• Nenhum resultado encontrado

Embolia gordurosa cerebral pós-traumática.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Embolia gordurosa cerebral pós-traumática."

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

EMBOLIA GORDUROSA CEREBRAL PÓS-TRAUMÁTICA

DARCY DE FREITAS VELLUTINI * SHINICHI ISHIOKA * *

LAMARTINE CORREIA DE MORAIS JR. * * *

A embolia gordurosa é uma das mais importantes causas de mortalidade em pacientes com fraturas. Embora a patogenia seja controvertida e ainda não haja tratamento preventivo eficaz, o diagnóstico pode ser feito com segu-rança. De acordo com Peltier7

, a embolia gordurosa nos capilares do pulmão foi primeiramente descrita por Zenker em 1862 e sua patologia delineada por Wagner em 1865; somente em 1873 foi que Bergmann fez o primeiro diagnós-tico clínico.

O presente trabalho registra dois casos de embolia gordurosa ocorridos em pacientes politraumatizados.

O B S E R V A Ç Õ E S

C A S O 1 — I . M . com 33 anos de idade, sexo masculino, internado no Pronto Socorro do H o s p i t a l das Clínicas da Universidade de São Paulo (reg. 142368) em 18-5-1968, v í t i m a de acidente automobilístico. A o e x a m e , o paciente se apresentava consciente, bem orientado no tempo e no espaço. Escoriações no rosto. Pressão arterial 1 5 5 x 8 0 ; Pulso 8 8 ; T e m p e r a t u r a 3 6 ° C . E s m a g a m e n t o da perna esquerda e fratura c o m p l e t a do 1 / 3 médio do fémur; f r a t u r a exposta do 1 / 3 distai da tíbia e perónio à direita. Foi feita, sob anestesia geral, limpeza cirúrgica da fratura no m e m b r o inferior direito e a m p u t a ç ã o do m e m b r o inferior esquerdo ao nível da coxa. No dia seguinte o paciente mostrou-se torporoso, confuso, sem rigidez de nuca e sem sinais neurológicos focais. C o m a suspeita de embolia gordurosa, foram pedidos e x a m e s complementares. Líquido cefalorraqueano normal. Pesquisa de gotículas de

gordura na urina positiva. Taxa de lípides totais 3 8 5 m g / 1 0 0 m l . Uréia no sangue

54 m h / 1 0 0 m l . Hemograma: 3 . 6 0 0 . 0 0 0 glóbulos vermelhos; Hemoglobina 11,1 g r / 1 0 0 ml ( 6 9 % ) . N o AP dia apareceram petéquias distribuídas pelo tórax e pescoço que desapareceram a o fim de três dias. O t r a t a m e n t o consistiu na administração de sangue total, m a n i t o l a 2 0 % , d e x a m e t a s o n a , álcool absoluto diluído e m soro

glico-sado a 5 % e antibióticos. H o u v e m e l h o r a progressiva do estado de consciência, com recuperação total da parte neurológica, sendo dada a l t a em 30-5-1968.

C A S O 2 — J . M . A . M . com 21 anos de idade, sexo masculino, internado no Hos-pital da Beneficência P o r t u g u e s a de São Paulo ( R e g . 155203) em 2-9-1968, v í t i m a de acidente automobilístico. O paciente se a p r e s e n t a v a torporoso, sem rigidez de nuca e sem sinais neurológicos focais. Pressão arterial 1 2 0 x 8 0 ; Pulso 1 2 0 ; Afebril. F r a t u r a do f é m u r à direita e de tíbia à esquerda. A p ó s 13 horas de internação, o

(2)

paciente apresentou hipertermia e crises c o n v u l s i v a s generalizadas. A

carotidoangio-grafia foi normal, tendo sido então l e v a n t a d a a hipótese de embolia gordurosa. Dos

E x a m e s realizados, a pesquisa de gordura na urina foi poitiva e o hematócrito foi de 2 7 % . C o m o aparecimento de secreção brônquica a b u n d a n t e foi feita traqueostomia. N o 4.» dia a p a r e c e r a m petéquias disseminadas pelo t ó r a x e pescoço. O t r a -t a m e n -t o consis-tiu n a adminis-tração de s a n g u e -to-tal, m a n i -t o l a 2 0 % , cor-ticóides, álcool absoluto diluído e m soro glieosado a 5 % e antibióticos. H o u v e piora progressiva no quadro clínico, ocorrendo o óbito e m 8-9-1968.

C O M E N T Á R I O S

Na etiologia da embolia gordurosa as partículas embolizantes podem par-tir do sistema ósseo (fraturas de ossos longos, operações ortopédicas) da gor-dura subcutânea e intermuscular e da gorgor-dura visceral. Embora o quadro clínico da embolia gordurosa não seja muito freqüente, as necrópsias de pa-cientes traumatizados mostram sua alta incidência (Denman e Gragg1

, Emson2

, Kuhne e Kremser4

, Takats e c o l .1 2

) . De 66 casos revistos na lite-ratura por Moine e Lagrave6

, ocorreu o óbito em 32. Inicialmente ocorre um quadro pulmonar (embolia gordurosa pulmonar) e, ulteriormente, sur-gem indícios de embolia gordurosa sistêmica que ocorre seja devido à persis-tência do foramen oval ou através dos capilares pulmonares para as veias pulmonares.

A embolia gordurosa pulmonar é definida por Vance 1 3

como uma obstru-ção na circulaobstru-ção pulmonar com acentuada queda nas trocas respiratórias dos alvéolos. Seus sintomas são: tosse, dor torácica, dispnéia, cianose, ester-tores, escarro sanguinolento e hipertermia. O aparecimento, na radiografia de tórax, de imagem miliar macronodular nas duas bases, segundo Lavarde õ

, confirma o diagnóstico. A pesquisa de gotículas de gordura no escarro tem valor diagnóstico duvidoso, pois admite-se poder ser ela normalmente ali encontrada. Insuficiência cardíaca direita pode ser secundária à hipertensão na artéria pulmonar. Os achados eletrocardiográficos que, segundo Peltier7

, podem ser encontrados são: taquicardia, aparecimento súbito de ondas S pro-fundas em D l e ondas Q propro-fundas em D3, e o desvio da zona de transição para a esquerda. Arritmias são freqüentes. Existe inversão da onda T, pro-vavelmente indicando severa sobrecarga do ventrículo direito. Depressão do segmento ST também ocorre por isquemia subendocárdica ; pode haver blo-queio do ramo direito. Nos nossos casos o quadro pulmonar foi evidente ape-nas em um deles (caso 2).

Vencida a barreira pulmonar que atua como filtro para as gotículas de gordura, ocorre embolia gordurosa sistêmica. Kuhne e Kremser4

(3)

A sintomatologia decorrente das lesões cerebrais pode simular e exis-tência de hematoma intracraniano pois também ocorre o chamado "inter-valo livre" entre o traumatismo e o aparecimento dos sintomas; isto ocorre em 85% dos casos, segundo Sachdeva e col. 8

, dentro das primeiras 48 horas, com sintomas traduzidos por alteração da consciência sem sinais neurológicos focais. O intervalo livre esteve presente apenas no caso 1, aqui relatado.

As petéquias hemorrágicas são consideradas como patognomônicas de embolia gordurosa sistêmica decorrente da embolia gordurosa das arteríolas do derma; elas se localizam no pescoço, ombros, tórax e, raramente, na parede abdominal; podem ser encontradas no palato mole e na subconjuntiva; podem aparecer precocemente no 2.° ou 3.° dia, com duração média de 48 ho-ras. Peltier7

assinalou petéquias em 20% de seus casos; Hirsch e col. 3

rela-taram 30%. Elas estiveram presentes nos nossos casos e seu aparecimento se deu no 4.° dia.

Os rins, mesmo nos casos graves, não apresentam lesões severas; o apa-recimento de lipúria, segundo Vance1 3

, se dá ou por filtração dentro da cápsula de Bowman através da parede intacta do vaso ou por rotura dos glomérulos. Usando método microscópico para pesquisar gotículas de gor-dura, Peltier7

obteve, em 40 pacientes traumatizados, um teste positivo em 57% dos casos. A sua pesquisa foi positiva nos nossos 2 casos.

Diminuição no valor da taxa de hemoglobina tem sido apontada como elemento valioso para o diagnóstico de embolia gordurosa. Esta queda se dá mesmo nos casos em que se fêz a reposição do sangue perdido no momento do traumatismo, sendo devida à hemorragia pulmonar. Nos nossos casos, constatamos uma queda na taxa de hemoglobina que foi bem maior no caso 2.

A lipase do soro se apresenta elevada somente 3 a 4 dias após o trauma-tismo, permanecendo elevada até o 7.° ou 8.° dia. Segundo Peltier7

e Sanch-deva e col.4

, a determinação da lipase no soro é o melhor exame comple-mentar para fins de diagnóstico, devendo ser feito entre o 3.° e o 7.D

dia após o traumatismo.

O exame do líquido cefalorraqueano é normal, não sendo nele encontra-das gotículas de gordura; o eletrencefalograma pode mostrar-se alterado sem caráter específico.

O tratamento da embolia gordurosa engloba vários aspectos. Trabalhos experimentais de Soloway e c o l .1 1

mostraram que o animal hipovolêmico re-tém, no parênquima pulmonar, 19% de gordura mais que o animal normo-tenso; daí a necessidade da correção da anemia que o paciente possa apre-sentar, mediante transfusões de sangue total. O tratamento da complicação pulmonar se faz pela traqueostomia, administração de oxigênio e, nos casos mais graves, com respiração controlada por aparelhos tipo Bird. O uso de álcool absoluto e de heparina, indicados por alguns autores (Hirsch e col. 3

, Moine6

, Soloway1 1

) tem dado lugar a controvérsias. Em trabalhos experi-mentais, Sachdeva e c o l .1 0

(4)

gor-dura e também por substâncias semelhantes à histamina que são liberadas localmente no tecido lesado, sendo responsáveis pelo bronco e vasoespasmo. Nos nossos casos, apesar de realizarmos um tratamento padronizado, que consistiu em sangue total, manitol, álcool absoluto diluído em soro glicosado, corticóide e antibióticos, obtivemos bom resultado em apenas um. Isto se deve, provavelmente, ao grau de intensidade da embolia gordurosa sistêmica

existente.

R E S U M O

São relatados dois casos de embolia gordurosa pós-traumática, sendo estudados os sinais e sintomas que caracterizam sua forma pulmonar e sistê-mica e relatados os métodos paraclínicos utilizados na confirmação do diag-nóstico, tais como radiografias de tórax,. eletrocardiograma, hemograma, dosa-gem de lipase no soro e pesquisa de gordura no escarro e na urina. São comentados os diversos tipos de tratamento empregados.

S U M M A R Y

Cerebral post-traumatic fat embolism: report of two cases.

T w o cases of post-traumatic fat embolism are reported. The pulmonary and systemic signs and symptoms are analysed. The paraclinical methods for diagnosis such as chest roentgenograms, electrocardiogram, hemoglobin and serum lipase values and the finding of fat droplets in sputum or in urine are emphazised. The basis for treatment are discussed.

R E F E R Ê N C I A S

1 . D E N M A N , F . R . & G R A G G , L . — F a t e m b o l i s m . A d i a g n o s i s e n i g m a . A r c h . S u r g . , 5 7 : 3 2 5 , 1 9 4 8 .

2 . E M S O N , H . E . — F a t e m b o l i s m s t u d i e d i n 1 0 0 p a t i e n t s d y i n g a f t e r i n j u r y . J. c l i n . P a t h . , 1 1 : 2 8 , 1 9 5 8 .

3 . H I R S C H , J. R . ; K I N I F F O , H . V . & L E V A N E , J. H . — L ' e m b o l i e g r a i s s e u s e p o s t ¬ t r a u m a t i q u e . J. C h i r . , 9 3 : 9 9 , 1 9 6 7 .

4 . K U H N E , H . & K R E M S E R , K . H . — D i e k l i n i s c h e B e d e u t u n g d e r t r a u m a t i s c h e n F e t t e m b o l i e . B r u m ' s B e i t r . Z . K l i n . C h i r . , 1 9 5 : 3 8 5 , 1 9 5 7 .

5 . L A V A R D E , G . — U n c a s d ' e m b o l i e g r a i s s e u s e p o s t - t r a u m a t i q u e g u é r i e p a r l a v e n t i l a t i o n a r t i f i c i e l l e c o n t i n u e . M e m . A c a d . C h i r . , 9 3 : 4 2 3 , 1 9 6 7 .

6 . M O I N E , M . & L A G R A V E , G . — L e s p r o b l è m e s d i a g n o s t i q u e e t t h e r a p e u t i q u e s p o s é s p a r l ' e m b o l i e g r a i s s e u s e . M e m . A c a d . C h i r . , 9 3 : 5 6 7 , 1 9 6 7 .

7 . P E L T I E R , L . F . — T h e d i a g n o s i s o f f a t e m b o l i s m . S u r g . G y n e c . O b s t , 1 2 1 : 3 7 1 , 1 9 6 5 .

8 . S A C H D E V A , V . P . ; S A C H D E V A , H . S.; G U L A T I , D . R . ; M A L L I K A R J U M , T . S. & G R E W A L , D . S. — S i s t e m i c f a t e m b o l i s m : r e v i e w o f l i t e r a t u r e a n d a r e p o r t o f t h r e e c a s e s . A m e r . S u r g . , 3 5 : 3 6 9 , 1 9 6 9 .

(5)

1 0 . S A C H D E V A , H . S.; S A C H D E V A , K . C . & C H A K R A V A T I , R . N . — F a t e m b o l i s m . A n e x p e r i m e n t a l s t u d y : e v a l u a t i o n o f s m o o t h m u s c l e r e l a x a n t s i n t r e a t m e n t . A m e r . S u r g . , 3 5 : 2 5 7 , 1 9 6 9 .

1 1 . S O L O W A Y , H . B . ; R O B I N S O N , E. F . ; H E R F U A Z E L , H . V . & H U Y S E R , K . L . — E x p e r i m e n t a l f a t e m b o l i s m . I n i t i a l d i s t r i b u t i o n o f f a t e m b o l i s m l a b e l e d w i t h

I1 3 1 i n n o r m o t e n s i v e a n d h y p o t e n s i v e r a b b i t s . A r c h . P a t h . , 8 8 : 1 7 1 , 1 9 6 9 .

1 2 . T A K A T S , G . ; B E C K , W . G . & F E N N , K . F. — P u l m o n a r y e m b o l i s m . S u r g e r y , 6 : 3 3 9 , 1 9 3 9 .

1 3 . V A N C E , B . M . — T h e s i g n i f i c a n c e o f f a t e m b o l i s m . A r c h . S u r g . , 2 3 : 4 2 6 , 1 9 3 1 .

Referências

Documentos relacionados

Este estudo objetivará avaliar a qualidade de vida de idosos de uma comunidade do Rio Grande do Sul, com base no referencial adotado, à luz da literatura que versa sobre a velhice, o

These results clearly show that the linear discriminant model obtained was able not only to recognize differences between the sensor signals obtained with the e-tongue device for

O  Projecto  MARLISCO  é  um  projecto  europeu  cujo  objectivo  é  criar  uma  plataforma  de  aprendizagem  mútua  para  a  sensibilização  social  e 

Desenvolver um portal com jogos educativos que possam ser utilizados por alunos com diferentes deficiências através da mediação das pedagogas da APAE, com

Afinal, ficamos a perguntar, qual vem a ser essa contribuição? A resposta, muito provavelmente decepcionante, residiria quem sabe em apenas assentar as questões

 01 Avaliação Teórica Bimestral, com questões dissertativas (contendo questões cuja elaboração priorizará a avaliação da capacidade interpretativa do aluno,

Imóveis à venda são veiculados pela Internet. Os corretores de imóvel de Anchieta têm aproveitado o ―bom momento‖ do mercado para lançar empreendimentos e promessas

Conforme cláusula 4.11.3 da Escritura de Emissão, o valor dos imóveis alienados fiduciariamente em garantia das Debêntures, não poderá ser, até o vencimento