• Nenhum resultado encontrado

Transplante de células da medula óssea no tratamento da cardiopatia chagásica crônica.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Transplante de células da medula óssea no tratamento da cardiopatia chagásica crônica."

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

Transplante de células da medula óssea

no tratamento da cardiopatia chagásica crônica

Bone marrow cells transplant in the treatment

of chronic chagasic cardiomyopathy

Ricardo Ribeiro dos Santos

1 ,2

, Milena Botelho Pereira Soares

1 ,2

e Antônio Carlos Campos de Carvalho

2 ,3

RESUMO

A c a rd i o p a ti a c h a gá si c a c rô n i c a é a i n d a u m a d a s m a i o re s c a u sa s d e ó b i to p o r i n su f i c i ê n c i a c a rd í a c a n a Am é ri c a La ti n a e p a ra a q u a l n ã o h á n e n h u m tra ta m e n to e f i c a z a té o m o m e n to . En q u a n to a p o p u la ç ã o d e i n d i ví d u o s c o m d o e n ç a d e Ch a ga s a gu a rd a o d e se n vo lvi m e n to d e n o vo s q u i m i o te rá p i c o s m a i s e f i c i e n te s e d e m e n o r to x i c i d a d e p a ra a e li m i n a ç ã o d o Trypano so ma c ruzi, u m a n o va e stra té gi a su rgi u n a te n ta ti va d e re p a ra r o u d i m i n u i r o s d a n o s c a u sa d o s a o m i o c á rd i o d e p a c i e n te s c o m f o rm a c rô n i c a c a rd í a c a . Tra ta - se d o tra n sp la n te d e c é lu la s d e m e d u la ó sse a o b ti d a s d o p ró p ri o i n d i ví d u o a se r tra ta d o , q u e p o d e le va r à m e lh o ra f u n c i o n a l e d a q u a li d a d e d e vi d a d o s p a c i e n te s, c o m o o c o rre u e m e stu d o s u ti li za n d o e sta a b o rd a ge m p a ra o tra ta m e n to d e p a c i e n te s c o m i n su f i c i ê n c i a c a rd í a c a d e e ti o lo gi a i sq u ê m i c a . Os p o ssí ve i s e f e i to s d e te ra p i a s c e lu la re s e su a u ti li za ç ã o e m p a c i e n te s c a rd i o p a ta s c h a gá si c o s c rô n i c o s sã o d i sc u ti d o s n o p re se n te a rti go .

Pal avr as-chave s: Do e n ç a d e Ch a ga s. Ca rd i o p a ti a . Cé lu la s- tro n c o . Me d u la ó sse a . Tra n sp la n te a u tó lo go .

ABSTRACT

Ch ro n i c c h a ga si c c a rd i o m yo p a th y re m a i n s a m a jo r c a u se o f d e a th d u e to h e a rt f a i lu re i n La ti n Am e ri c a n c o u n tri e s a n d f o r wh i c h th e re i s c u rre n tly n o e f f e c ti ve tre a tm e n t. Wh i le c h a ga si c p a ti e n ts wa i t f o r th e d e ve lo p m e n t o f m o re e f f i c i e n t a n d le ss to x i c c h e m o th e ra p e u ti c s f o r th e e li m i n a ti o n o f Trypanosoma c ruzi, a n e w stra te gy h a s a p p e a re d i n a n a tte m p t to re p a i r o r a m e li o ra te th e d a m a ge c a u se d to th e m yo c a rd i u m o f p a ti e n ts wi th c h ro n i c c h a ga si c c a rd i o m yo p a th y. Th i s th e ra p y, i n vo lvi n g th e tra n sp la n t o f b o n e m a rro w c e lls o b ta i n e d f ro m th e p a ti e n t to b e tre a te d , m a y le a d to i m p ro ve m e n t i n h e a rt f u n c ti o n a n d i n li f e q u a li ty o f p a ti e n ts wi th se ve re c h a ga si c c a rd i o p a th y, si m i la r to th a t o b ta i n e d wi th th i s a p p ro a c h i n th e tre a tm e n t o f p a ti e n ts wi th h e a rt f a i lu re o f i sc h e m i c e ti o lo gy. Th e p o ssi b le e f f e c ts o f c e ll th e ra p i e s a n d i ts a p p li c a ti o n s i n c h ro n i c c h a ga si c c a rd i o p a th s a re d i sc u sse d i n th e p re se n t re p o rt.

Ke y-words: Ch a ga s’ d i se a se . Ca rd i o m yo p a th y. Ste m c e lls. Bo n e m a rro w. Au to lo go u s tra n sp la n t.

1 . Centro de Pesquisas Go nç alo Mo niz da Fundaç ão Oswaldo Cruz, Salvado r, B A. 2 . Instituto do Milênio de B io engenharia Tec idual do Ministério da Ciênc ia e Tec no lo gia, B rasília, DF. 3 . Instituto de B io físic a Carlo s Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro , RJ.

Auxílio financ eiro : Instituto do Milênio de B io engenharia Tec idual ( IMB T/MCT) , CNPq, FIOCRUZ e NIH HL0 7 3 7 3 2 -0 1 .

En de r e ço par a cor r e spon dê n ci a:Dr. Ric ardo Ribeiro do s Santo s. Labo rató rio de Engenharia Tec idual e Imuno farmac o lo gia/CPqGM/FIOCRUZ. Rua Waldemar Falc ão 1 2 1 , B ro tas, 4 0 2 9 5 -0 0 1 Salvado r, B A, B rasil.

Tel: 7 1 3 5 6 -4 3 2 0 r: 2 6 0 /2 7 2 , Fax: 7 1 3 5 6 -4 3 2 0 r: 2 9 2 e-mail: ric ardo ribeiro @ c pqgm.fio c ruz.br

Rec ebido para public aç ão em 5 /1 /2 0 0 4 Ac eito em 1 3 /8 /2 0 0 4

Nos últimos anos, uma nova área da medicina vem sendo desenvolvida, que abre perspectivas inovadoras para o tratamento de doenç as c rônic o-degenerativas. É a c hamada medic ina regenerativa e c onsiste na utilizaç ão de c élulas, fatores de pro liferaç ão e diferenc iaç ão c elulares e bio materiais que permitem ao próprio organismo reparar tec idos e órgãos lesados. Alguns dos alvos terapêuticos são órgãos considerados por muito tempo c omo inc apazes de desenvolver quaisquer

processos de regeneração, como o cérebro e o coração. Os relatos de demonstrações de que os tecidos adultos possuem células-tronco pluripotentes próprias1 9 1 5, de que há migração

de células-tronco do sangue periférico e sua diferenciação para tipos celulares residentes em órgãos como o coração1 6 e de que

células já diferenciadas podem proliferar em resposta a agressões teciduais1 0 têm sido cada vez mais freqüentes na literatura, e

(2)

embora possa não ser eficiente para levar à cura dependendo do grau de dano tecidual que tenha ocorrido. Este é o caso do infarto do miocárdio, onde uma baixa taxa de proliferação de mioblastos e cardiomiócitos pode ser detectada nas bordas das lesões, porém não o suficiente para reparar todo o dano tecidual causado pela isquemia, resultando em extensas áreas de fibrose.

CÉLULAS- TRONCO

A célula-tronco é uma célula indiferenciada, capaz de proliferar e de originar outras células-tronco ( o que é denominado auto-regeneraç ão) e c élulas c om c apac idade de se diferenc iar, originando c élulas diferenc iadas c om c apac idade func ional normal. Para realizar a dupla tarefa de se auto-regenerar e ao mesmo produzir células diferenciadas, a célula-tronco pode seguir dois modelos básicos de divisão celular. O determinístico, onde a divisão de uma tronco gera invariavelmente uma nova célula-tronco e uma célula que irá se diferenciar; ou o aleatório ou estocástico, onde algumas células-tronco geram apenas novas células-tronco ao se dividirem, enquanto outras geram apenas células com potencial para sofrer diferenciação.

CÉLULAS- TRONCO EMBRIONÁRIAS

Em 1 9 8 1 , foi descrita a técnica de imortalização de células derivadas da massa celular interna de blastocistos de embriões de c amundo ngo s, as c é lulas-tr o nc o e mb r io nár ias o u ES ( embryonic stem c ells)4. Células ES são pluripotentes, pois

podem proliferar indefinidamente in vitro sem se diferenciar, mas também podem se diferenciar em vários tipos celulares dependendo das c ondiç ões de c ultivo. Outra c arac terístic a especial destas células é que elas podem ser re-introduzidas em embriões de camundongos, dando origem a células em todos os tecidos do animal adulto, inclusive a células germinativas1 7.

O fato das células ES se integrarem em todos os tecidos do animal adulto quando re-introduzidas em embriões de camundongo demonstra o seu potencial de diferenciação em qualquer célula do organismo, de uma célula da pele a um neurônio. Vários estudo s demo nstr ar am a difer enc iaç ão das c élulas ES de camundongos em tipos celulares distintos em culturas in vitro, ger ando c élulas hemato po iétic as, neur ô nio s, astr ó c ito s e oligodendrócitos, dentre outras2 1. A identificação dos fatores que

levam ao direc ionamento deste proc esso de diferenc iaç ão permitirá que, a partir de células-tronco embrionárias, possamos cultivar de forma controlada os mais diferentes tipos celulares, abrindo a possibilidade de expandir ou construir in vitro tecidos e órgãos, tornando viável a bioengenharia tecidual.

CÉLULAS- TRONCO NOS ORGANISMOS ADULTOS

Desde a década de 60, sabe-se que organismos adultos têm a capacidade de auto-regenerar determinados tecidos como a pele, o epitélio intestinal e principalmente o sangue, que tem suas células c o nstantemente destruídas e reno vadas, num c o mple xo e

finamente regulado processo de proliferação e diferenciação c elular. Durante muitas déc adas estudou-se o proc esso de hematopoiese a partir de células-tronco multipotentes de medula óssea, que são capazes de dar origem a células progressivamente mais diferenciadas e com menor c apac idade proliferativa.

A noção de que vários tecidos e órgãos do corpo humano, como o fígado, músculo esquelético, pâncreas, e sistema nervoso, têm um estoque de células-tronco, com uma capacidade limitada de regeneração tecidual após injúria, é também recente9. Ainda mais

recente é a idéia de que as células-tronco presentes nestes vários orgãos são não apenas multipotentes, no sentido de que podem gerar as células constitutivas daquele órgão específico, mas também pluripotentes, no sentido de que também podem gerar células de outros órgãos e tecidos. O primeiro relato desta propriedade das células-tronco adultas foi feito em 1998 por um grupo de cientistas italianos que estudaram a regeneração de músculo esquelético por células derivadas da medula óssea5. Embora o próprio músculo

esquelético possua células-tronco, denominadas de células satélite, Giuliana Ferrari e colaboradores demonstraram ao injetar células de medula óssea de camundongos transgênicos em músculos esqueléticos lesados quimicamente em camundongos imunodeficientes, que as células medulares injetadas eram capazes de se diferenciar em miócitos no ambiente muscular. Quando ao invés de injetar as células medulares na lesão muscular os autores faziam um transplante da medula óssea geneticamente marcada para os camundongos imunodeficientes, havia uma migração das células medulares do animal doador para a área lesada no músculo esquelético do recipiente, demonstrando que, sob condições de injúria, células-tronco medulares adultas podem migrar para a região lesada e se diferenciar em músculo esquelético. Este trabalho estabeleceu duas novas idéias, a de que células-tronco de medula óssea podem dar origem a células musculares esqueléticas e a de que há migração das células medulares para regiões lesadas no músculo esquelético.

Em janeiro de 1999, cientistas liderados por Angelo Vescovi publicaram um trabalho no qual demonstrou-se que células-tronco neurais de camundongos adultos podem restaurar as células hematopoiéticas na medula óssea de camundongos que a tiveram destruída po r irradiaç ão2. Este trabalho represento u uma

verdadeira revoluç ão nos c onc eitos até então vigentes, pois demonstrou que uma célula-tronco adulta derivada de um tecido rec onhec ido por seu alto grau de diferenc iaç ão e limitada c apac idade proliferativa é c apaz de seguir um programa de diferenciação completamente diverso se colocada em um ambiente adequado. Demonstrou também que as células-tronco adultas não estão limitadas no seu potencial de diferenciação pela sua origem embriológica; as células neurais têm origem no ectoderma e as sanguíneas no mesoderma embrionário.

Ainda em 1 9 9 9 , um grupo de cientistas suecos demonstrou que células-tronco neurais de camundongos adultos tem um po tenc ial generalizado de diferenc iaç ão , po dendo fo rmar qualquer tipo celular, de músculo cardíaco a estômago, intestino, fígado e rim, quando injetadas em embriões de galinha e de camundongos3. A partir destes experimentos, consolidou-se a

(3)

celular do organismo, independente de seu tecido de origem, desde que cultivadas sob condições adequadas.

Esta pluripotencialidade das células-tronco adultas recoloca a questão da utilização terapêutica das células-tronco em bases totalmente novas. Não apenas nos vemos livres das questões étic o -religiosas que c erc am a utilizaç ão das c élulas-tronc o embrionárias na medic ina, mas também nos livramos dos problemas de rejeição imunológica ao podermos utilizar células-tronco do próprio paciente adulto na regeneração de tecidos ou órgãos lesados.

APLICAÇÕES DE TERAPIAS COM CÉLULAS- TRONCO EM CARDIOPATIAS

Como mencionado acima, a constatação da pluripotencialidade das células-tronco abriu novas possibilidades terapêuticas. Nas cardiopatias em particular, o avanço das terapias celulares foi fantástico. Em casos de infarto do miocárdio, a injeção de células-tronco obtidas de medula óssea nas bordas da área lesada pela isquemia induziu o reparo do mioc árdio lesado e c ausou a melhora funcional, inicialmente em estudos utilizando modelos animais6 12, e mais recentemente, em pacientes14 19 20. Nos trabalhos

experimentais, demonstrou-se que a melhora funcional estava associada a uma diminuição da área de fibrose, à formação de novos cardiomiócitos e a neovascularização6 12. O tratamento de

animais com hormônios celulares, tais como o G-CSF e o SCF, capazes de induzir a mobilização de células de medula óssea para a periferia, foi também capaz de diminuir as lesões causadas posteriormente por um processo isquêmico no miocárdio1 3.

Recentemente, a injeção direta de fatores de crescimento celular ( IGF-1 e HGF) em c oraç ões de ratos lesados por agressão isquêmic a, resultou em rec uperaç ão da funç ão c ardíac a e regeneraç ão c elular ( Nadal-Ginard: c omunic aç ão pessoal) , antevendo a possibilidade de terapias baseadas na simples injeção de fatores de estimulação e/ou crescimento celular.

Nossos estudos em modelos animais de cardiopatia isquêmica crônica demonstraram que células-tronco oriundas da medula óssea,

que são de fácil obtenção e que podem ser coletadas do próprio indivíduo a ser tratado ( transplante autólogo) , são eficazes no tratamento de insuficiência cardíaca de origem isquêmica, e indicaram um potencial da utilização desta terapia em outras cardiopatias11.

TRATAMENTO DA CARDIOPATIA CHAGÁSICA CRÔNICA COM CÉLULAS- TRONCO

A cardiopatia chagásica crônica, uma doença que afeta milhões de indivíduos na América Latina, é uma doença para a qual não há nenhum tratamento eficaz. Esta doença é caracterizada por uma resposta inflamatória que leva à destruição progressiva do miocárdio, resultando em cardiomegalia e insuficiência cardíaca c o nge stiva, le vando à mo r te do s indivíduo s7. Emb o r a o s

mec anismo s de pato gênese da do enç a ainda não estej am esclarecidos, a melhora da função cardíaca, como ocorre no reduzido número de pacientes que recebem transplante cardíaco, previne a acelerada evolução para o óbito. Portanto, uma terapia capaz de causar uma melhora da função cardíaca, e que seja mais accessível à população de cardiopatas chagásicos, em sua grande maioria de baixa renda, é de grande interesse.

Para testar a eficácia da terapia com células de medula óssea na cardiopatia chagásica, utilizamos o modelo experimental de camundongos isogênicos infectados pela cepa Colombiana de

Trypa no so m a cruzi. Células de medula óssea foram obtidas de c amundongos normais e injetadas por via endovenosa em camundongos com cardiopatia chagásica crônica1 8. O grau de

inflamação e de fibrose foi avaliado em vários períodos pós-transplante. Camundongos transplantados tiveram uma melhora significativa na miocardite dois meses após o transplante, resultante de um aumento de apoptose nas células do infiltrado inflamatório ( Figura 1 a) . Mais surpreendentemente, a fibrose existente no coração chagásico crônico diminuiu significativamente, indicando ser este um processo reversível ( Figura 1b) . Os efeitos da terapia com células de medula óssea foram duradouros, uma vez que o número de células inflamatórias e a área de fibrose permaneceram reduzidos até seis meses após o tratamento. Utilizando células de 4 0 0

3 5 0 3 0 0 2 5 0 2 0 0 1 5 0 1 0 0 5 0 0

3 0 dias pós-transplante

6 0 dias pós-transplante

c ontrole não transplantado

A

C él u la s in fl am at ó ri as .m m 2 5 0 4 0 3 0 2 0 1 0 0

3 0 dias pós-transplante

6 0 dias pós-transplante

c ontrole não transplantado % d e fi b ro se

B

Fi gu ra 1 - Re d u ç ã o d a f i b ro se e i n f la m a ç ã o n o m i o c á rd i o c h a gá si c o c rô n i c o a p ó s o tra n sp la n te d e c é lu la s d e m e d u la ó sse a . Gru p o s d e c a m u n d o n go s BALB/c c o m i n f e c ç ã o c rô n i c a ( 1 8 m e se s d e i n f e c ç ã o ) , n ã o tra ta d o s o u tra n sp la n ta d o s c o m c é lu la s d e m e d u la ó sse a si n gê n i c a s ( 2 x 1 07 c é lu la s p o r c a m u n d o n go ) f o ra m sa c ri f i c a d o s a p ó s 3 0 o u 6 0 d i a s d e tra n sp la n te . Se c ç õ e s d o c o ra ç ã o f o ra m p re p a ra d a s p a ra a va li a ç ã o

(4)

medula óssea obtidas de camundongos chagásicos crônicos, infe c tado s j untame nte c o m o s c amundo ngo s r e c e pto r e s, verificamos que estas células têm potencial semelhante de induzir a melhora da miocardite e diminuição de fibrose, sugerindo que o transplante autólogo de células de medula óssea em pacientes chagásicos poderia trazer resultados benéficos para estes pacientes. Com a utilizaç ão de c élulas de medula óssea obtidas de camundongos transgênicos para a proteína verde fluorescente ( EGFP) ou para

β

-galactosidase de Esche richia co li ( Gtrosa2 6 ) , pode-se rastrear o destino de células-tronco injetadas em animais tratados. Ao avaliar o c oraç ão de c amundongos c hagásic os c rônic os nos primeiros 1 5 dias após o transplante, pode-se verific ar a presenç a de c élulas transgênic as no mioc árdio, indic ando que parte destas c élulas migram para o c oraç ão ( Figura 2 ) . Algumas destas células apresentaram morfologia de cardiomiócito e expressão de miosina, indicando a diferenciação das células de medula óssea transplantadas neste tipo celular ( Figura 2 b) . No momento, estamos realizando experimentos para

verificar se esta melhora a nível histopatológico se correlaciona com uma melhora da função cardíaca dos animais tratados com transplante de células de medula óssea. Uma possível seqüência de eventos ocorridos no coração dos camundongos que receberam as células-tronco está resumida na Figura 3.

As causas da melhora da inflamação e da fibrose no modelo murino de cardiopatia chagásica após o transplante de células de medula óssea ainda não estão esclarecidas. O tratamento não causou alteração na carga parasitária, indicando que não há um efeito direto no parasita. É possível, no entanto, que a resposta imune que promove a cardiopatia chagásica seja modulada pelo transplante de células de medula óssea. A observação de apoptose nas células do exudato inflamatório dos camundongos chagásicos transplantados, assim como a duração prolongada do efeito dos transplantes ( até 6 meses após o transplante) são indicações de que as células transplantadas podem estar alterando a resposta agressora ao coração. De fato, um trabalho recente demonstrou a atividade supressora de células da medula óssea em respostas imunes8.

Os dados experimentais no modelo murino nos levaram a testar, pela primeira vez no mundo, o uso de terapia com células de medula óssea em pacientes com insuficiência cardíaca de etiologia chagásica, em colaboração com Hospital Santa Izabel,

Figura 2 - Cé lula s de m e dula ó sse a inje ta da s e m a nim a is c ha gá sic o s c rô nic o s m igra m pa ra o m io c á rdio infla m a do e se dife re nc ia m e m c a rd i o m i ó c i to s. a , Se c ç ã o d e c o ra ç ã o d e c a m u n d o n go C5 7 BL/ 6 c ha gá sic o c rô nic o 3 dia s a pó s o tra nspla nte de c é lula s de m e dula ó sse a de c a m undo ngo s tra nsgê nic o s pa ra

β

- Ga l. a , Se c ç ã o de c o ra ç ã o de c a m undo ngo C57BL/6 c ha gá sic o c rô nic o 15 dia s a pó s o tra nspla nte de c é lula s de m e dula ó sse a de c a m undo ngo s tra nsgê nic o s pa ra EGFP. Se c ç õ e s fo ra m c o ra da s ( e m ve rde ) c o m a nti-

β

- Ga l ( a ) o u a ntiGFP ( b ) e a ntim io sina ( e m ve rm e lho ) , se guido do c o ra nte nuc le a r Ho e c hst 33258, e visua liza da s e m m ic ro sc ó pio c o nfo c a l.

(5)

em Salvador, Bahia. Células de medula óssea são retiradas da crista ilíaca de pacientes chagásicos com insuficiência cardíaca graus III e IV da New York Heart Association, purificadas por centrifugação em gradiente de fico ll e injetadas lentamente através de um cateter nas coronárias. Os resultados iniciais demonstram que esta terapia é segura e exeqüível22. A eficácia deste tratamento está ainda sendo

avaliada, o que requererá o tratamento de um número maior de indivíduos e um acompanhamento mais prolongado.

Diferentemente da lesão crônica resultante da isquemia do miocárdio, onde há pouca inflamação e cuja área é focal, a c ardiopatia c hagásic a c rônic a apresenta intensa inflamaç ão difusa por todo o miocárdio. O tratamento de lesões isquêmicas crônicas com células de medula óssea mostrou-se eficaz quando estas foram injetadas nas bordas da lesão1 1 1 2. Na cardiopatia

chagásica, supomos que a resposta inflamatória persistente leve ao recrutamento das células de medula óssea transplantadas na periferia para o tec ido c ardíac o. A identific aç ão dos fatores capazes de recrutar as células de medula óssea para o miocárdio poderá abrir novas possibilidades de tratamento para esta e para outras cardiopatias onde tais fatores não sejam produzidos.

É bem claro que pouco se sabe sobre os mecanismos de regeneração por células-tronco nesta ou em outras doenças, como por exemplo qual o tipo de célula na população de medula óssea que tem efeito no tratamento da c ardio patia c hagásic a. A identificação da( s) população( ões) responsável( is) pela melhora da miocardite é de grande interesse para o entendimento dos mec anismos de regeneraç ão e para o desenvolvimento de estratégias mais refinadas de intervenção com células purificadas e/ou fatores celulares específicos. No entanto, uma vez que a injeção de células de medula óssea pouco purificadas ( somente em gradiente de fico ll) mostrou-se eficaz ao menos no modelo experimental, não se pode deixar de levar em conta o benefício potencial que a aplicação destas células pouco purificadas podem trazer aos pacientes que não têm nenhuma outra opção terapêutica que não seja o transplante cardíaco. A purificação de populações específicas certamente tornará o processo mais custoso, e não necessariamente mais eficiente.

A terapia com células de medula óssea não cura a doença de Chagas. Até onde observamos, não há alteração na carga parasitária ou na parasitemia dos animais tratados, indicando que ela não interfere na infecção pelo T. cruzi. Não se sabe também se esta terapia tem efeito na resposta imune agressora ao coração. Esta é uma terapia com a qual se tenta reparar os danos causados durante anos ou até décadas de agressão ao miocárdio, resultante da doença de Chagas. O que se espera é que estes indivíduos possam conviver com o parasita sem sintomatologia, como ocorre com a maioria dos indivíduos infectados pelo T. cruzi, na forma indeterminada da doença. A erradicação do parasita pelo tratamento com quimioterápicos é, portanto, uma meta desejada nestes indivíduos tratados com terapia celular, assim como em outros indivíduos infectados pelo T. cruzi. Neste cenário, ressalta-se o fato de que há mais de 25 anos não são produzidos novos fármacos com maior eficácia e menos efeitos colaterais do que as duas únicas drogas ainda utilizadas contra o T. cruzi ( benzonidazol e nifurtimox) . A melhoria de função cardíaca nos indivíduos tratados com terapia celular talvez possibilite até mesmo

a utilização das drogas já existentes, uma vez que devido à gravidade da doença e pela alta toxicidade dos medicamentos, em geral, a sua aplicação nem é recomendada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 . B e ltr ami AP, B ar luc c hi L, To r e lla D, B ak e r M, Limana F, Chime nti S, Kasahara H, Ro ta M, Musso E, Urbanek K, Leri A, Kaj stura J, Nadal-Ginard B , Anve r sa P. Adult c a r dia c ste m c e lls a r e m ultipo te nt a nd suppo r t myo c ardial regeneratio n. Cell 1 1 4 :7 6 3 -7 7 6 , 2 0 0 3 .

2 . B j o rnso n C R, Rietze RL, Reyno lds B , Magli MC, Vesc o vi AL. Turning brain into blo o d: a hemato po ietic fate ado pted by adult neural stem c ells i n vi vo. Sc ienc e 2 8 3 : 5 3 4 -5 3 7 , 1 9 9 9 .

3 . Clar ke DL, Jo hansso n C, Wilb er tz J, Ver ess B , Nilsso n E, Kar lstr ö m H, Lendahl U, Frisén J. Generalized potential of adult neural stem c ells. Sc ienc e 2 8 8 : 1 6 6 0 -1 6 6 3 , 2 0 0 0 .

4 . Evans MJ, Kaufman MH. Establishment in c ulture o f pluripo tential c ells

fro m mo use embryo s. Nature 2 9 2 : 1 5 4 -1 5 6 , 1 9 8 1 .

5 . Ferrari G, Cusella G, Angelis D, Co letta M, Pao luc c i E, Sto rnaiuo lo A, Co ssu G, Mavilio F. Musc le Regener atio n b y B o ne-Mar r o w Der ived Myo genic Pro genito rs. Sc ienc e 2 7 9 : 1 5 2 8 -1 5 3 0 , 1 9 9 8 .

6 . Jac kso n KA, Maj ka SM, Wang H, Po c ius J, Hartley CJ, Maj esky MW, Entman

ML, Mic hael LH, Hirsc hi KK, Goodell MA. Regeneration of isc hemic c ardiac musc le and vasc ular endo thelium by adult stem c ells. Jo urnal o f Clinic al Investigatio n 1 0 7 :1 3 9 5 -1 4 0 2 , 2 0 0 1 .

7 . Kö b e r le F. Chagas’ dise ase and Chagas’ syndr o m e s: the patho lo gy o f Americ an Trypano so miasis. Advanc es in Parasito lo gy 6 :6 3 -1 1 6 , 1 9 6 8 .

8 . Krampera M, Glennie S, Dyson J, Sc ott D, Laylor R, Simpson E, Dazzi F. B one

marrow mesenc hymal stem c ells inhibit the response of naïve and memory antige n-spe c ific T c e lls to the ir c o gnate pe ptide . B lo o d 1 0 1 : 3 7 2 2 -3 7 2 9 , 2 0 0 3 .

9 . Krause DS. Plastic ity o f marro wderived stem c ells. Gene Therapy 9 :7 5 4

-7 5 8 , 2 0 0 2 .

1 0 . Le r i A, Ka j stur a J , Anve r sa P. Myo c yte pr o life r a tio n a nd ve ntr ic ula r remo deling. Jo urnal o f Cardiac Failure 8 :5 1 8 -5 2 5 , 2 0 0 2 .

1 1 . Olivares EL, Ribeiro VP, Wernec k de Castro JP, Ribeiro KC, Matto s EC, Go ldenberg RC, Mill JG, Do hmann HF, do s Santo s RR, de Carvalho AC, Masuda MO. B o ne marro w stro mal c ells impro ve c ardiac perfo rmanc e in healed infarc ted rat hearts. Americ an Jo urnal o f Physio lo gy – Heart and Circ ulato ry Physio lo gy 2 8 7 :4 6 4 -4 7 0 , 2 0 0 4 .

1 2 . Orlic D, Kaj stura J, Chimenti S, Jako niuk I, Anderso n SM, Li B , Pic kel J, Mc Kay R, Nadal-Ginard B , B o dine DM, Leri A, Anversa P. B o ne marro w c ells regenerate infarc ted myo c ardium. Nature 4 1 0 :7 0 1 -7 0 5 , 2 0 0 1 .

1 3 . Orlic D, Kaj stura J, Chimenti S, Limana F, Jako niuk I, Quaini F, Nadal-Ginard B , B o dine DM, Leri A, Anversa P. Mo bilized bo ne marro w c ells repair the infarc ted heart, impro ving func tio n and survival. Pro c eedings o f the Natio nal Ac ademy o f Sc ienc e USA 9 8 :1 0 3 4 4 -1 0 3 4 9 , 2 0 0 1 .

1 4 . Perin EC, Dohmann HF, B orojevic R, Silva SA, Sousa AL, Mesquita CT, Rossi MI, Carvalho AC, Dutra HS, Dohmann HJ, Silva GV, B elem L, Vivac qua R, Rangel FO, Espo rc atte R, Geng YJ, Vaughn WK, Assad JA, Mesquita ET, Willerson JT. Transendoc ardial, autologous bone marrow c ell transplantation for severe, c hronic isc hemic heart failure. Circ ulation 1 0 7 :2 2 9 4 -2 3 0 2 , 2 0 0 3 .

1 5 . Pittenger MF, Mac kay AM, B ec k SC, Jaiswal RK, Do uglas R, Mo sc a JD, Mo o rman MA, Simo netti DW, Craig S, Marshak DR. Multilineage po tential o f adult human mesenc hymal stem c ells. Sc ienc e 2 8 4 :1 4 3 -1 4 7 , 1 9 9 9 .

1 6 . Quaini F, Urbanek K, B eltrami AP, Finato N, B eltrami CA, Nadal-Ginard B ,

Kaj stura J, Leri A, Anversa P. Chimerism o f the transplanted heart.New

England Jo urnal o f Medic ine 3 4 6 :5 -1 5 , 2 0 0 2 .

1 7 . Ro bertso n E, B radley A, Kuhen M, Evans, M. Germ-line transmissio n o f genes intro duc ed into c ultured pluripo tential c ells by retro viral vec to r. Nature 3 2 3 : 4 4 5 -4 4 8 , 1 9 8 6 .

(6)

heart tissue and reduc e myo c arditis in c hro nic c hagasic mic e. Americ an Jo urnal o f Patho lo gy 1 6 4 :4 4 1 -4 4 7 , 2 0 0 4 .

1 9 . Sta m m C, We s tph a l B , Kle in e HD, Pe tzs c h M, Kittn e r C, Klin ge H, Sc humic hen C, Nienaber CA, Fr eund M, Steinho ff G. Auto lo go us bo ne-mar r o w ste m-c e ll tr ansplantatio n fo r myo c ar dial r e ge ne r atio n. Lanc e t 3 6 1 :4 5 -4 6 , 2 0 0 3 .

2 0 . Strauer B E, B rehm M, Zeus T, Gattermann N, Hernandez A, So rg RV, Ko gler G, Wernet P. Intrac o ro nary, human auto lo go us stem c ell transplantatio n

fo r myo c ardial regeneratio n fo llo wing myo c ardial infarc tio n. Deutsc he Medizinisc he Wo c hensc hrift 1 2 6 :9 3 2 -9 3 8 , 2 0 0 1 .

2 1 . Turksen K. Embryonic Stem Cells: Methods and Protocols. In: Troy TC, Turksen K ( eds) Methods in Molecular Biology, Humana Press, volume 1 8 5 , 2 0 0 2 .

Referências

Documentos relacionados

3.3.3 As aulas serão ministradas conforme a ordem alfabética do nome dos candidatos aprovados na ETAPA 2 deste processo seletivo, a partir das 9 horas do dia 8 de junho de 2016

A logística tem um papel importante e quase que insubstituível no ambiente do recurso humano, na busca de profissionais capacitados, trazendo para a empresa a pessoa certa, na hora

O curso prima pelas áreas de estudo fundamentadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais, para a formação de professor da educação básica, constituindo-se de um

A busca pelo corpo ideal imposto pela mídia credita no aumento dos transtornos alimentares no meio esportivo, os desportistas da amostra apresentam alta prevalência ao

• Simulator baseado em eventos discretos direcionado para a pesquisa em redes.. • Iniciou como parte do projeto VINT (netweb.usc.edu/vint)

O objetivo foi possibilitar um trabalho que desenvolvesse aos alunos das escolas participantes do projeto a noção da importância de preservar e conservar o Rio Santa Maria,

Mantenha premido CALL MENU na unidade base ou telefone para ver o menu DSC Call (Chamada DSC).. Prima ENT para