MSU formais sao os que têm sua açao organizada por organismos e lementares de representação de amplos setores das classes popu-lares. As associações de bairro são os exemplos mais conhecidos e, apesar da situação competitiva em que o Estado as coloca, P2 dem reunir-se numa associação mais ampla para desenvolverem campanhas comuns a todos os bairros ou para formarem um grupo
maior de pressão política sobre o Estado. A Igreja e outras ins
tituições podem, circunstancialmente, ajudar na mobilização das manifestações, e profissionais liberais podem oferecer
assesso-rias técnicas, talvez, como afirma Cadorso (8) para "dar sentido
político ao seu saber profissional".
MSU não formais sao os que têm sua ação direta e nao organizada
levada a efeito em situação de emergência, com um protesto
a-brupto (quebra-quebra. protestos de rua, saques, etc.) diante
da deterioração de um serviço público diretamente ligado às co~
;dições de vida. Exemplo recente, na periferi~ do Estado do Rio
de Janeiro, foi o bloqueio levado a efeito na Roqovia Rio-Magé, em maio deste ano, pelos moradores do distrito de Imbariê, como protesto pelos sucessivos atropelamentos ali verificados e como
reivindicação pela construção de uma passarela.
8 - Veja Ruth C. L. Cardoso. Movimentos SOC1a1S urbanos:
balan-ço crítico. In: Velasco e Cruz, Sebastião C. et alii. Socie
dade e ~olítica no Brasil pôs-64. são Paulo, Ed.
Brasilien-se, 198 . p. 231.
i
r
I
6
Sejam os movimentos fo~mais ou não formais, em relação a eles a
Imprensa reage de forma ambígua: ou dá ampla cobertura, na tenta
t~va de sensibilizar ~ opinião pfiblica em geral ou de pressio~
nar o Estado para que este atenda às revindicações ou, por
ou-tro lado, pode apenas dar pequenas notas e
at~
mesmoomiti~-se~9)
Uma questão a ser levantada seria quanto ã eficácia dos MSU. Po
demos dizer que 6 um juízo de valor. Depende de como as pessoas
os avaliam. Para uns, por estarem limitadas ã questão do
consu-mo coletivo, não consu-modificarão a sociedade e, neste sentido, sao
reprodutores de suas desigualdades. Para outros, eles abrem um
espaço político que, se pode ou nio modificar a sociedade, lev~
contudo, ã coesão, ao consentimento da opinião pública, ã
cons-ci~ncia de seus interesses, a açoes democráticas, e tudo isso
já é conquista política.
No que se refere ã resposta do Estado aos MSU, podemos dizer
que, embora existam situações extremas, raramente o Estado
sa-tisfaz integralmente ou reprime integralmente os MSU. Geralmen-te ele responde de forma ambígua, utilizando sua estrutura buro crática para decompor a reivindicação e protelar sua solução,ou di vidindo os f>.rSU, pela cooptação de seus membros mais efet i vos.
Nos últimos anos, mais especificamente a partir do começo da dê
cada de 80, os MSU t~m sofrido certas transformações.
Este nao tem ~ido um tema muito estudado at6 o momento: no
en-tanto, já
exist~m
autores como Nunes e Jacobi(lO) , que tentaramanalisar algumas das mudanças mais evidentes nos MSU. O estudo
dos referidos autores parte da crise mundial ã qual consideram
9 - A Seçio Cartas do Jornal do Brasil de 21.6.84, p. 10, publi-cou carta de joão Pedreira Br-asiT:- na qual este se queixa de
não ter nos jornais quaisquer coment~rioi a respeito da
pos-sibilidade de ganho d~ causa para os que recorreram
ã
Justi-ça contra o BNH atraves da FAMERJ. Em contranartida, o
exem-plo ", citado acima no distrito de rmbari~, teve amp:la
cober-tura jornalística, inclusive da Revista Veja, Rio de Janeiro,
Ed. Abril, n9 818, p~ 86, de 9.S.84~ "
10 - Nunes, Edson e Jacobi, Pedro. ~udam-se os tempos ... AbAn~li
se dos Movimentos Sociais Urbanos dos Anos
80.
VIr Encontroassociados os efeitos gerados pelas transformações tecno15gicas, a conjuntura recessiva e o desemprego estrutural.
As crises são duplamente graves nos países subdesenvolvidos já
que, em termos gerais, não contam com políticas sociais, - como
as dos países centrais -, que permitam atenuar seus efeitos, ou
que representem uma defesa para a população frente a essa situa-ção. Por exemplo: nos países centrais existem leis que protegem o trabalhador do possível desemprego tecno15gico, assegurando, o
retreinamento e a manutenção do nível salarial no caso de lhe
ser adjudicada uma outra função. Também conta com o denominado salário-desemprego.
Segundo Nunes e Jacobi há, em curso, duas transformações
funda-mentais produzidas pelos efeitos da crise urbana: a primeira e
..
a incontrolabilidade dos MSU, e a segunda seria a incorporação, aos MSU, da classe média ou dos setores anteriormente acomodados.
Esta última transformação
é
bem evidenciada na formação das assQciações de moradores, em especial da FAMERJ, em sua luta contra a política do BNH.
Também há de se levar em conta a conjuntura brasileira que, nas condições políticas atuais garante, de certa forma, maiores mani festações extra-institucionais do que eram garantidas na década de 70. IlTalvez uma das questões mais relevantes seja o confronto
entre a ~ frágil distância que separa o potencial transformador
desses movimentos e o contexto de explosibilidade social que tem caracterizado a aurora dos anos 80." (11)
2.2. Um Pequeno Histórico das Associações de Bairro no Brasil
Dentre os MSU destacamos as associações de bairro, dado que tais movimentos são o foco deste trabalho. As associações
secaracte-rizam pela vizinhança e pelo policlassismo.
S egun o San Se astIan d b · ( 1 2 ) A S U ,se os ~1 em gera po em 1 d I " ImItar-se a um problema específico (transporte, educação, esgoto, etc.), as associações de bairro assumem problemas múltiplos, desde que se.4-;
jam necessários ã defesa dos interesses do bairro. Podem
também-ter uma ação circunstancial, ou seja, uma veZ solutionado um
problema - satisfatoriamente ou nao - o grupo desaparece0 Ou, ao contrário, podem realizar atividades de caráter permànente. As-sim, elas podem interessar-se pelo tombamento de um prédio ou de uma árvore, podem promover mutirões ou festas espontâneas e
par-ticulares, podem exercer atividades tendentes a participar do
planejamento urbano (por exemplo, a ocupação das áreas desapro-priadas, mas não utilizadas pelo Metrô, no Rio de Janeiro), numa colaboração com a administração local, ainda que esta
colabora-çao, na maioria das vezes, se manifeste como oposição ~
adminis-tração.
Todos esses movimentos têm a finalidade de defender os interes-ses do bairro, entendida tal defesa como "conjunto de bens mate-riais e imatemate-riais que a vizinhança considera indispensável
pa-. 'd b d' ,,(13)
ra VIver uma VI a ur ana 19na .
No Brasil esses movimentos surgiram na década de 1980, porém fo
ram incrementados no p6s-guerra, em são Paulo, e se
desenvolve-ram a partir da década de 1950.
Gohn (14) considera a Sociedade de Amigos da Cidade (SAC) ,
funda-da em 1934, em são Paulo, a primeira entidade surgida com
obje-tivos reivindicat6rios urbanos (avenidas q~e ligassem os bairros
ao centro e a construção do Metrô). No final da década de 1930,
12 - Veja J.M.B. San Sebastian. Notas conceptuales de las
asocia-ciones de vecinos como movimientos sociales urbanos. In: Revista Internacional de Sociologia. Madrid, Consejo Superi-or de Investigaciones Cientificas, Instituto BAtMES de Socio
logia, ~ (21: 20, março/7~)
13 - San Sebastian, J. M. B. op. cito
14 - Gohn, Maria da Glória. Reivindicações populares urbanas. são
com o crescimento populacional de
são
Paulo, as vinte e seis di retorias regionais da SAC sofreram transformações e deram ori-gem às Sociedades Amigos de Bairros(SABs).Em 1937 as SABs sofreram um processo de esvaziamento, mas em
1945 cresceram em número e se expandiram, servindo de canais de representação popular, mas também oferecendo espaços de
manipu-lações pOlíticas pelo Estado, dado que,
à
época, o populismoa-tingia seu auge.
Nos últimos anos, conforme afirma
Gohn~~,
as SABs seexpandi-ram e adquiriexpandi-ram certa homogeneidade pois, na medida em que em
São Paulo são criadas novas periferias, as novas SABs surgem com idênticas reivindicações e objetivos. O movimento pressiona a administração municipal por maior participação da comunidade nos seus problemas.
No Rio de Janeiro, segundo Jó Rezende(16), desde 1950 se tem no
tícia de movimentos comunitários de associações de bairro. Na
década de 1960 essas associações se aglutinaram de forma mais
articulada, com ações mais programadas, notadamente no que se
refere ã luta contra remoções, desenvolvida ~ela FAFERJ,
ex-FAFEG (Federação das Associações de Favelados do Estado do Rio
de Janeiro), que Jó considera "uma das mais belas páginas da
história do Brasil". Entre 1964 e 1977 a FAFERJ - como, de res-to, todos os movimentos populares - sofreu repressão muito
for-te e praticamenfor-te ficou imobilizada. Em ~977 houve a retomada
da movimentação social, com a realização da I Semana de Debate, no Estado do Rio de Janeiro.
Na história dos MSU no Rio de Janeiro podemos considerar, em g~
ral, três momentos históricos relevantes e que se caracterizam'
d e acor o com o lnstante po ltlCO em que e es surgem d . 1'" . 1 (17) " o
15 - Ibidem, p. 56.
16 - Jó Rezende é analista de sistema do SERPRO e o atual
Pre-sidente da FAMERJ.
17 - Informação obtida na estrevista concedida por Jó Rezende, Presidente da FAMERJ.
primeiro momento di-se na d~cada de 50, quando sao organizadas, como jâ vimos, as Associações de Amigos de Bairro, nos chamados
bairros de elite, concomitantemente com o aparecimentos dos
Centros Pró-Melhoramentos nos bairros mais pobres e na
perife-ria da cidade. O cariter reivindicatório, no entanto, difere
de uma para outra associação, sendo que nas primeiras lutava-se
especificamente pela obtenção, de":nielqo:ramentos'_condizentes,,.'com.c
uma classe em ascensão e que defendia o seu espaço urbano, nao
só pela presença dos serviços que seriam essenciais, mas por
todo tipo de benefícios que seriam incorporados a novos tipos de padrões urbanísticos e imóveis. O segundo tipo de associação, no entanto, possuía um cariter assistencialista para uma popula ção carente de todo e qualquer serviço básico, como educação e saúde.
Entre 1950 e 1975, essas associações vao-se desvirtuando pouco
a pouco, a partir do reconhecimento, pelo governo, da sua im
portãncia junto a uma população que luta por melhores condições
de vida, passando a ter seus membros cooptados, de certa forma
manipulados por políticos, formando-se os bolsões ou feudos que
dividem entre si os benefícios que serão oferecidos às comunid~
des em troca de votos. No entanto, se de um lado existe um
sal-do negativo desse períosal-do, que está ligasal-do
à
manipulação eleitQral, de outro a manutenção de certa capacidade de organização e participação da população nas questões públicas pode ser um sal
do posi ti vo o
O terceiro momento desses MSU caracteriza-se por organizações de cunho reivindicatório que aparecem a partir de 1975, quando as lutas populares que vinham, de certa forma, se pautando pelo-seu célráter econômico, passam a abranger o campo político. En-tre 77 e 78 suas preocupaçoes tendem a transformar a correlação de forças que existe entre os grupos sociais e o sistema de
po-der do Estado. Isso tudo corresponde à deflagração do processo
de participação popular que teve início com as lutas pela anis-tia, ao lado das greves dos operirios dos setores mais modernos da indfistria, para eles convergindo movimentos organizados e
au-tônomos que abarcam um número crescente de setores sociais. A e~
sa época corresponde a retomada das atividades da FAFERG e a cri
bi1izações populares contra a carestia, as greves de trabalhado-res rurais, as comunidades eclesiais de base, movimentos feminis tas etc.
Esses movimentos vao crescendo com o nível das organizações e
das suas reivindicações, agora já por uma açao global do Estado, por uma participação na definição de suas políticas, visando nao
só sanar problemas imediatos, mas lutar pela democratização das
decisões e denúncia das irregularidades do Estado, da corrupção
e do controle irracional dos recursos públicos. Esse sentido po
lítico se coaduna perfeitamente com o pensamento de Borja(18). -"Los efectos políticos seran, pués, los resultantes de 1amn modi ficaciôn de la fuerza (cohesion, organización, apoyos externos y consentimiento de la opiniõn pública, consciência de los propios interesses, etc.) de los grupos sociales que han intervenido en
el movimiento y de los aparatos o instituciones a través de las
cuales han desarrollado sua acción".
A FAMERJ, criada em 1978, conta com quinhentas associações repre
sentativas não só de diferentes municípios do Estado do Rio de
Janeiro, como também das diferentes zonas do Município do Rio de Janeiro.
Ela tem quatro níveis de direçao: 19 Assembléia Geral, que se
reúne a cada dois anos; 29 ) Conselho Geral, do qual cada associa
ção participa com dois representantes; 39 ) Conselho
Intermediá-rio, com representações das zonas e dos municípios; 49 )
Direto-ria Executiva, com vinte e um membros eleitos a cada dois anos,
e que têm por função pôr em prática o que é deliberado nas ins
tâncias superiores.
o
financiamento do movimento é feito pelos próprios associados,e os mecanismos de arrecadação de recursos passam pela utiliza-ção do "livro de (luro", promoçao de "bingos", reuniões sociais, reuniões para discussão de algum problema concreto etc.
18 - Borja, J. Movimientos sociales urbanos. Buenos Aires, Arge~
Hoje, a FAMERJ e as associações de bairro discutem prioridades de política, numa postura não de submissão, mas de reivindicação
e pressão. Como afirma Jó Rezende, as associações fazem o "lobby"
e, dependendo dos resultados que alcançam, enaltecem ou desgas-tem publicamente a autoridade governamental. "Se somos um
pobre - afirma Jó - que a nossa pobreza seja socializada e
a teoria venha buscar na nossa luta a sua identidade".
3. O BANCO NACIONAL DE HABITACÃO
---~~~---~~~
.".
pals que
3.1. Um pequeno histórico do BNH, suas açoes e seus problemas
o
Banco Nacional de Habitação (BNH) , criado em 1964 comoautar-quia federal, e transformado em empresa pública em 1971, ropre ... sentando o principal instrumento financeiro do Governo, tem como objetivo atuar nas áreas de habitação, saneamento básico e deseg
volvimento urbano. Exerce, ao mesmo tempo, as funções de órgão
central do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e do Sistema F! nanceiro de SRneamento (SFS) e e sustentado principalmente
pe-los recursos das cadernetas de poupança, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do retorno dos empréstimos.
Até 1972, quando se implanta e se consolida o SFH, grande montag
te das suas ações foi destinado i construção de unidades
habita-cionais para a população de baixa renda, através das COHAB's
(Companhias de Habitação Popular). A excessiva concentração pop~
lacional nas zonas urbanas b as demandas crescentes dessa dinãmi ca social determinam o sempre crescente déficit habitacional pa-ra essa classe, associa.do aos problemas da oferta de serviços ur banos básicos para a população. Assim é que em 1973 foi
formula-do o. Plano Nacional de Habi tação Popular (PLANHAP) que
preten-dia ampliar o número e a qualidade das habitações populares, de
senvolvendo um sistema de infra-estrutura e equipamentos comuni-tários em conjunto com as áreas do Estado e do Município.
Sub-Ha-13
bitação, assim denominadas as edificações destituídas de
condi-ções mínimas de serviços, conforto e salubridade, conhecidas
por "palafitas", "mocambos", "parcelas", "invasões", etc •• So
mados a esse programa mais atual surgem os benefícios do FINSO.: CIAL (Fundo de Investimento Social), criado pelo Governo Federal
€m 25.5.82. Isso faz parte de uma área programática do Banco d~
nominada de programas de sentido social, constituída ainda pelo PROFILURB, cujo objetivo é financiar lotes dotados de
benfeito-rias básicas, como pontos de luz; água e esgoto sanitário, e
o FICAM, que seria o financiamento direto ao adquirente para
a construção, aquisição ou melhoria de habitações chamadas de
interesse social. Ainda estão incluídas aqui as COHAB's de cada Estado ou Município, para onde são repassados diretamente recur sos do Banco.
Além desse programa, ainda existem os Programas de caráter asso
ciativo como a COOPERATIVA, que passa através dos INOCOOPs (In~
tituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais), o PROSINDI,
que funciona através dos sindicatos de classe, o PROJEMP para
as empresas, o INSTITUTO ligado aos Institutos de Previdência Social, ou as Entidades Assistenciais integrantes de estrutura
administrativa da União, dos Estados e Municípios; o PROHASP,p~
ra servidores públicos, as CAIXAS MILITARES, o PROPESC, em con-vênio com a Confederação Nacional de Pescadores e o PLACAR, pa-ra zona rupa-ral.
Além da
ire
a habitacioft81 o B8ftCO desenvolve suas açoes nasreas do desenvolvimento urbano: saneamento e demais programas de desenvolvimento e de operaçoes de apoio técnico-financeiro.
..
a
Apesar de todo o esforço programático e da sua expansao ó e di
versificação, a crise brasileira se estende e impregna seus do-mínios, pelo abalo que vem sofrendo o tripé em que se sustenta
o Banco: a caderneta de poupança, o FGTS e o retorno dos empré~
timos. Por causa do desemprego, os trabalhadores retiram cada vez mais o FGTS e os outros o estão utilizando para amortizar suas prestações mensais. Por causa da concorrência com outros
investimentos, a caderneta de poupança não atrai tanto como se
outro lado, aquela faixa da população que fazia suas parcas
eco-nomias, ou deixou de fazê-lo ou está retirando cada dia mais. E
o pior e mais importante na nossa análise é o problema ligado ao
achatamento salarial. Imposto para combater a inflação, fez com
que os mutuários perdessem a capacidade de pagar suas prestações em dia e mesmo deixassem de comprar as habitações que ainda sao oferecidas pelo Banco, apesar de todos os incentivos para
moti-var os compradores. Esse é talvez o mais grave problema enfrent~
do pelo BNH: a inadimplência, que atingia mais fortemente os se-tores de baixa renda, e que agora se alastra pela classe média,
na medida em que esta perdeu parte do seu poder aquisitivo des
de que seus salários passaram a ser reajustados abaixo da infla-çao.
..
Tendo em vista os graves problemas enfrentados pelas suas
pro-prias fontes de financiamento, o BNH vem adotando políticas esp~
ciais para que, em diversos acordos com os mutuários, possam ser solucionados esses problemas agora comuns. As diversas formas de pagamento e de incentivos para a aquisição da casa própria não
resolveram e sim agravaram o problema. Neste momento(19) 3,4 m!
lhões de brasileiros terão de decidir como enfrentar 0 novo
au-mento da casa própria, estimado em pouco mais de 190% das presta ções atuais, ou então escolher entre os quatro planos alternati-vos apresentados pelo Banco que ofereceu, como vantagem, um au-mento menor em curto prazo em troca da capitalização da diferen-ça. Esse problema não ênovo, pois, no ano passado, por exemplo, o aumento foi 130,4%, maior que o do ano anterior (percentual
que vem crescendo ano a ano), o que faz com que os mutuários se
venham organizando em movimentos contestatórios e até mesmo
re-correndo i Justiça, englobando nesses movimentos não s6 operirios
desemnregados, absolutamente sem di~heiro, como profissionais de
alto nível, amassados pelo arrocho salarial e incapazes de acom-panhar a "virada" das prestações. Mesmo mutuários que têm recur
sos recusam-se a pagar, por considerarem o aumento extorsivo e
também por constatarem que o aumento não se coaduna com as for-mas estipuladas pelo contrato de financiamento da casa própria ,
19 - Veja a Revista Isto
g,
Gazeta Mercantil S.A., Ed.assinado no momento da sua aquisição.
4. A
FAMERJE A POL!TICA NACIONAL DE HABITAÇÃO
4.1. O Caráter Político dos MSU em Geral e da FAMERJ em Particu-lar
E
nesta altura do trabalho que se faz necessário analisar detidamente o tipo de ação desenvolvida pelos MSU em geral e pela FA-MERJ em particular, com o fim de definir o potencial político desses movimentos.
A FAMERJ - como MSU - encontra-se inscrita no quadro de discussão
do potencial político desses movimentos. Para se proceder a uma
melhor análise da questão, reportamo-nos aos autores que afirmam que os MSU têm potencial pOlítico quando se baseiam principalmeg te nas seguintes premissas:
- tais movimentos, embora atuem em geral na área de reprodução,
têm suas ações não limitadas somente a essa área, já que a re
produção e a produção não estão separadas; antes, uma faz a
outra e vice-versa;
- apesar de serem movimentos coletivos socialmente heterogêneos, alcançam sua unidade através de sua identidade popular;
- reconhecem o Estado não só como seu interlocutor, mas como seu
antagonista, frente ao qual reivindicam soluções para os seus
problemas não como concessoes, mas como um direito; não solici tam, exigem.
Essas premissas nao pretendem ser exaustivas se nao simplesmente as principais, segundo nosso entendimento.
Baseando-nos nelas poderíamos tentar analisar as ~. açoes da
FA-MERJ. No que se refere
à
primeira premissa, é importanterecor-dar o depoimento do representante desta entidade, no 19 Semináo,o:i()
na Fundaçio Getúlio Vargas, ao definir os fatores que influiriam na saúde da populaçio: " ... qualidade nos serviços de saúde,
con-cessio de água e esgoto, transporte adequado, possibilidade de
emprego, digno salário".
Como se pode observar, a FAMERJ nao só considera fatores
seto-riais como extra-setoseto-riais e, o que é mais importante, nio só da
área de reprodução, como da de produção, tal como possibilidades de emprego e digno salário. Consideramos esse depoimento de
fun-damental importância, especificamente no caso da FAMERJ com o
BNH, já que o problema em questão tem duas vertentes: uma que se
refere à política habitacional e a outra, representada pela polí
tica salarial.
E
evidente que as açoes da FAMERJ sao desenvolvidas mais nosen-tido da política habitacional, mas podemos considerar essa esco-lha como estratégica, no sentido de atacar os pontos vulneráveis do seu antagonista.
Quanto ã terceira premissa,
é
evidente que a FA~lliRJ considera jáum direito adquirido o financiamento habitacional como porcenta-gem fixa do salário de cada comprador e que não aceitará medidas
que - atrás de uma diminuição da prestação atual - escondem um
prejuízo futuro ainda maior. Suas ações estão dirigidas ao
BNH
como implementador da política nacional formulada pelo Estado.
E assim que·a FAMERJ se estabelece com a tese de se constituir
num movimento político cujas lutas gerais consolidam-se a partir da definição de sua missão, que se expressa, segundo seus diri-gentes, por uma luta contra uma estrutura opressora que obriga a
maioria da população a viver em condições sub-humanas e pela con~
ciência de que, a longo prazo, essa luta se dirige para a cons~
trução de um Estado democrático, a partir da prática dessa demo-cracia nas coisas mais simples do dia-a-dia.
o
trabalho da FAMERJ se entende sobre as seguintes áreas de atuaçao:
- conjunto habitacionais;
- posse da terra e loteamentos; - violência;
- transporte;
- saúde (com a abrangência já mencionada) , - educação, cultura e lazer;
- saneamento básico; - comunicação;
- abastecimento.
Todas essas áreas seriam administradas sob determinados princí-pios gerais, que expressam o nível de organização e das reivindi cações como aparecem no documento "Teses do I Congresso da FAMERJ" e que são constantemente discutidas e reformuladas tendo como re ferências as necessidades do momento. Assim, são suas lutas ge-rais com relação ao Estado:
- pela preservaçao da autonomia do movimento em relação ao Esta-do mantenEsta-do, porém, canais permanentes de comunicação;
- pela participação no processo decisório;
- pela finalização da corrupçao na administração pública;
- pela reforma de funcionamento da administração pública; como,
por exemplo, no que concerne
à
centralização.são 5ens programas de lutas gerais
a) a nível nacional
- pela liberdade de organização tanto política como sindical; - contra toda política repressiva;
- pela redemocratização do país; - contra a atual política .salarial;
pelo atendimento is necessidades básicas da população;
b) a nível internacional
- pela autodeterminação dos povos.
Outro aspecto relevante da questão é a importância desse tipo de organização frente ao atual Governo do Estado do Rio de Janeiro,
no que concerne ao nível de enfrentamento popular que tem sido
facilitado, sem dúvida, pelos próprios espaços abertos por um gQ
verno de oposição eleito pelo povo depois de dezoito anos de au-toritarismo e fechamento político; O diálogo com os três poderes do Estado tornou-se mais efetivo: o acesso aos gabinetes, às
au-toridades e ao próprio governador tornou-se mais fácil; a açao
do governo ficou certamente mais exposta
ã
opinião eã
críticade toda a população. Motivam-se o fortalecem-se as mobilizaç5es na luta contra uma conjuntura nacional que, neste momento de
crise, lança mão de uma política agressiva, posto que é
respon-sável pela provisão de equipamentos coletivos que vao ser distri buídos a uma população cujas forças sociais se aglutinam e cres-cem e cujas exigências são cada dia mais legítimas e poderosas.
Na medida em que a tônica global desses componentes é política,
a FAMERJ pretende esta inteiramente aberta
ã
participação de todos os grupos e organizações sociais. Objetivando a contribuição de todos para o bem-estar coletivo, esses grupos e organizaç5es não podem estar vinculados a um partido, raça, sexo ou religião.
A FA~ffiRJ seria, dessa forma, o espaço democrático para a
discus-são desses problemas. Daí o seu reconhecimento e assentamento às propostas de autoridades constituídas dos partidos politicos, dos poderes legislativo, judiciário e executivo, na medida em que se constituem em elementos da vida social.
o
que certamente parece mudar agora é que os movimentos sociaisurbanos organizados nio s5 lutam na esfera da reprodução, mas
também por um modelo de democracia que modifique a desigualdade
existente na distribuiçio de oportunidades de p~rticipação
4.2. A luta da FAMERJ contra a política habitacional do BNH
Com relação aos efeitos da ação do movimento conjunto da FAMERJ contra a política de habitação do BNH, estamos presenciando, em primeiro lugar, a constituição de um amplo debate de caráter na
cional, a partir da organização de mutuários de quase todo o
Brasil e a decisão de entrar na Justiça para garantir os seus direitos. são dezessete Estados engajados nessa luta (AL, AM, BA, CE, ES, GO, MA, MS, MG, PA, PB, PE, PR, RJ, RS, SC e SP) cu jas sentenças, em número de 200.000 até agora, foram favoráveis.
As formas de participação diversificam-se e os mutuários com
reajuste de julho de 1983 a março de 1984, que perderam o prazo do Mandato de Segurança, podem entrar com ação ordinária na Jus tiça.
A Lei 4380/64, que criou o BNH, define que a prestação da casa
própria será corrigida pelo salário do mutuário ou pela UPC, o
que for menor.
g
esta definição que se transformou na peça jurIdica utilizada pela FA~ffiRJ na Justiça, contra o BNH.
Também estão sendo atendida as reivindicações feitas pelos mora dores de Conjuntos Habitacionais, bairros e vilas para a defesa de seus direitos e a conquista de melhorias.
Outra forma de açao seria as denominadas "mudanças de residên-cia", ou seja, no caso de despejo, se a ordem não for sustada,
a família, junto com todos os moradores do prédio, se mudaria p~
ra a porta do BNH. Até hoje as amee:'ças de "mudanças de residên-cia" deram resultados positivos.
Neste enfrentamento, que vem ganhando contornos de grande mobili
zação social, a imprensa tem-se revelado pouco cooperativa. O
fato se explica, segundo Jô Rezende, porque, embora o universo interno da imprensa se componha de cidadãos, vivendo e sofrendo
problemas semelhantes aos de milhares de outros cidadãos, e
dispostos a se engajarem na luta, estes são empregados de uma
empresa (jornal, rádio, TV etc.), cujos dirigentes bloqueiam
Este bloqueio, todavia, se di ao nfvel da divulgação das açoes
(e conquistas) da FAMERJ contra o BNH; não pode, contudo, reali
zar-se permanentemente. Além do mais a prôpria divulgação das
"Opções do BNH", pela imprensa, chega ao mutuário, que confron ta a "grande conce ssão" com a sua situação real.
~ fato concreto, pois, que a cada dia
é
maior o número depes-soas que descobrem a importância e a eficácia da luta comunitá ria, da ação consciente, coletiva e organizada da população contra o abuso e a injustiça.
Para concluir, apresentamos abaixo as propostas fundamentais(20)
que, entre outras, são elaboradas pela FAMERJ no sentido de
transformar a política anti-social de habitação, em vig0r no
..
pals:
- "transformação do BNH em entidade social;
- eliminação dos atravessadores (agentes financeiros) e redução das taxas de juros;
destinaçãG de recursos orçamentários para subsidiar a aquis! . sição da casa própria pelas camadas mais exploradas;
- fixação da política habitacional pelo Congresso Nacional e nao pelo BNH;
- participação das entidades representativas da sociedade na
formulação, execuçã.o e controle da política habitacional;
- melhoria da qualidade das construç6es e garantia de condições de infra-estrutura;
- revogação imediata da legislaçio autoritária que permite exe-cução e despejos sumários sem amplo direito de defesa;
20 ~ Essas propostas estão contidas na "Cartilha" da FAMERJ que
eliminação das taxas abusivas na aquisição e transferência da casa própria;
- abatimento integral dos juros e da correção monetária pagos ao SFH no Imposto de Renda".
5. CONSIDERAÇOES FINAIS
Em princípio consideramos importante identificar se as mudanças
na política habitacional (se
ê
que se pode chamar de mudança aproposta dos novos quatro planos de pagamento) foram produto das
múltiplas açõ~s das Associações de Moradores ou se, na
realida-de, foram provenientes da crise do próprio ~sistema de financia
mento do BNH.
Concordamos que, na hipótese da FA~ffiRJ ter influenciado o
pro-cesso decisório do BNH,.a referida infiu~ncia não foi
suficien-te para que uma nova política fosse formulada, de modo a respei
tar os acordos contratuais primitivos assinados de boa fê
pe-los mutuário e favorecer a população nessa crise atual.
Há de se ter em conta a declaração do Sr. Nelson da Mata, presi
dente do BNH - "O sonho da casa própria acabou" -, já que
re-presenta o reconhecimento do fim de uma política habitacional
que possibilitava o acesso ã casa própria por um grande número
de pessoas de todas as~classes sociais.
Por outro lado,
é
necessário reconhecer a importância quetive-ram as Associações de Moradores no que se refere ao
esclareci-mento da situação para a população e
ã
conscientização da soci!dade civil como um todo. A publicidade promovida por essas
as-sociações (apesar da falta de colaboração dos meios de comunic~
ção) levou ã conscientização de distintos setores políticos. Um
exemplo disso são os discursQs dos candidatos à presidêncla do
país, nos quais são explicitadas as intenções de solucionar o
r
I
22
Outro aspecto relevante é a transformação que, sem dúvida, tem
acontecido nas associações de moradores em geral, fundamental-mente a partir das grandes mobilizações realizadas. A organiza-ção desses MSUs tem sido afetada por esse processo empreendido contra a política habitacional; tem melhorado, sido
aperfeiçoa-da e, o que é i mais importante, tem~se conscientizado do seu
potencial de mobilização. Por outro lado, não podemos deixar de ressaltar que, na atualidade, já existem 200 mil mutuários que obtiveram liminar e ganaharam a causa, em primeira instância.
A luta contra a política do BNH é a maior empreendida pela FA-MERJ nos últimos tempos e nela têm sido utilizados mecanismos
que vão desde a mobilização dos mutuários até a recorrência
-
aJustiça, passando pelas ameaças da "mudança de residência" e pe la sensibilização de deputados e senadores.
Ultimamente os contatos diretos com o BNH nao tem sido efetua-dos, as negociações não existem, pois os canais de comunicação
estão fechados, coisa que não acontecia na gestão anterior. A
FAMERJ, enriquecida através desse processo, pretende continuar a se fortalecer e buscar a negociação direta com o BNH no momeg to que se apresente politicamente mais oportuno. Essa negocia-ção logicamente não ficará apenas no plano das reivindicações, mas terá como objetivo lograr também a participação no processo
decisório esperando, dessa forma, transformar a política atual em outra que se apresente mais igualitária e mais justa, enfim, mais democrática.
Queremos assinalar que a questão da casa própria tem, para toda a população envolvida, uma relevância mais profunda no sentido
de que a moradia extrapola a demanda material e isso não pode ser deséonsiderado neste momento em que é possível que a idealo gia disseminada pelo BNH tenha atingido frontalmente uma neces-sidade humana, que é a da segurança pessoal e da família. Assim
.- d . E ( 21 ) liA' d . . - .
-e qu-e po -emas r-ep-etIr v -e r s : m o r a la proprla nao ap-enas reduz o sentimento de insegurança existencial, mas consiste em
um dos poucos pontos fixos de 'identidade individual'''. E foi
•
através dessa identidade individual que o BNH atingiu o povo br!
sileiro alimentando o sonho da casa própria durante todos esses
anos.
Para finalizar, queremos reafirmar os aspectos que, segundo nos-so entendimento, se configuram como os de maior interesse e rele vância, a saber:
a FAMERJ atua, pela primeira vez, contra uma política de alcan ce nacional;
- o objetivo material desta luta (a casa própria)
é
um dosas-pectos importantes na busca da identidade individual;
- nessa luta
1,
sao utilizados múl tiplos procedimentos;- a FAMERJ pretende ter continuidade
à
intervenção no processoSUf...1MARY
In this article, the writers offer a general theoretical picture describing and analyzing the origins, characteristics and
efficacy of urban social movements, as well as the origins and
proposals of the Federação das Associações de Moradores do Rio
de Janeiro - FAMERJ (Rio de Janeiro Federation of Residents Associations).
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINIST~~ÇÃO PUBLICA SUBDIREÇÃO DE PESQUISA
Série Cadernos EBAP
N9 01 - FORMAÇÃO DO ADMINISTRADOR PUBLICO: ALTERNATIVAS EM
DEBA-~ TE - 1980.
Bianor Scelza Cavalcanti
N9 02 EM BUSCA DE NOVOS CAMINHOS PARA A TEORIA DE ORGANIZAÇÃO -1980.
Anna Maria Campos
N9 03 - TREINAMENTO E DESE~NOLVIMENTO GERENCIAL: INFERENCIA
SO-BRE A EXPERIENCIA DAS EMPRESAS ESTATAIS NO BRASIL - 1980. Paulo Roberto Motta
N9 04 - ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS - 1980. Luciano Zajdsznajder
N9 05 - A INTERVENÇÃO ESTATAL NO SETOR SAUDE: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A PESQUISA "GASTO PUBLICO EM SAUDE" - 1980.
Equipe PROASA
N9 06 - EDUCAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO POBLICA: RETROSPECTIVA E
PERS-PECTIVA'DA EXPERIENCIA NORTE-A~ffiRICANA E REFLEXOES SOBRE
O CASO BRASILEIRO - 1980. Armando Moreira da Cunha.
N9 07 - PROJETO RIO: ANÁLISE DE U}~ EXPERIENCIA DE PLANEJAMENTO
PARTICIPATIVO - 1981. Héctor Ati1io Possiese
N9 08 - A PROPOSTA DE PARTICIPAÇÃO NA TEORIA GERENCIAL: A PARTI-CIPAÇÃO INDIRETA - 1981.
Paulo Roberto Motta
N9 09 - PARTICIPAÇÃO NA GERENCIA: UMA PERSPECTIVA COMPARADA 1981.
N9 10 - O RITUAL DA DESBUROCRATIZAÇÃO: SEUS CONTEXTOS DRAMÁTICO E REPRESENTAÇOES - 1981.
Maria Eliana Labra
N9 11 - ASSISTENCIA MEDICO-HOSPITALAR DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO . . .
BRASILEIRO ATRA~S DE SERVIÇOS CONTRATADOS - 1981.
Valéria de Souza
N9 12 - MINHA nfVIDA A LORDE KEYNES - 1982. Alberto Guerreiro Ramos
N9 13 ~ U~m PROPOSTA DE AVALIAÇÃO DO POLO NOROESTE - 1982.
Antônio de Pádua Fraga
N9 14 - REPARTINDO TAREFAS E RESPONSABILIDADES NAS ORGANIZAÇOES: ALGUNS DILEMAS ENFRENTADOS PELA GERENCIA - 1982.
Anna Maria Campos
N9 15 - AS DISFUNÇOES SOCIAIS DO PROGRAMA NACIONAL DO ÁLCOOL EM DECORRENCIA DA EXCESSIVA ENFASE NA CANA-DE-AÇOCAR - 1982. Fátima Bayma de Oliveira
N9 16 - SISTEM.A DE INFORM.AÇÃO DE SAODE: A VISÃO DE UM SANITARIS TA - 1982.
Franz Ru11i Costa
N9 17 - O "JEITINHO" BRASILEIRO COMO UM RECURSO DE PODER - 1982. c15vis Abreu Vieira
Frederico Lustosa da Costa Lázaro Oliveira Barbosa
N9 18 - FINSOCIAL: ANÁLISE DE UMA POLfTICA GOVERNAMENTAL - 1983. Paulo Emílio Matos Martins
N9 19 - AVALIAÇÃO DE EMPRESAS POBLICAS NOS PAfsES EM DESENVOLVI
MENTO: A PERSPECTIVA SOCIAL - 1983. Paulo Roberto Motta
..
N9 20 - REFLEXOES SOBRE O PROCESSO DE TECNIFICAÇÃO DA MEDICINA NO
BRASIL - 1983·
Paulo Ricardo da Silva Maia
N9 21 - A CO-GESTÃO NO INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER: UMA ANÁLISE
ADMINISTRATIVA - 1983.
Paulo Roberto Motta
. N9 22 - O SINDICALISMO NO GOVERNO DE GETOLIO VARGAS - 1983.
Luciva1 José Siqueira Costa
N9 23 - PLANEJAMENTO, PESQUISA E APRENDIZAGEM - 1983.
Luciano Zajdsznajder
N9 24 - A INFORMAÇÃO DO SETOR POBLICO COMO FORMA DE OBTENÇÃO DE
GANHOS SUBSTANCIAIS DE PRODUTIVIDADE - 1983.
José Osmir Fiore11i
N9 25 - ANÁLISE DA ESTRUTURA FORMAL DAS ORGANIZACOES: CONSIDERA i
ÇOES PRÁTICAS - 1983.
Armando Betgamini de Abreu
N9 26 - ALGUNS IMPACTOS SOCIAIS E ECONÔMICOS DA AUTOMAÇÃO NO
SE-TOR BANCÁRIO - 1983.
Samue1 Levy
N9 27 - O PROGRAMA DE ESTUDOS PROSPECTIVOS SOBRE O IMPACTO SOCIAL
DA TECNOLOGIA. UMA PROPOSTA INSTITUCIONAL - 1983.
Samue1 Levy
N9 28 - PESQUISA: RELEVÂNCIA SOCIAL, COOPERAÇÃO E ABERTURA À
A-PRENDIZAGEM - 1983.
Anna Maria Campos
N9 29 - INVESTIGAÇOES DE CIENCIAS SOCIAIS EM SAODE NO BRASIL
1984.
Sonia Maria F1eury Teixeira
000323348
N9 30 - A PARTICIPAÇÃO DO CIDADÃO NAS DECISOES DA ADMINISTRAÇÃO POBLICA - 1984.
Luis Carvalheira de Mendonça
N9 31 - ATENÇÃO PRIMÁRIA DE SAODE - RETROCESSO OU NOVOS RUMOS PARA A MODERNIZAÇÃO DO SERVIÇO?
Gleisi Heis1er Neves
ebap/sg/jl/rs/n9 037/85
•