• Nenhum resultado encontrado

Esclerose lateral amiotrófica e neurossífilis.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Esclerose lateral amiotrófica e neurossífilis."

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA E NEUROSSÍFILIS

E L I O V A Z U K E R M A N * ; S É R G I O Z A T Z * *

Reavaliamos neste trabalho a possível correlação de causa e efeito entre

o processo sifilítico e a esclerose lateral amiotrófica ( E L A ) pelo fato de

ter-mos tido a oportunidade de examinar uma paciente que apresentou

concomi-tância clínica de ambas as entidades.

Schaffer, em 1896

2 0

, foi dos primeiros a citar a sífilis como um dos

fa-tores etiológicos a ser considerado na E L A . Desde então foram registrados

numerosos casos responsabilizando a sífilis como possível fator causai das

síndromes amiotróficas (neurônio motor periférico) e/ou espásticas (neurônio

motor central), quer seja como sífilis parenquimatosa associada à tabes ou

à paralisia geral progressiva

2

>

4

>

6

>

7

>

9

>

1 1

>

1 2

>

1 3

.

1 4

>

1 5

-

1 9

>

2 1

>

2 2

.

2 5

-

2 6

.

Ao lado dos autores que afirmam existir relação de causa e efeito entre

a lues e a E L A

3

.

1 2

>

1 9

>

2 2

>

2 5

outros acreditam haver simples coincidência entre

as duas entidades

1

>

1 0

.

1 5

>

1 6

>

1 8

>. Alguns aventam a hipótese de ser a sífilis,

como outros processos tóxico-infecciosos, simples fator desencadeante de uma

moléstia endógena em indivíduo predisposto

5

.

São descritas algumas características clínicas que permitem diferenciar

os casos de E L A de origem degenerativa daqueles de síndrome

amiotrófico-espástica secundária a outros processos que afetam a medula e o bulbo, em

particular os de natureza sifilítica. Esses últimos apresentam um início

re-lativamente brusco, evolução por surtos, assimetria de comprometimento

muscular nos membros superiores, precedência de atrofias proximais em

re-lação às distais. Por outro lado, na E L A de origem degenerativa, o início

é insidioso, a evolução lenta, o acometimento muscular simétrico e

predomi-nantemente distai. Além disso, outros aspectos que levam ao diagnóstico

da forma secundária são a presença de sinais indicativos de lesão medular

transversa (comprometimento assimétrico das vias longas de sensibilidade e

motricidade) e de fenômenos parestésicos de tipo radicular, assim como a

ra-ridade de fasciculações musculares e de comprometimento bulbar

5

>

n

>

1 7

>

2 2

>

2 4

.

Nas referências registradas na literatura médica predomina o ponto de

vista de ser a concomitância entre E L A e sífilis resultante de simples

coinci-T r a b a l h o d o D e p a r t a m e n t o d e N e u r o l o g i a e N e u r o c i r u r g i a d a E s c o l a P a u l i s t a

d e M e d i c i n a , a p r e s e n t a d o n o I X C o n g r e s s o N a c i o n a l d e N e u r o l o g i a , P s i q u i a t r i a e

H i g i e n e M e n t a l ( R i o d e J a n e i r o , G B — j u l h o d e 1 9 6 9 ) : * P r o f e s s o r A d j u n t o ;

(2)

dência, embora alguns autores ainda admitam relação causai entre ambas

3

>

1 2

.

Esse enunciado difere sensivelmente daquele adotado por autores mais antigos,

que consideravam, em sua maioria, a existência de uma E L A de etiología

sifilítica.

O B S E R V A Ç Ã O

M . F . S . , 5 1 a n o s , p a r d a , b r a s i l e i r a , c a s a d a , a t e n d i d a n o a m b u l a t ó r i o d e N e u r o l o g i a d a E s c o l a P a u l i s t a d e M e d i c i n a , p e l a p r i m e i r a v e z , e m 3 0 7 1 9 6 8 . A p a -c i e n t e r e l a t a v a e s t a r p e r f e i t a m e n t e b e m a t é h á u m a n o a t r á s , q u a n d o p a s s o u a s e n t i r d o r e s n a r e g i ã o c e r v i c a l e n a c l a v í c u l a e s q u e r d a , a s q u a i s p i o r a v a m c o m a m o v i m e n t a ç ã o d o p e s c o ç o e d o s b r a ç o s . H á 6 m e s e s a p r e s e n t o u f r a q u e z a d o d e d o m é d i o d a m ã o d i r e i t a , q u e r a p i d a m e n t e s e e s t e n d e u a t o d o o m e m b r o s u p e r i o r d i -r e i t o . H á 4 m e s e s a p a -r e c e u i d ê n t i c a s i n t o m a t o l o g i a n o m e m b -r o s u p e -r i o -r e s q u e -r d o . C o n c o m i t a n t e m e n t e n o t o u " t r e m o r e s " n o s m ú s c u l o s a f e t a d o s , o s q u a i s p r o g r e s s i v a m e n t e s e t o r n a r a m m a i s d e l g a d o s e f r a c o s , l e v a n d o a g r a n d e d i m i n u i ç ã o d e c a p a c i d a d e d e m o v i m e n t o s e m a m b o s o s m e m b r o s s u p e r i o r e s . D e s d e o i n í c i o d a m o l é s -t i a s o f r e u d o r e s a r -t i c u l a r e s , a c o m p a n h a d a s d e i n c h a ç o e p a r e s -t e s i a s n a s m ã o s .

Anceãentes pessoais •— A p a c i e n t e a b o r t o u p o r ^ v e z e s ( g r a v i d e z e s d e 3 a 4 m e s e s )

e 3 f i l h o s m o r r e r a m c o m m e n o s d e l a n o d e i d a d e , d e c a u s a i g n o r a d a . U l t e r i o r m e n t e d e u à l u z 6 f i l h o s v i v o s e s a d i o s . N e g o u o u t r o s a n t e c e d e n t e s m ó r b i d o s d e r e l e v â n -c i a . N e g o u d o e n ç a s e m e l h a n t e à s u a e m q u a l q u e r d e s e u s f a m i l i a r e s . Exame -

clí-nico — • A s p e c t o g e r a l b o m . M u c o s a s c o r a d a s . P r e s s ã o a r t e r i a l 1 2 0 x 8 0 ; p u l s o 8 4

b p m r í t m i c o ; t e m p e r a t u r a a x i l a r 3 6 , 5 ° C . F í g a d o p a l p á v e l a 4 c m d o r e b o r d o c o s t a l n a l i n h a h e m i c l a v i c u l a r d i r e i t a ; b o r d o f i n o , c o n s i s t ê n c i a l e v e m e n t e a u m e n t a d a , s u -p e r f í c i e l i s a e a l g o d o l o r o s a . Exame ginecológico r e v e l o u c i s t o c e l e , r e t ó c e l e , r o t u r a d e p e r i n e o d e 2o g r a u e v u l v o v a g i n i t e t r i c o m o n ó t i c a . Exame oftalmológico m o s

t r o u p t e r i g i o i n t e r n o n o o l h o d i r e i t o ; e x a m e d o s f u n d o s o c u l a r e s s e m a n o r m a l i d a d e . Exame neurológico •— H i p o t r o f i a b i l a t e r a l d o s m ú s c u l o s d o s m e m b r o s s u p e r i o -r e s e d a c i n t u -r a e s c a p u l a -r . M ã o s d e a s p e c t o l u s t -r o s o , e d e m a c i a d a s , c o m a u m e n t o d e v o l u m e a r t i c u l a r e g r a n d e h i p o t r o f i a d o s m ú s c u l o s d a s r e g i õ e s t e n a r , h i p o t e n a r e d o s i n t e r ó s s e o s p a l m a r e s e d o r s a i s . A n t e b r a c o s c o m h i p o t r o f i a m u s c u l a r g l o b a l b i l a t e r a l m e n t e . N o s b r a ç o s e s s a h i p o t r o f i a m o s t r a v a - s e m e n o s a c e n t u a d a , e s t a n d o m a i s a c o m e t i d o o m ú s c u l o t r i c e p s . H i p o t r o f i a b i l a t e r a l d o s m ú s c u l o s d e l t o i d e , t r a p é z i o , e s t e r n o c l e i d o m a s t ó i d e o , s u p r a e s p i n h o s o , i n f r a e s p i n h o s o , r o m b o i d e e g r a n d e d o r s a l . F a s c i c u l a c ã o d i s c r e t a n o s m ú s c u l o s a c o m e t i d o s p e l a s h i p o t r o f i a s , p r i n c i p a l -m e n t e n a c i n t u r a e s c a p u l a r . D i s c r e t o s -m o v i -m e n t o s d e a d u ç ã o e a b d u ç ã o d o s d e d o s i n d i c a d o r e m é d i o d a m ã o e s q u e r d a ; a m o v i m e n t a ç ã o d o s b r a ç o s s e f a z i a u n i c a m e n t e a s c u s t a s d o s m ú s c u l o s p r o x i m a i s d o t r o n c o e c i n t u r a e s c a p u l a r . G r a n d e d i m i -n u i ç ã o d e f o r ç a e a c e -n t u a d a h i p o t o -n i a d o s m ú s c u l o s a c o m e t i d o s p e l a s h i p o t r o f i a s . R e f l e x o s ó s t e o - t e n d i n o s o s a b o l i d o s n o s m e m b r o s s u p e r i o r e s . A eletromiografia ( 1 0 - 8 - 6 8 ) m o s t r o u a l t e r a ç õ e s s u g e s t i v a s d e c o m p r o m e t i m e n t o m o t o r d e t i p o n e u r o g ê n i c o p e -r i f é -r i c o , c o m s i n a i s d e s o p -r i m e n t o n e u -r o n a l a t u a l ; f o -r a m e x a m i n a d o s o s m ú s c u l o s d e a m b o s o s m e m b r o s s u p e r i o r e s , n a e m i n ê n c i a t e n a r e h i p o t e n a r , b i c e p s , t r i c e p s , d e l t o i d e s e t r a p e z i u s . A eletromiografia d a l i n g u a ( 3 0 - 8 - 6 8 ) r e s u l t o u n o r m a l . O e x a m e d a s e n s i b i l i d a d e s u p e r f i c i a l e p r o f u n d a e m t o d o s o s s e g m e n t o s n ã o m o s t r o u q u a l q u e r a l t e r a ç ã o . O e x a m e d o t o n o m u s c u l a r , f o r ç a e m o t r i c i d a d e n o t r o n c o , c i n t u r a p é l v i c a e m e m b r o s i n f e r i o r e s m o s t r o u s e n o r m a l . O e q u i l í b r i o e s t a v a c o n s e r v a d o e a m a r c h a s e f a z i a c o m a u s ê n c i a d e m o v i m e n t a ç ã o a s s o c i a d a d o s m e m b r o s s u p e r i o r e s . A l g u n s r e f l e x o s m u s c u l a r e s p r o f u n d o s ( p a t e l a r e s , a d u t o r e s , m é d i o p l a n t a r e s e a q u i l e u s ) a p r e s e n t a r a m r e s p o s t a s e x a l t a d a s e p o l i c i n é t i c a s , b i l a t e r a l m e n t e . A l é m d i s s o , h a v i a o u t r o s s i n a i s p i r a m i d a i s e v i d e n t e s : R o s s o l i m o b i l a t e r a l , B a -b i n s k i e s -b o ç a d o à e s q u e r d a e c o m p r o m e t i m e n t o d o s r e f l e x o s c u t â n e o - a -b d o m i n a i s

( a u s e n t e s à e s q u e r d a , r e s p o s t a s m í n i m a s à d i r e i t a ) . E s f í n t e r e s s e m a l t e r a ç õ e s . P s i q u i s m o n o r m a l .

Exames complementares — Reação sorológica para lues: n e g a t i v a e m 3 1 - 7 - 1 9 6 8 ,

(3)

e a t é d i l u i ç ã o 1 / 1 6 e m 2 3 - 6 - 1 9 6 9 . Exames de líquido cefalorraqueano (Quadro 1).

Exame radiológico de coluna cervical ( 5 - 8 - 6 8 ) : o s t e o a r t r o s e , s e m s i n a i s d e l e s ã o

ó s s e a f o c a i . Exame radiológico de mãos, antebraços e clavículas ( 8 1 6 9 ) : a c e n t u a -d a o s t e o p o r o s e -d o s o s s o s l o n g o s e -d a s e x t r e m i -d a -d e s -d a s f a l a n g e s m e t a c a r p i a n a s e p u n h o s . Outros exames — H e m o g r a m a , u r i n a t i p o I , p e s q u i s a d e c é l u l a s L E , m u -c o p r o t e í n a s , p r o t e í n a C r e a t i v a , p r o v a s f u n -c i o n a i s h e p á t i -c a s , e x a m e r a d i o l ó g i -c o d e j o e l h o e t ó r a x , d o s a g e m d e c o l e s t e r o l e P B I , f o r a m t o d o s n o r m a i s .

Evolução — D u r a n t e s u a i n t e r n a ç ã o a p a c i e n t e r e c e b e u , p o r v i a i n t r a m u s c u l a r ,

2 4 . 0 0 0 . 0 0 0 U . d e p e n i c i l i n a e m 3 0 d i a s , n u m e s q u e m a d e 1 8 . 0 0 0 . 0 0 0 U . d e p e n i c i l i n a p r o c a i n a e 6 . 0 0 0 . 0 0 0 U . d e p e n i c i l i n a b e n z a t i n a . R e f e r i u m e l h o r a d a s d o r e s a r t i -c u l a r e s e d a s p a r e s t e s i a s n a s m ã o s . A p ó s a a l t a h o s p i t a l a r , e m 9 - 9 - 6 8 , r e -c e b e u m a i s 6 . 0 0 0 . 0 0 0 U . d e p e n i c i l i n a b e n z a t i n a ( 1 . 2 0 0 . 0 0 0 U . p o r v i a i n t r a m u s c u l a r d e 5 e m 5 d i a s ) . R e t o r n o u p a r a c o n t r o l e e m 6 - 1 - 6 9 r e f e r i n d o d o r e s n a s r e g i õ e s e s c a p u l a r e s e c e r v i c a i s a o r e a l i z a r m o v i m e n t o s d e l a t e r a l i z a ç ã o d a c a b e ç a . V o l t o u a t e r p a r e s -t e s i a s e p i s ó d i c a s n o s d e d o s d a s m ã o s . E x a m e n e u r o l ó g i c o e c l í n i c o p r a -t i c a m e n -t e i n a l t e r a d o s . R e c e b e u m a i s 4 . 8 0 0 . 0 0 0 U . d e p e n i c i l i n a b e n z a t i n a p o r v i a i n t r a m u s -c u l a r . O ú l t i m o -c o n t r o l e -c l í n i -c o f o i f e i t o e m 2 1 - 1 - 7 0 , a p r o x i m a d a m e n t e u m a n o e m e i o a p ó s a p r i m e i r a c o n s u l t a . A p a c i e n t e d i s s e t e r p a s s a d o b e m n o s ú l t i m o s 5 m e s e s , r e f e r i n d o m e l h o r a d a f o r ç a d o m e m b r o s u p e r i o r d i r e i t o e d e s a p a r e c i m e n t o d o " i n c h a ç o " d a s m ã o s h á 4 m e s e s . E n t r e t a n t o , p e r s i s t i a m a s p a r e s t e s i a s , t e n d o " f e r r o a -d a s " e s e n s a ç ã o -d e " e l e t r i c i -d a -d e " n o s m ú s c u l o s a f e t a -d o s p e l a s h i p o t r o f i a s . A o e x a m e n e u r o l ó g i c o n o t o u - s e d i s c r e t o a u m e n t o d a s h i p o t r o f i a s m u s c u l a r e s n o s a n t e b r a ç o s e c i n t u r a e s c a p u l a r b i l a t e r a l m e n t e , a l é m d e f a s c i c u l a ç ã o m u s c u l a r e p i s ó d i c a n e s s a s ú l t i m a s r e g i õ e s . D e s a p a r e c e u o a s p e c t o e d e m a c i a d o e l u s t r o s o d a s m ã o s . A p a -c i e n t e n ã o p o d i a f l e x i o n a r o s d e d o s b i l a t e r a l m e n t e , p o r é m -c o n s e g u i a e x e -c u t a r m e l h o r o s m o v i m e n t o s d e l a t e r a l i z a ç ã o n o s d e d o s d a m ã o e s q u e r d a . A m o v i m e n t a ç ã o r e s t a n t e d o s m e m b r o s s u p e r i o r e s p e r m a n e c e u p r a t i c a m e n t e i n a l t e r a d a , s e n d o a l g o m e -l h o r à d i r e i t a . D e s a p a r e c e r a m a s d o r e s a o e f e t u a r m o v i m e n t o s d e -l a t e r a -l i z a ç ã o d a c a b e ç a . H a v i a d o r à p r e s s ã o d o s m ú s c u l o s t r a p é z i o s e d o s m e m b r o s s u p e r i o r e s , p r i n c i p a l m e n t e n o s b r a ç o s . S i n a l d e B a b i n s k i e s b o ç a d o b i l a t e r a l m e n t e , m a i s e v i d e n t e ã e s q u e r d a . R e f l e x o s c u t â n e o - a b d o m i n a i s p r e s e n t e s b i l a t e r a l m e n t e , s e n d o m e n o s e v i d e n t e s à e s q u e r d a . S e n s i b i l i d a d e g l o b a l m e n t e c o n s e r v a d a . R e s t a n t e d o e x a m e i n a l t e r a d o .

C O M E N T A R I O S

O caso apresentado se refere a mulher de 51 anos df

1

(4)

na região da cintura escapular bilateralmente, evoluindo rapidamente para

um quadro de amiotrofias acentuadas em todos os músculos da cintura

es-capular, dos membros superiores e, em particular, dos músculos próprios das

mãos. Ao exame neurológico constatou-se síndrome amiotrófica de tipo

neuropático nos membros superiores e cintura escapular bilateralmente, ao

lado de síndrome piramidal em ambos os membros inferiores. Não havia

quaisquer perturbações de sensibilidade ou de esfincteres. O estado mental

se manteve íntegro. Os exames de líquido céfalorraqueano mostraram

pleoci-tose (linfo-mononuclear), hiperproteinorraquia, positividade das reações

glo-bulínicas e das reações para a sífilis. N o sangue a reação sorológica para

sífilis positivou-se após certo tempo.

Trata-se de um quadro clínico de esclerose lateral amiotrófica ( E L A )

— amiotrofias neuropáticas simétricas na cintura escapular e mãos, ao lado

de síndrome piramidal nos membros inferiores — acrescida de

manifesta-ções dolorosas, possivelmente de tipo radicular, que se apresentou com

evo-lução subaguda. Os resultados dos exames do líquido céfalorraqueano levaram

ao diagnóstico de neuro-lues parenquimatosa.

Após a instituição da penicilinoterapia a paciente foi acompanhada

du-rante 18 meses ocorrendo, nesse período, discreta piora das hipotrofias

mus-culares, sem progressão ou aparecimento de outros distúrbios neurológicos.

Houve ligeira melhora da movimentação do membro superior esquerdo. A

evolução das alterações do líquido céfalorraqueano mostrou diminuição da

síndrome inflamatoria, com permanência da positividade das reações para a

sífilis. A reação de Wasserman no sangue, inicialmente negativa,

positi-vou-se com títulos progressivamente crescentes.

De acordo com a literatura, o aspecto simétrico das amiotrofias, a

pre-sença de fasciculações musculares na cintura escapular e a evolução

pro-gressiva da síndrome neurológica seriam elementos indicativos do

diagnós-tico de moléstia de Charcot. Entretanto, a presença de manifestações clínicas

do tipo radicular, de evolução subaguda e sinais de neurossífilis em atividade

revelados pelo exame do líquido céfalorraqueano fazem pensar

preponderan-temente em meningomielite sifilítica, possivelmente com comprometimento

circulatorio da medula, dependente da artéria espinal anterior a esse n í v e l

2 3

.

Por outro lado, os aspectos terapêuticos merecem algumas

considera-ções. As opiniões são praticamente unânimes em que a E L A de origem

si-filítica deve receber tratamento específico precoce e intenso. Nessa

even-tualidade as manifestações clínicas podem sofrer estabilização em sua

evolu-ção, sendo os resultados tanto melhores quanto mais precoce a instituição

da medicação

3

.

1 0

>

1 2

>

1 8

>

2 1

>

2 2

; alguns autores preconizam mesmo, em todas as

síndromes que lembram a E L A , se os antecedentes pessoais comportarem a

idéia de sífilis, a necessidade do tratamento específico, mesmo que sejam

ne-gativas as reações sorológicas

1 4

(5)

moles-tia de Charcot não responde à penicilinoterapia, tendo evolução inexorável.

Em nossa paciente ocorreu, com a penicilinoterapia, praticamente uma

esta-bilização do quadro clínico neurológico. Pensamos ser esse resultado da

terapêutica um argumento favorável à afirmação da natureza sifilítica do

processo.

Outro elemento significativo para o diagnóstico de meningomielite

sifilí-tica é a concomitância do aparecimento, em uma mesma paciente, de duas

entidades relativamente raras

1 7

>

2 7

, isto é, a moléstia de Charcot e a

neu-rossífilis. O raciocínio baseado em dados estatísticos nos levou a concluir

pela existência de uma relação de causa e efeito entre a síndrome

neuroló-gica apresentada por essa paciente e o fator etiológico presente.

R E S U M O

É relatado um caso clínico de esclerose lateral amiotrófica ( E L A ) ,

ca-racterizado por amiotrofias extensas na cintura escapular e membros

supe-riores, associadas a exaltação dos reflexos osteotendinosos nos membros

in-feriores, com sinal de Rossolimo bilateral e sinal Babinski esboçado a

esquer-da, sem distúrbios sensitivos ou esfinterianos, em mulher de 51 anos de idade

e com história progressiva de um ano. O exame de líquido cefalorraqueano

permitiu o diagnóstico de neurossífilis parenquimatosa. Chamando a atenção

para a raridade dessa associação, os A A . discutem o papel da neuro-lues

como fator causal da síndrome de E L A , concluindo por uma provável

rela-ção de causa e efeito no caso descrito, por ter havido estabilizarela-ção do quadro

sintomatológico após terapêutica penicilínica.

S U M M A R Y

Amyotrophic lateral sclerosis and neurosyphilis. A case report

A clinic case of amyotrophic lateral sclerosis ( A L S ) in a 51 years old

woman is reported. The patient exhibited signs of pyramidal system and

anterior motor neuron involvement. The cerebrospinal fluid examinations

showed clear cut indications of parenchymatous neurosyphilis.

Attention is called to the rarity of the association above mentioned.

The role of neurosyphilis as an atiological factor of A L S is discussed. The

authors conclude that in the case described there is a close relationship

between the two entities.

R E F E R Ê N C I A S

1 . A L A J O U A N I N E , T . ; T H U R E L , R . ; C A S T A I G N E , P . ; G R A V E L E A U , J . & T R E M ¬ B L A Y , E . — D e u x c a s d e s c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e a s s o c i e é a u t a b e s . R e v . N e u r o l . ( P a r i s ) 8 3 : 2 9 1 , 1 9 5 0 .

(6)

3 . B A R R A Q U E R - F E R R É , L . — C o n t r i b u t i o n a l a c o n n a i s s a n c e d e l ' e t i o l o g i e d e l a s c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e . A c t a N e u r o l . P s y c h i a t . B é l g i c a 5 1 : 2 6 4 , 1 9 5 1 . 4 . B E E R M A N , H . — c i t . p o r D A T T A e c o l .1 2.

5 . B O D E C H T E L , G . & S C H R A D E R , A . — D i e A m i o t r o p h i s c h e L a t e r a l s k l e r o s e . In H a n d b u c h d e r I n n e r e n M e d i z i n , B d . 5, S p r i n g e r - V e r l a g , B e r l i n , p . 5 0 1 , 1 9 5 3 . 6 . B R A I N , W . R . — D i s e a s e s o f t h e N e r v o u s S y s t e m . Q u a r t a e d i ç ã o . O x f o r d

U n i v . P r e s s , L o n d o n , p . 6 0 7 , 1 9 5 1 .

7 . B U M K E , O . & F O E R S T E R , O . — H a n d b u c h d e r N e u r o l o g i c B d . 1 6 . S p r i n g e r ¬ V e r l a g , B e r l i n , p . 5 2 5 , 1 9 3 6 .

8 . C H A R C O T , J . M . — S c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e . In L e n ç o n s s u r l e s M a l a d i e s d u S y s t è m e N e r v e u x . S e g u n d a E d i ç ã o . V o l . I I , p . 2 1 3 , C e r t . e F i l s , V e r -s a i l l e -s , P a r i -s , 1 8 9 2 .

9 . C O O K , R . E . — c i t . p o r D A T T A e c o l .1 2.

1 0 . C O R D I E R , J . — S c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e e t s y p h i l i s . A c t a N e u r o l . P s y c h i a t . B e l g i c a 5 5 : 9 9 8 , 1 9 5 5 .

1 1 . C U R C I O , F . I . — A m i o t r o f i a e s p i n a l s i f i l í t i c a . P r . M e d . A r g e n t i n a 4 1 : 3 4 4 9 , 1 9 5 4 .

1 2 . D A T T A , A . ; D A S A D H I K A R Y , C . & G H O S H , S. — S y p h i l i t i c a m y o t r o p h y . J . I n d i a n M e d . A s s o c . 4 7 : 2 8 7 , 1 9 6 6 .

1 3 . D E S M O N D , S . & O ' D O H E R T Y , D . S. — T h e a m y o t r o p h i c l a t e r a l s c l e r o s i s s y n -d r o m e . D i s . N e r v . S y s t . 2 2 : 3 0 5 , 1 9 8 1 .

1 4 . L H E R M I T T E , J.; F A U R E - B E A U L I E U ; M11e. V O G T - P O P P & A J U R I A G U E R R A ,

J . — S c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e d e C h a r c o t e t s y p h i l i s . U n e o b s e r v a t i o n a n a t o m o - c l i n i q u e . R e v . n e u r o l . ( P a r i s ) 7 7 : 1 3 1 , 1 9 4 5 .

1 5 . L I C H T E N S T E I N , B . W . & L U H A N , J . A . — S y p h i l i t i c a m y o t r o p h y . C l i n i c a l p a t h o l o g i c a l r e p o r t o f a c a s e c o m p l i c a t i n g t a b e s d o r s a l i s . J . N e u r o p a t h . E x p . N e u r o l . 5 : 3 2 1 , 1 9 4 6 .

1 6 . M O R I L L A S , D . — E t i o p a t h o g e n i c p r o b l e m s o f a m y o t r o p h i c l a t e r a l s c l e r o s i s . M e d . E s p a ñ o l a 2 3 : 2 9 7 , 1 9 5 0 .

1 7 . M U L D E R , D . W . — A m y o t r o p h i c l a t e r a l s c l e r o s i s : c l i n i c a l s y n d r o m e a n d d i f f e -r e n t i a l d i a g n o s i s . M e d . C l i n . N o -r t h A m e -r i c a 4 4 : 1 0 1 3 , 1 9 6 0 .

1 8 . R A Y M O N D , F . — L e ç o n s s u r l e s M a l a d i e s d u S y s t è m e N e r v e u x . O c t a v e D o i n , P a r i s , 1 8 9 6 .

1 9 . R E V I L L A , A . G . — S y p h i l i t i c a m y o t r o p h y . D i s . N e r v . S y s t . 7 : 6 9 , 1 9 4 6 . 2 0 . S C H A F F E R , K . — c i t . p o r B U M K E & F O E R S T E R7, p g . 6 2 8 .

2 1 . S C H W O B , R . A . ; F O U C Q U I E R , E . & F R A N Ç O N , J . — A m y o t r o p h i c s y p h i l i t i q u e e t s c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e . R e v . n e u r o l . ( P a r i s ) 8 6 : 3 3 4 , 1 9 5 2 . 2 2 . S P O T A , B . B . — S o b r e u n c a s o d e s e u d o e s c l e r o s e l a t e r a l a m i o t r o f i c a s i f i l í t i c a .

S u s r e l a c i o n e s c o n l a e n f e r m e d a d d e C h a r c o t . S e m . M e d i c a ( B u e n o s A i r e s ) 4 : 1 8 6 7 , 1 9 3 2 .

2 3 . S T E E G M A N N , A . T . — S y n d r o m e o f t h e a n t e r i o r s p i n a l a r t e r y . N e u r o l o g y ( M i n n e a p o l i s ) 2 : 1 5 , 1 9 5 2 .

2 4 . V O G T - P O P P , C . & B O U R G U I G N O N , M . G . — S c l é r o s e l a t é r a l e a m y o t r o p h i q u e e t s y p h i l i s . R e v . n e u r o l . ( P a r i s ) 7 2 : 5 6 1 , 1 9 3 9 / 1 9 4 0 .

2 5 . V R A A J E N S E N , G . — A m y o t r o p h i c c e r e b r o e s p i n a l s y p h i l i s . A c t a N e u r o l . P s y -c h i a t . S -c a n d . 2 1 : 7 9 5 , 1 9 4 6 .

2 6 . W E C H S L E R , I . S . ; S A P I R S T E I N , M . R . & S T E I N , A . — P r i m a r y a n d s y m p t o m a t i c a m y o t r o p h i c l a t e r a l s c l e r o s i s . A m e r . J . M . S c . 2 0 8 : 7 0 , 1 9 4 4 .

2 7 . Z U K E R M A N , E . ; C A R D O S O , W . ; D I M I G U E L I , H . ; R E I S F I L H O , I . ; S C H W A R ¬ T Z M A N , J . S . ; B E I , A . ; M O R E I R A , M . H . ; G I O R G I , D . ; R O T B E R G , A . & R E I S , J . B . — I n c i d ê n c i a d a n e u r o s s í f i l i s e s u a s f o r m a s c l í n i c a s e m S ã o P a u l o . R e v . P a u l . M e d . ( S ã o P a u l o ) 7 0 : 2 7 0 , 1 9 6 7 .

Referências

Documentos relacionados

Não foram selecionados estudos farmacoeconômicos de avaliação de desfechos e custos, avaliações econômicas incompletas, resumos de congresso, estudos sobre outras

Se estiver treinando em casa ou ao ar livre, clique na tela e, em seguida, no botão de pause. Já quando estiver usando o Personal Trainer Online na academia, clique no botão de stop

relata que, ao ser indicado para presidir o gabinete, em 1889, o Visconde de Ouro Preto apresenta à Câmara seu programa de governo propondo amplas reformas

Antes de conectar a câmera pela primeira vez para carregar/ para transferir arquivos, insira o CD fornecido na unidade de CD-ROM para instalar os drivers necessários... Para usuários

A pensão por morte poderá ser concedida, em caráter provisório, por morte presumida mediante sentença declaratória de ausência, expedida por autoridade judicial, a

Como o objetivo do estudo era entender os fatores de adesão ao programa sócio torcedor dos clubes cariocas, fez-se necessário que no questionário houvesse uma

Dentre as intervenções pautadas e planejadas na articulação de estratégias para redução de EA em âmbito hospitalar, a RDC nº 36, de 25 de julho de 2013, relaciona a necessidade

No estágio II já existe fraqueza muscular moderada e envolvimento de um maior número de grupamentos musculares, logo, é orientado a continuidade dos exercícios do estágio I e