INFECÇÃO PELO HERPESVÍRUS HUMANO 6 (HHV-6) APÓS TRANSPLANTE RENAL: ASPECTOS CLÍNICOS E EPIDEMIOLÓGICOS E UTILIZAÇÃO DE PCR
COMO MÉTODO DIAGNÓSTICO
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Mestre em Ciências pelo programa de pós-graduação em Infectologia
CLAUDIA ROMANI LUIZ
INFECÇÃO PELO HERPESVÍRUS HUMANO 6 (HHV-6) APÓS TRANSPLANTE RENAL: ASPECTOS CLÍNICOS E EPIDEMIOLÓGICOS E UTILIZAÇÃO DE PCR
COMO MÉTODO DIAGNÓSTICO
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Mestre em Ciências pelo programa de pós-graduação em Infectologia
Orientador: Prof. Dr. Luis Fernando Aranha Camargo
Co-orientador: Profa. Dra. Clarisse Martins Machado
Luiz, Claudia Romani
Infecção pelo herpesvírus humano 6 (HHV-6) após transplante renal: aspectos clínicos e epidemiológicos e utilização de PCR como método diagnóstico. / Claudia Romani Luiz.-- São Paulo, 2009.
xviii, 93f.
Tese (Mestrado) – Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-Graduação em Infectologia.
Título em inglês: Infection with human herpesvírus 6 after renal transplantation: clinical and epidemiological aspects and use of PCR assay as diagnostic method.
iii
ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE MEDICINA
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INFECÇÃO PELO HERPESVÍRUS HUMANO 6 (HHV-6) APÓS TRANSPLANTE RENAL: ASPECTOS CLÍNICOS E EPIDEMIOLÓGICOS E UTILIZAÇÃO DE PCR
COMO MÉTODO DIAGNÓSTICO
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. David Salomão Lewi Profa. Dra. Ligia Camera Pierrotti
Profa. Dra. Luci Corrêa
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AGRADECIMENTO Á FAPESP
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que
proporcionou apoio financeiro para a confecção desta dissertação (Nº do Processo:
vii
Ao orientador Prof. Dr. Luis Fernando Aranha Camargo, pela sua dedicação e
apoio durante a realização deste trabalho. Agradeço os inúmeros ensinamentos na
prática clínica do cuidado ao paciente transplantado e a compreensão pelos
problemas pessoais que passei durante a realização deste estudo.
A Profa. Dra. Clarisse Martins Machado, pela excelente orientação na área
laboratorial. Agradeço o apoio, a amizade e a compreensão pelos problemas
pessoais que passei durante a realização deste trabalho.
Aos meus pacientes, agradeço pela oportunidade de participar de um
momento tão importante da vida de cada um, foi uma experiência inesquecível e um
aprendizado para toda a minha vida.
A Cynthia Lilliane Motta do Canto e a todos os amigos do laboratório de
Virologia do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo pela realização da PCR e
da sorologia e pela inestimável colaboração na realização deste trabalho.
Ao Prof. Dr. Celso Francisco Hernandes Granato, professor adjunto da
Disciplina de Infectologia (UNIFESP/EPM), por todos os ensinamentos na área de
virologia desde a minha residência e pelo apoio na realização deste estudo.
A Maria da Luz Fernandes, Milena Karina Colo Brunialti e a todos os amigos
do laboratório de imunologia e virologia da UNIFESP/EPM pela realização da
antigenemia e por toda a paciência e carinho nesta longa jornada.
Aos colegas da equipe de coleta do hospital do Rim pela imensa colaboração
e por propiciarem um ambiente tão agradável e descontraído para todos os
viii
do Rim e do Hospital São Paulo, pela colaboração e carinho.
Aos funcionários do Serviço de Arquivo Médico e Estatístico (SAME) do
Hospital do Rim e Hipertensão, pelo atendimento paciente na pesquisa dos
prontuários médicos.
Aos funcionários da Biblioteca Central da UNIFESP/EPM, pela atenção e
disposição no fornecimento dos artigos científicos.
Aos colegas da pós-graduação e do Grupo de Estudo em Infecção no
Transplante de Órgão Sólido da Disciplina de Infectologia (UNIFESP/EPM),
agradeço pelo carinho e apoio nesta jornada.
Ao meu amigo Dr. Fernando Gatti de Menezes pelo incentivo e por todo o
apoio na realização deste estudo
Aos meus colegas de residência médica Dra Beatriz Quental Rodrigues e Dr.
Guilherme de Souza Ribeiro que são e sempre serão amigos inseparáveis.
Às minhas amigas de infância e aos meus amigos da faculdade pelos
momentos maravilhosos que passamos e pelo apoio nos momentos difíceis.
Aos meus pais, Claudio e Angelina e meu irmão Dennys pelo apoio durante
ix
Dedicatória v
Agradecimentos à FAPESP vi
Agradecimentos vii
Lista de tabelas xii
Lista de abreviaturas e símbolos xiv
Resumo xvii
1 INTRODUÇÃO 1
1.1 Objetivos 13
2 MÉTODOS 14
2.1 Local do Estudo 14
2.2 Desenho do estudo 14
2.3 População do estudo 15
2.4 Critérios de inclusão 15
2.5 Critérios de exclusão 15
2.6 Período do estudo/seguimento dos pacientes 15
2.6.1 Avaliação Clínica 16
2.6.2 Coleta de amostras 16
2.7 Processamento das amostras 17
2.7.1 Sorologia para HHV-6 17
2.7.2 PCR “nested” para HHV-6 18
2.7.3 PCR em tempo real para HHV-6 20
2.7.4 Antigenemia para CMV 20
x
2.9.1 Infecção ativa por HHV-6 21
2.9.2 Doença por HHV-6 21
2.9.3 Infecção ativa por CMV 22
2.9.4 Doença por CMV 22
2.9.4.1 Síndrome relacionada ao CMV 22
2.9.4.2 Doença invasiva por CMV 22
2.9.4.3 Tratamento preemptivo para CMV 22
3 RESULTADOS 24
3.1 Características dos pacientes incluídos no estudo 24
3.2 Soroprevalência para HHV-6 pré-transplante 25
3.3 Avaliação de infecção ativa por CMV pós- transplante 25
3.4 Avaliação da detecção do vírus HHV-6 26
3.4.1 PCR “nested” 26
3.4.2 PCR em tempo real 27
3.4.3 Relação da detecção de DNA viral em amostras de plasma e BC 28
3.4.4 Comparação da PCR em tempo real e da PCR “nested” no
plasma 29
3.5 Frequência e características da infecção ativa pelo HHV-6 utilizando-se
como metodologia diagnóstica a PCR “nested” no plasma 30
3.5.1 Relação entre a replicação do CMV e do HHV-6 (diagnóstico através
da PCR “nested”) 31
3.5.2 Análise univariada dos fatores de risco para reativação do HHV-6
detectado través da PCR “nested” 31
3.6 Freqüência e características da infecção ativa pelo HHV-6 utilizando-se como metodologia diagnóstica a PCR em tempo real no plasma
32
xi
3.6.2 Análise dos fatores de risco para reativação do HHV-6 detectado
através da PCR em tempo real 34
3.7 Avaliação dos pacientes que apresentaram replicação viral sustentada
do HHV-6 35
3.7.1 Análise dos fatores de risco para sustentação da replicação do HHV-6 36
3.8 Impacto do uso do ganciclovir para tratamento da infecção pelo CMV na
cinética viral do HHV-6 37
3.9 Relação entre detecção de DNA viral no plasma e rejeição aguda celular
(RAC) 38
3.10 Relação entre a detecção de DNA viral no plasma e indução 38
3.11 Avaliação da detecção de DNA do vírus HHV-6 pré-transplante 38
3.11.1 Avaliação da detecção de DNA do vírus HHV-6 dos doadores pré-
transplante 38
3.11.2 Avaliação da detecção de DNA do vírus HHV-6 dos receptores pré-
transplante 40
3.12 Descrições de casos específicos 42
3.12.1 Caso 1 42
3.12.2 Caso 2 43
4 DISCUSSÃO 44
5 CONCLUSÕES 57
6 ANEXOS 59
7 REFERÊNCIAS 60
xii
Tabela 1: Tabela1: Sequência de primers (Pares de primers para PCR
(HV1/HV2) e “nested” PCR (HV3/HV4) 19
Tabela 2: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma e no BC
através da PCR “nested” em 348 amostras coletadas 27
Tabela 3: Associação entre os pacientes que apresentaram DNA viral
detectável no plasma e no BC através da PCR “nested” 27
Tabela 4:Associação entre a detecção de DNA viral através da PCR em
tempo real no plasma e no BC de 351 amostras coletadas 28
Tabela 5: Associação entre os pacientes que apresentaram DNA viral
detectável no plasma e no BC através da PCR em tempo real 28
Tabela 6: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma através da
PCR “nested” e da PCR em tempo real de 347 amostras 29
Tabela 7: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma através da
PCR “nested” e da PCR em tempo real nos 30 pacientes 30
Tabela 8: Análise univariada dos fatores preditores da replicação do HHV-6
detectado através da PCR “nested” 32
Tabela 9: Análise univariada dos fatores preditores da replicação do HHV-6
detectado através da PCR em tempo real 35
Tabela 10: Análise univariada dos fatores preditores da replicação
sustentada do HHV-6 36
Tabela 11: Associação entre a detecção de DNA viral no BC através da PCR
“nested” e da PCR em tempo real nos 17 doadores 39
Tabela 12: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma através da
PCR “nested” e da PCR em tempo real nos 18 doadores 39
Tabela 13: Associação entre a detecção de DNA viral no BC e no plasma
nos 17 doadores que apresentam amostras em BC e no plasma 39
Tabela 14: Associação entre a detecção de DNA viral no BC através da PCR
xiii
PCR “nested” e da PCR em tempo real nos 16 receptores pré-transplante Tabela 16: Associação entre a detecção de DNA viral no BC e no plasma nos 16 receptores que apresentam amostras em BC e no plasma pré-transplante
xiv
AEC Aminoetilcarbazol
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
AZA Azatioprina
BC “Buffy Coat”
CDC Centers for Disease Control and Prevention
CMV Citomegalovírus
CSA Ciclosporina
DF Doador Falecido
DM Diabetes Mellitus
dNTPs Desoxirribonucleotídeos Fosfatados
DV Doador Vivo
EBV Vírus Epstein-Barr
EDTA Etilenodiaminotetra Cético
ELISA Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay
FK Tacrolimus
GESF Glomeruloesclerose Segmentar e Focal
GMN Glomerulonefrite não-especificada
GNC Glomerulonefrite Crônica
HAS Hipertensão Arterial Sistêmica
HCV Vírus da Hepatite C
xv
HD Hemodiálise
HLA Human Leucocyte Antigen
IgG Imunoglobulina da Classe IgG
IgM Imunoglobulina da Classe IgM
IMTSP Instituto de Medicina Tropical de São Paulo
IRC Insuficiência Renal Crônica
ITU Infecção do Trato Urinário
IVAS Infecção das Vias Aéreas Superiores
kb Quilobases
LES Lupus Eritematoso Sistêmico
MCP Major Capsid Protein
MMF Micofenolato Mofetil
NK Células “Natural Killer”
NTI Nefrite Túbulo-intersticial
ORFs “Open Reading Frames”
PBMC Peripheral Blood Mononuclear Cell
PCR Reação em Cadeia da Polimerase
Pred Prednisona
RAC Rejeição Aguda Celular
xvi
SPSS Statistical Package for the Social Sciences
SUS Sistema Único de Saúde
TMB Tetrametilbenzidina
UNIFESP Universidade Federal de São Paulo
USP Universidade São Paulo
UTI Unidade de Terapia Intensiva
VPN Valor Preditivo Negativo
VPP Valor Preditivo Positivo
xvii
Objetivo: Avaliar aos aspectos clínicos e epidemiológicos da infecção pelo herpesvírus humano-6 (HHV-6) após transplante renal, avaliação da sua relação com a replicação do citomegalovírus (CMV), assim como a utilização da reação em cadeia por polimerase (PCR) “nested” e da PCR em tempo real como método
diagnóstico de infecção ativa. Métodos: Trata-se de um estudo descritivo
prospectivo, realizado no Hospital São Paulo e no Hospital do Rim e Hipertensão (afiliado a Universidade Federal de São Paulo), com acompanhamento de 30 receptores de transplante renal consecutivos. Foram coletadas sorologias para HHV-6 dos doadores vivos e receptores pré-transplante e os pacientes foram monitorizados semanalmente nos primeiros dois meses e quinzenalmente por mais dois meses pós-transplante com realização de PCR “nested” e PCR em tempo real para HHV-6 em amostras de plasma e “buffy coat” (BC) e antigenemia para CMV.
xviii
pacientes que apresentou reativação do HHV-6 em comparação com o grupo que não apresentou (33%) e doença pelo CMV sintomática também foi mais frequente nos pacientes co-infectados (36%) em relação aos pacientes que apresentaram
somente infecção pelo CMV (0%). Conclusões: A infecção pelo HHV-6 no
1 INTRODUÇÃO
O transplante renal, dentre os vários programas substitutivos da função renal
nos pacientes com insuficiência renal crônica (IRC), é a opção de tratamento mais
efetiva para reabilitação socioeconômica do paciente urêmico. O transplante foi
admitido como uma forma de tratamento eficaz após a década de 1960, sendo que a
partir de 1965 o número de centros transplantadores se expandiu. Desde então houve
progressiva melhora na sobrevida do paciente e do enxerto, relacionado ao declínio na
incidência, ao melhor diagnóstico e tratamento de processos infecciosos, ao menor
índice de complicações cirúrgicas, à redução da carga de imunossupressão e ao
aparecimento de novas drogas imunossupressoras. Como resultado, pode-se observar
em dados recentes da análise qualitativa de 10 anos do Registro Brasileiro de
Transplantes (RBT) que a sobrevida do paciente no primeiro ano foi de 91% e no final
do quinto ano foi de 83,2% e que a sobrevida do enxerto foi de 89,1% no primeiro ano
e de 75,7% no final do quinto ano, em análise dos transplantes realizados entre 2000 e
2004 (Brasil. Ministério da Saúde, 2009).
O Brasil possui hoje um dos maiores programas públicos de transplantes de
órgãos e tecidos do mundo com 548 estabelecimentos de saúde e 1.376 equipes
médicas autorizadas a realizar transplantes. Em 2008 foram notificados 19.125
transplantes no Brasil, sendo 3.154 transplantes renais (Brasil. Ministério da Saúde,
2009).
Apesar da excelente evolução na sobrevida dos pacientes e do enxerto, o
transplante renal não é isento de complicações. Essas são divididas em complicações
infecciosas (15 a 44%), cirúrgicas (2,6 a 20,3%), neoplásicas (1,2 a 16%), metabólicas,
gastrointestinais (5 a 25%), músculo-esqueléticas (3 a 16%), hematológicas, assim
como a ocorrência de rejeição e de nefropatia crônica do enxerto (Turcotte, 1972; Lee
et al., 1978; Flanigan et al., 1988; Julian et al., 1992; Osca Garcia et al., 1993;
Donnelly, 1995; Sheriffdeen et al., 2002; Cuellar-Rodriguez, Sierra-Madero, 2005;
Humar, Matas, 2005).
O risco de ocorrer infecção após transplante varia com o tempo, principalmente
método que possa avaliar com acurácia o risco que um paciente tem de desenvolver
infecção após o transplante, sendo assim o clínico avalia o risco de um receptor
desenvolver infecção considerando o risco de rejeição, a intensidade da
imunossupressão utilizada e fatores que possam contribuir para a susceptibilidade do
paciente a determinados agentes infecciosos (Fishman, 2007).
Quanto aos agentes das infecções, podemos classificá-los em oportunistas e
não oportunistas (Rubin, 2002). Dentre as infecções oportunistas que podem ocorrer
após o transplante renal, as causadas por vírus estão entre as mais comuns e mais
importantes. O paciente transplantado é suscetível a infecção por uma grande
variedade de patógenos virais que podem resultar de exposição comunitária (influenza,
adenovírus entre outros), pode ser transmitida através do enxerto (citomegamovírus
[CMV], vírus Epstein-Barr [EBV] entre outros), e outras podem ser resultantes de
reativações que podem ocorrer devido ao estado de imunossupressão (varicella zoster
[VZV], herpesvírus, entre outros) (Kotton, Fishman, 2005).
Os herpesvírus são patógenos particularmente importantes nos pacientes
transplantados, pois após a infecção primária permanecem em estado de latência,
podendo reativar periodicamente em condições de imunossupressão. Até o momento
oito herpesvírus foram isolados em humanos: vírus herpes simples (HSV)-1, HSV-2,
citomegalovírus (CMV), VZV, vírus Epstein-Barr (EBV), herpesvírus humano (HHV)-6,
HHV-7 e HHV-8. Estes vírus são divididos em três subfamílias (α, e ) que diferem em suas propriedades biológicas, incluindo sítios de latência, ciclo de replicação e
também nos seus efeitos clínicos (Yoshikawa, 2003a).
O papel da infecção pelo HHV-6 após transplante renal e seu impacto clínico
não está completamente definido.
O vírus HHV-6 foi isolado em 1986 de linfócitos B de sangue periférico de seis
pacientes portadores de doenças linfoproliferativas e síndrome da imunodeficiência
adquirida (AIDS), e inicialmente foi denominado vírus linfotrópico humano de células B
(Salahuddin et al., 1986). Posteriormente, confirmou-se sua semelhança com os
Em 1988, Yamanishi et al. identificaram o HHV-6 como agente etiológico do
Exantema Súbito (Roseola infantum), 6a doença exantemática, descrita em 1910 por Zahorsky.
De acordo com suas propriedades biológicas, organização genômica e
homologia, HHV-6 pertence à família Herpesviridae, gênero Roseolavirus e subfamília
Betaherpesvirus (Berneman et al., 1992; Roizman et al., 1992). Assim como os outros betaherpesvírus, possui ciclo replicativo longo e capacidade de permanecer em estado
de latência em numerosas células e tecidos, podendo ocorrer reativação (McCormack,
et al., 1997).
A partícula viral é formada por um capsídeo icosaédrico com 162 capsômeros,
sendo envolto por um envelope lipoprotéico. O genoma do HHV-6 contém dupla fita
de DNA com 160 a 162 quilobases (kb), composta por uma região central U (U1 – 100)
com 143 a 144 kb, contendo “open reading frames” (ORFs) e outra terminal (DR) com
8 a 9kb. Os segmentos terminal e juncional contêm repetições com função ainda
indeterminada (Gompels et al., 1995).
O vírus possui duas variantes genéticas com composições antigênicas
diferentes: HHV-6A e HHV-6 B. HHV-6B contém 119 ORFs e 97 genes U em
comparação com 110 ORFs para o HHV-6A. A similaridade da seqüência de
nucleotídeos é 90%, mas a região DR e a região codificada entre U86 e U100 (85 e
72% de similaridade da seqüência de nucleotídeos, respectivamente) são mais
divergentes (Dominguez et al., 1999; Isegawa et al., 1999). Em adição às diferenças
genéticas, outras variações (imunológicas, envolvendo reatividade a anticorpos
monoclonais; tropismo celular e manifestações clínicas) sustentam a visão que HHV-6A
e B são dois betaherpesvirus distintos.
O HHV-6 replica-se em linfócitos T CD 4 (células-alvo) in vivo (Takahashi et al., 1989; Lusso et al., 1991). HHV-6A e B diferem na habilidade de replicação em
linhagens de células linfocitárias T específicas. Em adição, linfócitos T CD 8 e células
“natural killer” (NK) são suscetíveis à replicação do HHV-6 em associação com ativação
de CD 4 de superfície (Lusso et al., 1991; Lusso et al., 1993b; Lusso et al.,1995).
Linfócito T CD 4 pode estar infectado concomitantemente por HHV-6 e HIV-1. O HHV-6
pode infectar macrófagos, monócitos, células dendríticas, glia, fibroblastos, células
epiteliais e progenitores de medula óssea (Lusso et al., 1989). HHV-6 bloqueia a
formação de colônias de progenitores eritrocitários e de granulócito/macrófago. Ambas
as variantes do HHV-6 infectam astrócitos fetais humanos primários in vitro, mas HHV-6A pode ter maior neurotropismo in vivo (Hall et al., 1998; Dockrell et al., 2003).
HHV-6 possui tropismo por diferentes tipos de células humanas, mas o receptor
celular identificado para o vírus é uma glicoproteína, membro de uma família de
reguladores da ativação do complemento: CD 46. Algumas linhagens de células T,
apesar da expressão de CD 46 não são capazes de suportar a replicação de HHV-6A,
sugerindo a existência de co-receptores (Dockrell et al., 2003).
O HHV-6, assim como os outros herpesvírus, pode induzir doença de três
formas: pela destruição direta de tecidos, pela promoção de respostas
imunopatológicas ou favorecendo a transformação neoplásica, podendo estes
mecanismos estar relacionados. O vírus persiste em células e tecidos humanos,
podendo causar doença recorrente. O estado de latência é sustentado pelo seqüestro
em sítios imunologicamente privilegiados, incluindo células epiteliais da orofaringe, do
trato respiratório alto, glândulas salivares e células mononucleares sanguíneas ou do
tecido linfóide (Straus, 2005).
A reativação viral ocorre mais comumente em indivíduos imunocomprometidos
(imunossupressão por doenças de base ou induzida por medicamentos). Estudos
sugerem que o HHV-6 pode reativar também em indivíduos imunocompetentes, sendo
relatada reativação viral durante a gestação e em pacientes com doenças graves
admitidos em UTI (Dahl et al., 1999; Razonable et al., 2002).
O modo de transmissão viral é incerto, mas HHV-6 está presente na saliva e
replica-se em células epiteliais, sugerindo que secreções orais contribuem para a
transmissão, especialmente de HHV-6B. A alta freqüência de isolamento viral na saliva
de indivíduos infectados e a alta soroconversão após 1 a 3 anos de idade sugerem ser
a saliva a fonte de infecção mais importante. A ocorrência de surtos em comunidades
fechadas evidencia que a transmissão viral está relacionada ao contato íntimo e direto.
Vários estudos mostram que a transmissão perinatal ou intrauterina pode ocorrer, mas
infecções em neonatos provavelmente resultam do contato com a saliva materna
durante o primeiro ano de vida (Mukai et al., 1994; Straus, 2005). Existem alguns
relatos, entretanto não há evidências, até o momento, que confirmam a disseminação
A infecção primária por HHV-6 ocorre geralmente nos primeiros dois anos de
vida, com maior incidência entre seis e nove meses de idade, sendo menos freqüente
em crianças menores de seis meses pela presença de anticorpos maternos. Muitos
estudos estimam a soroprevalência de HHV-6 na população, sendo de 64 a 83% aos
13 meses, maior que 95% em crianças maiores e 90% em adultos, não havendo
diferenças em relação ao gênero, raça e nível socioeconômico. A soropositividade
pode diminuir com a idade, dando falsa impressão de infecção primária em idosos. A
infecção tem distribuição universal, sem restrição geográfica e consiste em uma das
principais causas de hospitalizações e visitas aos serviços de emergência (Straus,
2005).
Em pacientes transplantados (receptores de medula óssea e órgãos sólidos), o
HHV-6 pode ser adquirido por infecção primária, reinfecção (diferentes sorotipos ou
não) ou reativação viral. Devido a alta taxa de soropositividade para HHV-6 na
população geral, a maioria das infecções em pacientes transplantados resulta da
reativação do vírus latente, ocorrendo geralmente nos primeiros dois meses após o
transplante, com maior freqüência entre a segunda e a quarta semana. (Singh,
Carrigan, 1996).
Casos de infecção primária por transmissão de HHV-6 através do tecido doador
têm sido documentados, sendo que células mononucleares com infecção latente pelo
HHV-6 no enxerto têm sido relacionadas como as prováveis fontes de transmissão (Lau
et al., 1998).
A variante HHV-6 B tem sido freqüentemente identificada como a causadora de
doença em indivíduos transplantados, entretanto na maioria dos estudos publicados a
determinação do subtipo do HHV-6 não foi realizada (Frenkel et al., 1994; Ljungman,
Singh, 2006).
Fatores de risco associados à infecção pelo HHV-6 em pacientes receptores de
transplante de órgãos sólidos não estão completamente definidos. Alguns estudos
sugerem que o tratamento anti-rejeição com anticorpo antilinfocitário monoclonal
(anti-CD3) ou timoglobulina (anticorpo policlonal) são fatores de risco para reativação viral
(Rossi et al., 2001; Nash et al., 2004).
A infecção por HHV-6 em transplantados geralmente é assintomática. Infecção
aos transplantados receptores de órgãos sólidos e pode variar desde sinais e sintomas
clínicos inespecíficos até o comprometimento grave de órgãos alvo com impacto na
mortalidade. O risco de doença sintomática parece estar relacionado ao tipo de
transplante e ao grau de imunossupressão, sendo que dentre os transplantes de
órgãos sólidos, os receptores de transplante hepático parecem estar mais predispostos
a apresentarem infecção sintomática pelo HHV-6 (Ljungman, Singh, 2006).
A principal manifestação clínica da infecção pelo HHV-6 observada em
receptores de transplante de órgãos sólidos é uma síndrome febril inespecífica no
período precoce pós-transplante. Estudo de Yoshikawa et al., (2000), em receptores
de transplante hepático verificou que febre inespecífica foi observada em 87% dos
pacientes com infecção pelo HHV-6 e em apenas 20% dos pacientes sem infecção (p<
0.01).
Em pacientes transplantados, a síndrome febril geralmente atribuída ao CMV,
pode na verdade estar relacionada à infecção simultânea com outros herpervírus como
HHV-6 ou HHV-7. Razonable et al.,( 2003) em estudo com receptores de transplante
hepático verificou que 89% dos pacientes com infecção pelo CMV apresentavam
co-infecção pelo HHV-6B ou pelo HHV-7.
Supressão da medula óssea, manifestada principalmente por leucopenia e
trombocitopenia, tem sido associada com infecção pelo HHV-6 em receptores de
órgãos sólidos (Singh et al., 1997). O HHV-6 infecta as células hematológicas
progenitoras e reduz a formação de colônias (Burd et al., 1993; Isomura et al., 1997).
O HHV-6 tem tropismo pelo sistema nervoso central (Caserta et al., 1994;
Challoner et al., 1995), existem na literatura estudos de relato de caso e estudos de
caso-controle documentados que demonstram a associação entre o HHV-6 e
complicações do sistema nervoso central de etiologia não identificadas (Paterson et
al.,1999; Rogers et al., 2000; Singh, Paterson, 2000; Bollen et al., 2001). Estudo com
pacientes receptores de transplante hepático verificou que 15% dos pacientes
apresentavam alteração do “status mental” de origem indeterminada após transplante,
e que pacientes com viremia pelo HHV-6 apresentavam incidência significativamente
maior em comparação com pacientes sem viremia (Rogers et al., 2000). Os sintomas
são geralmente incaracterísticos como letargia, confusão mental, convulsão e
Existem relatos na literatura de pneumonia intersticial associada ao HHV-6 em
transplantados de medula óssea (Cone et al., 1993; Hentrich et al., 2005) e em
receptores de transplante de pulmão. Embora o HHV-6 tenha sido detectado em
9,4-14,6% das amostras de lavado bronco-alveolar em transplantados de pulmão (Ross et
al., 2001; Jacobs et al., 2003) a sua relevância como patógeno causador da pneumonia
é controversa (Ljungman, Singh, 2006).
Outras manifestações clínicas associadas ao HHV-6 em pacientes
transplantados, como hepatites e doença do trato gastrointestinal, também têm sido
relatadas (Appleton et al., 1995; Lautenschlager et al., 1998; Hentrich et al., 2005).
Os efeitos indiretos da replicação do HHV-6 estão associados com sintomas
clínicos graves e acredita-se que estes correspondam à manifestação clínica
predominante, enquanto doença com invasão de tecidos ocorre com menor frequência
em receptores de órgãos sólidos. O HHV-6 é considerado um vírus imunomodulador e
pode causar supressão importante da imunidade celular podendo facilitar a
super-infecção com outros agentes oportunistas e contribuir para a mortalidade geral
(Flamand et al., 1995; Singh, Carrigan, 1996; Dockrell et al., 1997, Singh et al.,1997).
Vários estudos têm demonstrado interação entre o HHV-6 e o CMV em
transplante renal. Em 1996 Herbein et al, realizaram estudo longitudinal com 32
receptores de transplante renal, rim-pâncreas e fígado. Manifestações clínicas graves
pelo HHV-6 (independente se atribuídas a primo-infecção ou reativação viral) foram
observadas somente em pacientes co-infectados pelo CMV. Ratnamohan et al. (1998),
em estudo prospectivo com 30 pacientes transplantados renais e rim-pâncreas avaliou
a incidência de infecção por HHV-6 e CMV através da detecção da PCR no sangue e
urina. A detecção simultânea de DNA viral do HHV-6 e do CMV, tanto em urina quanto
no sangue, foi o melhor preditor de doença na análise univariada e multivariada.
Estudo de Dockrell et al. (1997) em receptores de transplante hepático
demonstrou que infecção primária pelo HHV-6 foi fator de risco significativo para o
desenvolvimento de infecção sintomática pelo CMV.
Estudo de Humar et al. (2000) com 88 receptores de transplante hepático,
demonstrou que infecção pelo HHV-6, detectada através da PCR qualitativa no “Buffy
Coat”, foi fator de risco independente na análise multivariada para doença pelo CMV
apresentaram infecção pelo HHV-6, e destes 15/48 apresentaram doença pelo CMV,
sendo que em 10/15 pacientes HHV-6 foi detectado antes da doença pelo CMV, 4/10
HHV-6 detectado no início da doença e 1/10 após o início da doença. Dos 10 pacientes
que positivaram o HHV-6 primeiramente, cinco positivaram antes do primeiro PCR para
CMV positivo e cinco positivaram concomitantemente.
É possível que a associação entre HHV-6 e CMV possa estar relacionada com a
imunossupressão grave que predispõem a doença pelo CMV concomitante com a
infecção pelo HHV-6. Alternativamente a imunossupressão causada pelo HHV-6 pode
ser induzida pela sua ação no sistema imunológico (células T CD4, células T CD8,
células NK e monócitos) (Gentile, 2000).
Infecção pelo HHV-6 também tem sido relacionada como fator preditor
significativo e independente de infecção fúngica invasiva em transplante hepático
(Dockrell et al., 1997; Rogers et al., 2000).
Os dados da literatura a respeito da associação entre HHV-6 e rejeição em
transplante de órgãos sólidos são conflitantes. A infecção pelo HHV-6 tem sido
associada com rejeição aguda do enxerto em alguns, mas não em todos os relatos
(Griffiths et al., 1999; Lautenschlager et al., 2000; Rogers et al., 2000).
O diagnóstico laboratorial de infecção ativa é complexo por motivos intrínsecos
ao ciclo de vida do HHV-6 que permanece em estado de latência clínica por período
variável durante o qual o vírus persiste em sítios anatômicos de onde provavelmente
nunca será clareado (Locatelli et al., 2000), várias metodologias diagnósticas vêm
sendo utilizadas com o objetivo de diferenciar infecção aguda de infecção latente:
isolamento viral (Ihira et al.,2002; Yoshikawa et al., 2002), determinação da carga viral
em células sanguíneas mononucleares periféricas ou outras amostras biológicas
através da PCR, (Ljungman et al., 2000; Locatelli et al., 2000; Boutolleau et al., 2003),
detecção de “transcripts” virais (Yoshikawa et al., 2003b); antigenemia (Volin et al.,
2004). A detecção de DNA viral através da PCR convencional em células sanguíneas
tem valor diagnóstico limitado, pois é incapaz de diferenciar a manutenção do genoma
viral em células com infecção latente, da presença de células que estão ativamente
produzindo HHV-6 (infecção ativa). Entretanto a detecção e ou quantificação do DNA
viral através da PCR em fluídos corpóreos presumidamente livres de células, como o
plasma ou soro é considerado um marcador relevante de infecção ativa (Huang et al.,
2006). Este fato fundamenta-se na hipótese de que quando ocorre replicação viral
massiva no tecido linfóide, são liberadas partículas de vírus maduras na corrente
sanguínea (Achour et al., 2007).
O ensaio quantitativo de detecção da carga viral do HHV-6 através da PCR em
tempo real não apresenta padronização internacional, laboratórios utilizam tipos
variados de amostras como sangue total, células mononucleares de sangue periférico
ou plasma. Sendo, portanto, difícil a comparação da carga viral do HHV-6 entre os
estudos publicados.
A incidência de infecção por HHV -6 pós-transplante de órgãos sólidos varia de
acordo com o método diagnóstico utilizado e o tipo de órgão transplantado. Dados
gerais demonstram que 38-55% dos transplantados renais, 22-54% dos transplantes de
fígado, 36% dos transplantes cardíacos e mais do que 57% dos transplantes de
coração-pulmão desenvolvem infecção ativa pelo HHV-6 (Morris et al., 1989; Okuno et
al., 1990; Herbein et al.,1996; Dockrell et al., 1997; Lautenschlager et al., 2000; Rogers
et al., 2000; de Oña et al., 2002).
Okuno et al. (1990) avaliaram a relação entre a infecção pelo HHV-6 e
transplante renal. Dos 21 pacientes transplantados oito (38%) apresentaram aumento
dos títulos de anticorpos contra o HHV-6, sendo que em dois destes pacientes o vírus
foi isolado em leucócitos de sangue periférico.
Estudo prospectivo com 65 receptores de transplante renal mostrou infecção
ativa em 55% dos pacientes nos primeiros três meses após o transplante. Viremia,
detectada através do isolamento viral em sangue periférico, ocorreu em nove (14%)
dos pacientes e 27 (41%) dos pacientes apresentaram aumento significativo dos títulos
de anticorpos (Yoshikawa et al., 1992).
Em 1996, Herbein et al. realizaram estudo longitudinal com 32 receptores de
transplante renal, rim-pâncreas e fígado, sendo observado infecção ativa em 10 (31%)
dos pacientes. O diagnóstico de infecção foi realizado através do isolamento viral em
células mononucleares periféricas em seis pacientes e através do aumento dos títulos
sorológicos em quatro pacientes.
Ihira et al. (2001) avaliando 40 receptores de transplante hepático, observou
que infecção pelo HHV-6, definida pela detecção de DNA viral no plasma através da
(detecção de antígenos específicos para HHV-6 em células mononucleares de sangue
periférico) como método diagnóstico de infecção em 51 receptores de transplante
hepático, observou 11/51 (22%) dos pacientes apresentou infecção pelo HHV-6
(Lautenschlager et al., 2000).
Infecção primária pelo HHV-6 tem sido reportada em 61-100% pacientes
receptores de transplante hepático que apresentavam sorologia negativa pré-
transplante. Este estudo foi realizado em crianças que receberam o enxerto de suas
mães (Dockrell et al., 1997; Yoshikawa et al., 2001). Em pacientes pediátricos
receptores de transplante hepático, infecção pelo HHV-6 foi detectada em 23/47 (49%)
dos receptores através do isolamento viral e testes sorológicos, aproximadamente 2 a 4
semanas após o transplante (Yoshikawa et al., 2000).
A monitorização de 26 pacientes após transplante de medula óssea detectou
que 12 (46%) apresentaram viremia por HHV-6 através do isolamento viral que foi
considerado o ensaio padrão para detecção de replicação ativa. Utilizando a PCR
convencional qualitativa em plasma para monitorização da replicação ativa, observou
que este ensaio apresentou sensibilidade de 92%, especificidade de 97%, valor
preditivo positivo (VPP) de 85%, e valor preditivo negativo (VPN) de 99%. Foi realizada
uma análise para avaliação da PCR em tempo real em PBMCs como preditor de
infecção viral ativa, sendo evidenciados sensibilidade de 100%, especificidade de 74%,
valor preditivo positivo (VPP) de 35% e valor preditivo negativo (VPN) de 100% (Ishira
et al., 2002).
O diagnóstico de infecção através da sorologia tem pouco valor na prática clínica
uma vez que a positividade em crianças maiores do que dois anos e adultos é maior do
que 90%. Entretanto a soroconversão de um paciente IgG negativo para IgG positivo
ou um aumento de quatro vezes ou mais nos títulos de IgG são evidências
significativas de infecção primária recente (Straus, 2005).
O tratamento da infecção pelo HHV-6 em transplantados de órgãos sólidos inclui
a redução da imunossupressão e o uso de antivirais (Kotton, Fishman, 2005). O
antiviral ideal para o tratamento da infecção ainda não foi estabelecido assim como não
existe até o momento terapia antiviral com atividade específica contra o HHV-6 (de
Clercq, Naesens, 2006), sendo assim o tratamento atualmente utilizado consiste no uso
momento, estudos randomizados publicados comparando a atividade dos antivirais
contra o HHV-6 in vivo.
Estudos in vitro demonstram que o HHV-6 é mais suscetível ao cidofovir, entretanto o ganciclovir e o foscarnet também inibem o vírus e são melhores opções
terapêuticas por apresentarem menor nefrotoxicidade (Singh et al.,1996; Zerr et al.,
2002) . O aciclovir parece ser menos ativo contra o HHV-6 in vitro (Yoshida et al., 1998), entretanto estudo em transplantados de medula óssea demonstrou que altas
doses de aciclovir estão associadas à diminuição dos níveis de DNA viral (Wang et al.,
1996).
Tokimasa et al. (2002), relataram menor incidência de reativação pelo HHV-6 em
pacientes que receberam ganciclovir para profilaxia de CMV. Estudos demonstram que
a terapia com ganciclovir ou foscarnet reduzem a carga viral do HHV-6 no líquido
cefaloraquidiano (Zerr et al., 2002) e no sangue (Mendez et al., 2001; Zerr et al.,
2002).
Existem relatos de efetividade tanto do ganciclovir quanto do foscarnet em casos
de meningoencefalite por HHV-6 pós-transplante, sem estabelecimento de
superioridade de uma droga em relação à outra. A análise dos relatos e séries de
casos publicados, em resumo, demonstram que a taxa de sucesso da terapia foi de
apenas 60%, entretanto deve-se reconhecer que em vários casos a terapia foi iniciada
tardiamente no curso da doença (Ljungman, Singh, 2006).
Terapia combinada com o uso de foscarnet e cidofovir ou ganciclovir tem sido
descritas em relatos de caso no tratamento de encefalite por HHV-6 com sucesso
(Pohlmann et al., 2007).
Manichanh et al. (2001) sugerem que pontos de mutação em U 69 do HHV-6
estão associados à exposição prolongada aos antivirais in vivo (profilaxia e tratamento de infecção por CMV), com conseqüente diminuição da suscetibilidade ao ganciclovir in vitro. Estes autores publicaram o primeiro relato de resistência do HHV-6 ao ganciclovir, demonstrada por mutação no aminoácido M318V no gene U 69, homólogo
ao UL 97 do CMV, implicado na resistência deste vírus ao ganciclovir. A substituição
de M318V altera a atividade de fosforilação da proteinoquinase viral, diminuindo os
níveis de ganciclovir monofosfato entre as células e a concentração final de ganciclovir
O maribavir, droga anti-herpética recentemente desenvolvida para o tratamento
do CMV, não tem atividade contra o HHV-6 in vitro (Williams et al., 2003) entretanto o cyclopropavir, outra droga antiviral recente ainda em fase pré-clínica, demonstrou
atividade in vitro contra o HHV-6 (Kern et al., 2005).
Na literatura, há poucos trabalhos sobre o HHV-6 após transplante de órgãos
sólidos, sendo a maioria em pacientes submetidos a transplante hepático. A infecção
pelo HHV-6 é ainda menos estudada em transplante renal e as metodologias
diagnósticas nestes estudos são muito diversificadas. Portanto é necessário o
esclarecimento de alguns aspectos clínicos e epidemiológicos desta infecção neste
1.1 Objetivos
-Estudo de aspectos clínicos e epidemiológicos da infecção pelo Herpesvírus
Humano-6 (HHV-6) após o transplante renal.
- Estudo da relação entre replicação viral do HHV-6 e do citomegalovírus (CMV)
após o transplante renal.
- Avaliação da reação em cadeia por polimerase (PCR) em tempo real, ensaio
quantitativo, e da PCR “nested”, qualitativo, como método diagnóstico de infecção
ativa.
- Avaliação da soroprevalência pré-transplante para HHV-6 em doadores e
receptores de transplante renal.
2 MÉTODOS
2.1 Local do estudo
O acompanhamento clínico dos pacientes foi realizado em dois centros
hospitalares interligados:
- Hospital do Rim e Hipertensão da Fundação Osvaldo Ramos, órgão
suplementar da Universidade Federal de São Paulo, possui 11 andares e 89 leitos.
Trata-se de um serviço de referência e líder em número de transplantes de rim no
Brasil. Nesta instituição predomina o tipo de transplante com doadores vivos, sendo
estes responsáveis por 65,5% do total de transplantes em 2005 (Medina-Pestana,
2006).
- Hospital São Paulo – UNIFESP, hospital universitário geral, porte especial, de
tratamento de doenças de alta complexidade, que atende diariamente mais de 4.500
paciente-ambulatoriais e 1.200 pronto-socorro / pronto-atendimento, é responsável na
grande São Paulo, pela cobertura de área que abrange mais de 5 milhões de
habitantes. Conta com 743 leitos, sendo 651 destinados para adultos. (Hospital São
Paulo/UNIFESP, 2008).
Os exames laboratoriais foram realizados em dois laboratórios distintos:
- Laboratório de Virologia do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo
(IMTSP-USP): realização de sorologia e PCR “nested” e em tempo real para
HHV-6.
- Laboratório de Virologia - UNIFESP: realização de antigenemia para CMV.
2.2 Desenho do estudo
Trata-se de um estudo descritivo prospectivo.
2.3 População do estudo
Foram selecionados prospectivamente 30 pacientes consecutivos submetidos a
transplante renal no Hospital São Paulo e no Hospital do Rim e Hipertensão entre
fevereiro de 2007 e fevereiro de 2008, sendo 13 transplantes realizados no Hospital
São Paulo e 17 no Hospital do Rim e Hipertensão.
2.4 Critérios de inclusão
Os critérios de inclusão no estudo foram: pacientes com idade maior que 18
anos; pacientes com previsão de permanência na cidade de São Paulo por pelo menos
quatro meses após o transplante; receptores cujos doadores vivos apresentassem
amostras de sangue disponíveis para detecção de anticorpos anti-HHV-6 antes do
transplante (realização de sorologia para HHV-6) e detecção de DNA viral através da
PCR; aceitação de assinatura do termo de consentimento devidamente informado.
2.5 Critérios de exclusão
Os critérios de exclusão foram: receptores cujos doadores vivos não
apresentassem soro disponível para realização de sorologia para HHV-6; pacientes
recebendo profilaxia primária para CMV com ganciclovir e pacientes que evoluíram a
óbito no primeiro mês pós-transplante por motivos outros que não estejam relacionados
ao HHV-6. Durante o período do estudo nenhum paciente foi excluído.
2.6 Período do estudo/seguimento dos pacientes
O acompanhamento dos pacientes foi realizado semanalmente durante os
primeiros dois meses após o transplante e depois, a cada 15 dias até o período de
(interrogatório de sintomas clínicos e exame físico) e coleta de exames totalizando 12
avaliações por paciente.
2.6.1 Avaliação Clínica
A avaliação clínica dos pacientes compreendia o questionamento e observação
de sintomas clínicos e exame físico. Os principais sintomas clínicos avaliados
compreendiam: sintomas gerais como febre e suas características, anorexia, adinamia,
mal-estar geral; sintomas neurológicos: alterações de comportamento, distúrbios da
memória e da fala, cefaléia, confusão mental, convulsões, déficit motor; sintomas
respiratórios: tosse, expectoração, coriza, dispnéia; sintomas gastrointestinais:
náuseas, vômitos, dor abdominal, alterações do hábito intestinal; sintomas urinários:
disúria, alterações do volume urinário e aspecto da urina.
O exame físico compreendia: exame geral (estado geral, coloração de
mucosas); ausculta cardíaca e pulmonar; exame abdominal (hepatoesplenomegalia);
exame da pele (rash cutâneo) e anexos; orofaringe (hiperemia ou lesões em cavidade
oral, úvula, tonsilas, amígdalas e palato); cabeça e pescoço (linfonodos e rigidez de
nuca) e neurológico.
2.6.2 Coleta de Amostras
Após a assinatura do termo de consentimento pelo paciente (receptor) e pelo
doador vivo no pré-transplante, que compreendia um dia antes do transplante ou o dia
do transplante, foram coletadas amostras de soro do receptor e do doador vivo para
realização da sorologia para HHV-6.
Também no pré-transplante foram coletadas amostras de sangue do receptor e
do doador vivo para realização da PCR para HHV-6 no “buffy coat” e no plasma.
Após o transplante, amostras de sangue foram coletadas dos receptores com as
• PCR para HHV-6 semanalmente nos primeiros dois meses pós-transplante e a cada 15 dias após este período.
• Antigenemia para CMV semanalmente nos primeiros dois meses pós-transplante e a cada 15 dias após este período.
• Hemograma completo, uréia e creatinina semanalmente nos dois primeiros meses e a cada 15 dias após este período.
• Outros exames, como por exemplo, radiografias de tórax, foram solicitados quando houvesse necessidade.
2.7 Processamento das amostras
2.7.1 Sorologia para HHV-6
Os testes sorológicos para o diagnóstico de infecção por HHV-6 foram
realizados no Laboratório de Virologia do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo
(IMTSP-USP).
Para a detecção de anticorpos IgG e IgM anti-HHV-6 foi utilizado a metodologia
ELISA (Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay) que é um teste imunoenzimático que
permite a detecção de anticorpos específicos no plasma sanguíneo, através do “kit”
Panbio (E-HV601G e E-HV601M) de acordo com as instruções do fabricante.
Para a detecção de anticorpos IgG, primeiramente foi adicionado 1000 ul de
diluente de soro [solução tampão salina de Tris (pH 7,2-7,6) com conservante (0,1%
Proclin)] a 10 ul da amostra de soro de cada paciente, foram pipetadas 100 ul desta
amostra nos respectivos micropoços e incubado durante 30 minutos a 37ºC ± 1ºC. A
placa foi lavada seis vezes com solução tampão diluída. Foram aplicados 100 ul de
anti-IgG humana de ovino conjugada com peroxidase em cada micropoço e a placa foi
incubada durante 30 minutos a 37ºC ± 1ºC. Posteriormente a placa foi lavada
novamente seis vezes com solução tampão diluída e após foi adicionado 100 ul de
TMB (tetrametilbenzidina) para cada poço, incubados durante 30 minutos em
temperatura ambiente (20-25ºC) formando-se uma coloração azul. Seguindo a mesma
solução de paragem (1M de ácido fosfórico) para todos os poços, mudando a cor para
amarela. Dentro de 30 minutos foi realizada a leitura em microscópio de fluorescência.
Para a detecção de anticorpos IgM, foram realizadas as mesmas etapas do
procedimento, entretanto com adição de anti-IgM humana de ovino conjugada com
peroxidase.
2.7.2 PCR “nested” para HHV-6
As amostras foram processadas no Laboratório de Virologia do Instituto de
Medicina Tropical de São Paulo (IMTSP-USP).
Primeiramente, o DNA viral foi extraído a partir de 200 ul de soro com o kit de
extração QIAamp® DNA Mini Kit (QIAGEN , Valencia, CA, USA) conforme protocolo do
fabricante.
Para a detecção do HHV-6 foi amplificada parte da região conservada do
genoma que codifica a proteína principal do capsídeo viral (MCP/major capsid protein
gene) utilizando os iniciadores HV1 e HV2 na primeira amplificação e HV3 e HV4 na
segunda reação (“nested”). Após a preparação do mix da primeira amplificação, 5,00 ul
do DNA extraído foi adicionado e amplificado em termociclador automatizado
(Mastercycler® gradient – Eppendorf (Hamburg-Germany) utilizando um ciclo inicial de
95ºC por 5 minutos seguidos de 35 ciclos de 95ºC por 30 segundos, 55ºC por 45
segundos e 72ºC por 1 minuto e extensão final de 72ºC por 10 minutos. Ao mix da
segunda amplificação foi adicionado 5,00 ul do produto da primeira reação e
amplificado em termociclador automático utilizando um ciclo inicial de 95ºC por 5
minutos seguidos de 35 ciclos de 95ºC por 30 segundos, 55ºC por 45 segundos e 72ºC
por 1 minuto e extensão final de 72ºC por 10 minutos.
1. Mix da primeira amplificação: água MiliQ 35,20 ul; buffer 10X (s/ MgCL 2 ) Gibco 5,00 ul; dNTPs 10 mM Pharmacia 1,00 ul; MgCL 2 50 mM Gibco 1,50 ul; primer HV1 (10 pmoles/ul) 1,00 ul; primer HV2 (10 pmoles/ul) 1,00 ul; Taq polimerase (5;00
U/uL) Pharmacia ou Gibco 0,30 ul; amostra DNA extraído 5,00 ul.
HV3 (10 pmoles/ul) 1,00 ul; primer HV4 (10 pmoles/ul) 1,00 ul; Taq polimerase
(5,00 U/uL) Pharmacia ou Gibco 0,30 ul; amostra da primeira amplificação 5,00 ul.
Para cada reação foi utilizado controle negativo (5,00 ul de agua) e controle
positivo.
Tabela1: Sequência de primers (Pares de primers para PCR (HV1/HV2) e “nested” PCR (HV3/HV4) de acordo com o estudo de Huang et al, 1992).
Seqüência de primers*: Tamanho:
HV1 (outer) 5’-CAATGCTTTTCTAGCCGCCTCTTC-3’ 480pb
HV2 (outer) 5’-ACATCTATAATTTTAGACGATCCC-3’ 480pb
HV3 (inner) 5’-TTGTGCGGGTCCGTTCCCATCATA-3’ 214pb
HV4 (inner) 5’-TCGGGATAGAAAAACCTAATCCCT-3’ 214pb
Os produtos de amplificação foram analisados por eletroforese em gel de
agarose e visualizados sob luz ultravioleta após coloração com brometo de etídio. Para
isso, 5,00 ul dos produtos de amplificação foram adicionados a 2,00 ul do tampão de
corrida (azul de bromoferol; Sigma) e aplicados em gel de agarose a 1,5%
(ultrapura/GIBCO BRL) previamente corado com brometo de etídio. A corrida
eletroforética foi feita em voltagem de 80V e tampão TAE (tris-acetato-EDTA) 0,5 X
2.7.3 PCR em tempo real para HHV-6
As amostras foram processadas no Laboratório de Virologia do Instituto de
Medicina Tropical de São Paulo (IMTSP-USP).
O DNA viral foi extraído a partir de 200 ul de soro com o kit de extração
QIAamp® DNA Mini Kit (QIAGEN , Valencia, CA, USA) conforme protocolo do fabricante.
Para a detecção do vírus, somente os iniciadores HHV3 e HHV4 foram
utilizados. Após a preparação do mix da primeira amplificação, 5,00 ul do DNA extraído
foram adicionados e amplificados em termociclador automatizado (Mastercycler®
gradient – Eppendorf (Hamburg-Germany)) utilizando o seguinte protocolo de
amplificação: um ciclo de 50ºC por 2 minutos, um ciclo de 95ºC por 10 minutos,
seguidos de 40 ciclos de 95ºC por 15 segundos, 60ºC por 1 minuto e um ciclo de 95ºC
por 15 segundos e 60 ºC por 30 segundos e 95ºC por 15 segundos para a etapa de
dissociação da PCR em tempo real (ABI 7300 Real Time PCR Systems Applied
Biosystems- Foster City, USA).
O limite de detecção foi determinado pelas diluições seriadas do plasmídio
contendo um fragmento de HHV-6, sendo de 4.800cópias/mL de plasma para o ensaio
com “Sybr Green” (PCR em tempo real) e de 480 cópias/mL de plasma para a PCR
“nested”. (Canto et al., 2008)
Os resultados referentes ao HHV-6 (sorologia e PCR “nested” e em tempo real)
não estavam disponíveis para o clínico (transplantador), sendo assim estes dados não
foram utilizados para orientação clínica a respeito de profilaxia, tratamento e alteração
da imunossupressão.
2.7.4 Antigenemia para CMV
As amostras foram processadas no Laboratório de Virologia da Disciplina de
Doenças Infecciosas e Parasitárias da Escola Paulista de Medicina-UNIFESP.
Após separação de neutrófilos com uso de dextran 5%, cada amostra foi
foi realizado no mesmo dia da chegada de cada amostra. Após 24 horas, a reação foi
processada com a utilização de um “pool” de anticorpos monoclonais que identificam o
antígeno da matriz viral pp-65. Utilizou-se em seguida um conjugado anti-IgG ligado a
peroxidase, revelando-se a reação com a adição de H2O2 e aminoetilcarbazol (AEC). Após avaliação da lâmina ao microscópio óptico comum, os resultados foram
expressos por número de núcleos de neutrófilos corados em relação a 3,00 x 106 células.
O resultado da antigenemia era reportado ao clínico (transplantador)
imediatamente, sendo este o responsável pela decisão clínica em relação à instituição
do tratamento, profilaxia e alteração da imunossupressão.
2.8 Metodologia estatística
Os dados foram registrados no programa SPSS (Statistical Package for the
Social Sciences), versão 15.0, para comparar as proporções utilizou-se o teste
Qui-quadrado ou teste exato de Fisher. Valores de p menores ou iguais a 0,05 foram
considerados significativos.
2.9 Definições
2.9.1 Infecção ativa por HHV-6
Definida pela detecção de DNA viral através da PCR positiva em amostras de
“Buffy Coat” ou amostras de plasma.
2.9.2 Doença por HHV-6
Infecção ativa associada à presença de sinais e/ou sintomas compatíveis com
doença por HHV-6 (doença febril sem outro foco, rash cutâneo, pneumonite intersticial,
2.9.2 Infecção ativa por CMV
Antigenemia positiva independente do seu valor e da presença de sinais ou
sintomas clínicos.
2.9.3 Doença por CMV
2.9.4.1 Síndrome relacionada ao CMV
Definida de acordo com American Society of Transplantation, como a presença
do CMV no sangue, neste caso antigenemia positiva, associado à presença de pelo
menos um dos critérios: temperatura ≥ 38o C, início ou aumento significativo de
adinamia, leucopenia (leucócitos < 3.500/µL), linfocitose atípica > 5% ou
trombocitopenia (plaquetas < 100.000/µL. (Humar et al., 2006).
2.9.4.2 Doença invasiva por CMV
A doença invasiva pelo CMV foi definida baseada na presença de sinais ou
sintomas relacionados a um órgão específico mais evidência de infecção pelo CMV
(células com inclusão pelo CMV, detecção do antígeno do CMV in situ ou detecção de DNA viral) localizados em biópsias ou fluidos corporais apropriados, como exemplo
lavado broncoalveolar ou líquor. (Kotton, Fishman, 2005).
2.9.4.3 Tratamento preemptivo para CMV
Definido como a monitorização rigorosa da infecção pelo CMV através da
realização da antigenemia semanal nos primeiros quatro meses após o transplante em
pacientes de alto risco para infecção pelo CMV ( doador IgG positivo e receptor IgG
negativo ou receptores IgG positivo, independente do status sorológico do doador,
rejeição com thymoglobulina (anticorpo antilinfocitário policlonal) ou altas doses de
corticóide ou SIMULECT® (inibidor de interleucina 2). Estes pacientes recebem
tratamento para CMV preemptivo com ganciclovir, mesmo que totalmente
3 RESULTADOS
3.1 Características dos pacientes incluídos no estudo
Observou-se no grupo de pacientes do estudo, predomínio de sexo masculino
17 (56,6%). A média de idade foi de 43,37 anos (18 -71 anos) com mediana de 49
anos.
Em relação ao transplante, 29 pacientes receberam o seu primeiro transplante e
um paciente foi re-transplantado.
O perfil dos doadores compreendia 10 doadores falecidos e 20 vivos, sendo
destes, cinco HLA (Human Leucocyte Antigen) I, 12 HLA II e três HLA III.
As principais causas de IRC foram: 13 pacientes por etiologia indeterminada,
cinco pacientes por Diabetes Mellitus (DM), três por Lupus Eritematoso Sistêmico
(LES), três por Glomeruloesclerose segmentar e Focal (GESF), dois por Hipertensão
Arterial Sistêmica (HAS), dois por nefropatia por IgA, um por Glomerulonefrite
não-especificada (GMN), um por nefropatia túbulo-intersticial crônica por infecções urinárias
de repetição.
Dos 30 pacientes, 26 (86,6%) fizeram hemodiálise antes do transplante por um
período médio de 30,4 meses, um (3,3%) paciente realizou diálise peritoneal por 13
meses e três (10%) pacientes não foram submetidos à diálise antes do transplante.
O Perfil sorológico para CMV dos doadores pré-transplante foi de 28 (93,3%)
IgG positivo e dois (6,6%) IgG negativos e dos receptores foi de 28 (93,3%) pacientes
IgG positivo e dois (6,6%) pacientes IgG negativo.
O esquema de imunossupressão inicial dos pacientes compreendia: 13 (43,3%)
pacientes tacrolimus, prednisona e ácido micofenólico; 10 (33,3%) pacientes
tacrolimus, prednisona e azatioprina; cinco (16,6%) pacientes ciclosporina, prednisona
e azatioprina sendo que um paciente durante o acompanhamento modificou azatioprina
Terapia de indução foi realizada em 5/30 (16,7%) pacientes: três pacientes com
thymoglobulina (anticorpo antilinfocitário policlonal), um paciente com SIMULECT®
(inibidor de interleucina 2) e um paciente com thymoglobulina mais SIMULECT®.
Dos 30 pacientes três (10%) evoluíram com rejeição aguda celular (RAC)
durante o acompanhamento, sendo tratados com solumedrol: um paciente apresentou
RAC Ia, um apresentou RAC “borderline”, e um apresentou RAC IIa (a classificação da
rejeição celular aguda é baseada na severidade da lesão histológica de acordo com os
critérios de Banff).
3.2 Soroprevalência para HHV-6 pré-transplante
Soroprevalência nos doadores: foram coletadas sorologias dos 20 doadores
vivos, não foram coletadas sorologias dos doadores falecidos. Do total, 100% das
amostras mostraram IgG positivo e IgM negativo.
Soroprevalência nos receptores: foram coletadas sorologias dos 30 receptores,
sendo 29/30 (96,6%) IgG positivo e 4/30 (13,3%) IgM positivo. Nenhum paciente era
soronegativo pré-transplante.
Nos 20 pares em que foi possível avaliar a sorologia no receptor e seu doador
podemos observar 16 (80%) com perfil do doador e do receptor IgG positivo/IgM
negativo, três (15%) doador IgG positivo/IgM negativo e receptor IgG positivo/IgM
positivo, um (5%) doador IgG positivo/IgM negativo e receptor IgG negativo e IgM
positivo.
3.3 Avaliação de infecção ativa por CMV pós-transplante
Foram coletadas 311 amostras de antigenemia para CMV, com média de 10,3
amostras por paciente, sendo que 38\311 (12,2%) foram positivas. A média do valor de
CMV pós-transplante foi de 37,86 dias (variação de 10- 75 dias) com mediana de 37
dias.
Dos 30 pacientes, 14 (46,7%) apresentaram infecção ativa pelo CMV. Estes
pacientes apresentaram durante o estudo 21 episódios de infecção pelo CMV com
média de 1,5 episódios (1-3 episódios) por paciente. Sendo que 10/14 pacientes
(71,4%) apresentaram infecção assintomática; 2/14 pacientes (14,3%) apresentaram
síndrome relacionada ao CMV e 2/14 pacientes (14,3%) apresentaram doença invasiva
do trato gastrointestinal pelo CMV.
A média de tempo para início dos sintomas de doença pelo CMV foi de 39 dias
(variação de 24-51 dias) com mediana de 40,5 dias. Dentre os pacientes sintomáticos
com síndrome relacionada ao CMV um paciente apresentou adinamia e anemia, e um
paciente apresentou adinamia e febre. Dentre os pacientes com doença invasiva do
trato gastrointestinal pelo CMV um apresentou quadro de adinamia, epigastralgia e
diarréia (biópsia confirmando CMV esofágico) e o outro paciente apresentou diarréia
com melena (biópsia confirmando úlcera duodenal com lesão citomegálica).
3.4 Avaliação da detecção do vírus HHV-6
3.4.1 PCR “nested”
Foram coletadas 667 amostras dos 30 receptores de transplante e 39 amostras
dos doadores, totalizando 706 amostras.
Foi realizado PCR “nested” no plasma (358 amostras) e no “Buffy Coat” (348
amostras) sendo que 58 (16,2%) foram positivas no plasma e 222 (63,7%) foram
positivas no “Buffy Coat” (BC).
Dos 348 episódios em que foram realizados PCR “nested” no plasma e BC na
Tabela 2: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma e no BC através da PCR “nested” em 348 amostras coletadas.
PLASMA
BC POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 47 (13,5%) 175 (50,2%)
NEGATIVO 11 (3,1%) 115 (33%)
A média de amostras de PCR convencional para HHV-6 por paciente foi de 22,2
(16-30 amostras).
Dos 30 pacientes, 29 (96,6%) evoluíram com positivação da PCR “nested” no
BC durante o acompanhamento, com média de 11,3 (329/29) exames positivos para
cada paciente (3-12 exames positivos) (Tabela 3).
Dos 30 pacientes, 21 (70%) evoluíram com positivação da PCR “nested” no
plasma durante o acompanhamento, sendo que todos também positivaram o BC.
Média de 2,57 (54/21) exames positivos por paciente (1-8 exames positivos) (Tabela 3).
Tabela 3: Associação entre os pacientes que apresentaram DNA viral detectável no plasma e no BC através da PCR “nested”.
PLASMA
BC POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 21 (70%) 8 (26,6%)
NEGATIVO 0 (0%) 1 (3,33%)
3.4.2 PCR em tempo real
A PCR em tempo real, que é uma técnica quantitativa, através da química Syber
Green, foi realizada em 351 amostras. A média de amostras coletadas por paciente foi
Das 351 amostras, foram positivas: 26/351 no plasma (7,4%) e 63/351 no BC
(17,9%). Em 16/351 amostras (4,5%) a PCR em tempo real foi positiva tanto no plasma
como no BC (Tabela 4).
Tabela 4: Associação entre a detecção de DNA viral através da PCR em tempo real no plasma e no BC de 351 amostras coletadas.
PLASMA
BC POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 16 (4,5%) 47 (13,3%)
NEGATIVO 10 (2,8%) 278 (79,2%)
Dos 30 pacientes, 21 (70%) evoluíram com positivação da PCR em tempo real,
sendo que 2/21 (9,5%) positivaram apenas amostras no plasma, 9/21 (42,8%)
positivaram apenas amostras no BC e 10/21 (47,6%) positivaram no plasma e no BC
(Tabela 5).
Tabela 5: Associação entre os pacientes que apresentaram DNA viral detectável no plasma e no BC através da PCR em tempo real.
PLASMA
BC POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 10 (33,3%) 9 (30%)
NEGATIVO 2 (6,66%) 9 (30%)
A média de tempo para positivação da PCR em tempo real no plasma foi de 47,4
dias (5-113 dias) com mediana de 22 dias e a média de tempo para positivação da
PCR no BC foi de 35 dias (2-100 dias) com mediana de 23 dias.
A média da carga viral máxima no plasma apresentada por cada paciente foi de
4,1. 108 cópias/mL plasma e no BC foi de 1,5. 106 cópias/106 leucócitos.
Utilizando critério inicial de infecção ativa como a positivação de qualquer um
dos métodos diagnósticos (PCR “nested” ou PCR em tempo real), comparamos os
seus resultados no plasma e no “Buffy Coat”. Para esta análise foram incluídas as 347
amostras em que foram realizados os quatro diferentes ensaios em cada amostra (PCR
“nested” no plasma, PCR “nested” no BC, PCR em tempo real no plasma e PCR em
tempo real no BC).
Das 347 amostras realizadas no plasma, 62 (17,86%) foram positivas e das 347
amostras realizadas em BC, 222 (63,9%) foram positivas.
Os resultados deste estudo estão de acordo com a literatura e demonstra uma
alta taxa de detecção do HHV-6 no BC em relação ao plasma, o que provavelmente
está relacionado à detecção de DNA viral latente no BC. Sendo assim no presente
estudo consideramos infecção ativa pelo HHV-6 como a detecção de DNA viral no
plasma.
3.4.4 Comparação da PCR em tempo real e da PCR “nested” no plasma.
Das 347 amostras realizadas no plasma, 60 (17,29%) foram positivas, sendo 24
(40%) positivas tanto na PCR convencional como na PCR em tempo real, duas (3,33%)
positivas apenas na PCR em tempo real e 34 (56,66%) positivas apenas na PCR
convencional (Tabela 6).
Tabela 6: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma através da PCR “nested” e da PCR em tempo real de 347 amostras.
PCR “nested” PCR
em tempo real
POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 24 (6,91%) 2 (0,57%)
NEGATIVO 34 (9,79%) 287 (82,7%)
Dos 30 pacientes, 22 (73,3%) apresentaram detecção de DNA viral no plasma,
real, 10 (45%) detectado apenas na PCR convencional e um (4,54%) detectado apenas
na PCR em tempo real (Tabela 7).
Tabela 7: Associação entre a detecção de DNA viral no plasma através da PCR “nested” e da PCR em tempo real nos 30 pacientes.
PCR “nested” PCR
em tempo real
POSITIVO NEGATIVO
POSITIVO 11 (36,66%) 1 (3,33%)
NEGATIVO 10 (33,33%) 8 (26,66 %)
3.5 Freqüência e características da infecção ativa pelo HHV-6 utilizando-se como metodologia diagnóstica a PCR “nested” no plasma
Considerando infecção ativa pelo HHV-6 como a detecção de DNA viral no
plasma utilizando-se PCR “nested” como metodologia diagnóstica, foi observado que
21/30 pacientes (70%) apresentaram infecção ativa durante o seguimento.
Considerando que episódio de infecção ativa corresponde ao período de
replicação viral, foram observados nos 21 pacientes 28 episódios, com média de 1,3
episódios por paciente (variação de 1-3 episódios), sendo que destes 28 episódios 17
(60%) foram episódios de replicação pontual e 11 (40%) foram episódios de replicação
sustentada (duas ou mais amostras positivas consecutivas).
Em 11/21 (52,4%) pacientes foi detectada replicação viral ativa em amostra
isolada; em 2/21 (9,5%) pacientes apresentaram dois episódios, cada um deles em
amostra isolada com média de 73,5 dias de intervalo entre as amostras positivas; 8/21
(38%) pacientes apresentaram episódios de infecção ativa com replicação viral por
período maior do que uma semana (ou em duas ou mais amostras consecutivas) com
média de 22,3 dias e tempo máximo de 57 dias.
A média de tempo para detecção de DNA viral no plasma pós-transplante foi de