1 OsautoresagradecemaosprofessoresDalilaXavierdeFrança(Univer-sidadeFederaldeSergipe)eCíceroR.Pereira(UniversidadeCatólica deGoiás)pelasvaliosassugestões.Estetrabalhoéumaversãodeum doscapítulosdaTesedeDoutoradodoprimeiroautor,sobaorientação dosegundo,defendidanoInstitutoSuperiordeCiênciasdoTrabalho edaEmpresa(Portugal).
2 Endereço:RuaAtalaia,260ap.103Atalaia,Aracaju,SE,Brasil49035-110.E-mail:meolima@uol.com.br.
SucessoSocial,BranqueamentoeRacismo
1MarcusEugênioO.Lima2 UniversidadeFederaldaBahia
JorgeVala
InstitutoSuperiordeCiênciasdoTrabalhoedaEmpresa–Lisboa
RESUMO –Esteestudoinvestigaosefeitosdacordapelepercebidaedosucessosocialnobranqueamentoenainfra-hu-manização.Paraaconsecuçãodesteobjetivo,indivíduosbrancosdeveriamavaliarumgrupodepessoasnegraseumgrupo depessoasbrancas(representadosporfotografias),queobtinhamsucessosocialouqueerammalsucedidossocialmente.O delineamentoutilizadocontinhaduasvariáveisindependentesinter-participantes(cordapele:brancosversus negros)ede-sempenhosocial(sucessoversusfracasso).Osresultadosindicaramqueosnegrosqueobtêmsucessosocialsãopercebidos comomaisbrancosdoqueosnegrosquefracassam.Umaanálisedemediaçãoindicouquequantomaisosnegroscomsucesso sãopercebidoscomobrancosmaiscaracterísticastipicamentehumanaslhessãoatribuídas.Oinversosepassaparaosnegros maispercebidoscomonegros.EstesresultadossãoanalisadosediscutidosàluzdasteoriassobreracismonoBrasilesobre asnovasexpressõesderacismo.
Palavras-chave:sucesso;branqueamento;racismoeinfra-humanização.
SocialSuccess,WhiteningandRacism
ABSTRACT–Thisstudyinvestigatestheeffectsofperceivedskincolourandofthesocialsuccessonthewhiteningandon theinfra-humanization.Inthissense,whitesubjectsevaluatedagroupofblackpeopleoragroupofwhitepeople(represented byphotographs),whichobtainedsocialsuccessorthatfail.Thedesigncontainstwobetweensubject’sindependentvariables (whiteversusblack)andsocialperformance(successversusfailure).Theresultsindicatethatblacksthatobtainsocialsuccess areperceivedaswhitenerthantheblacksthatfail.Amediationanalysisindicatedthatasmuchtheblackswithsuccessare whitened,moretypicallyhumancharacteristicsareattributedtothem.Theinversehappensforblackslesswhitened.These resultsareanalysedanddiscussedinaccordingtothetheoriesaboutracisminBrazilandthenewexpressionsofracism.
Keywords:success;whitening;racismandinfra-humanization.
destas expressões aparentemente menos violentas trans-formarem-seemmanifestaçõesflagrantementeagressivas, quandoexistaumcontextosocial,econômicoepolíticoque aslegitimeejustifique.Específicoacadaumadessasnovas formasdeexpressãodoracismoéoseucaráterculturale histórico, que reflete as vicissitudes das relações “inter-racializadas”decadacontextosocialondeemergem.
Énestesentidoqueasnovasexpressõesdoracismono Brasilcarregamemsialgunselementoscomunseoutrosele-mentosdiferenciadosdasexpressõesdoracismonaEuropa enosEUA.Considerandooracismocomoumprocessode hierarquização, exclusão e discriminação contra um indi-víduo(outodaumacategoriasocial),queédefinidocomo diferente com base em alguma marca física externa (real ouimaginária),aqualére-significadaemtermosdeuma marcaculturalinternaquesupostamentedefinepadrõesde comportamento (Lima, 2003), hipotetizamos que um dos elementosdeexpressãodoracismoéainfra-humanização dasvítimas,asquaissãopercebidascomopossuindomais características naturais ou naturalizadas do que culturais. Nestesentido,osgruposracializados(porexemplo,negros) sãoaproximadosdopólodanaturezaedistanciadosdopólo da cultura em relação aos grupos não “racializados” (por exemplo,brancos).
Umdoselementosimportantesquedistingueasexpres-sões do racismo no Brasil das expresUmdoselementosimportantesquedistingueasexpres-sões em sociedades “bi-raciais”,comoanorte-americana,ouemsociedadesonde Vários estudos têm demonstrado que o racismo, nas
atuaissociedadesformalmentedemocráticaseciosascom o“politicamentecorreto”,temmudadoassuasformasde expressão, no sentido de se tornarem progressivamente maisdisfarçadasouveladas.NaEuropaenosEUA,tem-se faladoemnovasexpressõesdoracismoenovasteoriassobre estetematêmsurgidonapsicologiasocial,aexemplodas teoriasdoracismosimbólicoemoderno(Kinder&Sears, 1981; McConahay & Hough, 1976), do racismo aversivo (Gaertner&Dovidio,1986),doracismoambivalente(Katz &Hass,1988)edoracismosutil(Pettigrew&Meertens, 1995;Vala,Brito&Lopes,1999).NoBrasil,algunsestudos têmanalisadoestasmodernasexpressõesmaisveladasde racismo(Camino,Silva,Machado&Pereira,2001;Lima, 2003;Turra&Venturi,1995).
oracismosedirigeagruposexógenosouassimpercebidos, comoaseuropéias,éobranqueamento3 .Nesseestudo,pro-curamosanalisarasnovasexpressõesderacismonoBrasil, considerandoaperformancesocialcomoumavariávelque atua sobre o branqueamento e sobre a infra-humanização dosnegros.
A“essênciahumana”easformasdeinfra-humanização
Ainfra-humanizaçãoresultadanegaçãoamembrosde outros grupos (“exogrupos”) de determinadas caracterís-ticas tipicamente humanas, caracteríscaracterís-ticas que compõem a “essência humana”. Mas que características definem a “essênciahumana”?Váriosestudostêmapontadocomoca-racterísticastipicamentehumanassãoosvalores(Schwartz & Struch, 1989); a cultura (Moscovici & Pérez, 1999); a linguagem,ainteligênciaeacapacidadedeexpressarsen-timentos(Leyens&cols.,2000).DanielBar-Tal(1989)foi umdospioneirosnaanálisedainfra-humanizaçãodosgrupos minoritários,aoanalisaromodocomojudeuserampercebi-dospeloregimenazistaeafirmarqueainfra-humanização pode ocorrer através da “deslegitimação” da categoria ou grupo social com a atribuição de características extrema-mentenegativas:
Dehumanization involves categorizing a group as inhuman eitherbyusingcategoriesofsubhumancreaturessuchasin-feriorracesandanimals,orbyusingcategoriesofnegatively valued superhuman creatures such demons, monsters, and satans.Traitcharacterizationisdonebyusingtraitsthatare evaluatedasextremelynegativeandunacceptabletoagiven society(Bar-Tal,1989,p.93).
Maistarde,ainfra-humanizaçãofoianalisadaemestudos empíricos na psicologia social, em diversas perspectivas deanálise.Deumamaneiramaisespecífica,osprincipais indicadores de infra-humanização utilizados nos estudos na psicologia social são: a) a negação da capacidade do “exogrupo” de adotar valores tipicamente humanos, b) a caracterizaçãode“exogrupo”satravésdetraçosdenatureza emoposiçãoaostraçosdeculturaec)asub-atribuiçãode sentimentosao“exogrupo”.
Struch e Schwartz (1989) conceptualizaram a infra-humanizaçãodo“exogrupo”emdoisníveis:a)aonívelda diferenciaçãodosvalores,nosentidodequequantomaiora percepçãodequeo“exogrupo”adotavaloresdiferentesdo “endogrupo”,maioréainfra-humanizaçãoeb)aonívelda capacidadedeexpressarvalorestipicamentehumanos,tais como,aconsideraçãoeacompaixãopelosoutros;apreo-cupaçãocomobem-estardetodaasociedadeeaeducação humanitáriadascrianças.Essesautoresrealizaramumestudo
juntoaumaamostradeisraelenses,quedeveriamindicaros seusníveisdeidentificaçãocomoseuprópriogrupoeosva-loresqueestimavam.Emseguida,osparticipantesdeveriam avaliarumgrupodeJudeusultra-ortodoxos.Osresultados indicaram que os dois indicadores de infra-humanização apresentaram-sepositivamenterelacionadoscomadisposi-çãoparaaagressãocontrao“exogrupo”.
A infra-humanização pode ser analisada também ao níveldeumaatribuiçãodiferenciadaamembrosdopróprio grupo (“endogrupo”) e do outro grupo da capacidade de expressãodesentimentoseemoçõesprimárias(Leyens& cols.,2000).Estasemoçõessãodefinidaspelosautorescomo característicasquesãocompartilhadasporsereshumanose tambémporanimais.Exemplosdeemoçõesprimáriassão araiva,omedo,asurpresaeoprazer.Asemoçõessecundá-riasousentimentos,porsuavez,sãounicamentehumanas. Exemplosdesentimentossãooamor,aresignação,aespe-rança,oarrependimento,etc.Leyensecols.realizaramum conjuntodeestudosparaverificaropapeldaatribuiçãode emoçõesprimáriasesentimentosnainfra-humanizaçãodos “exogrupos”.
Osautoresverificaramquesãoatribuídasmenosemoções secundáriasousentimentosaosmembrosdo“exogrupo”do queaosmembrosdo“endogrupo”,nãohavendodiferenças aoníveldasemoçõesprimárias(Leyens&cols.,2001).
MoscoviciePérez(1999)argumentamqueasrepresen-tações sociais construídas sobre os grupos “racializados” podem estruturar-se em dois eixos: o eixo dos traços de naturezaeoeixodostraçosdecultura.Ostraços“naturais” sãodefinidoscomocaracterísticasquesãousadasdema-neiraindiferenciadanasdescriçõesdesereshumanosenas descriçõesdeanimais.Jáostraços“culturais”sãoaqueles típicosdossereshumanos(Moscovici&Pérez,1997).Para testarestahipótese,MoscoviciePérez(1999,experimento 1) realizaram um estudo sobre as representações sociais construídasacercadosciganosnaEspanha.Osparticipantes doestudo,espanhóisnãociganos,liamumtextosobreas estratégiasutilizadasaolongodahistóriaparaassimilaros ciganos à sociedade dominante. Metade dos participantes foiinformadadequeosciganosaceitaramestasestratégias e se deixaram integrar culturalmente.A outra metade foi informada de que os ciganos não aceitaram a integração cultural. Em seguida, os participantes deveriam descrever osciganoscombasenumalistadeadjetivos“naturaisposi-tivos”(intuitivo,livre,fisicamentehábil,espontâneoecom ritmomusical),“naturaisnegativos”(selvagem,impulsivo, agressivo,visceraleruidoso),“culturaispositivos”(criativo, lealàsuaidentidade,solidário,mentalmentehabilidosoe extrovertido)e“culturaisnegativos”(vingativo,perverso,ma-nipulador,falsooumentirosoemal-intencionado).Moscovici ePérez(1999)verificaramqueosciganosquerecusarama integraçãoculturalforammaisdescritosemtermosdetraços naturaisdoqueosciganosquesedeixaramintegrar.Emum segundoexperimento,osautoresconfirmaramosresultados verificadosnoprimeiro.
Correia,Brito,ValaePérez(2001)utilizaramosmesmos traçosnaturaiseculturaisdoestudooriginaldeMoscovici ePérez(1999),everificaramque,emPortugal,sãoatribuí-dosmaistraçosnaturaisnegativosdoquenaturaispositivos nadescriçãodosciganos.NaFrançaeempaísesdoLeste 3 Emboranestetrabalhoestejamosinteressadosnopapelfundamentalque
europeu (Romênia, Moldávia e Bulgária), os ciganos são representadosmaisemtermosdetraçosnaturaisdoqueem termosdetraçosculturais.
Emboraestesindicadoresderacismoeinfra-humaniza-çãotenhamsemostradoimportantesnosestudosreferidos, nenhumestudorealizadonoBrasilutilizouaatribuiçãodi-ferenciadadecaracterísticasculturaisenaturaisaosnegros comoumindicadorderacismo.
BranqueamentoeracismonoBrasil
VáriosestudiososdoracismonoBrasiltêmdemonstrado queexisteumaforterelaçãoentreofracassosocialeeconô-micocomacornegraeentresucessoeacorbranca(Adorno, 1996;Degler,1971;Guimarães,1999).Tantoqueobran-queamentopareceseroelementoprincipalquediferenciao racismobrasileirodeoutrosracismos(Skidmore,1989).De fato,oracismonoBrasilmanifesta-se,entreoutrosaspec-tos,pelobranqueamentodosindivíduosquefazemsucesso eoenegrecimentoouempardecimentodosquefracassam. Adorno(1996),analisandoboletinsdeocorrênciasde“cri-mesviolentos”emSãoPaulonoanode1990,observouque adependerdocursodoprocesso,oréupodemudardecor. Seforsendoprogressivamenteinocentadopelasevidências podesetornarbrancooumorenoclaronasdescriçõesfeitas. Poroutrolado,seasevidênciasapontaremparaasuaculpa-bilidadepodesetornarmorenoescuroounegro.
No Brasil, como demonstraram os estudos deAdorno (1996)eaanálisesociológicadeDegler(1971),éobran-queamentodacondiçãosocialdonegroquedefineoracismo e a infra-humanização contra ele. Sendo assim, podemos suporqueosefeitosdacordapeleedosucessonainfra- humanizaçãodosgrupospodemsermediadospelobranque-amento.Nãoobstanteaimportânciadobranqueamentonas relações“racializadas”noBrasil,nenhumestudoanalisou empiricamenteopapeldobranqueamentocomomediador dasexpressõesderacismo4.
Assim sendo, realizamos dois estudos com o objetivo deanalisararelaçãoentreacordapeledosgrupos,oseu desempenhoouperformancesocial,omodocomoasuacor dapeleépercebida(branqueamento)eainfra-humanização dosgrupos.Oprimeiroestudotevecomoobjetivovalidara distinçãoentretraçosnaturaisetraçosculturais,bemcomo, opapeldeinfra-humanizaçãorefletidonessaformadere-presentaçãosocialdosgrupos.Osegundoestudoanalisouo papeldacordapeledosgruposedasuaperformancesocial nobranqueamentoenaatribuiçãodessestraçosdenatureza edecultura.
Estudo1
SeguindoospressupostosdeMoscoviciePérez(1999),
procedemosaumavalidaçãoglobaldadistinçãoentretra-çosdenaturezaetraçosdecultura.Oobjetivodesteestudo foiverificarseexisteumarepresentaçãodiferenciadaentre características exclusivamente humanas, e portanto mais flexíveiseaprendidasaolongodavida,ecaracterísticasque sãoutilizadasigualmenteparadescreversereshumanose animais.Asprimeirascaracterísticas,maisflexíveiseapren-didas,sãoaquidenominadas“característicasculturais”.As últimas características, menos flexíveis, são denominadas “característicasnaturais”.
Realizamos um estudo junto a uma amostra de 114 universitários,deambosossexos,aosquaisperguntávamos emquemedidacadacaracterísticadescreviaexclusivamente sereshumanosoudescreviaexclusivamenteanimais.Foiuti-lizadoumquestionário,compostoporoitoquestões,sendoas seisprimeirasrelativasàvalidaçãodadistinção,a7ªeraum controledocarácterestereotípicodostraçosea8ªreferia-se àvalênciadotraço.
Primeiramente,compusemosasdimensõesde“traçosde natureza”ede“traçosdecultura”,considerandoosresultados da primeira questão. Na primeira questão os participantes deveriamindicaremquemedidacadaumdos12traçosca-racterizavamsereshumanoseemquemedidacaracterizavam animais. Utilizamos uma escala bi-polar de seis posições, quevariavade1(caracterizaexclusivamenteosanimais)a6 (caracterizaexclusivamenteossereshumanos),sendo4,5o pontointermediárioentreo“caracterizamaisossereshuma- nosdoqueosanimais”(4)eo“caracterizaquaseexclusiva-mentesereshumanos”(5).Emseguida,realizamosumteste t,tomandocomoparâmetroopontointermediário(4,5).As médiassuperioresa4,5refletemapercepçãodequeotraço caracteriza quase exclusivamente seres humanos, respostas inferiores refletem a percepção de que o traço caracteriza maisaosanimaisdoqueaossereshumanosouigualmente aestasduascategorias.ComopodemosvernaTabela1,dos 12adjetivos,cincosãosignificativamentepercebidoscomo estandodoladodanatureza(esperto,espontâneo,agressivo, descontrolado5eimpulsivo).Otraço“alegre”,teoricamente consideradonadimensãodenatureza,nãosediferencioudo pontomédio.Todavia,manteremosestetraçonadimensão dostraçosnaturais,umavezque,deacordocomasavalia-çõesdosparticipantes,elenãopodeserconsideradocomo exclusivamentehumano.Dentreos12adjetivos,cincoforam percebidoscomoapropriadosquaseouexclusivamentepara caracterizar seres humanos (progressista, sábio, falso ou mentiroso,infantileignorante).Otraçointeligente,embora nãotenhasidocolocadocomoexclusivodestadimensão,será consideradonesteestudocomoatributotipicamentehumano; umavezque,comoindicamumconjuntodeestudosrealizados porLeyensecols.(2000),ainteligênciaécaracterísticamais referidaparadiferenciarossereshumanosdosanimais.
Foramentãocompostasasdimensõesderepresentação dosgrupos(culturaversusnatureza).Emseguida,analisamos osvaloresdecadaumadasdimensõesnosquatroindicadores deinfra-humanizaçãodequedispúnhamos(típicosdepesso-as,típicosdeanimais,herdadoversusapreendidoeidadede expressãodacaracterística).Osresultadosobtidosindicaram queostraçosculturaissãomaispercebidoscomotípicosde pessoasdoquedeanimais,aprendidosdoqueherdadose 4 Nestetrabalhoentendemosotermomediadoremediaçãonumsentido
estritamenteestatístico.Ummediadoréumavariávelqueinterferena relaçãoentreumavariávelantecedenteeumavariávelcritério;tornan-do,quandopresentenarelação,opoderdaprimeiranulo(mediação perfeita)oumaisfraco.Énestesentidoqueobranqueamentopodeser concebidocomoummediadordarelaçãoentreacordapeledaspessoas
sãoexpressosemidadesmaisadultasdoquenainfância.O contráriosepassaparaostraçosnaturais.
Tendovalidadoadistinçãoentretraçosnaturaisecultu-rais,procedemosaocontroledavalênciadessasdimensões. Paraestefim,utilizamosumaquestãosobreapositividade ou negatividade de cada característica. Os participantes deveriamindicaremquemedidacadacaracterísticaerapo-sitivaounegativa,numaescalaquevariavade1(totalmente negativo)a5(totalmentepositivo).Osresultadosindicaram queadimensãodostraçosdeculturapositivos(inteligen-tes,sábioseprogressistas,M=4,54)nãosediferenciada dimensãodostraçosdenaturezapositivos(alegres,espertos e espontâneos,M = 4,56),t(111) = -0,12ns.Também os traços de cultura negativos (falsos, ignorantes e infantis,
M = 2,27) não se diferenciaram dos traços de nature-za negativos (agressivos, descontrolados e impulsivos,
M=2,35),t(109)=-1,19ns .Ostraçospositivosconsidera-dosconjuntamentesediferenciaramsignificativamentedos traçosnegativos(M=4,55versusM=2,04,t(109)=32,77,
p <0,0001).Damesmaforma,edeacordocomospressu- postosdestadistinção,ostraçosdeculturanãosediferencia-ramdosdenatureza,aoníveldavalência,(M=3,27versus M=3,32,t(109)=-0,83ns).
Este primeiro estudo teve como objetivo validar uma diferenciaçãoentrecaracterísticasculturaisecaracterísticas naturais.Aimportânciadavalidaçãodessadiferenciaçãono Brasilseprendeadoisfatores:a)anecessidadededesen-volvertécnicasdeestudodoracismoquenãoimpliquemna obstruçãoderespostas,ouseja,quesejammenossusceptíveis àsinfluênciasdasnormasanti-racistasedo“politicamente correto”;b)apossibilidadedeanalisaroracismocomoum processodeinfra-humanizaçãodooutro,oqueconsidera-mostornamaisamplooconceitoderacismo,porimplicar alémdadiscriminaçãoedasegregaçãosociais,asegregação simbólica.
Estudo2
Num segundo estudo, procuramos entender o papel desempenhadopelacordapeledosgrupos(brancosversus
negros), pela sua performance social (sucessoversus fra-casso)nomodocomosãopercebidos(branqueamento)ena atribuiçãodiferenciadadecaracterísticasnaturaiseculturais (infra-humanização).As nossas principais hipóteses de trabalhosão:
a) serãoatribuídasmaiscaracterísticasculturaisaosbrancos doqueaosnegros;
b) serãoatribuídasmaiscaracterísticasculturaisaosgrupos queobtêmsucessodoqueaosquefracassamsocialmen-te;
c) os grupos com sucesso serão percebidos como mais brancosdoqueosgruposquefracassam;
d) obranqueamentoatuarácomoummediadorentreacor dapelepercebidadosgruposeasavaliaçõesfeitassobre eles.
Método
Participantes
Participaram neste estudo 78 estudantes de Psicologia deumauniversidadeparticularemAracaju(Sergipe),todos brancosecomidadevariandode18a38anos(M=21,1DP
=2,94),sendo79%dosexofeminino.Adefiniçãodacorda peledosparticipantesfoifeitaconjuntamentepelopesqui-sadoreumcolaborador.Forammantidosparaasanálises apenasosparticipantesqueforamavaliadosconsensualmente como“brancos”.Istoimplicounaexclusãodesetequestio-nários,restando,portanto,71questionáriosválidos.
Procedimentos
Os participantes eram abordados em sala de aula e convidadosacolaborarememumestudosobreaformação deimpressões.Odelineamentoexperimentalutilizadofoi inter-participantesdotipo2(performancesocialdosgrupos: sucessoversusfracasso)por2(cordapeledosgrupos:negros
versusbrancos).Avariávelcordapelefoimanipuladaatravés da apresentação de uma fotografia dos membros de cada grupo.Os71participantesforamdistribuídosaleatoriamente pelasquatrocondiçõesexperimentais.
Material
Foramutilizadosdoistiposdequestionários,naprimeira páginadosquestionáriosconstavaumcenário,noqualera descritaasituaçãodeumgrupodebrasileirosqueobtinha sucessoeconômicoesocialouquefracassava.Abaixodo cenárioerareproduzidaumafotografiadetrêspessoasde sexomasculinocomidadevariandoentre22e27anos,que representavamessegrupo.Emseguida,osparticipantesde-veriamatribuiraogrupocadaumadascaracterísticasnaturais e culturais validadas no estudo 1 e, finalmente, deveriam indicar,numaescalatipoLikert,acordapeledogrupoque viamnafoto.Umdosmodelosdequestionáriocontavauma históriasobreumgrupodepessoascomsucessosocialeo outromodelodequestionáriocontavaumahistóriasobreo fracassosocial.
Foramutilizadasquatrofotografias,duaspararepresentar umgrupodepessoasbrancas(comesemsucesso)eoutras
Tabela1.Médiasdostraçosutilizadosparadescreversereshumanosou animaisetestestdeStudent(two-tailed)utilizandoopontomédiocomo critério(4.5)(N=114)
Traço Média padrãoDesvio Testest
Inteligente 4,58 0,87 t(103)=0,90ns. Progressista 5,34 0,83 t(97)=0,49p<0,001 Sábio 5,46 0,76 t(99)=12,67p<0,001 Ignorante 4,59 1,28 t(107)=0,75ns. FalsoouMentiroso 5,80 0,48 t(103)=27,54p<0,001 Infantil 4,93 0,92 t(97)=4,73p<0,001 Esperto 3,37 0,92 t(105)=-12,56p<0,001 Alegre 4,56 0,99 t(99)=0,61ns. Espontâneo 3,95 1,36 t(97)=-3,93p<0,001 Agressivo 3,80 0,71 t(91)=-9,34p<0,001 Descontrolado 4,32 1,09 t(99)=-1,65p=0,10 Impulsivo 3,90 1,16 t(105)=-5,28p<0,001
duas para representar os negros com e sem sucesso.As fotografiasutilizadaspararepresentarogrupodosbrancos eramcompostaspelasmesmaspessoas,apenasaroupados participanteseraalterada.Nacondiçãodesucesso,ostrês modelosdafotousavamternoegravata;nacondiçãodefra-casso,elesvestiamumacamisasimples.Nasfotosutilizadas para representar o grupo dos negros, adotamos o mesmo procedimento,ouseja,osmodelosdasduasfotoseramos mesmos,apenasaroupamudava.
A fim de analisar a adequação das fotografias para o estudo,istoé,senãoexistiam,naspessoasutilizadascomo modelosnasfotos,diferençasestéticasoudequalidadegrá-ficaquepudesseminterferirnosresultados,efetuamosum pré-testedasfotografias.Paratanto,indagamosaumgrupo de45estudantesuniversitáriossobreaspectosdecadauma dasfotos.Cadaparticipanteavaliavaapenasumadasfotos eindicavaacordapele(aescalavariavade1,“negros”a 7“brancos”)eaaparênciafísicadastrêspessoasdafoto(a escalavariavade1,“máaparênciafísica”,a7“boaaparência física”).Asfotografiasutilizadasnopré-testeapresentavam todososalvosvestindoamesmaroupa.Osresultadosindi-caramquenãoexistemdiferençasaoníveldapercepçãode aparênciafísicadosalvos,F(1,44)<1ns.Osalvosbrancos sãopercebidoscomotendoboaaparênciafísica(M=4,43
DP=1,20)deigualmaneiraparaosalvosnegros(M=4,59
DP=1,26).Comrelaçãoàcordapele,oefeitodosalvosfoi significativo,F(1,44)=141.17p<0,0001.Osalvosbrancos sãopercebidoscomomais“brancos”(M=5.65DP=1.30) doqueosalvosnegros(M=1,68DP=0,89).
ResultadoseDiscussão
Verificaçãodamanipulação
Fizemos uma verificação da manipulação, através da pergunta:“Emquemedidaconsideraestegrupobem/mal sucedidosocialeeconomicamente?”Aescalavariavade1 (poucobemsucedido)a5(muitobemsucedido).Osresul-tadosindicaramqueosgruposcomsucessosãopercebidos comomaisbemsucedidos(M =3,69)doqueosquefracas-sam(M=3,05,F(1,69)=6.53p<0,01).
Cordapele,performancesocialeinfra-humanização
Primeiramente,investigamossehaviamrespostasdiferen-ciadasentrehomenseentremulheresnaamostrapesquisada. OsresultadosdeumaANOVA,commedidasrepetidas,indi-caramquenãoexisteefeitomultivariadodogênero,F(1,69) =1.62p=0,21etampoucoefeitosunivariados,Fs(1,69) ≤1ns.Tendoverificadoqueogênerodosparticipantesnão interferiuemsuasrespostas,começamosaanalisarosefei-tosdacordapeleedaperformancesocialnaatribuiçãode característicasnaturaiseculturaisaosgrupos.Realizamos novamenteumaANOVAcommedidasrepetidas,tomando asduasprimeirasvariáveiscomoindependentesinter-parti-cipanteseoconteúdodostraços(naturaisversusculturais) easuavalência(positivosverssusnegativos)comovariáveis independentesintra-participantes.Avariáveldependentefoio escoredeatribuiçãodostraços.Osresultadosindicaramque nãohouveefeitoprincipaldacordapele,F(1,67)<1,ns.,
enemdeinteraçãoentreacordapeleeosucesso,F(1,67) =2.56p=0.11.Entretanto,oefeitoprincipalmultivariado daperformancefoisignificativo,F(1,67)=9.27p<0,01. Sãoatribuídasmaiscaracterísticasaosgruposcomsucesso (M=1,53)doqueaosquefracassam(M=1,22).
Aoníveldosefeitosunivariados,nãohouveefeitoprin-cipaldoconteúdodostraços,F(1,67)<1,ns.E,contrao esperado,nãohouveinteraçãoentreconteúdoecordapele,
F(1,67) < 1,ns. Entretanto, confirma-se a nossa hipótese referente à interação entre perfomance social e conteúdo dostraços,F(1,67)=5.71,p<0,05.Comopodemosverna Tabela2,amédiadeatribuiçãodostraçosdeculturaparaos gruposcomsucessoémaiordoqueamédiadeatribuiçãodos traçosdenatureza.Aatribuiçãodetraçosdeculturaétambém maiorparaosgruposqueobtêmsucessodoqueparaosque fracassam,nãohavendodiferençasaoníveldostraçosde natureza.Esteresultadoéimportanteporquedemonstraque aatribuiçãodiferenciadadetraçosdeculturaéumindicador deinferiorizaçãoeinfra-humanizaçãodosgrupos.Embora semoefeitohipotetizadodacordapele.
A interação entre conteúdo dos traços, sucesso e cor da pele dos grupos não foi significativa,F(1,67) = 1.74
p=0,19.Comrelaçãoaosefeitosdavalência,verificamos umefeitoprincipal,F(1,67)=48.31p<0,0001,queindica queaatribuiçãodetraçospositivosémaior(M=1,78)do queadetraçosnegativos(M=0,97).Verificamosqueeste efeitoéqualificadoporumainteraçãoentrevalênciaeper-formance,F(1,67)=36.38p<0,0001.Ocorreumamaior atribuição de traços positivos para os grupos que obtêm sucesso(M=2,29)doqueparaosgruposquefracassam (M=1,27).Aoníveldostraçosnegativos,verifica-seque estes são mais atribuídos para os grupos que fracassam (M=1,16)doqueaosqueobtêmsucesso(M=0,77).Os gruposquefracassamnãosãodiferenciadosemtermosde traçospositivosenegativos.
Tabela2.Médiasedesviospadrões(entreparêntesis)daatribuiçãodetraços emfunçãodoconteúdoedosucesso
Sucesso ConteúdodosTraços Cultura Natureza
Sucesso 1,62a
(0,51)
1,44b (0,45)
Fracasso 1,16c
(0,54)
1,28bc (0,52) Nota: Médias com letras diferentes diferem significativamente (Student Newman-Keuls,p<.05).Aescalavariavade0(nadacaracterístico)a4 (totalmentecaracterístico)
Tabela3.Médiasedesviospadrões(entreparêntesis)daatribuiçãodetraços emfunçãodavalência,doconteúdoedosucesso.
Valência Traçosculturais Traçosnaturais Sucesso Fracasso Sucesso Fracasso
Positivos 2,47a (0,93)
1,17c (0,70)
2,11d (0,77)
1,37c (0,71) Negativos 0,76b
(0,66)
1,14c (0,80)
0,78b (0,51)
Verificamosaindaumainteraçãotriplaentrevalência,per-formanceeconteúdo,F(1,67)=4.69p<0,05,quequalifica aanterior.ComopodemosvernaTabela3,oefeitodeuma maioratribuiçãodetraçosculturaisdoquenaturais,paraos gruposcomsucesso,verifica-seapenasaoníveldostraços positivos.Osgruposquefracassamrecebem,demaneirain-diferenciada,traçosnaturaiseculturais,positivosenegativos. Jáosgruposqueobtêmsucessorecebemmaistraçosculturais positivosdoquenaturaispositivosenãosãodiferenciados aoníveldostraçosculturaisenaturaisnegativos.
A interação entre valência dos traços, performance e cordapeledosgruposnãofoiencontrada,F(1,67)<1ns. Ainteraçãoentreconteúdoevalênciadostraçoscomacor dapeledosgrupostambémnãofoiverificada,F(1,67)<1
ns.Omesmoocorreuparaainteraçãoquádrupla(conteúdo, valência,cordapelee“performance”),F(1,67)<1ns.
Estesresultados,noseuconjunto,indicaramqueasnossas hipótesessobreoefeitodacordapeleeda“performance” nainfra-humanizaçãodosnegrosforamapenasparcialmente confirmadas.Anossaprimeirahipóteseeraadequeosnegros seriammenoscaracterizadosemtermosdetraçosdecultura doqueosbrancos.Osresultadosindicaramqueoefeitoda cordapelesobreoconteúdodostraçosnãofoisignificativo. Anossasegundahipótesereferia-seaoefeitodosucessono conteúdodostraços,esperávamosqueosgruposcomsucesso fossemmaiscaracterizadosemtermosdetraçosdeculturado queosgruposquefracassam.Estahipótesefoiconfirmada, emboracomainterferênciadavalênciadostraços.Osresul-tadosindicaramqueumamaioratribuiçãodetraçosculturais doquenaturais,paraosgruposcomsucesso,ocorreapenasno queserefereaostraçospositivos.Esteresultadopareceindi-carqueadiscriminaçãodosquefracassamsegueummodelo queaglutinaabiologizaçãodasdiferenças,objetivadapela atribuiçãodemenostraçosculturaisemaistraçosnaturais, comaassimetriapositivo/negativo,querefleteocarátermais sutildopreconceitonaatualidade(Mummendey,1995).
Efeitosdosucessoedacordapelesobreo branqueamento
Paratestarmosahipótesedobranqueamentocomome-diadordosefeitosdacordapeleedosucessodosgruposna
infra-humanização,realizamos,primeiramenteumaanálise devariância(univariada),tomandoobranqueamentocomo variável dependente da cor da pele objetiva dos grupos e da sua “performance” social. Os resultados indicaram um efeito principal da cor da pele dos grupos,F(1,70) =61.15p=0,0001.Osnegrossãopercebidoscomomenos brancos(M=2,17DP=1,59)doqueosbrancos(M=4.66
DP=1,11).Nãohouveinteraçãoentreacorpercebidaea performance,F(1,70)<1ns.Entretanto,eemconsonância comasnossashipóteses,verificamosumefeitoprincipalda “performance”no“branqueamento”,F(1,70)=5.41p=0,02. ComopodemosvernaFigura1,osgruposqueobtêmsucesso sãovistoscomo“maisbrancos”doqueosquefracassam, quesão“enegrecidos”.
Tendoverificadoqueapercepçãodacordapeledosgru-posémoderadapela“performance”socialeeconômicados grupos,podemossuporqueosefeitosdacordapelepercebida dosgruposnasuainfra-humanização,podemsermediados pelobranqueamento.Detalmodoque,emalgumasformas deexpressãodoracismobrasileiro,obranqueamentopode serusadocomoumavariávelmediadoraentreacordapele percebida,osucessodosgruposeainfra-humanização.
Afimdetestarestahipótese,seguimososprocedimentos sugeridosporBaroneKenny(1986).Deacordocomestes autores,umadasformasdeanalisaramediaçãoérealizando umconjuntoderegressõesmúltiplas.Oefeitodemediação ocorre quando são satisfeitas as seguintes condições: (1) existeumefeitodavariávelindependente(VI)sobreava-riáveldependente(VD);(2)existeumefeitodaVIsobrea variávelmediadora(VM);(3)existeumefeitosignificativo daVMsobreaVDe,finalmente(4)oefeitodaVIsobre aVD torna-se mais fraco, ou mesmo desaparece, quando a variável mediadora é colocada no modelo de análise. Quandooefeitodavariávelindependentedesaparece,de-poisdocontroledavariávelmediadora,estamosdiantede umamediaçãoperfeita.Paratestaroefeitodemediaçãodo branqueamento, conduzimos alguns conjuntos de análises deregressão,utilizandoométodostepwise.Numprimeiro conjuntodeanálises,regredimososefeitosdaperformance sobreosindicadoresderacismo.Noutraanálise,regredimos osucessosobreobranqueamento.Numoutroconjuntode análises,regredimosobranqueamentosobreosindicadores de infra-humanização. Finalmente, para verificarmos os efeitosdemediação,realizamosoutroconjuntodeanálises deregressão,noqualanalisamososefeitosdaperformance sobre a infra-humanização quando o branqueamento era controlado.
Paraasanálises,adotamosaindaosprocedimentospro-postosporMummendey,Otten,BergereKessler(2000),que realizamanálisesdemediaçõesseparadasparacadaumdos níveisdeumadasvariáveisindependentes.Nocasodonosso estudo,emfunçãodasnossashipóteses,escolhemosacorda peledosgrupos-alvocomovariáveldecorte.Primeiramente, testamosseobranqueamentoatuavacomoummediadorentre osefeitosdosucessodosbrancoseasuainfra-humanização. Osresultadosindicaramque,nocasodosbrancos,acorrela-çãoentre“performance”ebranqueamento,emborapositiva, nãoésignificativa,r(35)=0,22p=0,216.
Emseguida,testamosamediaçãoapenasparaogrupo dosnegros.Osresultadosindicaramumefeitodemediação 1
2 3 4 5 6 7
Índice
de
branqueamento
Grupos com Sucesso Grupos que Fracassam 3,78
3
Figura 1.Médias de branqueamento dos grupos-alvo em função do sucesso
do branqueamento na relação entre sucesso e atribuição detraçosdeculturapositiva.Quantomaiorosucessodos negros, maior a atribuição de traços de cultura positivos, β=0.62,F(1,35)=20.72p<0,001(verFigura2).Também verificamosumefeitodobranqueamentosobreaatribuição de traços de cultura positivos,β = 0,48,F(1,35) = 10.26
p <0,01,quantomaisosnegrossãopercebidoscomobran-cos, mais lhes são atribuídos traços de cultura positivos. Entretanto,quandoregredimosobranqueamentoeosucesso sobreaatribuiçãodostraçosdeculturapositivos,verificamos que o efeito do branqueamento permanece significativo, β=0,32,F(1,35)=5.65p<0,05,masoefeitodiretodo sucesso torna-se mais fraco,β = 0,51F(1,35) = 14.74
p < 0,01. Na primeira regressão, a variável independente explica36%davariânciadavariáveldependente(R2=0,36),
quandointroduzimosomediador,oníveldeexplicaçãosobe consideravelmente(R2=0,44).Assim,ostraçosdecultura
positivossãoatribuídospredominantementeaosnegroscom sucessoquesãobranqueados.Deoutramaneira,obranquea-mentoéumacondiçãonecessáriaparaaatribuiçãodetraços deculturapositivosaosnegroscomsucesso.
Não houve efeito de mediação do branqueamento em relação às outras dimensões de traços de natureza e cul-tura. Entretanto, verificamos uma mediação perfeita do
branqueamento nos efeitos do sucesso sobre a dimensão compósitadacultura(traçosdeculturapositivos+traçosde culturanegativos).Existeumefeitodiretodosucessosobre acaracterizaçãodosnegrosemtermosculturais,β=0,35
F(1,35)=4.78p <0,05.Aosnegroscomsucessosãoatribu-ídosmaistraçosculturais(verFigura3).Tambémoefeito dobranqueamentoésignificativo,β=0,46F(1,35)=9.14
p <0,01,quantomaiorobranqueamentomaioracaracteriza-çãoculturaldosnegros.Entretanto,oefeitodiretodosucesso desaparecequandocontrolamosoefeitodobranqueamento, β=0,24F(1,35)=2.07p=0,16,aopassoqueoefeitodo branqueamentomantém-seinalterado,β=0,46,F(1,35)= 9.14p<0,01.Sendoassim,aatribuiçãodetraçosculturais aosnegrosocorreapenasquandoosnegrossãobranqueados. Ocontráriotambéméverdadeiro,quantomaisosnegrosque fracassamsãoenegrecidos,menoscaracterísticasculturais lhes são atribuídas.A mediação do branqueamento tam-bémaumentaopoderpreditivodasvariáveis,naprimeira regressão(semomediador)avariânciaexplicadaéde10% (R2=0,10),aopassoque,quandointroduzimosomediador na equação de regressão, a variância explicada sobe para 19%(R2=0,19).
Tambémanalisamosamediaçãodobranqueamentosobre aatribuiçãodecaracterísticaspositivasenegativasaosgru-pos.Aatribuiçãodostraçospositivosaosgruposfoimediada pelobranqueamento.Verifica-seumefeitodiretodosucesso sobreaatribuiçãodetraçospositivos,β=0,58,F(1,35)= 17.43p<0,001,quantomaiorosucessomaistraçospositivos. Tambémoefeitodobranqueamentosobreaatribuiçãode traçospositivosfoisignificativo,β=0,49,F(1,35)=10.71
p<0,01,quantomaisosnegrossãopercebidoscomobrancos, maistraçospositivoslhessãoatribuídos.Contudo,oefeito diretodosucessosetornamaisfracoquandocontrolamoso branqueamento,β=0,47F(1,35)=11.97p<0,01.Quanto maiorobranqueamentodosnegrosqueobtêmsucesso,mais traçospositivoslhessãoatribuídos,ouainda,quantomaisos negrosquefracassamsãopercebidoscomonegros,menor aatribuiçãodetraçospositivos(verFigura4).Omediador, nestecaso,implicaumaumentodavariânciaexplicadade 32%(R2=0,32)para41%(R2=0,41).
Consideraçõesfinais
Consideramosqueoindicadordeinfra-humanizaçãopro-postonessainvestigaçãopossuipelosmenosduasvantagens emrelaçãoaoutrasmedidasderacismo.Aprimeiradelasé
Figura2.Análisedemediaçãodosucessocomopreditor,obranqueamento comomediadorearepresentaçãodosgruposemtermosdetraçosdecultura positivacomovariáveldependente(N=35)
*p<0,05;**p<0,.01;***p<0,001
Branqueamento
Performance Cultura positiva
0,48**
0,32* (0,32*)
0,62*** (efeito direto) (0,51**)
Figura3.Análisedemediaçãodosucessocomopreditor,obranqueamento comomediadoreacaracterizaçãodosnegrosemtermosdetraçosdecultura comovariáveldependente(N=35)
*p<0,05;**p<0,01
Nota:performance0(fracasso)1(sucesso).
Branqueamento
Performance Traços de Cultura
0,46**
0,32* (0,46**)
0,35* (efeito direto) (0,24ns.)
Figura4.Análisedemediaçãodosucessocomopreditor,obranqueamento como mediador e a positividade dos grupos como variável dependente (N=35)
*p<0,05;**p<0,01;***p<0,001 Nota:performance0(fracasso)1(sucesso).
Branqueamento
Performance traços positivosAtribuição de
0,49**
0,32* (0,34*)
0,.58*** (efeito direto) (0,47**)
quesetratadeumindicadornãoobstrutivodasrespostas;uma vezqueosparticipantesquandorespondemnãopercebem querespostasmais“naturalizadoras”sãotambémrespostas maisracistas.Umasegundavantagemdesseindicadornoes-tudodoracismoéoconteúdoavaliado.Comosetratadeuma formaderepresentaçãosocial“naturalizadora”dosgrupos, temosumindicadorderacismocommuitavalidadeinterna, umavezqueoracismo,comorefereDelacampagne(1990), existesemprequesetentaexplicarumacondiçãosociale cultural por meio de uma característica natural. Este fato tornaesteindicadordiferentedeoutrasescalasutilizadas,que abordamapenaselementosrelacionadoscomadiscriminação (Kinder&Sears,1981;McConahay,1986).
Todavia, os resultados obtidos neste estudo indicaram queoindicadordeinfra-humanizaçãosóteveefeitoatravés damediaçãodobranqueamento.Demodoque,estetipode indicadorcomprovadamenteeficazemestudossobreracismo naEuropa(Lima&Vala,2002;Moscovici&Pérez,1999), podenãosertãoeficaznoestudodoracismonumasociedade naqualnegrosebrancosapresentam-se,pelomenosaonível formal,integradosculturalmente.
Nesteestudo,ostraçosdeculturaforamefetivosatravés da mediação do branqueamento. Os negros com sucesso são descritos em termos de traços de cultura quando são branqueados.Estepadrãoderesultadosconfirmaosnossos pressupostos teóricos de que cada contexto de relações “racializadas”possuiumaformaespecíficaderacismo,que apresenta manifestações particulares. Diferentemente da Europa,ondeosgruposvítimasderacismo(imigrantes)são percebidos como exógenos àquela formação cultural, no Brasilbrancosenegrossãotodosbrasileiros,aindaquenão tenhamdireitoigualàcidadania.Demodoque,oracismo “àbrasileira”possuiespecificidades.Graçasaonotávelca-leidoscópiodecoresquecompõemasociedadebrasileira, desenvolve-se uma forma de representação que associa o fracassoàcornegraeosucessoàcorbranca,equepode mudarsubjetivamenteacordeumindivíduo,afimdemanter intactasascrençascoletivaseasatitudesnegativasassocia-dasàcategoriadepertençadesseindivíduo.Nestesentido, o branqueamento dos negros bem sucedidos permite que osparticipantesbrancosrealizemumamaioratribuiçãode traçospositivosnadescriçãodestegrupoequelhesatribua maistraçosdecultura.
Aliteraturasobreasnovasexpressõesdoracismotem demonstradoqueadimensãodostraçospositivoséamais importantenasexpressõesmaisveladasderacismo,umavez que,naatualidade,oracismoseexpressamaispelanegação dostraçospositivosdoquepelaatribuiçãodetraçosnegati-vosaosgruposminoritários(Gaertner&McLaughlin,1983; Pettigrew&Meertens,1995;Vala&cols.,1999).Estesre-sultadosnospermitemaindadizerquenegrossãopercebidos positivamenteporquee,apenasporque,sãobranqueados.
Aoníveldaatribuiçãodetraçosdecultura,vimosqueos negrossão“culturalizados”apenasquandosãobranqueados. Esteresultadodemonstraumprocessodeinfra-humanização dosnegrosquereflete,aindahoje,asideologiasdoracismo científicodoséculoXIX,aquelasmesmasquemotivaram aspolíticasdeimigraçãodemão-de-obraeuropéiaparao Brasil,depoisdaaboliçãodaescravidão.Naqueleperíodo, acreditava-sequeoBrasilsósetornariaumpaíscivilizado
edesenvolvidose,aolongodotempo,branqueasseasua população,extirpandoo“sanguenegro”.Pareceque,quase doisséculosdepois,aindaseacreditaqueacivilidadeeo desenvolvimentodaspessoassóépossívelquandoelassão percebidascomobrancas.
Emboraosnossosdadosdecorramdeumestudoexpe-rimental, com uma amostra reduzida e localizada em um contextoespecíficoeparticularderelações“racializadas” noBrasil,podemossupor,amparadosporalgumaevidência empírica(Adorno,1996;França&Monteiro,2002;Harris, Consorte,Lang&Byrne,1993;Lima,2003)eevidências teóricas(Alencastro,1998;Degler,1971;Guimarães,1999, Harris,1970;Piza,2000;Schwarcz,1993;Skidmore,1989), quedeumamaneirageral,noBrasil,obranqueamentode-sempenhaumpapelfundamentalnoracismo,detalmodoque estatambémpodeserumavariávelmediadorafundamental daspercepçõeseavaliaçõesdosnegrosemoutroscontextos derelações“racializadas”noBrasil.
Assim,podemosconsiderarqueestesresultadossinalizam paraaimportânciadeoutrasanálisesempíricasqueexplorem eaprofundemocarátermediadorqueobranqueamentoexer-cenasexpressõesderacismo,inclusivecomparandooutras cidades e regiões do Brasil, com diferentes composições etnográficas,paraseverificarseexistemdiferençasregionais nasformasdeexpressãodoracismo.
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