LÍVIA MARANGONI ALFAYA
Processamento auditivo em crianças infectadas pelo Vírus da
Imunodeficiência Humana
Processamento auditivo em crianças infectadas pelo Vírus da
Imunodeficiência Humana
Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo para a obtenção do título de mestre em Ciências Médicas
Área de concentração: Mecanismos Fisiopatológicos nos Sistemas Visual e Áudio-Vestibular.
Orientadora: Profª Drª Myriam de Lima Isaac
Alfaya, Lívia Marangoni
Processamento auditivo em crianças infectadas pelo Vírus da Imunodeficiência Humana. Ribeirão Preto, 2007.
108 f. : il. ; 30cm
Dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP. Área de concentração: Mecanismos Fisiopatológicos nos Sistemas Visual e Áudio-Vestibular.
Orientador: Isaac, Myriam de Lima.
Agradeço a Deus pela presença grandiosa e constante em minha vida, orientando meus passos, abençoando minhas decisões e oferecendo sempre mais do que preciso!
Aos meus pais, João e Vanda, pela base sólida, exemplo de caráter e por nunca mediram esforços para que pudesse alcançar meus objetivos. Especialmente à minha mãe, pela compreensão e incentivos permanentes na busca pelos meus sonhos. Amo vocês!
À minha irmã, Thaís, pelo apoio, amizade e opiniões sinceras e ao meu cunhado, Toninho, pela amizade, exemplo de dedicação e disposição e também pelos suportes de informática. Amo vocês também!
Aos meus tios, primos e familiares pela amizade, companhia e conselhos. Obrigada por fazerem parte da minha vida!
À Drª Myriam de Lima Isaac, pela participação fundamental nesse projeto, pela atenção, amizade e carinho e principalmente por ser modelo de determinação, inteligência, respeito e humanidade.
Às Fonoaudiólogas e amigas Fabiane Couto Garcia, Gisele Doricci, Danielle Domenis, Juliana Andrez, Ana Paula André, Cristiane Garcia, Mônica Mendonça e Marília Trevisani que, de alguma forma, colaboraram para a realização desse projeto.
Aos funcionários do Setor de Fonoaudiologia por compreenderem minhas necessidades e pela disponibilidade do espaço físico e equipamentos para realização deste projeto, especialmente à Fgª Alessandra Kerli da Silva Manfredi e as secretárias, Juliana e Sandra, pela disposição e bom humor sempre presentes.
Aos funcionários do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, principalmente à Cecília, Rogério, Rita e Edson, sempre muitos prestativos, eficientes e atenciosos.
À Fgª Alina Sanches Gonçalves, pela ajuda imprescindível e orientações valiosas na realização dos testes do processamento auditivo.
À Fgª Adriana R. T. Anastásio, pela gentileza em compartilhar os espaços físicos e equipamentos destinados aos alunos da graduação.
“Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma.”
ALFAYA, L. M. - Processamento auditivo em crianças infectadas pelo Vírus da Imunodeficiência Humana. 108 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2007.
Esta pesquisa teve por objetivo avaliar o processamento auditivo de crianças infectadas pelo HIV por meio de testes comportamentais, Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo (ASPA), composta pelos testes de localização sonora, memória sequencial verbal e não verbal; o teste de Logoaudiometria Pediátrica (Pediatric Speech Test - PSI) nas condições de mensagem competitiva contralateral (MCC) e mensagem competitiva ipsilateral (MCI) e o teste de reconhecimento de dissílabos em tarefa dicótica (SSW em português). Foram avaliadas 15 crianças infectadas pelo HIV em atendimento médico na Unidade Especial de Tratamento de Doenças Infecciosas e 15 crianças sem fatores de risco para infecção pelo HIV, ambas com idade variando entre 8 e 9 anos. A desatenção foi a principal queixa relatada nos dois grupos. Os resultados revelaram alta incidência de alterações nos dois grupos em quase todos os testes aplicados, com exceção do PSI – MCC. Na ASPA a maior incidência de erros foi observada no teste de memória para sons verbais e no PSI o maior número de erros ocorreu na condição MCI. O SSW foi o teste que apresentou maior incidência de resultados alterados com prevalência de erros nas condições competitivas, principalmente na orelha esquerda para os dois grupos. Outro aspecto observado foi a melhora no desempenho na faixa etária de 9 anos. Os achados reforçam a importância do acompanhamento auditivo em crianças com HIV e a necessidade de atenção especial aos aspectos auditivos no processo de aprendizagem, facilitando a detecção precoce de desordens no processamento auditivo bem como o seu tratamento adequado.
ALFAYA, L. M. - Auditory processing in children with Human Immunodeficiency Virus. 108 f. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2007.
This research aimed to evaluate auditory processing of HIV-positive children by using the behavioral tests: Simplified Auditory Processing Test (SAPT), which includes sound localization test, verbal and non-verbal memory tests; Pediatric Speech Test – PSI with both Contralateral Competing Message (CCM) and Ipsilateral Competing Message (ICM) and Portuguese version of Staggered Spondaic Word Test. We evaluated 15 children with HIV that were in medical treatment at Special Unity of Infectious Disease Treatment and 15 children with no risk factors to be infected by HIV. All children had their age ranging from 8 to 9 years old. Lack of attention was the main complaint in both groups. The results show high incidence of alterations in both groups in almost every test applied, except in PSI (CCM). Analyzing the SAPT we detected prevalence of wrong answers in verbal memory test and in PSI the greater number of errors was at ICM condition. SSW was the test which showed high incidence of wrong results with prevalence of mistakes on overlapping conditions, mainly in left ear to both groups. Another observed aspect was the improvement that occurred at age of 9 years old. The findings reinforce the importance of auditory follow up from HIV infected children and the necessity of giving special attention to the auditory aspects at learning process, making the auditory processing disorders easy to be early detected as well as providing suitable treatment.
Figura 1 - Critérios de referência de normalidade para o teste SSW ... 28
Figura 2 - Testes do processamento auditivo e suas correlações com os mecanismos fisiológicos auditivos e habilidades auditivas ... 30
Gráfico 1 - Freqüência de alterações na ASPA nos Grupos 1 e 2 ... 40
Gráfico 2 - Freqüência de alterações por teste da ASPA ... 41
Gráfico 3 - Freqüência de alterações no PSI nos Grupos 1 e 2 ... 47
Gráfico 4 - Comparação do desempenho dos grupos para o teste PSI nas condições MCC e MCI ... 49
Tabela 1 - Caracterização dos grupos quanto ao gênero e a idade ... 34 Tabela 2 - Principais queixas observadas nos grupos obtidas por meio do
questionário para avaliação do Processamento Auditivo ... 35 Tabela 3 - Caracterização da formação do Grupo 1 (f - feminino e m - masculino) e
do desempenho individual dos sujeitos nos testes pesquisados (nl - normal e a - alterado) ... 36 Tabela 4 - Caracterização da formação do Grupo 2 (f - feminino e m - masculino) e
do desempenho individual dos sujeitos nos testes pesquisados (nl - normal e a - alterado) ... 37 Tabela 5- Freqüência de alterações na Timpanometria em valores absolutos (N) e
relativos (%)... 38 Tabela 6 - Distribuição dos grupos para o teste Timpanometria. Valores
apresentados em número absoluto (N) e porcentagem (%) ... 38 Tabela 7 - Distribuição dos grupos para o teste Reflexo Acústico Contralateral.
Valores apresentados em número absoluto (N) e porcentagem (%) ... 39 Tabela 8 - Distribuição dos resultados alterados nos grupos segundo a faixa etária
nos testes da Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo em valores absolutos (N) e relativos (%) ... 42 Tabela 9 - Distribuição dos grupos para o teste de localização sonora em valores
absolutos (N) e relativos (%), Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com 95% de confiança (IC 95%) ... 43 Tabela 10 - Distribuição dos grupos para o teste memória sequencial verbal em
valores absolutos (N) e relativos (%), Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com 95% de confiança (IC 95%) ... 44 Tabela 11 - Distribuição dos grupos para o teste memória sequencial não verbal em
valores absolutos (N) e relativos (%), Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com 95% de confiança (IC 95%) ... 45 Tabela 12 - Distribuição dos grupos em valores absolutos (N) e relativos (%) para o
teste RCP, Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com 95% de confiança (IC 95%) ... 46 Tabela 13 - Distribuição dos grupos, em valores absolutos (N) e relativos (%), de
acordo com a faixa etária para o PSI (8 anos) ... 48 Tabela 14 - Distribuição dos grupos, em valores absolutos (N) e relativos (%), de
Tabela 16 - Distribuição dos grupos, em valores absolutos (N) e relativos (%), para o teste PSI - MCI (8 anos) ... 50 Tabela 17 - Distribuição dos grupos, em valores absolutos (N) e relativos (%), para o
teste PSI - MCI (9 anos) ... 51 Tabela 18 - Distribuição dos grupos, em valores absolutos (N) e relativos, para o
teste SSW ... 52 Tabela 19 - Valores médios absolutos (N) do número de erros no SSW em cada uma
das condições avaliadas distribuídos de acordo com o grupo e com a faixa etária ... 53 Tabela 20 - Valores médios absolutos (N) do número de erros no SSW em cada
orelha de acordo com o grupo e faixa etária ... 53 Tabela 21 - Panorama geral da freqüência de resultados alterados, em valores
absolutos (N) e relativos (%) apresentados por cada grupo na pesquisa do RAC e nos testes da avaliação comportamental do processamento auditivo ... 54 Tabela 22 - Frequencia de erros em cada coluna do SSW no Grupo 1 ...
99
Tabela 23 - Frequência de erros em cada coluna do SSW no Grupo 1 para a faixa etária de 8 anos ... 100 Tabela 24 - Frequencia de erros em cada coluna do SSW no Grupo 1 para a faixa
etária de 9 anos ... 100 Tabela 25 - Frequencia de erros em cada coluna do SSW no Grupo 2 ... 101 Tabela 26 - Frequencia de erros em cada coluna do SSW no Grupo 2 para a faixa
etária de 8 anos ... 102 Tabela 27 - Frequencia de erros em cada coluna do SSW no Grupo 2 para a faixa
etária de 9 anos ... 102 Tabela 28 - Distribuição da freqüência de acertos, em valores relativos (%), em cada
condição do SSW, nos sujeitos do Grupo 1 ... 103 Tabela 29 - Distribuição da freqüência de acertos, em valores relativos (%), em cada
ASHA American Speech-Language Hearing Association ASPA Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo
AT Audiometria Tonal
dB decibel dBNA decibel Nível de Audição dBNS decibel Nível de Sensação
DPA Desordem do Processamento Auditivo
DC Direita competitiva
DNC Direita não-competitiva
EC Esquerda competitiva
EEG Eletro Encefalograma
ENC Esquerda não-competitiva
HAART Highly Active Anti-retroviral Therapy HCRP Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto HIV Human Immunodeficiency Virus
Hz Hertz
IPRF Índice Percentual de Reconhecimento de Fala LRF Limiar de Reconhecimento de Fala
LS Localização Sonora
MSNV Memória Sequencial Não Verbal MSV Memória Sequencial Verbal
OD Orelha Direita
OE Orelha Esquerda
PA Processamento Auditivo
PSI Pediatric Speech Test
RAC Reflexo Acústico Contralateral RCP Reflexo Cócleo - Palpebral
SIDA Síndrome da Imunodeficiência Adquirida SRT Speech Reception Threshold
SSW Staggered Spondaic Word Test
TC Tomografia computadorizada
1 INTRODUÇÃO ... 1
2 REVISÃO DE LITERATURA ... 5
2.1 VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA E DESENVOLVIMENTO ... 6
2.2 VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA E AUDIÇÃO ... 9
2.3 PROCESSAMENTO AUDITIVO ... 12
3 OBJETIVOS ... 16
3.1 GERAL... 18
3.2 ESPECÍFICO... 18
4 CASUÍSTICA E MÉTODO... 19
4.1 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS ... 20
4.2 SUJEITOS ... 20
4.3 PROCEDIMENTOS... 21
4.4 EQUIPAMENTOS ... 31
4.5 ANÁLISE DOS RESULTADOS ... 31
5 RESULTADOS ... 33
5.1 CARACTERIZAÇÃO DA CASUÍSTICA ... 34
5.2 RESULTADOS DA AVALIAÇÃO AUDIOLÓGICA BÁSICA...38
5.3RESULTADOS DOS TESTES DA AVALIAÇÃO COMPORTAMENTAL DO PROCESSAMENTO AUDITIVO ... 39
5.3.1 AVALIAÇÃO SIMPLIFICADA DO PROCESSAMENTO AUDITIVO... 39
5.3.2 PEDIATRIC SPEECH TEST - PSI ... 47
5.3.3 STAGGERED SPONDAIC WORD TEST - SSW ... 51
6 DISCUSSÃO ... 55
7 CONCLUSÃO... 72
REFERÊNCIAS ... 74
APÊNDICES ... 91
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA) é causada pelo Vírus da
Imunodeficiência Humana (Human Immunodeficiency Virus – HIV), sendo primeiramente
descrita em 1981 pelo “Centers for Disease Control” e caracterizada pelo grave
comprometimento da resposta imune do indivíduo.
Em 1983 foi descrito o primeiro caso de SIDA infantil e de acordo com o “Centers for
Disease Control” as apresentações são semelhantes àquelas do adulto, isto é, imunodeficiência
inexplicada, caracterizada pela presença de infecções oportunistas em crianças menores de
treze anos de idade (DINIZ; WIENBERG, 1991).
Embora existam consideráveis avanços no tratamento da doença, dados do relatório da
Organização Mundial de Saúde de dezembro de 2002 estimam que 3,2 milhões de crianças
vivem com HIV / AIDS (CASTELO FILHO, 2003).
No Brasil, estima-se que este número esteja em torno de 19.825, além disso,
observa-se acometimento proporcionalmente maior da população feminina em relação à população
masculina o que pode incrementar o número de crianças infectadas (BRASIL..., 2006).
Segundo dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, (2006) a principal via de
transmissão do HIV em crianças é a perinatal (81%) que pode ocorrer durante a gestação,
parto ou no período pós-parto.
Os autores Rachid e Schechter (2003) referem uma relação entre o aumento do risco
de transmissão à medida que progride a imunodeficiência da mãe.
A evolução clínica da SIDA depende de vários fatores como: época da infecção,
genótipo e fenótipo viral, resposta imunológica, constituição genética individual, tratamento
adequado das infecções oportunistas, carga viral sistêmica e uso de medicamentos
anti-retrovirais, os quais têm proporcionado aumento na esperança de vida dos portadores do HIV
Além disso, a manifestação precoce da SIDA pode agravar o comprometimento das
habilidades cognitivas. Smith et al. (2006) obtiveram resultados sugestivos do
comprometimento significante de habilidades cognitivas em crianças com HIV que
apresentavam manifestação precoce da SIDA, quando comparadas ao grupo de crianças
infectadas pelo HIV.
De acordo com a literatura, (BROUWERS et al., 1994; CHAO et al., 2004;
EXHENRY; NADAL, 1996; KNIGHT et al., 2000), as células do sistema nervoso central são
claramente um importante alvo secundário do HIV e mesmo na ausência de níveis detectáveis
de carga viral no sangue a replicação viral continua (CHAO et al., 2004).
A infecção desse sistema ocorre precocemente, sendo a idade e a via de transmissão
fatores determinantes para o risco de encefalopatia (MITCHELL, 2001). São freqüentes as
alterações como: microcefalia, hiporreflexia, retardo no desenvolvimento neuropsicomotor,
atraso de linguagem e sinais piramidais (CAREY et al., 2006; FRANKLIN et al., 2005;
ROCHA, et al. 2005).
A importância do diagnóstico precoce de alterações neurológicas indicando o
comprometimento do sistema nervoso central ainda é um desafio e, no entanto, deve ser
preconizada, uma vez que com a progressão da doença a infecção pelo HIV pode provocar
efeitos devastadores, sendo freqüentes déficits de atenção, problemas de comportamento,
alterações no desenvolvimento motor e da linguagem (BLANCHETTE et al., 2001; BRUCK
et al., 2001; CHASE, et al., 2000; SMITH et al., 2006).
Atualmente com a evolução do tratamento clínico por meio da terapia anti-retroviral
tem se observado um aumento na sobrevida dos portadores do HIV (BURQUIER et al., 1997;
CZORNVJ, 2006; SANCHES-RAMON, 2003) e um número cada vez menor de crianças com
central, o que não exclui o risco para o desenvolvimento de alterações neurológicas
(MARTIN et al., 2006).
O sistema auditivo das crianças infectadas pelo o HIV pode apresentar
comprometimento em vários níveis, dentre eles citamos a ação lesiva viral sobre as estruturas
nervosas periféricas e centrais e uso de medicamentos ototóxicos e presença de infecções
oportunistas, ressaltando-se a prevalência de otites médias, levando a perdas auditivas de
graus variados, (DASHEFSKY; WALD, 1994; GONDIM et al., 2000; MARTINS et. al.,
2000; RINALDO et al., 2003). Além disso, alguns autores detectaram perda auditiva nas altas
freqüências após 19 meses de tratamento com AZT (CHRISTENSEN et al., 1998).
A privação sensorial causada pela perda auditiva, mesmo de caráter flutuante, pode ter
como conseqüência alteração da percepção dos estímulos auditivos complexos, incluindo a fala.
Esta degradação do sinal auditivo pode causar prejuízo na representação de sons e nas habilidades
auditivas, que envolvem compreensão de fala em ambiente ruidoso, memória auditiva, integração
binaural e processos temporais (MOORE; HARTLEY; HOGAN, 2003; SANTOS et al., 2001).
Desta forma, a investigação da recepção, análise e organização das informações acústicas
enviadas pelo ambiente ao sistema auditivo periférico e central torna-se imprescindível,
principalmente no caso de crianças infectadas pelo HIV, que apresentam alta susceptibilidade a
alterações otológicas e neurológicas, além de estarem sujeitos a fatores ambientais como falta de
estimulação em decorrência da debilidade materna, hospitalizações freqüentes, etc.
Considerando a freqüência das alterações otológicas, auditivas, de linguagem, fala e
aprendizagem observadas na população atendida pelo serviço de fonoaudiologia na pediatria
da Unidade Especial de Tratamento das Doenças Infecciosas (UETDI) do Hospital das
Clínicas de Ribeirão Preto (HCRP – USP) (ALFAYA et al., 2004; ISAAC et al., 2004)
achamos necessário realizar uma avaliação das características do processamento auditivo
2.1 VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA E DESENVOLVIMENTO
Os primeiros anos de vida constituem um período crítico do desenvolvimento do
sistema nervoso, quando a estimulação regular garante uma maturação adequada do
respectivo sistema neural (AZEVEDO, 1996).
Considerando que a principal via de transmissão do HIV em crianças é a perinatal
(BRASIL..., 2006), as manifestações clínicas da SIDA podem iniciar precocemente, já no
primeiro semestre de vida, sendo um fator importante para o comprometimento do
desenvolvimento das funções cognitivas (MITCHELL, 2001).
Crianças com HIV convivem com uma problemática crônica e podem ter seu
desenvolvimento comprometido por alterações biológicas, decorrentes dos danos causados
pelas primeiras manifestações clínicas da doença, infecções oportunistas, infecções congênitas
(COPLAN et al. 1998; LEMES et al., 2000; MARTINS et al., 2000; RINALDO et al., 2003; SMITH et al., 2006) ou por fatores ambientais, uma vez que há um índice importante de
orfandade e institucionalização, pobreza, estigmatização social, susceptibilidade a internações
freqüentes, privando a criança de estimulação ambiental (KOLLAR; JELENIK;
HEGELSBERGER, 2003; LEMES et al. 2000; MARTINS et al. 2000; RETZLAFF, 1999;
SMITH et al., 2006; WOLTERS, 1997).
Coscia et al. (2001) ressaltaram, em sua pesquisa, que o ambiente familiar tem
importante papel no coeficiente de inteligência de crianças com HIV, principalmente quando
estas se encontram nos estágios mais avançados da doença, nesse caso, intervenções, com o
objetivo de melhorar a qualidade de vida no ambiente familiar, podem ter um impacto
positivo no desenvolvimento cognitivo dessas crianças. Muitas delas experimentam diversos
comprometimentos funcionais ocasionados por problemas comportamentais e sintomas
As manifestações neurológicas do HIV em crianças podem apresentar importantes
variações. A idade, o modo da infecção e a carga viral são fatores determinantes para o risco e
o tipo de encefalopatia (MITCHELL, 2001; WOLTERS et al., 1997).
Infecções congênitas como citomegalovírus e toxoplasmose também são comuns em
crianças com HIV, podendo afetar o desenvolvimento do feto da mãe portadora do HIV,
mesmo na ausência de transmissão do vírus (EXHENRY; NADAL, 1996; MITCHELL,
2001). Nesse caso as manifestações variam de assintomáticas até as mais devastadoras
(ROCHA et al., 2005).
Estudos realizados com neuroimagem (TC, RM e PET Scans) comprovam a presença
de alterações vasculares, metabólicas e de massa no sistema nervoso central de crianças
infectadas pelo HIV (BLANCETTE et al., 2001; EXHENRY; NADAL, 1996; KOLLAR;
JELENIK; HEGELSBERGER, 2003; MITCHELL, 2001).
Burquier et al. (1997) comprovaram em seu estudo, com testes eletroencefalográficos,
que mesmo após o tratamento anti-retroviral as alterações precoces causadas pela infecção do
HIV, apesar de não evoluírem, não foram revertidas.
Mitchell (2001) realizou um estudo com crianças que apresentavam parâmetros
imunológicos e virológicos, estáveis em tratamento com terapia anti-retroviral, e observou um
declínio significante em testes neurocognitivos, mesmo após a repetição dos mesmos, o que
poderia ter melhorado o desempenho devido à prática anterior dos testes. Esse declínio,
mesmo com os parâmetros estáveis, sugere que a replicação do vírus no sistema nervoso
central pode não ser muito bem controlada em alguns pacientes, tornando imprescindível a
atenção ao desenvolvimento cognitivo das crianças infectadas pelo HIV por parte dos
Autores como Blanchette et al. (2001), Bruck et al. (2001), Lemes et al. (2000),
Martins et al. (2000) e Coplan et al. (1998) ressaltam em seus estudos a prevalência de atraso
nas diversas áreas do desenvolvimento neuropsicomotor manifestado nos primeiros anos de
vida.
Chase et al. (2000) estudaram o desenvolvimento cognitivo e motor de 595 crianças
filhas de mães infectadas pelo HIV, das quais 114 foram infectadas, e constatou atraso
significante nesse grupo, principalmente nos dois primeiros anos de vida. O referido estudo
sugere que um número grande de crianças apresentará algum tipo de comprometimento no
desenvolvimento cognitivo e/ou motor, que podem ser considerados indicadores da
progressão do HIV.
Um acompanhamento longitudinal de um grupo de nove crianças, com diagnóstico
clínico de infecção pelo HIV em tratamento médico, foi realizado por Kollar, Jelenik, e
Hegelsberger (2003), que examinaram o desenvolvimento neuropsicomotor, por meio de um
protocolo específico, que utilizou EEG e RM. Os resultados obtidos contemplam aspectos
normais do desenvolvimento em 3 crianças e comprometimento de grau leve a severo nas
outras. Uma informação relevante é a dificuldade de socialização sofrida pela criança,
expondo-a a problemas psico-sociais que podem comprometer o desenvolvimento mental
independentemente da infecção do HIV no sistema nervoso central.
Atualmente a progressão dos sintomas definidores de SIDA vêm diminuindo
provavelmente devido ao diagnóstico precoce da infecção e conseqüente intervenção
terapêutica, porém muitos estudos que relacionam a infecção pelo HIV com o
desenvolvimento neurológico apontam alterações maiores que 50% nas populações estudadas
(ROCHA et al., 2005).
A importância do diagnóstico precoce de alterações neurológicas indicando o
progressão da doença a infecção pelo HIV pode provocar efeitos devastadores nesse sistema
(CHASE et al., 2000).
O emprego da neuroimagem e testes eletrofisiológicos associados a exames regulares
do desenvolvimento neuropsicomotor pode ser um importante aliado no diagnóstico precoce
das manifestações clínicas da doença, (BURQUIER et al., 1997; KOLLAR; JELENIK;
HEGELSBERGER, 2003; MITCHEL, 2001).
Crianças mais velhas geralmente não apresentam manifestações neurológicas
rapidamente progressivas e catastróficas como os infantes, mas a exposição à terapêutica
anti-retroviral e a progressão da doença podem deixar sinais e sintomas neurológicos como
irritabilidade, desatenção, comprometimento em vários níveis de linguagem e prejuízo na
coordenação motora fina (MITCHELL, 2001).
Esses sintomas podem se agravar na adolescência, principalmente no caso de jovens
que foram infectados ao nascimento e, portanto tem um grande histórico de tratamentos
anti-retrovirais. Nesse caso há o predomínio de problemas cognitivos na maioria dos pacientes,
incluindo dificuldades de atenção e memória (CAREY et al., 2006; EXHENRY; NADAL,
1996; MITCHELL, 2001; YORK et al., 2001).
2.2- VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA E AUDIÇÃO
O sistema auditivo do portador do HIV pode apresentar comprometimentos em
diversos níveis, uma vez que existe uma afinidade do vírus pelo sistema nervoso central, com
71% de manifestações envolvendo as áreas da cabeça e pescoço (BAGENDA et al., 2006;
BANKAITS; KEITH, 1995; EXHENRY; NADAL, 1996; MITCHELL, 2001; ROCHA et al.,
2005), somando-se ao fato que esse indivíduo encontra-se predisposto a uma série de
infecções oportunistas capazes de provocarem alterações otorrinolaringológicas (GONDIM et
Estudos demonstram que as crianças infectadas pelo HIV estão sujeitas a múltiplas
manifestações otorrinolaringológicas, sendo freqüentes aquelas que possam provocar perdas
auditivas, como por exemplo, os episódios de otite média (DASHEFSKY; WALD, 1994;
GONDIM et al., 2000; KOZLOWSKI, 2003; REZENDE et al., 2004; RINALDO et al., 2003;
SHAPIRO et al., 2006; WOLTERS et al., 1997 ), sendo que muitas vezes o acometimento
otorrinolaringológico ocorre antes mesmo do diagnóstico da infecção pelo HIV (GONDIM et
al. 2000).
O comprometimento do sistema auditivo dos portadores do HIV pode ocorrer também
pela disfunção coclear resultante da ototoxicidade causada por drogas usadas no tratamento
do HIV e por alguns dos medicamentos usados para o tratamento de infecções oportunistas
(REZENDE et al., 2004, RINALDO et al. 2003).
Embora o mecanismo de atuação dessas drogas no sistema auditivo ainda não esteja
totalmente esclarecido, especula-se que os agentes anti-retrovirais possam interferir no
mecanismo de produção de energia mitocondrial na orelha interna e, além disso, o grau de
comprometimento pode estar associado à idade e histórico de infecção de orelha média do
sujeito (MARRA et al., 1997; REZENDE et al., 2004), resultando em perdas auditivas
neurossensoriais, vertigem ou náusea (BANKAITIS; KEITH, 1995).
Um estudo realizado por Soucek e Michaels apud Matas et al. (2006) encontrou perda
auditiva neurossensorial em grande parte dos portadores do vírus e a maioria deles apresentou
um nível reduzido de Emissões Otoacústicas, sugerindo comprometimento coclear.
A imunodeficiência predispõe o portador do HIV a infecções oportunistas que podem
levar à perda auditiva neurossensorial, incluindo a meningite causada por Cryptococus
neoformans, tuberculose meníngea e meningite viral, fúngica ou bacteriana, otossífilis.
(GONDIM et al., 2000; REZENDE et al., 2004; RINALDO et al., 2003; SHAPIRO;
Matas et al. (2000) realizaram um estudo audiológico em crianças nascidas de mães
soropositivas para o HIV, onde verificaram a presença de alterações auditivas
significantemente maiores no grupo de crianças infectadas, sendo que as alterações auditivas
de origem central prevaleciam. Ressalta ainda, que as causas mais freqüentes das alterações
auditivas encontradas nesse grupo são: a presença de otites médias com perfuração timpânica,
otite média recorrente ou persistente, ototoxicidade e comprometimento do sistema nervoso
por infecções.
A prevalência de alterações auditivas de caráter condutivo foi verificada por
Kozlowski (2003) que realizou um estudo com 14 crianças infectadas pelo HIV cujos
resultados obtidos na avaliação audiológica demonstraram que cinco sujeitos (36%)
apresentaram alterações auditivas do tipo condutiva e nove (64%) apresentaram audição
normal.
Weber et al. (2006) avaliaram o impacto das novas drogas anti-retrovirais (Highly
Active Antiretroviral Therapy - HAART) na prevalência de otite média crônica em população
pediátrica infectada pelo HIV e, baseados nos dados apresentados, concluíram que o uso de
HAART em crianças brasileiras menores de 6 anos de idade infectadas pelo HIV esteve
associado à menor prevalência de otite média crônica, provavelmente como conseqüência do
aumento promovido na contagem de linfócitos T CD4+.
A perda auditiva, mesmo de caráter flutuante, pode ter como conseqüência alteração
da percepção dos estímulos auditivos complexos, incluindo a fala, levando a prejuízos
centrais, mesmo após a resolução do problema periférico (MOORE; HARTLEY; HOGAN,
2003; SANTOS et al. 2001).
Esta degradação do sinal auditivo pode causar prejuízo na representação de sons e nas
habilidades auditivas prejudicando a aquisição e o desenvolvimento da linguagem (CHASE et
O mesmo é referido por Santos et al. (2001) que ressaltam a inconsistência na detecção
dos sons causada pelo caráter flutuante da perda auditiva, decorrente de episódios recorrentes
de otite, prejudicando a maturação do sistema nervoso central e consequentemente o
desenvolvimento das habilidades auditivas. Além disso, o acúmulo de fluído na orelha média
pode produzir ruídos que distorcem a percepção do som pela cóclea (BALBANI;
MONTOVANI, 2003).
Alguns fatores têm sido apontados como favorecedores para o desenvolvimento de
otites em crianças, dentre eles podemos citar a existência de infecções precoces, o não
recebimento do aleitamento materno e o fato de freqüentarem creches (SANTOS, 1996).
A perda auditiva provocada pela otite média normalmente fica em torno de 30 dB e
acomete principalmente as freqüências baixas e médias, comprometendo ainda mais a
inteligibilidade de fala, prejudicando o envio de informações para o córtex auditivo.
Sendo assim, acredita-se que a otite média seja um dos fatores determinantes de
alterações auditivas centrais, justificando o encaminhamento para a avaliação do
processamento auditivo (MOORE; HARTLEY; HOGAN, 2003; SHAPIRO; NOVELLI,
1998).
2.3 PROCESSAMENTO AUDITIVO
Processamento Auditivo (PA) é definido pela American Speech-Language Hearing
Association (ASHA) (1996-2005) como sendo o conjunto de processos e mecanismos que
ocorrem dentro do sistema auditivo em resposta a um estímulo acústico. Compreende as
seguintes habilidades: discriminação e reconhecimento de padrões auditivos, localização e
lateralização do som, aspectos temporais da audição, incluindo resolução, mascaramento,
integração e ordenação, performance auditiva com sinais acústicos competitivos e com
A desordem do processamento auditivo (DPA) é caracterizada pela alteração em uma
ou mais habilidades supracitadas que frequentemente apresenta impacto na leitura,
compreensão da linguagem oral e aprendizagem.
Crianças com DPA podem apresentar dificuldades para ouvir em ambientes com ruído
de fundo ou reverberação, seguir instruções orais, compreender sons de fala degradados,
apresentar respostas inconsistentes aos estímulos auditivos e desatenção ainda que possuam
audição periférica normal (JERGER; MUSIEK, 2000). Além disso, podem apresentar
dificuldades para localizar o som, habilidades inferiores para música e canto e problemas de
leitura, escrita e aprendizagem (ASHA, 2005).
O surgimento desses sintomas pode acontecer na idade pré-escolar ou em estágios
acadêmicos mais avançados, quando o ambiente apresenta mudanças acústicas ou as
exigências acadêmicas aumentam. Em alguns casos esses sintomas podem ser as primeiras
manifestações de desordens neurológicas (MUSIEK, 1994 apud BAMIOU & MUSIEK
2001).
Considerando que os problemas relacionados ao sistema auditivo central podem
ocorrer de forma isolada ou associados a outros fatores neurológicos e/ou desenvolvimentais
que possam influenciar no desenvolvimento cognitivo, o diagnóstico da desordem deve ser
realizado em equipe multidisciplinar, iniciado por detalhada anamnese e incluindo testes
eletrofisiológicos e comportamentais, além da avaliação audiológica básica (JERGER;
MUSIEK, 2000).
Os testes eletrofisiológicos, além de fornecerem informações sobre a integridade do
sistema auditivo central, permitem mensurar sua maturação e plasticidade, sendo de grande
utilidade para comprovar e documentar a eficiência dos programas de treinamento auditivo
A avaliação comportamental do PA é feita por meio de testes especiais que permitem a
identificação e categorização de dificuldades no desempenho funcional da audição,
permitindo o estabelecimento de diretrizes e critérios que auxiliam no processo de
reabilitação. Alem disso, podem fornecer dados sobre a maturação auditiva auxiliando no
acompanhamento da evolução no processo de reabilitação.
TESTES COMPORTAMENTAIS DO PROCESSAMENTO AUDITIVO
A bateria de testes especiais usada na avaliação comportamental do PA é composta
por testes de escuta dióticos, monóticos e dicóticos (BELLIS, 1997 apud SOUZA; SOUZA,
2002).
- testes dióticos: estímulos idênticos são apresentados em ambas as orelhas
simultaneamente em campo livre (ex.: Testes de localização sonora, de memória sequencial
verbal e não verbal).
- testes monóticos: sons com redundância reduzida, ou seja, uma parte do sinal
auditivo está distorcida ou ausente, são apresentados em uma orelha de cada vez. Avaliam a
habilidade do ouvinte de realizar o fechamento auditivo, a figura-fundo e a discriminação, por
exemplo, o Pediatric Speech Test (PSI) com Mensagem Competitiva Ipsilateral.
- testes dicóticos: estímulos auditivos diferentes são apresentados simultaneamente
em ambas as orelhas que avaliam a integração e a separação binaural, ou seja, a habilidade do
ouvinte para repetir tudo o que ouviu ou para dirigir a atenção para uma só orelha. (ex.: PSI -
com Mensagem Competitiva Contralateral e Staggered Spondaic Word Test - SSW). A DPA pode ser classificada em três categorias distintas segundo Pereira (1997):
- Decodificação: nesta categoria o processo gnósico auditivo prejudicado refere-se à
inabilidade para atribuir significado à informação sensorial auditiva, quanto à análise do
- Codificação: nesta categoria o processo gnósico auditivo prejudicado refere-se à
inabilidade de integrar informações sensoriais auditivas e associar com outras informações
sensoriais.
- Organização: nesta categoria o processo gnósico auditivo prejudicado refere-se à
inabilidade de representar eventos sonoros no tempo.
TRATAMENTO
Normalmente a intervenção nas DPAs é formada por três componentes: intervenção
direta, que se trata do uso de técnicas que trabalhem as habilidades auditivas deficientes; uso
de estratégias compensatórias, como uso de pistas visuais, contextuais e lingüísticas além da
modificação ambiental, com a finalidade de garantir o acesso à informação auditiva (ASHA,
2005).
Seguindo esta linha o tratamento e manejo das DPAs deve incorporar abordagens de
bottom-up que proporcionam melhora no sinal acústico e treinam habilidades auditivas
específicas e top-down que consistem no emprego de estratégias compensatórias para minimizar o impacto da desordem (ex. estratégias cognitivas, metacognitivas e de linguagem).
O tratamento deve ser consistente com os princípios da neurociência, ou seja, o treino
deve ser intensivo a fim de explorar a plasticidade e reorganização cortical; deve ser extensivo
maximizando a generalização e reduzindo os déficits funcionais; deve ser abrangente para
incluir aprendizagem, maximizando o resultado terapêutico e minimizando os déficits
funcionais (ASHA 2005; CHERMAKL; MUSIEK, 2002; JERGER; MUSIEK, 2000;
MOORE, 2006).
Complementando, é importante que os princípios do treinamento sejam estendidos a
finalidade de maximizar o domínio e promover generalização das habilidades aprendidas
(ASHA, 2005).
A reabilitação do indivíduo com transtorno do PA deve ser planejada e realizada por
diferentes profissionais (fonoaudiólogo, neurologista, psicólogo, terapeuta ocupacional)
baseando-se nas necessidades individuais de cada paciente dependendo da natureza, das
manifestações funcionais e do grau do problema (BELLIS, 2002).
Recentes avanços nas pesquisas sobre treinamento auditivo recomendam que seja
incluído o uso de treino com estímulo específico que mantêm o ouvinte alerta, bem como o
desenvolvimento de jogos de computador que motivem e deixem a criança feliz em jogá-los
diversas vezes nas sessões de treinamento (MOORE, 2006).
Os resultados da eficiência do treinamento auditivo em crianças com DPA são
comprovados por vários autores (HAYES et al. 2003; KOZOLOWISKIet al. 2004; KRAUS,
2001; RUSSO et al. 2005; WARRIER et al. 2004) que relatam melhora nos resultados dos
exames monitorados, no desempenho escolar e no relacionamento familiar após tratamento
3.1. OBJETIVO GERAL
Avaliar o processamento auditivo de crianças infectadas pelo Vírus da
Imunodeficiência Humana, por meio da Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo,
Logoaudiometria Pediátrica (PSI) e Teste Dicótico de Dissílabos Alternados em Português
(SSW).
3.2. OBJETIVO ESPECÍFICO
Descrever e analisar os achados audiológicos das crianças infectadas pelo Vírus da
4.1 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
O referido estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa do Hospital das
Clínicas de Ribeirão Preto, sob o protocolo 0292.0.004.000-03. ANEXO A
A coleta de dados inicial (análise de prontuários médicos, anamnese e otoscopia) foi
realizada no Setor de Eletrofisiologia da Audição do Departamento de Oftalmologia,
Otorrinolaringologia e de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Ambulatório de Infectologia de
Crianças e Adolescentes na Unidade Especial de Tratamento de Doenças Infecctocontagiosas
(UETDI), Setor de Infectologia Pediátrica do Departamento de Puericultura e Pediatria do
Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (HCRP) da Universidade de São Paulo (USP).
As avaliações audiológicas e os testes de PA foram aplicados no Setor de
Fonoaudiologia do Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço do HCRP.
4.2 SUJEITOS
Participaram dessa pesquisa 30 crianças, com idade variando entre 8 a 9 anos e 11
meses, de ambos os gêneros; sendo 15 crianças infectadas pelo HIV e 15 crianças sem riscos
de infecção pelo HIV.
Os critérios de inclusão estabeleciam que elas apresentassem níveis de audição
sonoros considerados normais, deveriam ser falantes do português e frequentar escola pública
regular.
Foram excluídos aqueles que apresentavam comprometimentos e/ou históricos que
pudessem interferir na compreensão e no desempenho nos testes aplicados incluindo
alterações na otoscopia, síndromes, alterações neurológicas e psicológicas evidentes,
alterações comprovadas no desenvolvimento cognitivo, na linguagem, fala, leitura, escrita e
Após verificação cuidadosa dos critérios de inclusão e exclusão, os sujeitos foram
divididos em dois grupos. O Grupo 1, comparação, formado por 15 sujeitos não infectados
pelo HIV e o Grupo 2, estudo, formado por 15 sujeitos infectados pelo HIV.
Consideraram-se infectados pelo HIV aqueles sujeitos com diagnóstico clínico da
infecção pelo vírus em acompanhamento médico no Ambulatório de Infectologia de Crianças
e Adolescentes da UETDI do HCRP – USP. Todos os sujeitos incluídos nesse grupo faziam
uso de medicação anti-retroviral.
O grupo de comparação foi composto por voluntários, em bom estado de saúde geral,
alguns deles irmãos ou parentes de sujeitos do grupo estudo.
4.3 PROCEDIMENTOS
Inicialmente foi feita uma triagem por meio da análise dos prontuários médicos das
crianças cuja faixa etária atendia às exigências do projeto, com o objetivo de selecionar
aquelas que se enquadravam nos critérios de inclusão.
O contato prévio com os responsáveis pelos sujeitos era realizado no dia dos retornos
médicos ou por telefone com a finalidade de verificar se havia interesse na participação da
pesquisa.
Visando a compreensão da abrangência e metodologia da pesquisa, realizou-se
cuidadosa explanação verbal esclarecendo os objetivos e procedimentos usados nas
avaliações. Havendo interesse na participação, os pais, ou responsável legal, formalizavam
seu consentimento, por meio da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido
(ANEXO B).
Posteriormente os sujeitos foram submetidos a uma avaliação médica com a finalidade
de verificar ausência de sinais evidentes de enfermidade otológica, identificados por meio da
caso a criança apresentasse alguma alteração não seria incluída na pesquisa, sendo
encaminhados para avaliação e conduta otorrinolaringológica.
Os procedimentos foram realizados em dois dias evitando que a criança ficasse
cansada e distraída durante as avaliações, comprometendo assim seu desempenho. Quando
essa divisão não era possível eram feitos intervalos e oferecidas atividades lúdicas e/ou lanche
sendo a retomada dos testes feita com o consentimento da criança.
A investigação dos fatores de risco para alterações auditivas periféricas foi realizada
por meio de anamnese (APÊNDICE A) e complementada com dados constantes no prontuário
médico. Em seguida foram coletadas informações pertinentes aos fatores de risco e queixas
relacionadas a alterações auditivas centrais (APÊNDICE B).
Dando continuidade à pesquisa, realizaram-se os testes que compõem a avaliação
audiológica básica (audiometria tonal, limiar de recepção de fala, índice percentual de
reconhecimento de fala), a timpanometria e a pesquisa do reflexo acústico contralateral
(APÊNDICE C).
A avaliação do PA foi composta por testes de escuta dióticos (teste de localização
sonora, memória sequencial verbal e não verbal); teste de Logoaudiometria Pediátrica
(Pediatric Speech Test- PSI ) e teste Dicótico de Dissílabos Alternados (Sttagered Spondaic
Word - SSW) conforme descrevemos a seguir:
AVALIAÇÃO AUDIOLÓGICA BÁSICA:
Audiometria Tonal (AT):
Foram obtidos limiares auditivos no intervalo de freqüências de 0.25 a 8 KHz, sendo
considerado normal o audiograma com todos os limiares inferiores a 15 dB NA (NORTHERN
Limiar de Recepção de Fala (LRF):
O valor do estímulo de fala inicialmente apresentado foi calculado somando 40 dBNA
à média aritmética dos limiares obtidos nas freqüências 0.5, 1 e 2 KHz. Conforme a palavra
solicitada era repetida adequadamente, diminuía-se a intensidade em 10 dBNA e assim
sucessivamente, até o momento que a repetição apresentava 50% de acertos e erros,
confirmando-se o limiar obtido na audiometria tonal.
Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF):
A lista de palavras para a repetição pelo sujeito foi apresentada em um nível de
intensidade constante cujo valor é a soma de 40 dBNA à média dos limiares obtidos nas
freqüências 0.5, 1 e 2 KHz. A porcentagem de acertos considerada adequada foi igual ou
superior a 88%.
Timpanometria:
Consideramos normais as curvas do Tipo A e alteradas as demais conforme a proposta
de Jerger (1970).
Pesquisa do reflexo acústico contralateral (RAC):
Os reflexos acústicos contralaterais foram pesquisados nas freqüências 0.5, 1, 2, e 4 KHz.
O teste era iniciado em 85 dBNA, sendo 110 dBNA o maior nível de intensidade
testado. Consideramos normal a presença de reflexo nesse intervalo.
TESTES DO PROCESSAMENTO AUDITIVO:
Após instrução da criança a respeito da realização de cada teste, uma apresentação
prévia dos estímulos era feita, para verificar se a compreensão do teste foi adequada e caso
Durante a realização de todos os testes o avaliador permanecia atento aos
comportamentos e necessidades da criança, reforçando orientações quando necessário,
tornando a avaliação um processo interativo.
Todos os testes foram realizados em ambiente com isolamento acústico e seguiram os
princípios propostos por Pereira (1997).
AVALIAÇÃO SIMPLIFICADA DO PROCESSAMENTO AUDITIVO (ASPA)
Os resultados do desempenho nos testes da ASPA eram registrados no APÊNDICE D.
Localização Sonora (LS):
O avaliador situava-se a uma distância de 20 cm da criança que deveria localizar, sem
o apoio visual, o instrumento tocado (guiso).
Foram avaliadas cinco direções em relação à cabeça da criança: à frente, atrás, acima,
à esquerda e à direita.
Cuidou-se para que os estímulos apresentados à frente e atrás não assumissem a
posição de Zero Azimuth, evitando uma confusão com relação à origem do estímulo.
Solicitou-se como resposta a indicação da direção da qual a criança acreditava provir o
som. O desempenho considerado adequado foi a presença de quatro ou cinco acertos, sendo o
erro esperado nas direções acima, à frente ou atrás.
Memória sequencial verbal (MSV):
Na prova de memória sequencial verbal, as crianças deveriam identificar seqüências
de sons verbais formadas pela combinação das sílabas PA, TA, CA e FA (CORONA et al.,
2005).
Inicialmente verificava-se se a criança era capaz de produzir adequadamente os sons
avaliadora. Foram apresentadas quatro seqüências, sendo a primeira experimental, nesse caso
era permitida pista visual, o que não ocorria nas outras seqüências.
Considerou-se adequado o desempenho com dois ou três acertos.
Memória sequencial não verbal (MSNV):
A memória sequencial não verbal foi avaliada por meio da apresentação de quatro
seqüências de instrumentos musicais, sendo eles o guiso, sino, reco-reco e agogô.
A princípio os instrumentos eram apresentados de forma a proporcionar familiaridade
da criança com os sons, em seguida a seqüência experimental era feita com pista visual e
posteriormente as outras seqüências não apresentavam esse recurso. Após o toque dos
instrumentos a criança deveria virar-se para o avaliador indicando a seqüência de
instrumentos que ela acreditava ter ouvido.
Dois ou três acertos eram considerados adequados.
Reflexo Cócleo-Palpebral (RCP):
A pesquisa do reflexo cócleo-palpebral era observada pela apresentação de um
estímulo breve de alta intensidade por meio da percussão do agogô próximo a criança.
Consideramos o resultado normal quando era observada a presença do mesmo e
alterado se ausente.
LOGOAUDIOMETRIA PEDIÁTRICA (PSI):
O PSI foi criado por Jerger, Lewis, Hawkins & Jerger (1980), com o objetivo de
avaliar a inteligibilidade de fala de crianças, e aprimorado por Jerger e Jerger (1983). Os
autores sugeriram que a interpretação dos resultados do PSI siga os padrões estabelecidos para
o Syntetic Sentence Identification – SSI.
A versão em português, também conhecida como teste monótico de frases com
foi elaborada por Almeida, Campos e Almeida (1988) e estudada por Kalil (1994) que
verificou semelhança no desempenho entre crianças da língua portuguesa e inglesa.
No PSI, o audiômetro foi acoplado a um CD player a fim de reproduzir as sentenças e
a história contidas na faixa 4, vol.1 do CD elaborado por Pereira e Schochat (1997).
Foram apresentadas 10 frases (sinal – S), simultaneamente a uma mensagem
competitiva composta por uma história infantil (mensagem competitiva – MC). O teste foi
realizado com mensagem competitiva contralateral (MCC) e mensagem competitiva
ipsilateral (MCI) nas relações S/MC 0dB e -40dB para MCC e 0dB e -10dB MCI.
A intensidade do sinal de fala era calculada com base na média aritmética dos limiares
auditivos obtidos nas freqüências 0.5, 1 e 2 KHz acrescidas de 40 dB e a mensagem
competitiva era selecionada de acordo com a relação Sinal / Ruído (S/MC) desejada.
Exemplificando: para a relação S/MC 0 ambas as mensagens apresentavam a mesma
intensidade, para uma relação S/MC -40 a mensagem competitiva era superior em 40dBNA
ao sinal de fala.
Caberia à criança apontar as figuras correspondentes às frases ouvidas. Os acertos
eram registrados no protocolo (APÊNDICE E), e analisados considerando-se a porcentagem
de acertos em cada condição segundo os critérios apontados por Pereira (2005).
Sendo assim, o parâmetro de normalidade considerado para situação de mensagem
competitiva contralateral foi o número de acertos maior ou igual a 90% nas relações de 0 dB e
e -40 dB. Na situação de mensagem competitiva ipsilateral a criança, cujo desempenho foi
considerado adequado, deveria apresentar porcentagem de acertos igual ou superior a 80% na
relação 0 dB e valores iguais ou superiores a 70% na relação -10 dB.
Com a finalidade de descartar um possível “vício” o inicio do teste ocorria de forma
TESTE DE RECONHECIMENTO DE DISSÍLABOS EM TAREFA DICÓTICA (versão em português do SSW):
O teste Sttagered Spondaic Word - SSW foi criado e desenvolvido por Katz, em 1962, com o propósito de medir a integridade da audição central. A versão em português
denominada teste de reconhecimento de dissílabos em tarefa dicótica foi adaptada por Borges
(1986) e utiliza como estímulos sonoros palavras dissilábicas paroxítonas compostas,
pertencentes ao português brasileiro, apresentadas ao paciente a 50 dB NA acima da média
aritmética dos limiares tonais das freqüências 0.5, 1 e 2 KHz.
Composto por quarenta itens formados por quatro palavras cada um, totalizando 160
estímulos. Cada uma das duas orelhas é estimulada por duas palavras. O estímulo é iniciado
pela orelha direita, alternado para a orelha esquerda e, assim, sucessivamente.
A primeira e a quarta palavra são apresentadas isoladas e separadamente a cada uma
das orelhas do indivíduo, isto é, sem competição sendo denominadas Direita Não Competitiva
(DNC) e Esquerda Não Competitiva (ENC). A segunda e a terceira palavras são apresentadas
dicoticamente, isto é, uma em cada orelha simultaneamente, portanto há competição (Direita
Competitiva – DC e Esquerda Competitiva - EC)( BORGES,1997).
A seguir um exemplo da forma de apresentação de uma das séries de quatro palavras
usadas no SSW:
DNC 1ª palavra DC 2ª palavra ENC 4ª palavra
bota fora fogo
EC 3ª palavra
pega
O protocolo de registro de resultados do teste SSW encontra-se no APÊNDICE F
seguido pelo APÊNDICE G que apresenta os registros do desempenho individual dos sujeitos
Inicialmente a criança recebia instruções sobre a realização do teste e deveria repetir as
palavras ouvidas no fone. Além disso, o próprio teste apresenta uma demonstração prévia de
alguns itens para que o paciente compreenda a tarefa.
O avaliador anotava as respostas erradas pela criança na folha de registro; o total de
erros em cada condição (DNC, DC, EC e ENC) era obtido por meio da soma dos valores
absolutos (N) das colunas correspondentes às respectivas condições. A porcentagem de erros
era o produto do total de erros de cada condição por 2,5 e finalmente, a porcentagem de
acertos era obtida pela subtração da porcentagem de erros do total de acertos possíveis, ou
seja, 100%.
A análise quantitativa do desempenho no SSW foi realizada de acordo com critérios de
referência, descritos na Figura 1, baseados nos trabalhos científicos de Santos (1993),
Almeida (1997) e Câmara (1998) Apud Pereira (2005).
Considerou-se adequado o sujeito que apresentou desempenho dentro dos padrões de
normalidade em todas as condições testadas.
Faixa etária
DC Nº acertos ≥ a
EC Nº acertos ≥ a
Condições Não Competitivas Nº acertos ≥ a
8 anos 80 % 75 % 90 %
9 anos 90 % 90 % 90 %
Figura 1 - Critérios de referência de normalidade para o teste SSW. (PEREIRA, 2005).
Exemplificando: Sujeito nº 1, 8 anos de idade.
Condições DNC DC EC ENC ENC EC DC DNC Colunas A B C D E F G H
Total de erros em cada condição: Números absolutos (N)
DNC = A + H = 4 +2 = 6 erros
DC = B + G = 3 + 3 = 6 erros
EC = C + F = 5 + 4 = 9 erros
ENC = D + E = 2 + 2 = 4 erros
Total de erros em cada condição: Números relativos (%)
DNC = 6 erros x 2,5 = 15 %
DC = 6 erros x 2,5 = 15 %
EC = 9 erros x 2,5 = 22,5 %
ENC = 4 erros x 2,5 = 10 %
Porcentagem de acertos:
DNC = 100 - 15 % = 85 % alterado
DC = 100 - 15 % = 85 % normal
EC = 100 - 22,5 = 77,5 % normal
A Figura 2 a seguir apresenta uma relação entre os testes empregados nessa pesquisa e
suas correlações com os mecanismos fisiológicos auditivos e as habilidades auditivas
envolvidas.
Testes especiais de avaliação do PA
Mecanismos fisiológicos auditivos Habilidade auditiva Prejuízo gnósico auditivo Memória Sequencial Verbal Memória Sequencial Não Verbal
Inversões no SSW
Discriminação de sons em
seqüência;
Memória auditiva
Ordenação
temporal Organização
Localização Sonora Discriminação da fonte sonora;
Localização
Localização Decodificação
PSI – MCI/MCC
com frases
Reconhecimento de sons
verbais em escuta monótica
e/ou dicótica com resposta de
apontar figuras;
Atenção Seletiva
Figura-fundo Codificação
SSW
Reconhecimento de sons
verbais em escuta dicótica;
Atenção seletiva
Figura-fundo Decodificação
Figura 2. Testes do processamento auditivo e suas correlações com os mecanismos
4.4 EQUIPAMENTOS
Os equipamentos usados para realização da audiometria tonal liminar, PSI e SSW
foram audiômetro Midmate 622, da Madsen Eletronics, fone TDH - 39P e coxim MX-41 AR,
ambos calibrados no Padrão ANSI-89.
As medidas de imitância acústica e a pesquisa do reflexo acústico contralateral foram
realizadas por meio de equipamento AZ7R da Interacoustics, com tom de sonda de 220 Hz.
A ASPA foi realizada em ambiente com isolamento acústico. Os instrumentos
utilizados nos testes de memória sequencial não verbal foram o sino, guiso, reco-reco e
choqualho. Para a pesquisa do reflexo cócleo-palpebral utilizou-se o agogô.
O equipamento empregado para realizar o PSI e o SSW, em cabina acústica, foi o
audiômetro Midmate 622 com fone TDH - 39P e coxim MX-41 AR. O audiômetro foi
acoplado a um aparelho compact disc player XP- 260 da AIWA.
A calibração física rotineira dos equipamentos foi realizada, bem como a calibração
biológica dos testes, conforme sugere Kalil, Pereira, Schochat (1997).
4.5 ANÁLISE DOS RESULTADOS
Inicialmente, foi estabelecido o número de respostas corretas nos diferentes testes, em
cada uma de suas etapas, para o Grupo 1 e Grupo 2.
Foram calculados, desta forma, os índices de erro nas provas de localização sonora,
memória sequencial para sons verbais e não verbais e reflexo cócleo-palpebral; as
porcentagens de erro para cada uma das condições do PSI (MCC e MCI) e SSW.
Para analisar os dados obtidos, empregaram-se procedimentos estatísticos do tipo
descritivo e analítico com os resultados organizados em tabelas apresentados em números
Inicialmente foi realizada uma análise exploratória dos dados (PAGANO;
GAUVREAU, 2004). A comparação dos resultados obtidos nos testes comportamentais do
PA aplicados nos dois grupos foi realizada por meio do teste exato de Fisher, com nível de
significância de 0,05. Além disso, utilizou-se o modelo de regressão logística múltipla para
estimar o odds ratio (HOSMER; LEMESHOW,2000).
As análises foram realizadas pelo Centro de Métodos Quantitativos – CEMEQ da
Inicialmente faremos a caracterização da casuística avaliada, com uma visão geral do
desempenho individual das crianças dos dois grupos em todos os testes avaliados, seguida
pela análise do desempenho obtido pelos grupos na avaliação audiológica básica e nos testes
comportamentais aplicados para avaliação do PA:
Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo (ASPA) composta pelos testes de
localização sonora, memória sequencial verbal e não verbal;
Logoaudiometria Pediátrica (Pediatric Speech Test - PSI) nas condições de mensagem competitiva contralateral (MCC) e mensagem competitiva ipsilateral (MCI);
Teste de Reconhecimento de Dissílabos em Tarefa Dicótica (Sttagered Spondaic Word - SSW em português);
5.1CARACTERIZAÇÃO DA CASUÍSTICA
A Tabela 1 caracteriza os grupos estudados com relação ao gênero e à idade. O Grupo
1 foi formado por 8 crianças do gênero masculino e 7 do gênero feminino, sendo 7 com 8
anos e 8 com 9 anos. O Grupo 2 foi formado por 8 crianças do gênero masculino e 7 do
gênero feminino, sendo 6 com 8 anos e 9 com 9 anos.
Tabela 1- Caracterização dos grupos quanto ao gênero e a idade.
gênero idade
masculino feminino 8 anos 9 anos
Grupo 1 8 7 7 8
Grupo 2 8 7 6 9
Considerando as respostas obtidas durante a aplicação do questionário da avaliação do
PA, observou-se um número maior de queixas no Grupo 2 sendo que as principais foram a
desatenção e histórico de dificuldades no aprendizado da leitura e escrita (ambas com 46,67%).
No Grupo 1 a desatenção foi a principal queixa (46,67 %), conforme indica a Tabela 2.
Tabela 2- Principais queixas observadas nos grupos, obtidas por meio do questionário para
avaliação do Processamento Auditivo.
GRUPO 1 GRUPO 2
N % N %
Desatenção 7 46,67% 7 46,67%
Dificuldades na escrita 5 33,33% 7 46,67%
Dificuldades na leitura 3 20,00% 7 46,67%
Episódios de Otite na infância 6 40,00% 5 33,33%
Dificuldade pra ouvir 3 20,00% 3 20,00%
Alterações de fala 2 13,33% 1 6,67%
Uma visão geral sobre a formação dos grupos e desempenho individual dos sujeitos do
Grupo 1 e Grupo 2 nos testes da avaliação audiológica básica, na ASPA, no PSI e no SSW é
Tabela 3- Caracterização da formação do Grupo 1 (f - feminino e m - masculino) e do
desempenho individual dos sujeitos nos testes pesquisados (nl - normal e a -alterado).
SUJEITO IDADE GÊNERO TIMP RAC ASPA PSI SSW
1 8 f nl a nl nl nl
2 8 f nl a nl nl a
3 8 f nl a a a a
4 8 f nl a a nl a
5 8 m a a a nl a
6 8 m nl a a nl a
7 8 m a a a a a
8 9 f nl nl nl nl nl
9 9 f nl nl nl nl a
10 9 f a a nl nl a
11 9 m nl nl a a a
12 9 m nl a a a a
13 9 m nl a nl nl a
14 9 m a a nl nl a
Tabela 4- Caracterização da formação do Grupo 2 (f - feminino e m - masculino) e do
desempenho individual dos sujeitos nos testes pesquisados (nl - normal e a - alterado).
SUJEITO IDADE GÊNERO TIMP RAC ASPA PSI SSW
16 8 f nl a a a a
17 8 f a a a nl a
18 8 m nl nl a nl a
19 8 m nl a nl a a
20 8 m nl nl nl nl a
21 8 m a a a a a
22 9 f nl a a nl a
23 9 f a a nl nl nl
24 9 f a a a nl a
25 9 f a a nl nl a
26 9 f nl a nl nl a
27 9 m a a nl nl a
28 9 m a a a nl a
29 9 m a a a nl a
5.2RESULTADOS DA AVALIAÇÃO AUDIOLÓGICA BÁSICA
Na audiometria tonal liminar e nos testes de fala, Índice Percentual de
Reconhecimento de Fala (IPRF) e Speech Reception Threshold (SRT), todas as crianças (100%) dos dois grupos apresentaram resultados dentro dos padrões de normalidade.
De acordo com a Tabela 5, verifica-se alta freqüência de alterações na Timpanometria
no Grupo 2, principalmente na orelha direita (Tabela 6), ainda que não tenham sido
observadas alterações evidentes por meio da otoscopia.
Tabela 5- Freqüência de alterações na Timpanometria. Valores absolutos (N) e relativos (%).
Normal Alterado Total
N 11 4 15
Grupo 1
% 36,67 13,33 50,00
N 7 8 15
Grupo 2
% 23,33 26,67 50,00
N 18 12 30
Total
% 60,00 40,00 100,00
Tabela 6- Distribuição dos grupos para o teste Timpanometria. Valores apresentados em
números absolutos (N) e relativos (%).
Orelha Direita Orelha Esquerda Total
Grupos
Normal Alterado Normal Alterado
N 12 3 13 2 15
Grupo 1
% 40,00 10,00 43,33 6,67 50,00
N 8 7 11 4 15
Grupo 2
% 26,67 23,33 36,67 13,33 50,00
N 20 10 24 6 30
Total
A Tabela 7 caracteriza o grupo em relação aos resultados obtidos na pesquisa do
Reflexo Acústico Contralateral, observando-se alta incidência de alterações nos dois grupos
em ambas as orelhas.
Tabela 7- Distribuição dos grupos para o teste Reflexo Acústico Contralateral. Valores
apresentados em valores absolutos (N) e relativos (%).
Orelha Direita Orelha Esquerda Total
Normal Alterado Normal Alterado
N 5 10 9 6 15
Grupo 1
% 16,67 33,33 30,00 20,00 50,00
N 6 9 4 11 15
Grupo 2
% 20,00 30,00 13,33 36,67 50,00
N 11 19 13 17 30
Total
% 36,67 63,33 43,33 56,67 100,00
5.3RESULTADOS DOS TESTES DA AVALIAÇÃO COMPORTAMENTAL DO PROCESSAMENTO AUDITIVO
5.3.1 AVALIAÇÃO SIMPLIFICADA DO PROCESSAMENTO AUDITIVO
A ASPA compreende os testes de localização sonora, memória sequencial verbal e não
verbal e pesquisa do reflexo cócleo-palpebral. O Gráfico 1 indica alta incidência de alterações
nos dois grupos avaliados, sendo observado um número discretamente maior de alterações no
O Gráfico 2 apresenta uma visão geral do desempenho dos grupos para os testes de
localização sonora (LS), memória sequencial verbal (MSV) e não verbal (MSNV) e pesquisa
do reflexo cócleo – palpebral (RCP).
De uma forma geral as crianças do Grupo 2 apresentaram maiores alterações em todos
os testes, principalmente na pesquisa do reflexo cócleo-palpebral. De acordo com o teste
exato de Fisher não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos para
nenhum dos testes aplicados.
Gráfico 1 - Freqüência de alterações na ASPA nos Grupos 1 e 2 0,00%
5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00%
Normal Alterado
A comparação do desempenho na ASPA entre as faixas etárias é apresentada na
Tabela 8. Notamos um maior número de alterações nas crianças de 8 anos dos dois grupos em
todos os testes da ASPA.
As crianças de 9 anos do Grupo 1 só apresentaram alterações no teste de memória
sequencial verbal, já as crianças da mesma faixa etária no Grupo 2 apenas não apresentaram
alterações no teste de memória sequencial não verbal.
Gráfico 2 - Freqüência de alterações por teste da ASPA 0,00%
10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00%
LS MSV MSNV RCP
Tabela 8- Distribuição dos resultados alterados nos grupos segundo a faixa etária nos testes
da Avaliação Simplificada do Processamento Auditivo em valores absolutos (N) e
relativos (%).
LS MSV MSNV RCP
Grupo Idade nº Sujeitos N % N % N % N %
Grupo 1 8 anos 7 2 28,57% 4 57,14% 1 14,29% 0 0,00%
9 anos 8 0 0,00% 3 37,50% 0 0,00% 0 0,00%
Grupo 2 8 anos 6 2 33,33% 4 66,67% 3 50,00% 1 16,67%
9 anos 9 2 22,22% 4 44,44% 0 0,00% 1 11,11%
Total 30 6 20,00% 15 50,00% 4 13,30% 2 6,70%
Legenda: LS – Localização Sonora
TESTE DE LOCALIZAÇÃO SONORA
De acordo com a Tabela 9 não houve diferença estatisticamente significante entre os
grupos no teste de localização sonora, sendo que a maioria das crianças (76,67 %) conseguiu
realizar adequadamente esse teste.
Tabela 9- Distribuição dos grupos para o teste de Localização Sonora em valores absolutos
(N) e relativos (%), Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com 95% de
confiança (IC 95%).
Normal Alterado Total OR (IC 95%)*
Grupo 1 N % 13 43,33 2 6,67 15 50,00 Grupo 2 N % 10 33,33 5 16,67 15 50,00
0,281 (0,043; 1,847)
Total N % 23 76,67 7 23,33 30 100,00 *
TESTE DE MEMÓRIA SEQUENCIAL VERBAL
No teste de memória sequencial verbal não foi observada diferença estatisticamente
significante entre os grupos, porém houve uma alta incidência de alterações nos dois grupos
(Tabela 10).
Tabela 10- Distribuição dos grupos para o teste memória sequencial verbal em valores
absolutos (N) e relativos (%), Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos com
95% de confiança (IC 95%).
Variável Normal Alterado Total OR (IC 95%)*
Grupo 1 N % 8 26,67 7 23,33 15 50,00 Grupo 2 N % 7 23,33 8 26,67 15 50,00
0,713 (0,163; 3,115)
Total N % 15 50,00 15 50,00 30 100,00 *