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Alterações eletrocardiográficas observadas durante o uso do trimetafano no tratamento da hipertensão arterial maligna

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Academic year: 2017

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TRIMETAFANO E GIPERTENSÃO ARTERIAL MALIGNA. ALTERAÇÕES DO ECG

Arq. Bras. Cardiol. 31/4 273-276 - Agosto, 1978

* Prof.-Assist. (Nefrologia).

** Prof.-Assist.-Dr. (Cardiologia) do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP *** Arfonad – Roche.

ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS OBSERVADAS DURANTE O USO DO TRIMETAFANO NO TRATAMENTO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL MALIGNA. Vitor Augusto Soares *

Eder Trezza **

Recebido em 23/12/77

Os autores apresentam alterações eletrocardiográficas importantes observadas durante o uso do canfosulfonato de trimetafano, em quatro pacientes com hipertensão arterial maligna e insuficiência renal.

A dosagem utilizada variou entre 2,1 e 5,5 mg/kg/min. As alterações eletrocardiográficas observadas foram: infradesnivelamento do segmento ST, achatamento e subseqüente inversão da onda T e aparecimento de ondas U gigantes com aumento do intervalo QTc. Dois pacientes desenvolveram fibrilação ventricular.

O canfosulfonato de trimetafano (***) é uma das poucas drogas, do escasso arsenal terapêutico para o tratamento de crises hipertensivas, existentes no mercado farmacêu-tico brasileiro. Ele tem sido empregado por nós, com re-sultados satisfatórios, desde 1970. Todavia, em nossa ex-periência, pudemos observar importantes alterações eletrocardiográficas determinadas por aquele hipotensor em 4 pacientes. Não tendo encontrado na literatura compulsada a descrição das alterações eletrocardiográficas por nós constatadas, decidimos publicá-las, sendo essa a finalidade do presente trabalho.

TABELA I - Principais dados clínicos e laboratoriais de 4 pacientes submetidos a 8 séries terapêuticas com canfosulfonato de trimetafano.

Pacientes C.P.S. C.G.M. J.S. A.M.S.P.

Dados Clínicos

Idade 38 35 29 32

Sexo M F M F

PA inicial 280 x 140 190 x 135 230 x 150 250 x 150

final 140 x 100 120 x 80 180 x 120 180 x 130

Freq. card. inicial 84 60 115 128

final 64 44 50 75

Uréia plasmática mg % (1) 252 260 164 306

Creat. Sanguínea mg % (2) 11,9 8,2 5,5 19,3

Potássio sérico mEq/1 (3) 3,5 3,5 4,2 4,8 4,2 4,6 5,8 4,1

Cálcio sérico mg % (4) 8,2 9,0 - 7,6 - - - 9,1

Dose de canfossulfonato de trimetafano

total 2.000 mg 1.500 1.000 2.000 1.000 500 500 600

mg/min 4,8 5,0 3,0 5,5 5,5 4,3 2,1 2,5

mg/kg/hora 3,5 6,8 4,6 7,6 5,0 2,5 1,4 2,0

(1) Método de Gentz Kaw, C-J, modificado; normal: de 15-35 mg % (2) Método de Follin - Wu; normal: de 1 a 2 mg %

(3) Método de fotometria de chama; normal: 3,55 a 4,47 mEq/1 (4) Método de Patrich, U. Ferro, B.S. e Anna Bell; normal: 9-11,5 mg %

MATERIAL E MÉTODOS

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ARQUIVOS BRASILEIROS DE CARDIOLOGIA

Nos 4 doentes a terapêutica inicial foi constituída pela aplicação parenteral de furosemide e reserpina e guanetidina por via oral. O CST foi introduzido posteriormente por não ter havido resposta satisfatória ao esquema terapêutico inicial. Essa substância foi administrada pela via intravenosa, dissolvida em solução glicosada a 5%, sendo a dose ajustada de acordo com a resposta pressórica, regulando-se a velocidade da infusão de forma a procurar estabilizar a pressão arterial diastólica em torno de 90 a 100 mmHg. A suspensão da droga foi sempre realizada de modo lento e gradativo, na medida em que a redução pressórica se mantinha sem o medicamento. Em 3 pacientes houve necessidade de reintrodução do CST devido à reascensão progressiva da pressão, de modo que no total 8 séries terapêuticas foram efetuadas.

As doses ministradas variaram entre 2,1 e 5,5mg/kg/ min ou 500 a 2.000 mg como dose total em cada série (tab. 1).

Os eletrocardiogramas de todos os pacientes mostraram sinais de sobrecarga das câmaras esquerdas e durante a administração do CST surgiram acentuadas alterações da repolarização ventricular, com o padrão clássico descrito na hipopotassemia, ou seja, infradesnivelamento do segmento ST, achatamento e posterior inversão da onda T e aparecimento de grandes ondas U, as quais tomavam-se maiores do que as ondas T (fig. 1, 2, 3). Concomitante observaram-se aumentos apreciáveis do QTc. Na fase de piora do ECG houve uma tendência para redução da freqüência cardíaca e aparecimento de arritmias, principalmente supraventriculares, constituídas por marca-passo mutável, ritmo nodal e extra-sístoles atriais. Dois pacientes apresentaram vários episódios de fibrilação ventricular não precedidos de extra-sistolia ou taquiarritmias ventriculares premonitórias; ambos foram reanimados, mas posteriormente vieram a falecer em

recidivas da fibrilação ventricular. DISCUSSÃO

Apesar de ser considerado uma importante alternativa terapêutica para as crises hipertensivas, o CST tem seus efeitos colaterais pobremente descritos na literatura. Midríase paralítica, íleo adinâmico, atonia de bexiga 1,2,

parada respiratória 3, embora freqüentemente referidos em

publicações médicas, não ocorreram em nossa experiência

4. Surpreendentemente para nós, todavia, não encontramos

referências às alterações eletrocardiográficas que aqui descrevemos.

Obviamente a própria hipertensão arterial e, com muito maior razão, a crise hipertensiva modificam importantemente o trabalho cardíaco e determinam “de per si” anormalidades do traçado eletrocardiográfico. As alterações dependentes do quadro hipertensivo são bastante conhecidas e constituídas principal-mente por sobrecarga das câmaras esquerdas e alterações secundárias da repolarização ventricu-Fig. 1 - Paciente C.G.M.. Ritmo juncional e sobrecarga ventricular

esquerda. Notar ondas V gigantes da V

3 a V6. Na ocasião de traçados K +

4,5 mE, Na120 mE uréia 290mg%. A PA caira de 230 x 150 para 110 x 90 mmHg.

Fig. 2 - Pacientes C.P.S. Ritmo sinusal e sobrecarga de câmaras esquerdas. Notar grandes ondas U de V

2 a V5. Na ocasião de traçado: K +

4,0 mE, Ca++ 8,2 mg%. A PA caira de 280 x 140 para 140 x100 mmHg.

Fig. 3 - Paciente A.M.S.P.. Ritmo sinusal com sobrecarga de câmaras esquerdas. Notar o aparecimento de ondas V2 a V5 após a administração do CST. Na ocasião do traçado: K+ 4,1 mE. A PA cairá de 250 x 150

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TRIMETAFANO E GIPERTENSÃO ARTERIAL MALIGNA. ALTERAÇÕES DO ECG

lar, caracterizadas por infradesnivelamento do segmento ST e tendência à negativação das ondas T em derivações esquerdas, com morfologia assimétrica, sendo a alça inicial mais lenta e a terminal mais rápida. Não raro são observados bloqueios completos ou incompletos do ramo esquerdo. Bradicardia sinusal também está comumente presente nas hipertensões arteriais não- complicadas por insuficiência cardíaca congestiva. Na hipertensão maligna pode existir um hiperaldosteronismo secundário, que por sua vez tende a determinar uma perda urinária de potássio. Entretanto, em que pese essa possibilidade, não encontramos na literatura, nem observamos em nossa experiência hipopotassemias apreciáveis ou alterações eletrocardiográficas semelhantes às aqui descritas, nos portadores de hipertensões malignas não submetidas ao tratamento pelo CST 4-6.

A presença de insuficiência renal com freqüência, senão habitualmente, determina a ocorrência de hiperpotassemia, cuja conhecida tradução eletrocardiográfica são ondas T altas, ponteagudas, estreitas e simétricas em derivações precordiais.

Portanto, acreditamos que nem a crise hipertensiva, nem a insuficiência renal explicariam satisfatoriamente o padrão aberrante de repolarização que observamos durante o uso do CST. Os níveis séricos de potássio nos 4 pacientes sempre situaram-se na faixa normal ou subnormal, não se tendo chegado a surpreender hipo ou hiperpotassemias expressivas. Entretanto, sabe-se que o eletrocardiograma costuma espelhar muito mais o equilíbrio ao nível da membrana da fibra miocárdica, do que as concentrações plasmáticas do potássio. Dessa forma, é freqüente que “hipopotassemias” sejam suspeitadas pela análise do ECG quando ocorrem reduções rápidas do potássio na circulação, sem que os níveis séricos caiam a valores considerados inferiores ao normal. Por outro lado, desconhecemos o mecanismo de ação do CST sobre o miocárdio, não sendo improvável a possibilidade de que a droga interfira diretamente sobre a permeabilidade iônica da parede celular, alterando os fenômenos eletrolíticos ao nível da membrana das fibras, o que resultaria em uma dificuldade da repolarização. Nessa ordem de idéias o deficit de potássio, sugerido pelo ECG, seria apenas intracelular.

Um outro elemento cuja expoliação pode determinar alterações eletrocardiográficas é o cálcio. Em nosso material a calcemia foi avaliada em apenas 4 das 8 séries terapêuticas, como pode ser visto na tabela I, tendo sido constatados níveis inferiores ao normal em 2 pacientes. A manifestação eletrocardiográfica da hipocalcemia é um aumento do QTc, às custas de um alongamento do ST. Portanto, mesmo que episódios de hipocalcemia tenham participado do aparecimento das alterações por nós constatadas no ECG, a simples depleção de cálcio não explicaria o conjunto das modificações. Acreditamos que apenas a análise de um maior número de casos poderá fornecer elementos concludentes a esse respeito, sendo todavia improvável que a hipocalcemia, mesmo se associada

à hipopotassemia, constitua a causa primária das anomalias em questão.

Restariam ainda para ser consideradas as modificações eletrocardiográficas que podem ser induzidas pela hipertensão intracraniana. Tendo em vista que as alterações da repolarização ventricular se foram acentuando durante o uso do CST, a despeito de ter havido queda importante da pressão arterial e diurese abundante, fomos levados a não atribuir as modificações do ECG à encefalopatia hipertensiva, uma vez que, fosse a hipertensão intracraniana a causadora das anormalidades eletrocardiográficas, as alterações deveriam ser mais acentuadas no inicio da terapêutica, diminuindo progressivamente com a melhora dos níveis tensionais, ocorrendo precisamente o inverso.

A dose de CST preconizada na literatura é de 1 a 15 mg/ min 8 e a dose máxima por nós utilizada foi de 5,5 mg/min,

portanto, situada em uma faixa terapêutica aparentemente segura. Sendo no entanto excretada pelos rins, é provável que na vigência de insuficiência renal a droga venha a acumular-se no organismo, configurando uma situação de superdosagem. A favor dessa interpretação temos o fato de que o paciente que apresentou alterações eletrocardiográficas com a menor dosagem do CST foi exatamente o que possuía função renal mais comprometida (paciente nº 4).

Em doses muito pequenas, da ordem de 100 a 700 microgramas/min, o CST já chegou a ser testado no tratamento de insuficiência cardíaca em hipertensos vítimas de infarto do miocárdio, com fundamento na hipótese de que a redução da resistência periférica (“afterload”) diminuiria o trabalho cardíaco e pouparia o miocárdio isquêmico, mas ainda recuperável, na zona periinfarto 5. Embora os resultados

obtidos indicassem uma possível redução do tamanho da área necrosada, em relação ao grupo não-tratado, as reduzidas quantidades do trimefano empregados não teriam utilidade alguma na terapêutica das crises hipertensivas, tomando qualquer comparação irrelevante.

Sendo a hipertensão maligna uma patologia de elevadíssima mortalidade, os recursos terapêuticos para sua reversão devem ser selecionados e utilizados da maneira mais criteriosa possível, procurando-se evitar a sobreposição de agressões terapêuticas. Assim sendo, ressaltados os benefícios que com freqüência podem ser conseguidos pelo emprego do CST, sua administração deverá ser efetuada sob o mais rigoroso controle, analisando-se periodicamente o ECG e reduzindo-se precocemente as dosagens tão logo surjam as alterações eletrocardiográficas suspeitas de intoxicação.

SUMMARY

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ARQUIVOS BRASILEIROS DE CARDIOLOGIA

Drug dosages varied between 2.1 and 5.5 mg/ kg/min (total dose ranged from 500 to 2.000 mg) in each of the series, by continuous I.V. drip in glucose solution. Drip velocity was adjusted to maintain the diastolic pressures between 90 and 100 mmHg.

The electrocardiographic alterations, observed in all patients, were characterized by marked disturbances of ventricular repolarization typical of hypokalemia: lowering of the ST/segment, flatting and subsequent inversion of the T wave, and appearance of giant U waves with enlargement of QTc interval. Arrhythmias, mainly supraventricular, were equally observed. Two patients developed several episodes of ventricular fibrillation, with death; at least one of these deaths was apparently related to the use of trimethaphan.

REFERÊNCIAS

1. Gifford, R. W., Jr. Management and treatment of malignant hypertension and hypertensive emergencies. In Genest, J. Koiw E.; Kuchel, O. -Hypertension, 1st Ed. McGraw Hill Bool Co., New

York, 1917. Physiopathology and treatment.

2. A. M. A. Commitee on Hypertension - The treatment of malignant hypertension - JAMA 228:673, 1974. 3. Nies. A. S. - Clinical pharmacology of antihypertensive

drugs. Med. Clin N. Amer. 61:675 1977.

4. Franco, R. J. S.; Matsubara, L. S.; Bonilha, J. P. M.; Mota. A. C.; Soares, V. A.; Habermann, F.; Almeida D. B. - Hipertensivo Maligna: quadro clínico, tratamento e evolução de 26 pacientes. Em publicação nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia.

5. Ramos, O. L.; Saad, F. A.; Lima M. C. C.; Sustovich, R. D.; Ajzen, H. - Hipertensão Maligna: Estudo anatomoclínico em 22 pacientes. Rev. Assoc. Med. Bras. 11:371 1965.

6. Schottstaedt, M. F.; Sokolow, M. - The natural history and course of hypertension with papillede ma (malignant hypertension). Am. Heart J., 45:331, 1955.

7. Brealin, D. J. - Hypertensive crisis. Med. Clin. N. Amer. 53:351. 1969.

8. Keith, T. A. - Hypertension crisis. JAMA 237: 1570, 1977.

Imagem

TABELA I - Principais dados clínicos e laboratoriais de 4 pacientes submetidos a 8 séries terapêuticas com canfosulfonato de trimetafano
Fig. 2 - Pacientes C.P.S. Ritmo sinusal e sobrecarga de câmaras esquerdas. Notar grandes ondas U de V

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