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Reflexos anticoncorrenciais da guerra fiscal

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Ana Cristina Sathler de Queiroz Vilar

REFLEXOS ANTICONCORRENCIAIS DA “GUERRA FISCAL”

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ANA CRISTINA SATHLER DE QUEIROZ VILAR

REFLEXOS ANTICONCORRENCIAIS DA “GUERRA FISCAL”

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação “stricto sensu” em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do titulo de mestre em Direito Político e Econômico, sob a orientação do Dr. Alcides Jorge Costa.

Orientador: Prof. Dr. Alcides Jorge Costa

São Paulo

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V697r Vilar, Ana Cristina Sathler de Queiroz

Reflexos anticoncorrenciais da "Guerra Fiscal"./ Ana Cristina Sathler de Queiroz Vilar. São Paulo, 2012.

92 f. ; 30 cm

Referências: p. 85-89

Dissertação (Mestrado em Direito Político e Econômico)- Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012.

1. Tributação. 2. Guerra Fiscal. 3. Isenções Fiscais Unilaterais. 4. ICMS. 5. Livre Concorrência. I. Título

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REFLEXOS ANTICONCORRENCIAIS DA “GUERRA FISCAL”

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do titulo de mestre em Direito Político e Econômico, sob a orientação do Dr. Alcides Jorge Costa.

Aprovada em 21 de agosto de 2012

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________________________ Prof. Dr. Alcides Jorge Costa.

Universidade Presbiteriana Mackenzie

____________________________________________________________________ Prof. Dra. Zélia Luiza Pierdorná

Universidade Presbiteriana Mackenzie

____________________________________________________________________ Prof. Dr. Mauro José Silva

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Ao meu Deus por realizar meu sonho e me abençoar em tudo durante todo tempo.

Aos meus queridos amigos por me apoiaram e comemoram comigo essa vitória: Natanael e Ligia, Valdene, Juliana, Fabiana e Luidi, Rose e Ludson, Beth e Sandro, Márcio e Paula, Tutu e Darlene, Any, Keila, Brígida, a Turma do Hummikub, Tia Rita, Tio Lelé, Jessé e Yara, Débora, Saulo e Lia, Rô, Sara e Davi, Talita e Diogo, Gabriel, Lucas Monteiro, Rodrigo Viana, Lucas Heler, Pastor Geraldo e Érica.

À Tarsila, amiga e sócia, por confiar em meu trabalho em São Paulo e por manter o nosso trabalho em Varginha.

À minha amada Igreja Presbiteriana, especialmente IPB de Varginha, pelas orações e recursos despendidos a mim para que eu permanecesse em São Paulo durante esse tempo.

Ao Sr. Lopes por ser um pai para mim e dispor de tempo, oração e de recursos próprios para me ajudar nessa jornada.

À minha amiga Marina por ter me incentivado e “dividido” sua casa e família comigo.

À minha família querida pelo apoio, especialmente ao tio Jader e à tia Léa.

À minha Vovó, Mamãe, tia Netty (minha mãe do coração) e irmã, Paulinha, por sempre me incentivarem e comemorarem comigo a cada passo.

Ao Daniel pelo seu sorriso cada vez que eu voltava pra casa.

Ao Dr. Alcides, meu querido orientador, pela dedicação e paciência em me direcionar nesse trabalho. Foi um presente poder desfrutar de seus ensinamentos, repassados com tanta sabedoria e tranqüilidade.

Aos meus colegas de turma, especialmente Carla Simões e Thiago Colombo, com quem vivi momentos especiais dentro e fora de sala de aula.

Ao Mackenzie, lugar onde pude crescer intelectualmente e conhecer um novo horizonte por meio deste mestrado.

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Este trabalho tem como objetivo analisar como o fenômeno da “guerra fiscal” no âmbito do ICMS pode prejudicar a Livre Concorrência, vez que a igualdade de competição pode facilmente ser falseada por meio da concessão dos incentivos fiscais unilaterais. Introduzindo o estudo do tema tratamos da intervenção do Estado sobre o domínio econômico por meio da tributação, que passou a servir de potente instrumento de intervenção deixando de figurar como mera forma de custeio. A utilização da tributação, para tanto, deve obedecer a limites, dentre os quais o princípio da Livre Iniciativa e da Livre Concorrência, delineadores do exercicio da competência tributaria. A seguir, abordamos o princípio da Livre Concorrência e a concessão dos incentivos fiscais unilaterais. Neste tópico do trabalho, demonstramos a importância do artigo 146-A da Constituição Federal para o tema, permitindo a criação de critérios especiais de tributação para prevenir distúrbios da concorrência, além de demonstrar qual é a posição adotada pelo Superior Tribunal Federal quanto à concessão dos incentivos fiscais unilaterais. Seguimos, adentrando mais especificamente na abordagem sobre o fenômeno da “guerra fiscal”, a concessão dos incentivos fiscais unilaterais no âmbito do ICMS e seus reflexos para a concorrência. Discutimos ainda a necessidade de efetiva defesa da concorrência frente à “guerra fiscal”, discutindo as ações do CADE, órgão de defesa da concorrência no Brasil, para minimizar os reflexos anticoncorrenciais da “guerra fiscal”. Por fim, apresentamos as conclusões, com críticas aos Estados que se utilizam da autonomia que lhes fora atribuída constitucionalmente para conceder incentivos fiscais unilateralmente, ou seja, sem observância dos preceitos legais necessários a sua concessão. Além disso, apontamos como sugestão, maior atribuição de competência ao CADE para intervir junto às empresas que se beneficiam das isenções concedidas e prejudicam os mercados locais, já que o órgão não possui competência para punir a concorrencia desleal dos Estados.

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This paper aims to analyze the phenomenon of the "tax war" under ICMS taxation can harm free competition, because the matched competition can easily be distorced by unilateral granting of tax incentives. Introducing the study of the subject we have government economy intervention through taxation, which is currently a powerful instrument of intervention and not only a source of funding. The taxation to do so, should conform to limits, of which the principle of Enterprise and Free-Competition, guiding the exercise of the competence. Below we discuss the principle of Free-Competition and unilateral granting of tax incentives. At this point of the work shows the importance of article 146-A of the Constitution to the subject, allowing the creation of special tax criteria to prevent disturbances of competition, as well as shows what is the position adopted by the STF against the granting of incentives unilateral tax. Following, going more specifically into the phenomenon of tax war and the unilateral granting of tax incentives under ICMS and its consequences for competition. Approach the need for effective protection of free competition against the "tax war", discussing the actions of the CADE, the antitrust agency in Brazil, to minimize the anticompetitive consequences of the tax war. Finally, we present the conclusions, with criticism directed to the states that use of the autonomy constitutionally assigned them, to grant unilateral tax incentives denying legal principles for being granted. We point out the suggestion largest power of competence to CADE to act with the companies that are benefiting from the exemptions granted unilaterally harming local markets, as the CADE has no power to punish the unfair competition among states.

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1 Introdução...08

2 Intervenção do Estado no domínio econômico por meio da tributação...12

2.1 Intervenção estatal “sobre” o domínio econômico...12

2.2 A Tributação como instrumento de intervenção econômica: as normas tributárias indutoras...19

2.3 A livre iniciativa como fundamento da ordem econômica e tributária...24

3 A Livre Concorrência e Os Incentivos Fiscais Unilaterais...28

3.1 O princípio da livre concorrência como limite à concessão das exonerações fiscais...28

3.2 A norma do artigo 146 – A da Constituição Federal...34

3.3 Os incentivos fiscais unilaterais e sua utilização pelos Estados...39

3.4 Reflexos da concessão dos incentivos fiscais unilaterais sobre a Livre Concorrência...45

3.5 O STF e a concessão dos incentivos fiscais unilaterais...52

4 A concessão de incentivos fiscais unilaterais do ICMS que fomentam a “GuerraFiscal” e prejudicam a Livre Concorrência...57

4.1 Um conceito para “Guerra Fiscal” ...57

4.2 O ICMS como principal instrumento da “Guerra Fiscal”...61

4.3 “GuerraFiscal” e a Concorrência...67

5 A Defesa da Concorrência da “Guerra Fiscal”...71

5.1 A consulta 0038/99 e seus principais aspectos...71

5.2 O papel do CADE frente à “Guerra Fiscal” ...74

Conclusão...78

Referências...84

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1. INTRODUÇÃO

Dentre os campos em que a tributação mais de perto se relaciona com a ordem econômica, se destaca a livre concorrência, que, por seu turno, pode servir de limite ou guia para a conformação das normas tributárias. Tem-se, assim, a tributação como um instrumento de aperfeiçoamento da livre concorrência, pois a garantia desta servirá de justificativa para a instituição da norma tributária isentiva.

A abordagem sobre os aspectos econômicos e legais de um Estado na busca de seu desenvolvimento econômico conduzem à análise do papel e da atuação do Estado fiscal e regulador. Diferentemente do que se entendia no Estado Liberal, em que o governo não deveria intervir no campo privado, no Estado do Bem Estar Social, o governo deve intervir na ordem econômica sempre observando sua finalidade, qual seja: assegurar a todos existência digna.

Nesta esteira, é o próprio Estado que, no decorrer da história do capitalismo, dá vida ao poder econômico dos agentes econômicos que atuam no mercado - poder este que não é ilimitado. O Estado eficiente, que busca atingir seus objetivos, deve valorizar o exercício legítimo do poder econômico1, o que é a função social de todas

as atividades econômicas.

A transformação das funções estatais, em decorrência do abandono de uma postura absenteísta e do incremento de uma atuação estatal positiva, teve reflexo inegável na forma de criação dos textos legais. O Direito positivo, que antes se manifestava como um direito repressivo e punitivo, apenas se torna, com o Estado social, também, um direito premial. Evolução esta que também se verificou no campo da instituição, exoneração e administração dos tributos. A tributação passou a ser importante instrumento de intervenção do Estado sobre o domínio econômico e social, deixando de figurar como mera fonte de custeio do Estado.

No exercício de seu papel gestor outorgado pela sociedade, um das formas de intervenção do Estado sobre o domínio econômico é o exercicio de sua função indutora, gerando efeitos sobre a economia em geral e também sobre a livre

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concorrência: o efeito indutor da norma tributária poderá permitir que a concorrência seja saudável entre os agentes, ou não.

A Ordem Econômica Constitucional2 é fundada em dois princípios constitucionais, quais sejam: a livre iniciativa e a valorização do trabalho humano. Isto significa que há uma ordem econômica baseada na livre iniciativa, cuja finalidade buscada é a digna existência de todos. Cada um dos princípios arrolados pelo mesmo artigo servirá de critério a direcionar a atuação da livre iniciativa e do trabalho humano3. Os benefícios do desenvolvimento econômico são notórios, mas qual a maneira mais eficiente de estimular este desenvolvimento integralmente? O exercicio da tributação é fundamental aos interesses dos Estado, mas tamanho poder precisa ser contido e disciplinado em favor da segurança dos cidadãos e dos agentes economicos.Frente ao mercado globalizado é ainda mais relevante o papel estatal no incentivo do desenvolvimento econômico como pano de fundo de um mercado eficiente e forte.

O presente trabalho tem como proposta a análise da concessão dos incentivos fiscais unilaterais à luz da livre concorrência. Torna-se importante a abordagem a

partir do desdobramento do fenômeno “guerra fiscal” entre os Estados e Distrito Federal e seus reflexos anticoncorrenciais.

O tema se mostra relevante na medida em que verificamos que as normas tributárias, especificamente as que concedem incentivos fiscais, apesar de constituírem forte instrumento interventivo não podem ser instituídas à revelia da Lei, sendo imperiosa a imposição de limites, que na presente proposta de estudo são os limites impostos pelo princípio da livre concorrência.

Nossa proposta, portanto, é analisar como a concessão de incentivos fiscais unilaterais, no âmbito do ICMS, pode prejudicar o desenvolvimento econômico dos Estados, alimentando a denominada “guerra fiscal” e enfraquecendo o mercado, que é patrimônio nacional protegido constitucionalmente e pelo Direito da Concorrência. No limite desse estudo, todavia, não analisaremos a fundo como se processa a

“guerra fiscal” instalada entre os Estados, restringindo-nos a caracterizá-la, tendo

2 A Ordem Econômica Constitucional pode ser conceituada como o conjunto de normas que define

um determinado modo de produção econômica.Desta forma, ordem econômica, parcela da ordem jurídica (mundo do dever-ser), não é senão o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser). GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 2010, p.67.

3 SCHOUERI, Luis Eduardo. Livre Concorrência e Tributação. In: Rocha, Valdir de Oliveira (coor.).

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como pano de fundo o ICMS, imposto de competência estadual com maior arrecadação.

Assim, o que hoje denominamos “guerra fiscal” entre os Estados e Distrito Federal são os atos unilaterais adotados por estes entes federativos, voltados para si mesmos e restritos aos seus limites territoriais, geralmente produzindo efeitos negativos nos mercados de outras unidades federativas.

Com efeito, na denominada “guerra fiscal” entre os Estados e Distrito Federal, nosso foco volta-se para as normas jurídicas que contenham desonerações relativas ao ICMS sem fundamento na Lei Complementar n°24/1975, e que resultem em redução ou supressão do ônus tributário do ICMS, ainda que indiretamente.

Para efetivação de nosso objetivo, na linha de pesquisa atinente ao poder econômico e seus limites jurídicos, apresentamos breve introdução delimitando o tema estudado e o método de análise.

No primeiro capítulo tratamos da necessária intervenção do Estado sobre o domínio econômico, demonstrando que na evolução do Estado Liberal até o Estado Social, o mercado não foi capaz de se auto-regular. A “mão invisível” fora substituída

pela mão visível do Estado, conformadora da ordem econômica, alterando-se o próprio conceito de liberdade econômica, que teve sua noção construída sobre uma visão social.

O Estado substituiu o mercado na coordenação da economia. As normas tributárias indutoras são forma de intervenção indireta do Estado, facultando ao agente econômico a liberalidade de observar ou não o comando normativo, sem que isto lhe acarrete sanções. Todavia, demonstrando que o Estado, ao intervir na economia com o objetivo de regulá-la, deve obedecer aos limites constitucionais impostos pelo legislador para preservação da ordem econômica e tributaria.

No segundo capitulo, tratamos especificamente do princípio da livre concorrência como limite às exonerações fiscais, adotadas pelos Estados e Distrito Federal, especificamente os incentivos fiscais unilaterais. Fazemos também uma breve abordagem do artigo 146-A da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional n.42, que prescreve competência à lei complementar para estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência.

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argumentos dos Estados que ingressaram com ações diretas de inconstitucionalidade das leis instituídas por outros Estados concedendo benefícios fiscais sem a observação dos requisitos estabelecidos na LC 24/75, ou seja, sem celebração previa de convênios.

No capitulo terceiro, verificamos a relação direta de causa e efeito entre os incentivos fiscais unilaterais e a “guerra fiscal”, cujo maior instrumento é a concessão de incentivos unilaterais no âmbito do ICMS, destacando os reflexos anticoncorrenciais da concessão de incentivos fiscais unilaterais e da conseqüente

“guerra fiscal”.

No quarto capitulo, entramos no estudo da defesa da concorrência frente à

“guerra fiscal”, destacando os principais aspectos analisados na Consulta 0038/99 feita ao CADE- Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência- pelo Pensamento Nacional das Bases Empresariais – PNBE, com o objetivo de buscar parecer acerca da nocividade ou não da “guerra fiscal” à livre concorrência, realizada pelos Estados e Distrito Federal, por meio de mecanismos fiscais relacionados ao ICMS.

Buscamos ainda nesse capitulo refletir sobre o papel do órgão de defesa da concorrência- CADE- frente à concessão de incentivos fiscais unilaterais pelos Estados, que entre outros aspectos, influenciam a formação de preços no mercado, matéria que está umbilicalmente relacionada à defesa da concorrência.

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2. INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO POR MEIO DA TRIBUTAÇÃO.

2.1 Intervenção estatal “sobre” o domínio econômico.

Na Europa dos Séculos XVIII e XIX, prevaleceu a lógica liberal de não intervenção do Estado na economia. A visão predominante era a da existência de uma ordem econômica natural, fora da esfera jurídica e política, que em tese não precisaria ser garantida pela constituição. No entanto, apesar da lógica de não intervenção, todas as constituições liberais possuíam disposições econômicas em seus textos.4

Esse modelo de Estado liberal privilegiava as bases de um capitalismo centrado no liberalismo econômico, ou seja, havia uma rígida divisão entre o Estado e o mercado. O Estado deveria se abster de interferir no equilíbrio natural a ser alcançado pelo mercado, que deveria caminhar sozinho, sendo auto-regulável. O entendimento prevalente era pela existência de uma concorrência perfeita entre os agentes econômicos, conceito que, posteriormente, se mostrou utópico5.

Com a teoria da “Mãoinvisível”6, a intervenção estatal se reduziu drasticamente e

a forma como as normas tributárias eram elaboradas também foram influenciadas pelo pensamento liberal, prevalecendo o entendimento de que a tributação deveria ser reduzida, possuindo uma limitada função arrecadatória. A maioria dos recursos deveria ficar na iniciativa privada, considerada o setor produtivo da economia.

Porém, as reiteradas crises políticas e econômicas indicaram que a teoria liberal não era suficiente para que o Estado cumprisse seu objetivo de tutela do interesse

4 BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento. São Paulo: Malheiros, 2005.

p.32.

5 BOMFIM, Diego. Tributação e Livre concorrência. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 80

6 Explica Diego Bomfim, que não era reconhecida como função do ente estatal a intervenção sobre o

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público7. O mercado se mostrou ineficaz na contenção da crescente desigualdade,

surgindo os defensores de uma maior intervenção estatal.8

Com as grandes guerras mundiais surgiram inúmeras questões sociais, que só puderam ser solucionadas com a quebra da rigidez do liberalismo, dando espaço ao surgimento do intervencionismo estatal9. Emergiram entre as nações os valores democráticos, que trouxeram em seu bojo a consagração dos direitos econômicos e sociais até então desprezados.

A concepção de estado liberal gerou, em momentos críticos da história uma situação insuportável, de modo que, mesmo em países de imensa tradição liberal e capitalista, passou-se a se admitir a necessidade de intervenção do poder público no mercado e na economia, ainda que extremamente restrita ou em setores específicos e predeterminados.10

A “mão invisível” fora substituída pela mão visível do Estado, conformadora da

ordem econômica, alterando-se o próprio conceito de liberdade, que teve sua noção construída sobre uma visão social.11 O Estado substituiu, ainda que parcialmente, o

mercado na coordenação da economia.12

O Estado liberal ou abstencionista, cuja concepção sustentava o distanciamento do Estado em relação à vida social, passou por transformações e no século XX assumiu papel de agente regulador da economia13.

Tornaram-se então freqüentes nas constituições do século XX disposições sobre a ordem econômica e, por vezes, a social, o que era inconcebível anteriormente,

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“(...) no século XVIII o poder público era visto como inimigo da liberdade individual, e qualquer restrição ao individual em favor do coletivo era tida como ilegítima. Essa foi a raiz individualista do Estado Liberal. Ao mesmo tempo, a burguesia enriquecida, que já dispunha de poder econômico, preconizava a intervenção mínima do Estado na vida social, considerando a liberdade contratual em direito natural dos indivíduos”. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. São Paulo. Saraiva,1998.p.62

8 RESENDE, Flávio Lucio Chaves de. Extrafiscalidade: Os tributos como instrumento de

implementação do Estado Democrático de Direito. Brasília, 2008. Disponível em www.clubjus.com.br. Acesso em 18 mar. 2012.

9 De acordo com Eros Roberto Grau a disciplina jurídica da atividade econômica surge como produto

da ação que o Estado passa a desenvolver em relação ao processo econômico. Ação essa que é voltada para a preservação do mercado tendo em vista o interesse social. Preservação que é perseguida porque é sob seu clima que se encontram as condições mais propicias para a aplicação dos fundamentos do capitalismo: Propriedade privada e liberdade econômica. GRAU, Eros Roberto. Elementos de direito econômico. São Paulo: RT, 1981, p.18-19

10 TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: Método, 2003, p. 73. 11 GRAU, Eros Roberto. Op.Cit. p.19 (nota 10)

12 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. A intervenção do Estado no domínio econômico e os chamados “incentivos fiscais”. In Direito Constitucional, Manole-2007.p.309.

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porque tais matérias eram tidas como fora do alcance da intervenção estatal. A economia e os problemas sociais eram da alçada dos particulares.14

A primeira Constituição Econômica do Brasil, seguindo o exemplo da Constituição Mexicana15 (1917) e de Weimar (1919), foi a Constituição de 1934. A partir desta carta todas as demais compreendem um capítulo sobre a ordem econômica.

A nomeada Constituição Econômica16 é conseqüência da ampliação das dimensões da concepção clássica de constituição, que introduziu em seu texto aspectos da ordem econômica, alargando materialmente o conteúdo da Lei Fundamental do Estado.

Inúmeras são as relações entre as forças econômicas que se desenvolvem pelas regras próprias da economia, sendo certo que tais normas serão regidas pelas normas constitucionais que vão atuar neste ambiente especifico. Dentro da ordem jurídica está a ordem econômica, constituindo-se de um conjunto de regras constitucionais disciplinadoras da atividade econômica.17

Eros Roberto Grau18 descreve ordem econômica como parcela ou porção da

ordem jurídica no moderno Estado Social. Ordem econômica constitucional é o de conjunto de normas que define, institucionalmente, um determinado modo de produção econômica.

Em outra obra, o mesmo autor define ordem econômica como o conjunto de normas que define, institucionalmente, um determinado modo de produção. Desta forma, ordem econômica, parcela da ordem jurídica (mundo do dever-ser), não é senão o conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser) 19. A ordem econômica do mundo do dever-ser, que é capitalista,

ainda que se qualifique como intervencionista, está comprometida com a finalidade de preservação do capitalismo.

A ordem econômica constitucional é ainda definida como o conjunto de preceitos e instituições jurídicas que, garantindo os elementos definidores de um determinado

14 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 461.

15“A ordem econômica passa a ter dimensão jurídica a partir do momento em que as constituições

passaram a discipliná-la sistematicamente, o que teve inicio com a Constituição Mexicana de 1917”. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2009.p.766

16A expressão surgiu na Alemanha em 1932 em trabalho envolvendo as concepções de ordenação da

propriedade, do contrato, do trabalho, da organização e das técnicas de produção, bem assim das formas e da amplitude da intervenção do Estado no domínio econômico. Cf. GRAU, Eros Roberto. Op.Cit. p.44 (nota 2)

17 ARAÚJO, Eugenio Rosa. Direito Economico. Rio de Janeiro: Ímpetos, 2010.p.50 18 GRAU, Eros Roberto. Op.Cit. p.43 (nota 10)

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sistema econômico20, institui uma determinada forma de organização e

funcionamento da economia e constitui, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica.

A ordem econômica se fundamenta na conservação de um domínio econômico capitalista. Contudo, seu maior primado é a defesa de uma ordem justa capaz de amenizar as desigualdades sociais e regionais, mormente o seu objetivo fundamental conste do art. 3º, III, da Constituição Federal; além de se orientar pelos princípios elencados no art. 170, caput e incisos. Sob tais parâmetros toda e qualquer ação, seja do Estado, seja de particulares deve prezar a estrita observância desses princípios.

Destarte, é de bom alvitre afirmar que a ordem econômica não se esgota no nível constitucional, pois a nível infra-constitucional essa ordem deve ser reafirmada. A própria Constituição prevê que leis realizem a manutenção dessa ordem, o que podemos verificar na analise, por exemplo, dos preceitos inscritos no §4º do artigo 173 e 186 da CF, entre outro

A constituição brasileira de 1988 consagrando o sistema capitalista, fundado na propriedade privada dos meios de produção e no livre exercício das atividades econômicas, protegendo essa ordem econômica, atribuiu ao Estado competência para intervir no domínio econômico21.

A intervenção do Estado no domínio econômico visa proteger o próprio sistema capitalista, já que o domínio de mercado e as praticas abusivas acabariam por prejudicar bem maior que são as relações de consumo. Embora capitalista, a ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado.22

A economia de mercado depende primariamente das interações entre os agentes econômicos na alocação de recursos, mas depende também da atuação do Estado para que o comportamento capitalista não seja devastador. O uso do poder

20 Fábio Nusdeo menciona que para sistema econômico podem existir duas acepções: Uma que tem

conotação de conjunto das atividades econômicas de uma comunidade, e outra que representa o conjunto orgânico de instituições, através do qual a sociedade irá enfrentar ou equacionar o seu problema econômico, relacionando-se, pois, com o problema da escassez de recursos. NUSDEO. Fábio. Curso de Economia – Introdução ao Direito Econômico. São Paulo: RT, 2010.

21 Esta intervenção, de acordo com Jose Afonso da Silva é atuação do Estado na tentativa de “por

ordem na vida econômica e social, de arrumar a desordem que provinha do liberalismo, importa em impor condicionamentos à atividade econômica, do que derivam os direitos econômicos que consubstanciam o conteúdo da constituição econômica.”. SILVA, José Afonso da. Op.Cit. p. 786 (nota 15)

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econômico23 não é apenas legitimo, mas necessário à subsistência competitiva de

seu detentor. É uma situação normal de mercado. Por isso, no Estado do Bem-Estar social, o governo deve interferir na economia a fim de garantir a ordem econômica, mas sem condenar a livre iniciativa.

A atividade econômica do Estado devidamente organizada, ou seja, eficiente, gera o desenvolvimento, que por sua vez provoca uma melhora no nível de satisfação das necessidades individuais e coletivas. Várias são as conseqüências sociais da atividade econômica, uma vez que os bens necessários para a sobrevivência proporcionarão o desenvolvimento econômico24.

O Texto Constitucional de 1988 permite verificar distintas funções cometidas ao Estado Brasileiro em relação ao tema econômico. São elas: (i) ao Estado é permitido agir na exploração da atividade econômica, nos termos do Art. 173 da Constituição de 1988; (ii) o Estado tem o dever de atuar como agente normativo e regulador da atividade econômica, circunstância na qual exercerá funções de fiscalização, de incentivo ou de planejamento, conforme expressa previsão do Art. 174 da Constituição Federal; (iii) o Estado atuará, ainda, como prestador de serviços públicos de modo direto ou indiretamente, mediante concessão ou permissão, a teor do Art. 175 da Constituição Federal.

Na assertiva de Diogo Bonfim25, é importante entender o sentido em que se dá a

intervenção do Estado e o que significa domínio econômico. Afirma o autor que a intervenção do Estado no domínio econômico nada mais é que a atuação do Estado como agente regulador da economia, seja pela via direta ou pela via indireta.

Eros Roberto Grau26 entende por domínio econômico o que conceitua de

atividade econômica em sentido estrito, de titularidade do serviço privado, o que

23 Poder, nas palavras do professor Vicente Bagnoli é algo difícil de ser definido com exatidão,

principalmente quanto ao poder qualificado como econômico, dentro da realidade brasileira de desenvolvimento. “O poder econômico é a manifestação do poder condicionado ao fator econômico que subordina quem não detém o elemento econômico”. BAGNOLI, Vicente. Direito e Poder econômico. São Paulo: Elsevier, 2008, p.38.

24 Como observa Fábio Nusdeo, o desenvolvimento envolve uma série de modificações qualitativa e

quantitativas, de tal maneira a conduzir a uma radical mudança de estrutura da economia e da própria sociedade. Desenvolver é o exercício de um potencial já existente, ou seja, um processo duradouro. O processo de desenvolvimento econômico supõe ajustes institucionais, ficais e jurídicos; incentivos e fornecimento de condições para um sistema eficiente de produção e distribuição de bens e serviços à sociedade. A atividade econômica eficiente deve desencadear o desenvolvimento, pois crescimento sem desenvolvimento seria mera modernização. NUSDEO, Fábio. Op.Cit.(nota 20).

25 BOMFIM, Diego. Op.Cit. p.96-97 (nota 5)

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significa precisamente, que a constituição consagra uma economia de mercado; pois a iniciativa privada é um princípio básico da ordem capitalista.

O Estado intervém27 no domínio econômico de duas maneiras básicas: regulando ou executando a atividade econômica, ou seja, de forma indireta ou direta.

É relevante destacar que, ao falarmos do Estado como executor, ou seja, intervindo na economia diretamente, este o faz de maneira concreta, na economia, na condição de produtor de bens e serviços, ao lado de particulares ou como se um deles fosse; o faz quando explora a atividade econômica por intermédio de um de seus órgãos internos e não quando explora serviços públicos, mesmo que, aparentemente, não se consiga vislumbrar se uma dada empresa estatal está explorando um ou outro.

Trata-se de intervenção econômica direta, quando o Estado atua no domínio econômico como agente econômico, ou seja, quando explora qualquer dos setores da economia com o objetivo de lucro, em competição com os particulares. Nesta forma de intervenção, o Estado, por ser titular da exploração das atividades econômicas, recebe o mesmo tratamento jurídico dispensado aos particulares. É o que convém chamarmos de Estado Empresário28.

A intervenção estatal indireta refere-se à cobrança de tributos, concessão de subsídios, subvenções, benefícios fiscais e creditícios, e de maneira geral, à regulamentação normativa de atividades econômicas a serem naturalmente desenvolvidas por particulares.29

O poder de regular abrange o poder de legislar e corresponde ao próprio poder de governar, isto é, o poder de restringir, proibir, intervir, proteger, encorajar, promover e até mesmo tributar, tendo em vista qualquer objetivo publico, desde que sem violação aos direitos das pessoas. 30

José Afonso da Silva ensina que o Estado intervém no domínio econômico nas modalidades participação e intervenção. Na primeira modalidade o Estado é parte ativa no exercício de atividades econômicas, ou seja, agente atuante direto, amparado nos artigos 173 a 177 da Constituição de 1988. Já na segunda

27 Há distinção entre atuação e intervenção. Nas palavras do jurista, intervenção, em sentido rigoroso,

caracteriza atuação em área de outrem, porém, se usadas as expressões para manifestar o mesmo significado, pouco importará o termo a ser usado. GRAU, Eros Roberto. Op.Cit. p. 91 (nota2)

28 AGUIAR, Glauco Lubackeski de. Tributação Extrafiscal e Intervenção Econômica. Marília, 2008.

221f. Dissertação de Mestrado em Direito pela Universidade de Marília.p.85.

29 TAVARES, André Ramos. Op.cit. p. 73 (nota 10)

30 ELALI, André. Incentivos Fiscais Internacionais: concorrência fiscal, mobilidade financeira e crie do

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modalidade de intervenção, o Estado aparece como agente normativo e regulador da atividade econômica, compreendendo as atividades de fiscalização, incentivo e planejamento, com fundamento no art. 174 também da Constituição de 1988.31

A intervenção por via da regulamentação da atividade econômica surge como pressão do Estado sobre a economia para devolvê-la á normalidade, ou seja, manter um regime de livre concorrência. Mais especificamente, quando o estado intervém na atividade econômica com a função de incentivador ele estará promovendo a economia de forma a proteger, estimular, auxiliar e favorecer as atividades particulares que satisfaçam necessidades de caráter geral.

Na lição de Eros Grau, a intervenção pode ocorrer de três maneiras: por absorção ou participação, que é forma de intervenção no domínio econômico, sendo forma de intervenção direta; e por indução e direção, que seriam formas de intervenção sobre o domínio econômico (ação estatal como regulador da atividade econômica em sentido estrito); sendo estas, formas de intervenção indireta.32A intervenção indireta

ocorre por meio de normas jurídicas, sendo estas cogentes quando diretivas e dispositivas quando indutoras.

A regulação estatal é dirigida preponderantemente aos particulares, mas também às entidades estatais. O Estado, por meio de seu poder normativo ou regulatório pode coagir ou induzir comportamentos, ou seja, direcioná-los. Tal atividade traduz-se em planos, compromissos e deveres jurídicos assumidos pelos órgãos estatais. Esses deveres devem assegurar segurança jurídica à sociedade, reduzindo os riscos de certas atividades socialmente desejáveis.

O equilíbrio econômico e social conduzido pelo Estado é necessário frente às crescentes atividades econômicas cotidianas e às necessidades sociais, que clamam por segurança jurídica e o cumprimento dos direito e garantias fundamentais. A atuação do Estado na busca do interesse comum passa a ser de parceria com o particular na execução do poder econômico, que é reconhecido como legitimo pelo mesmo Estado.

A interferência do agente privado em negócios de interesse público não dispensa o seu acompanhamento pelo Estado. Os interesses público-privados serão concatenados para a consecução do objetivo comum do poder econômico que é o

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aumento dos lucros, mas com a regulação do mercado pelo Estado nas mais diversas áreas: trabalho, consumo, concorrência, tributos.

Sendo assim, a atuação do Estado sobre o domínio econômico configura instituto fundamental da economia de mercado, tendo extrema relevância por conformar as relações econômicas e o exercício da atividade econômica de acordo com os objetivos traçados pela Constituição.

É importante ter em vista as razões que fundamentam a atuação do Estado Brasileiro no domínio econômico, porque se essa atuação não se assenta nos princípios da ordem econômica, não pode também ser vista como simples exceção, na medida em que tanto a iniciativa privada como a estatal se destinam ao mesmo objetivo de realização daqueles fins, princípios e fundamentos.

2.2 A Tributação como instrumento de intervenção econômica: As normas tributárias indutoras

A regulação econômico-social é um dos tipos de atividade estatal, realizada tanto no desempenho da atividade administrativa como legislativa, jurisdicional e de controle. Para Marçal Justen Filho33 “a regulação consiste na adoção de normas e

outros atos estatais, sem se traduzir na aplicação direta de recursos do Estado para desempenho direto de alguma atividade no domínio econômico-social”. A regulação

seria assim, um instrumento de promoção consciente dos fins essenciais do Estado. A obtenção de receita e a realização de gastos para atender as necessidades públicas ocorre por meio da atividade financeira do Estado. Para que o Estado alcance seus fins e objetivos políticos, ele necessita de recursos financeiros, cujo maior veículo é o ingresso das receitas públicas.34 A arrecadação tributária constitui o principal item da receita, nao sendo sua única fonte de receita.

A tributação é sem duvida o instrumento de que se tem valido a economia capitalista, pois sem os tributos o Estado não poderia realizar seus fins sociais, a nao ser que monopizasse toda a atividade economica.35

33 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2008,p.533.

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A relação tributária não é apenas uma relação de poder entre o Estado e o contribuinte, mas também uma relação fundamentada na soberania do Estado e nos princípios do Estado de Direito. É importante ressaltar que o poder de tributar é um aspecto da soberania estatal, o que torna exercicio da tributação fundamental aos interesses dos Estado.

Várias são as questões de mercado que conduzem a política tributária, e talvez por isso hoje se observa que a estrutura do Sistema Tributário Brasileiro muito mais desestimule a atividade economica do que estimule36. Reclama-se por uma eficiente política global diante de claros problemas de estrutura e interesses políticos sobretudo.

No mercado globalizado é ainda mais relevante o papel estatal no incentivo do desenvolvimento econômico como pano de fundo de um mercado eficiente e forte. A regulação estatal se torna necessária e legitima quando não há condiçoes de funcionamento satisfatoria do mercado, o que se passa essencialmente nos casos de ausência de concorrência perfeita.37

Os tributos são meios hábeis a efetivar a intervenção no domínio econômico com a finalidade de retificar desarranjos em setores da atividade econômica, servindo como instrumento de intervenção na medida em que são normas indutoras, ou como meio de custeio desta intervenção quando são fonte de recursos para que o Estado possa, utilizando-os, atuar com tal objetivo.

No exercicio do poder regulatório38 do Estado, o poder público pode estabelecer

situações desonerativas de gravames tributários, mediante a concessão de incentivos e benefícios fiscais, com o natural objetivo de estimular o contribuinte à adoção de determinados comportamentos, tendo como propósito governamental secundário a realização do interesse público.

Assentou-se anteriormente que a intervenção indireta do Estado sobre a economia pode-se operar, conforme classificação adotada por Eros Roberto Grau,

“por direção” ou “por indução”. Como a intervenção indireta se materializa por meio

36 COSTA, Alcides Jorge. Notas de aula. Programa de Mestrado em Direito do Mackenzie. São Paulo.

Setembro de 2010.

37

“A deficiência na concorrência caracteriza-se quando não existe disputa suficiente e equilibrada no mercado, o que impede que a concorrência econômica produza seus efeitos positivos.” JUSTEN FILHO, Marçal. Op.Cit. p.533-39 (nota 33)

38

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das normas jurídicas, então estas normas ora terão cunho diretivo, ora terão

natureza indutora. Daí se falar em “normas de direção” e “normas de indução”.

Na intervenção por direção os comandos normativos são dotados de imperatividade e cogência, vale dizer, são impositivos de certos e obrigatórios comportamentos a serem observados pelos agentes econômicos. As normas de intervenção por direção, porque impõem uma conduta compulsória ao agente econômico, se não cumpridas pelo seu destinatário, o sujeitam a sanções. Por isto

que Luís Eduardo Schoueri afirma que “[...] A norma de direção vincula a determinada hipótese um único conseqüente” 39.

Já na intervenção por indução, as normas jurídicas assumem qualidade distinta das normas diretivas, pois neste caso o Estado intervém pela positivação de regras dispositivas, ou seja, em vez de coagir o destinatário da norma pela vinculação de sanção, o Estado privilegia aqueles mais desejáveis40, influenciando na formação de sua vontade pela via do incentivo ou do desestímulo. Neste caso, “[...] O Estado abre

mão do seu poder de dar ordens, substituindo-o por seu poder econômico, com

efeito equivalente”.41

Como a norma indutora tem natureza dispositiva, pode ser que o sujeito econômico opte por não conduzir sua ação econômica no sentido pretendido pelo legislador, mas nem por isto recairá em comportamento ilícito. Em verdade, a norma indutora abre-lhe duas alternativas de, realizando a hipótese por ela descrita, sofrer as conseqüências prescritas – sejam estimulantes ou desestimulantes daquele comportamento – ou então escolhe comportar-se de modo distinto da previsão normativa, em outro sentido42.

Detalhe interessante das normas indutoras é que elas podem assumir tanto feição positiva como negativa, segundo os efeitos que produzam. Esta colocação é importante porque em um primeiro momento pode parecer que a intervenção por indução represente, sempre, estímulos, incentivos, benefícios, quando, em verdade, podem instituir normas indutoras com caráter desestimulante, como é exemplo a pesada tributação do cigarro, ou seja, a produção e comercialização deste produto

39 SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica. Rio de Janeiro:

Forense, 2005, p. 43

40 ELALI, André. Tributação e Regulação Econômica um exame da tributação como instrumento de

regulação econômica na busca da redução das desigualdades regionais. São Paulo: MP Editora, 2007, p. 104

41 SCHOUERI, Luís Eduardo. Op.cit., p. 44 (nota 39)

42 AGUIAR, Glauco Lubackeski de. Tributação Extrafiscal e Intervenção Econômica. Marília, 2008.

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não são vedadas; a livre iniciativa é assegurada, entretanto, por razões outras –

saúde pública, etc.43

Deste modo, a distinção jurídica entre a norma de direção e a norma indutora reside no seu objeto que é o grau de liberdade do administrado. Enquanto aquela tem por propósito impor um comportamento ao agente econômico, obrigando-o a agir conforme sua previsão, sob pena de sofrer sanções; esta faculta ao agente econômico a liberalidade de observá-la ou não, sem que isto lhe acarrete sanções. Evidente que uma vez tendo optado por agir consoante a previsão da norma indutora e concretizada a hipótese normativa, estará ele vinculado à conseqüência prescrita. Outro ponto relevante ao se tratar de normas indutoras é quanto ao seu conteúdo, pois para identificá-las é preciso observar sua finalidade pela perspectiva econômica. É possível identificar-se inúmeras normas, com os mais diversos conteúdos, com finalidade indutora. Dentre estas, sobressaem-se, no universo jurídico normativo brasileiro, as normas tributárias.

No âmbito tributário, empregam-se os termos fiscalidade e extrafiscalidade para indicar essas finalidades. Destacando neste contexto as regras tributárias de caráter extrafiscal, ou seja, as que perseguem objetivos alheios aos meramente arrecadatórios; observamos o mecanismo dos benefícios fiscais oferecidos para fomentar iniciativas de interesse público e incrementar a produção e o consumo, quando necessário ao desenvolvimento socioeconômico.

Este destaque no bojo da indução econômica é resultante, ao menos em nível nacional, da soma de alguns fatores como, por exemplo, a elevada carga tributária brasileira e o emaranhado legislativo-tributário existente no país. Assim, normas de indução com conteúdo tributário são eficazes do ponto de vista social, porque, ao estimular ou desestimular os comportamentos econômicos, seu efeito é imediato, em razão da realidade brasileira subjacente às circunstâncias de sua criação.

Em razão de seu especial posicionamento dentro da ordem jurídica vigente, as normas tributárias indutoras submetem-se a dois regimes jurídicos – econômico e tributário, sem prevalência de um ou de outro, pois ambos são externados no plano constitucional, o que revela a necessária aplicação de todos os princípios tributários e econômicos como instrumentos de interpretação da norma isentiva. Quer-se dizer assim, que não há dissociação entre a ordem econômica e a ordem tributaria.

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Em essência, antes de indutora, a norma jurídica é tributária. Ou, valendo-se das lições semiótica, a norma tributária indutora é do ponto de vista sintático e semântico uma norma tributária; mas na perspectiva pragmática, ela é norma indutora44. Em conseqüência, toda norma tributária indutora possui natureza extrafiscal, na medida em que sua finalidade sempre é de fomento ou desestímulo de condutas econômicas, com vistas à promoção de objetivos socioeconômicos.

Por ser a maior fonte de renda do Estado, os tributos têm grande repercussão sobre a economia e sobre isso não há discussão. Assim, a tributação pode gerar facilidades e/ou dificuldades para o exercício das atividades empresariais configurando, pois, instrumento de intervenção do Estado na Economia. Os tributos, como instrumentos de intervenção das pessoas políticas na economia, para fins de alcance das respectivas autonomias financeiras, apresentam funções que os diferenciam de acordo com sua natureza fiscal ou extrafiscal.

Originariamente, os tributos foram criados para dotar o Estado de recursos, financiando suas atividades essenciais. Essa é a função fiscal do tributo. O objetivo dos tributos era concebido de tal modo que a sociedade financiasse o Estado.45

Posteriormente, os tributos deixaram de ser apenas fonte de receita para o Estado e passaram também a ser instituídos, majorados e até extintos com a finalidade de intervenção do Estado na economia, o que qualificou sua função extrafiscal46.

O tributo terá natureza extrafiscal quando ficar caracterizada uma finalidade política, econômica ou social alheia ao objetivo meramente arrecadatório de dinheiro para os cofres públicos. Na extrafiscalidade, o que orienta a tributação não é, primordialmente, o interesse em arrecadar os tributos, mas a necessidade de intervenção estatal no seio social ou na economia, com o intuito de se realizar um fim pré-determinado. O finalismo extrafiscal impregnado nas normas tributárias é sempre o seu objetivo primordial, ou seja, nestas normas é o resultadoque dela advém que se tem por importante; o comportamento consagrado na hipótese normativa e as conseqüências jurídicas surgidas dos eventuais fatos jurídicos realizados naqueles termos são secundários47.

44 AGUIAR, Glauco Lubackeski de. Op.cit. p.97 (nota 42) 45 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Op.Cit. p.311 (nota 12)

46CAMPANELLI, Daniela Moreira. Incentivos tributários estaduais concedidos unilateralmente e

segurança jurídica. São Paulo, 2010.192f. Dissertação de mestrado em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica. p.69.

(26)

Deste modo, as normas tributárias indutoras, porque não visam arrecadação de dinheiro aos cofres públicos e possuem estrutura condicional-imperativa com características pragmáticas, podem positivar benefícios e desvantagens, segundo o comportamento que se pretenda ver realizado. Os comportamentos econômicos podem ser induzidos por meio de deveres instrumentais (obrigação acessória, na linguagem do Código Tributário Nacional), também mediante a criação de regimes especiais de tributação (simplificadores ou agravantes) ou pela concessão de incentivos fiscais os mais diversos (imunidades, isenções, anistias, concessões de créditos presumidos, etc.) 48

As normas tributárias extrafiscais se submetem ao regime jurídico econômico em razão de sua finalidade indutora, indicativa da intervenção econômica indireta; e se submetem ao regime jurídico tributário por serem, antes de tudo, uma norma tributária que conforma uma hipótese tributária. Ainda nas palavras de Glauco

Aguiar, “a finalidade extrafiscal da norma tributária não descaracteriza sua estrutura

normativa; em verdade, ela continua a regular as relações jurídicas tributárias, de

modo que o regime tributário também deve ser observado” 49.

Inegável a finalidade de intervenção econômica das normas tributárias de função extrafiscal. Razão que valida a compatibilidade da norma tributária extrafiscal com os princípios e regras que estruturam tanto o sistema tributário como também a ordem econômica para ser meio de efetivação de políticas públicas.

2.3 A Livre iniciativa como fundamento da ordem econômica e tributária

Uma nação não progride ou mesmo sobrevive sem o constante desenvolvimento e aperfeiçoamento de seus setores e agentes econômicos, cujos princípios norteadores encontram-se dispostos na Constituição Federal.

Imperativo constitucional vigente, pois, a necessidade de observação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência no âmbito da atividade econômica, princípios estes estruturantes da ordem econômica constitucional.

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A atividade econômica devidamente organizada gera o desenvolvimento, pois cumpre a sua finalidade de satisfação de necessidades. Em outras palavras, a atividade econômica eficiente tem por finalidade desencadear o desenvolvimento. Dessa maneira o desenvolvimento representa sucesso na organização da produção e na satisfação das necessidades.50

Observadas as limitações que a própria Constitução Federal estabelece, constitui-se em fundamento de nossa ordem econômica a possibilidade concedida a todos de se lançarem no desempenho de qualquer atividade economica licita, permitida em lei ou autorizada pela autoridade competente.

A constituição federal menciona o princípio da livre iniciativa tanto no artigo 1°, IV, quanto no artigo 170, caput. Pois bem, o princípio da livre iniciativa, em tensão com a valorização do trabalho, precisa ser alçado a uma condição diferenciada em relação aos demais princípios da ordem econômica. Cumpre ao Estado assegurar os fundamentos da ordem a partir dos princípios, mas não pode em nome destes princípios eliminar a livre iniciativa nem desvalorizar o trabalho.51

Para Diego Bomfim52, o princípio da livre iniciativa deve ser entendido como a

possibilidade de atuação particular no domínio econômico sem embaraços do poder público, ou seja, é parcela de liberdade, desdobrada como liberdade ao exercício de atividade econômica.

Celso Ribeiro Bastos53 define livre iniciativa como:

[...] uma manifestação, no campo econômico, da doutrina favorável à liberdade: o liberalismo. Este tem por objeto o pleno desfrute da igualdade e das liberdades individuais frente ao Estado. Assim sendo, a livre iniciativa consagra a liberdade de lançar-se à atividade econômica sem se deparar com restrições impostas pelo Estado.

Eros Roberto Grau54 explica que “Livre iniciativa é termo de conceito

extremamente amplo, que expressa desdobramento da liberdade”.55 No mesmo

50 DEL MASSO, Fabiano. Direito Econômico. Rio de Janeiro: Elsevier: Campus Jurídico, 2007.p.103. 51 BOMFIM, Diego. Op.Cit. p. 173 (nota 5)

52 Idem. Ibidem.

53 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 451. 54

“[...] a liberdade no Estado do século XXI não é a mesma vigente no século XIX. Se nos primórdios do constitucionalismo a liberdade aparecia como uma garantia do indivíduo diante dos desmandos do soberano, ela surge hoje em sentido socialmente comprometido. SCHOUERI, Luís Eduardo. Op.Cit. p.245 (nota 3)

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raciocínio, o autor descreve essa liberdade como “sensibilidade e acessibilidade a

alternativas de conduta e de resultado.

Em sua origem, o princípio da livre iniciativa na ordem econômica era expressão

de uma garantia de legalidade: “liberdade de iniciativa econômica é liberdade pública

precisamente ao expressar não sujeição a qualquer restrição estatal senão em virtude de lei”; jamais sendo considerada em termos absolutos.56 Uma das faces da

livre iniciativa se expõe como liberdade econômica, cujo titular é a empresa. Todavia, não se pode visualizar no princípio apenas a liberdade de desenvolvimento da empresa ou a consagração do capitalismo.

Observadas as limitações que a própria constituição oferece, a livre iniciativa, como fundamento da ordem econômica, é a possibilidade concedida a todos de se lançarem no desempenho de qualquer atividade econômica lícita ou que seja permitida por lei e organizada por autoridade competente.57

A livre iniciativa abre o caminho dos empreendedores ao mercado, para que produzam mercadorias e ofereçam serviços, o que, por conseguinte, culmina na natural competição – ou concorrência – pelos potenciais clientes de seus produtos ou serviços. E assim, a concorrência formada gera a necessidade do desenvolvimento de estratégias competitivas, uma vez que a presença de vários ofertantes desencadeará, em regra, necessidade de os agentes econômicos serem mais eficientes.58

Em síntese, a livre iniciativa significa a liberdade dos indivíduos no plano econômico, não apenas de empresas, mas também de trabalho, no que se refere aos fins e meios adotados na produção, circulação e distribuição de riquezas, podendo tal liberdade ser restringida por lei, posto que como já mencionado essa liberdade não é absoluta.

Fundamentada, portanto, primordialmente nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, a ordem econômica59 determina os limites éticos de produção econômica, que deixam, portanto, de ser éticos para se tornarem legais, quando equilibra o princípio da livre iniciativa com o princípio de defesa do meio ambiente ou

56 GRAU, Eros Roberto. Op.cit. p.205 (nota 3) 57 Artigos 1°,V,5°,XIII,170 caput,199 e 209 da CF/88. 58 DEL MASSO, Fabiano. Op.Cit.p.254 (nota 50)

59 [...] plano de fixação de objetivos para proporcionar o melhor nível de vida possível. A política

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do consumidor, bem como com os princípios tributários. Os fundamentos e princípios constitucionais da ordem econômica funcionam como limites da produção. O que permite ao empreendedor explorar quaisquer atividades livremente, mas ciente dos limites de proteção a alguns valores circunscritos como substanciais para uma vida digna.60

No que se conclui, nas próprias palavras de Fabiano Del Masso, que as medidas de política econômica representam a forma de implementação pragmática dos instrumentos econômicos para se alcançar os resultados dispostos juridicamente na ordemeconômica de uma Constituição.61

Já a livre concorrência, que cuida da liberdade de atuação das forças de mercado na disputa de cientela62, é, pois, a manifestação da liberdade de iniciativa. Um dos fundamentos elementares de quaisquer de todos os sistemas capitalistas, porque:

Sendo livre a concorrência, as leis do mercado determinarão as circunstâncias em que haverá ou não o êxito do empreendedor (livre iniciativa). A livre concorrência não tolera o monopólio ou qualquer outra forma de distorção do mercado livre, com o afastamento artificial da competição entre os empreendedores. Pressupõe, pelo contrário, inúmeros competidores, em situação de igualdade.63

O fim da ordem econômica delineado pela Constituição Federal deve ser buscado, no domínio econômico, por meio da forma de produção capitalista, desde que preservada ao máximo a livre iniciativa e os demais princípios da ordem econômica, dentre os quais a livre concorrência.64

60 DEL MASSO, Fabiano. Op.Cit.p.111 (nota 50) 61 Idem. Ibidem.p.107.

(30)

3. A LIVRE CONCORRÊNCIA E OS INCENTIVOS FISCAIS UNILATERAIS

3.1 O princípio da Livre Concorrência como limite às exonerações fiscais

Os ideais da ordem econômica não se divorciam da ordem tributária, devendo ser a tributação instrumento de aperfeiçoamento da ordem econômica. A livre concorrência não deve ser vista de forma isolada, mas sempre em interação com outros princípios constitucionais.

O poder de tributar, que envolve o poder de isentar65, é regulado na Constituição por princípios rígidos de raízes históricas e políticas do regime democrático por ela adotados. Vários desses princípios abrigam limitações ao exercício deste poder e não apenas à competência tributaria.66 Também são limitadores ao poder de tributar os princípios prescritos na ordem econômica.

Dentre os campos em que a tributação mais de perto se relaciona com a ordem econômica, se destaca a livre concorrência, que poderá servir de guia ou limite para a conformação da norma tributária. Ainda Luis Eduardo Schoueri67, tratando da

relação entre os temas da tributação e da livre concorrência, esclarece que

o efeito indutor da norma tributaria poderá permitir que a concorrência se aperfeiçoe. O efeito indutor da norma tributaria, entretanto, poderá produzir conseqüência inversa, quando afeta a concorrência, reduzindo o grau de liberdade preexistente. Nesse caso, será a livre concorrência que servirá de limite para a formulação da norma tributaria: examinar-se-á, portanto, como seu afeito sobre os agentes econômicos afeta o grau de concorrência antes existente.

A livre concorrência não é fundamento da ordem econômica, nem tampouco sua finalidade. Como visto, a ordem econômica funda-se na livre iniciativa e tem a finalidade de garantir a todos uma existência digna. Em diversas situações o princípio da livre concorrência pode ser confrontado com outros princípios, devendo o intérprete legal sopesá-los em função dos critérios da proporcionalidade.

Cumpre então falar do princípio da livre concorrência como desdobramento de outro princípio, qual seja, a livre iniciativa, complementando-a com sua ponderação.

65 BORGES, José Souto Maior. Isenções tributárias. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980.p.41 66 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2010.p.90

(31)

Ao contrario do que possa parecer, não existe entre o princípio da livre concorrência e o princípio da livre iniciativa uma identidade plena; tendo cada princípio seu papel na ordem econômica.68

Assevera ainda Luís Eduardo Schoueri69 que a livre concorrência pressupõe a livre iniciativa, mas com ela não se confunde, já que a livre concorrência inexiste sem a livre iniciativa. A expressão de liberdade da livre concorrência não assegura que os agentes econômicos concorram sem interferência do Estado; ao contrário, ela é uma garantia positiva de que a concorrência deve ser alcançada pelos agentes e assegurada pelo Estado. Não é uma liberdade individual do agente econômico, mas da sociedade como um todo. O artigo 219 da constituição aponta o mercado interno como patrimônio nacional, sendo a liberdade de concorrência garantia de funcionamento do mercado. A concorrência deve estar aberta a todos e voltar-se ao interesse coletivo.

Para garantir a livre concorrência o legislador constituinte dispôs no artigo 174, § 4° que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Note-se que a constituição não condena o exercício do poder econômico, mas seu abuso suscita a intervenção estatal coibindo os excessos que prejudiquem o livre funcionamento das estruturas de mercado. Particularmente em relação à concorrência, o exercício do poder econômico será tido como ilícito se empregado abusivamente.

O princípio da livre concorrência expressa a vedação de qualquer ação, estatal ou particular, que objetive influir no livre jogo de mercado e crie um desequilíbrio na competição entre os agentes econômicos. Ocorrendo, no entanto, o desequilíbrio, a intervenção econômica é necessária para assegurar a manutenção da concorrência.70

O Setor Público tem grande participação na vida econômica de um Estado, uma vez que além das receitas tributárias e outras espécies de ingressos públicos, o Estado intervém sobre a economia mediante regulação, incentivo, planejamento e

68 Sem a presença da livre iniciativa não há que se falar em livre concorrência [...], sendo a livre

concorrência um delineador da livre iniciativa. BOMFIM, Diego. Op.Cit. p. 173-175.

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fiscalização71. A tributação72 é sem dúvida a maior fonte de receita do Estado. É sua

base financeira, sendo rico instrumento de indução do comportamento dos agentes econômicos que atuam no mercado.73 Por isso, existindo um sistema tributário ineficiente, que gere conflitos frente aos princípios da ordem econômica, esse sistema poderá ser grande óbice ao desenvolvimento econômico, que é um dos objetivos da federação.

Elevada a princípio constitucional, a livre concorrência exige que o estado a defenda, abrindo espaço para a defesa da concorrência. A ordem econômica não protege a livre atuação dos agentes do mercado a qualquer custo. Ao contrário, essa atuação deve ser monitorada pelo Estado que poderá intervir direta ou indiretamente, fixando regras de enquadramento e orientação ou induzindo o comportamento dos agentes por meio de estímulos e desestímulos.74 “Não se trata da liberdade dos agentes econômicos isoladamente, mas da liberdade da sociedade como um todo. O que se defende é a concorrência e não os concorrentes.” 75

O princípio da livre concorrência, portanto, não permite uma concorrência desenfreada e ilimitada incapaz de gerar ganhos econômicos à sociedade como um todo, sempre tendo em mente que a ordem econômica tem por fim assegurar existência digna a todos, conforme os ditames da justiça social.

O princípio da livre concorrência ao lado do princípio da livre iniciativa, conforma a ordem econômica, entendida como uma ordem que protege a livre iniciativa, desde que não maculada a livre concorrência. A livre concorrência, por tanto, legitima a regulação econômica acerca de certas praticas mercadológicas consideradas ofensivas sobre as atividades econômicas, para que abusos decorrentes do exercício descontrolado da atividade econômica sejam equilibrados.76

A livre concorrência tem por escopo garantir a todos os que pretendam atuar no mercado uma condição de ingresso, isto é, uma garantia de atuação em condições

71 SOUZA, Sharon Cristine Ferreira de; Costa, Patricia Ayub da; Tributação, Política Fiscal e

Desenvolvimento Econômico. Disponível em http://www.idtl.com.br/artigos/294.pdf. Acesso em 01 de novembro de 2011.

72 A tributação consiste na expropriação lícita do patrimônio dos contribuintes, conforme explicitado no

artigo 3º do Código Tributário Nacional, para que o Estado cumpra suas funções e alcance o bem comum.

73 Parte-se da premissa de que o mercado depende da concorrência e que estes conceitos

pressupõem a atuação do Estado. SALOMÃO Filho, Calixto. Direito Concorrencial - as condutas. São Paulo: Malheiros, 2003,p.55.

74 SCHOUERI, Luís Eduardo. Op.Cit. p.246 (nota 3) 75SCHOUERI, Luís Eduardo. Tributo ao Mercado

– Desequilíbrio concorrencial tributário e a Constituição: Um debate. ETCO. São Paulo: Saraiva, 2010.p.33.

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