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Ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos.

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Academic year: 2017

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PERSPECTIVA DO S DIREITO S HUMAN O S

FLA FLA FLA FLA

FLAVIA PIOVIA PIOVIA PIOVIA PIOVIA PIO VESANVESANVESANVESANVESAN

Faculdade de Direito e Programa de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

piovesan@ dialdata.com.br

RESUMO

O bjetiva o artigo desenvolver uma análise a respeito das ações afirmativas sob a perspectiva dos direitos humanos. Inicialmente, trata da concepção contemporânea de direitos huma-no s, intro duzida pe la D e claração Unive rsal de 1948, co m ê nfase na unive rsalidade , indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos. Em um segundo momento são apreciadas as ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos, com destaque dos valo -res da igualdade e diversidade. Por fim, são avaliadas as perspectivas e desafios para a imple-mentação da igualdade étnico -racial na ordem contemporânea.

AÇÃO AFIRMATIVA – DIREITO S HUMAN O S – DISCRIMIN AÇÃO RACIAL – IGUALDADE DE O PO RTUN IDADES

ABSTRACT

AFFIRMATIVE ACTIO N FRO M A HUMAN RIGHTS PERSPECTIVE. The article aims to develop an analysis on affirmative action from a human rights perspective. Initially, it deals with the contemporary conception of human rights, introduced by the Universal Declaration of 1948, stressing their universality, indivisibility, and interdependence. At a second stage, affirmative actio n is analyze d fro m a human rights pe rspe ctive , stre ssing the value s o f egalitarianism and diversity. Finally, the perspectives and challenges to implement ethnic-racial egalitarianism in the contemporary order are assessed.

AFFIRMATIVE ACTIO N – HUMAN RIGHTS – RACIAL DISCRIMIN ATIO N – EQ UAL O PPO RTUN ITIES

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Fo calizare i e ste te m a pe lo prism a jurídico , de stacando trê s re fle xõ e s ce n-trais: a co nce pção co nte m po râne a de dire ito s hum ano s, o m o do de co nce be r as açõ e s afirm ativas da pe rspe ctiva do s dire ito s hum ano s e as pe rspe ctivas e de safio s para a im ple m e ntação da igualdade é tnico racial na o rde m co nte m -po râne a.

A CON CEPÇÃO CON TEMPORÂN EA DE DIREITOS HUMAN OS

C o m o re ivindicaçõ e s m o rais, o s dire ito s hum ano s nasce m quando de -ve m e po de m nasce r. C o m o re alça N o rbe rto Bo bbio (1988), o s dire ito s hu-m ano s não nasce hu-m to do s de uhu-m a ve z ne hu-m de uhu-m a ve z po r to das. Para H annah Are ndt (1979), o s dire ito s hum ano s não são um dado , m as um co nstruído , um a inve nção humana e m co nstante pro ce sso de co nstrução e re co nstrução1. C o m

-põ e m um co nstruído axio ló gico , fruto da no ssa histó ria, de no sso passado , de no sso pre se nte , fundam e ntado e m um e spaço sim bó lico de luta e ação so cial. N o dize r de Jo aquin H e rre ra Flo re s, o s dire ito s hum ano s co m põ e m a no ssa racio nalidade de re sistê ncia, na m e dida e m que traduze m pro ce sso s que abre m e co nso lidam e spaço s de luta pe la dignidade hum ana. Re alçam , so bre tudo , a e spe rança de um ho rizo nte m o ral, pautado pe la gram ática da inclusão , re fle -tindo a platafo rm a e m ancipató ria de no sso te m po .

Ao ado tar o prism a histó rico , cabe re alçar que a D e claração de 1948 ino vo u e xtrao rdinariam e nte a gram ática do s dire ito s hum ano s, ao intro duzir a cham ada co nce pção co nte m po râne a de dire ito s hum ano s, m arcada pe la uni-ve rsalidade e indivisibilidade de sse s dire ito s. Uniuni-ve rsalidade po rque clam a pe la e xte nsão unive rsal do s dire ito s hum ano s, co m a cre nça de que a co ndição de pe sso a é o re quisito único para a titularidade de dire ito s, co nside rando o se r hum ano co m o e sse ncialm e nte m o ral, do tado de unicidade e xiste ncial e dignidade . Indivisibilidignidade po rque , ine ditam e nte , o catálo go do s dire ito s civis e po

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lítico s é co njugado ao catálo go do s dire ito s e co nô m ico s, so ciais e culturais. A D e claração de 1948 co m bina o discurso libe ral e o discurso so cial da cidada-nia, co njugando o valo r da libe rdade ao valo r da igualdade .

A partir da D e claração de 1948, co m e ça a de se nvo lve r-se o D ire ito Ite rnacio nal do s D ire ito s H um ano s, m e dianIte a ado ção de inúm e ro s instrum e n-to s inte rnacio nais de pro te ção . A D e claração de 1948 co nfe re lastro axio ló gico e unidade valo rativa a e sse cam po do D ire ito , co m ê nfase na unive rsalidade , indivisibilidade e inte rde pe ndê ncia do s dire ito s hum ano s.

O pro ce sso de unive rsalização do s dire ito s hum ano s pe rm itiu a fo rm a-ção de um siste m a inte rnacio nal de pro te a-ção de sse s dire ito s. Esse siste m a é inte grado po r tratado s inte rnacio nais de pro te ção que re fle te m , so bre tudo , a co nsciê ncia é tica co nte m po râne a co m partilhada pe lo s Estado s, na m e dida e m que invo cam o co nse nso inte rnacio nal ace rca de te m as ce ntrais do s dire ito s hum ano s, fixando parâm e tro s pro te tivo s m ínim o s. N e sse se ntido , cabe de s-tacar que até 2003 o Pacto Inte rnacio nal do s D ire ito s C ivis e Po lítico s co ntava co m 149 Estado sparte s, o Pacto Inte rnacio nal do s D ire ito s Eco nô m ico s, So -ciais e C ulturais co ntava co m 146 Estado s-parte s, a C o nve nção co ntra a To rtura co ntava co m 132 Estado sparte s, a C o nve nção so bre a Elim inação de To -das as Fo rm as de D iscrim inação Racial co ntava co m 1 6 7 Estado s-parte s, a C o nve nção so bre a Elim inação de To das as Fo rm as de D iscrim inação co ntra a Mulhe r co ntava co m 170 Estado s-parte s, e a C o nve nção so bre o s D ire ito s da C riança apre se ntava a m ais am pla ade são , co m 191 Estado s-parte s2. O e le

va-do núm e ro de Estava-do s-parte s de sse s tratava-do s sim bo liza o grau de co nse nso inte rnacio nal a re spe ito de te m as ce ntrais vo ltado s ao s dire ito s hum ano s.

Ao lado do siste m a no rm ativo glo bal, surge m o s siste m as re gio nais de pro te ção , que buscam inte rnacio nalizar o s dire ito s hum ano s no s plano s re gio -nais, particularm e nte na Euro pa, Am é rica e África. C o nso lida-se , assim , a co n-vivê ncia do siste m a glo bal da O rganização das N açõ e s U nidas – O N U – co m instrum e nto s do siste m a re gio nal, po r sua ve z, inte grado co m o siste m a am e -ricano , o e uro pe u e o af-ricano de pro te ção ao s dire ito s hum ano s.

O s siste m as glo bal e re gio nal não são dico tô m ico s, m as co m ple m e nta-re s. Inspirado s pe lo s valo nta-re s e princípio s da D e claração U nive rsal, co m põ e m o e spe ctro instrum e ntal de pro te ção do s dire ito s hum ano s no plano inte

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cio nal. N e ssa ó tica, o s dive rso s siste m as de pro te ção de dire ito s hum ano s inte rage m e m be ne fício do s indivíduo s pro te gido s. Ao ado tar o valo r da pri-m azia da pe sso a hupri-m ana, e sse s siste pri-m as co pri-m ple pri-m e ntapri-m -se , so pri-m ando -se ao siste m a nacio nal de pro te ção a fim de pro po rcio nar a m aio r e fe tividade po ssí-ve l na tute la e pro m o ção de dire ito s fundam e ntais. Este s são a ló gica e o co n-junto de princípio s pró prio s do D ire ito do s D ire ito s H um ano s.

AS AÇÕ ES AFIRMATIVAS DA PERSPECTIVA DOS DIREITOS HUMAN OS

C o m o já m e ncio nado , a partir da D e claração Unive rsal de 1948, co m e ça a de se nvo lve r-se o D ire ito Inte rnacio nal do s D ire ito s H um ano s, m e diante a ado ção de inúm e ro s tratado s inte rnacio nais vo ltado s à pro te ção de dire ito s fun-dam e ntais.

A prim e ira fase de pro te ção do s dire ito s hum ano s fo i m arcada pe la tô -nica da pro te ção ge ral, que e xpre ssava o te m o r da dife re nça (que no nazism o havia sido o rie ntada para o e xte rm ínio ) co m base na igualdade fo rm al. A título de e xe m plo , basta avaliar que m é o de stinatário da D e claração de 1948, be m co m o basta ate ntar para a C o nve nção para a Pre ve nção e Re pre ssão ao C ri-m e de G e no cídio , tari-m bé ri-m de 1948, que pune a ló gica da into le rância pautada na de struição do “o utro ” e m razão de sua nacio nalipautadade , e tnia, raça o u re -ligião .

To rna-se , co ntudo , insuficie nte tratar o indivíduo de fo rm a ge né rica, ge ral e abstrata. Faz-se ne ce ssária a e spe cificação do suje ito de dire ito , que passa a se r visto e m sua pe culiaridade e particularidade . N e ssa ó tica de te rm inado s suje ito s de dire ito o u de te rm inadas vio laçõ e s de dire ito s e xige m um a re spo sta e spe cífica e dife re nciada. Vale dize r, na e sfe ra inte rnacio nal, se um a prim e ira ve rte nte de instrum e nto s inte rnacio nais nasce co m a vo cação de pro po rcio -nar um a pro te ção ge ral, ge né rica e abstrata, re fle tindo o pró prio te m o r da di-fe re nça, pe rce be -se , po ste rio rm e nte , a ne ce ssidade de co ndi-fe rir a de te rm ina-do s grupo s um a pro te ção e spe cial e particularizada, e m face de sua pró pria vulne rabilidade . Isso significa que a dife re nça não m ais se ria utilizada para a ani-quilação de dire ito s, m as, ao re vé s, para sua pro m o ção .

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cu-liaridade s de sua co ndição so cial. Ao lado do dire ito à igualdade , surge tam bé m , co m o dire ito fundam e ntal, o dire ito à dife re nça. Im po rta o re spe ito à dife re n-ça e à dive rsidade , o que lhe s asse gura um tratam e nto e spe cial.

D e stacam -se , assim , trê s ve rte nte s no que tange à co nce pção da igual-dade : a. igualigual-dade fo rm al, re duzida à fó rm ula “to do s são iguais pe rante a le i” (que no se u te m po fo i crucial para a abo lição de privilé gio s); b. igualdade m a-te rial, co rre spo nde na-te ao ide al de justiça so cial e distributiva (igualdade o rie n-tada pe lo crité rio so cio e co nô m ico ); e c. igualdade m ate rial, co rre spo nde nte ao ide al de justiça co m o re co nhe cim e nto de ide ntidade s (igualdade o rie ntada pe lo s crité rio s gê ne ro , o rie ntação se xual, idade , raça, e tnia e de m ais crité rio s).

Para N ancy Frase r, a justiça e xige sim ultane am e nte re distribuição e re -co nhe cim e nto de ide ntidade s. C o m o ate sta a auto ra:

O re co nhe cim e nto não po de re duzirse à distribuição , po rque o status na so

-cie dade não de co rre sim ple sm e nte e m razão da classe . To m e m o s o e xe m plo

de um banque iro afro -am e ricano de Wall Stre e t, que não po de co nse guir um

táxi. N e ste caso , a injustiça da falta de re co nhe cim e nto te m po uco a ve r co m a

m á distribuição . [...] Re cipro cam e nte , a distribuição não po de re duzir-se ao

re co nhe cim e nto , po rque o ace sso ao s re curso s não de co rre sim ple sm e nte e m

razão de status. To m e m o s, co m o e xe m plo , um trabalhado r industrial e spe

ci-alizado , que fica de se m pre gado e m virtude do fe cham e nto da fábrica e m que

trabalha, e m vista de um a fusão co rpo rativa e spe culativa. N e sse caso , a

injusti-ça da m á distribuição te m po uco a ve r co m a falta de re co nhe cim e nto . [...]

Pro po nho de se nvo lve r o que cham o co nce pção bidim e nsio nal da justiça. Essa

co nce pção trata da re distribuição e do re co nhe cim e nto co m o pe rspe ctivas e

dim e nsõ e s distintas da justiça. Se m re duzir um a a o utra, abarca am bas e m algo

m ais am plo (2001, p.55-56).

H á, assim , o caráte r bidim e nsio nal da justiça: re distribuição so m ada ao re co nhe cim e nto . N o m e sm o se ntido , Bo ave ntura de So uza Santo s (2003) afir-m a que ape nas a e xigê ncia do re co nhe ciafir-m e nto e da re distribuição pe rafir-m ite a re alização da igualdade3. Ainda acre sce nta:

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...te m o s o dire ito a se r iguais quando a no ssa dife re nça no s infe rio riza; e te m o s

o dire ito a se r dife re nte s quando a no ssa igualdade no s de scaracte riza. D aí a

ne ce ssidade de um a igualdade que re co nhe ça as dife re nças e de um a dife re nça

que não pro duza, alim e nte o u re pro duza as de sigualdade s. (p.56)

É ne sse ce nário que as N açõ e s U nidas apro vam , e m 1965, a C o nve n-ção so bre a Elim inan-ção de To das as Fo rm as de D iscrim inan-ção Racial, ratificada ho je po r 167 Estado s, de ntre e le s o Brasil (de sde 1968).

D e sde se u pre âm bulo , e ssa C o nve nção assinala que qualque r “do utrina de supe rio ridade base ada e m dife re nças raciais é cie ntificam e nte falsa, m o ral-m e nte co nde náve l, so cialral-m e nte injusta e pe rigo sa, ine xistindo justificativa para a discriminação racial, e m te o ria o u prática, e m lugar algum”. Adicio na a urgê ncia de ado tar-se to das as m e didas ne ce ssárias para e lim inar a discrim inação racial e m to das as suas fo rm as e m anife staçõ e s e para pre ve nir e co m bate r do utri-nas e práticas racistas.

O artigo 1º da C o nve nção de fine a discrim inação racial co m o

...qualque r distinção , e xclusão , re strição o u pre fe rê ncia base ada e m raça, co r,

de sce ndê ncia o u o rige m nacio nal o u é tnica, que te nha o pro pó sito o u o e fe ito

de anular o u pre judicar o re co nhe cim e nto , go zo o u e xe rcício e m pé de

igual-dade do s dire ito s hum ano s e libe rigual-dade s fundam e ntais.

Vale dize r, a discrim inação significa to da distinção , e xclusão , re strição o u pre fe rê ncia que te nha po r o bje to o u re sultado pre judicar o u anular o e xe rcí-cio , e m igualdade de co ndiçõ e s, do s dire ito s hum ano s e libe rdade s fundam e n-tais no s campo s po lítico , e co nô mico , so cial, cultural e civil o u e m qualque r o utro cam po . Lo go , a discrim inação significa se m pre de sigualdade . Esta m e sm a ló gi-ca inspiro u a de finição de discrim inação co ntra a m ulhe r, quando da ado ção da C o nve nção so bre a Elim inação de To das as Fo rm as de D iscrim inação co ntra a Mulhe r pe la O N U , e m 1979.

A discrim inação o co rre quando so m o s tratado s co m o iguais e m situaçõ e s dife re nte s, e co m o dife re nte s e m situaçõ e s iguais.

C o m o e nfre ntar a pro ble m ática da discrim inação ?

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N a ve rte nte re pre ssiva punitiva, há a urgê ncia de e rradicar-se to das as fo rm as de discrim inação . O co m bate à discrim inação é m e dida fundam e ntal para que se garanta o ple no e xe rcício do s dire ito s civis e po lítico s, co m o tam -bé m do s dire ito s so ciais, e co nô m ico s e culturais.

Se o co m bate à discrim inação é m e dida e m e rge ncial à im ple m e ntação do dire ito à igualdade , po r si só é , to davia, m e dida insuficie nte . Vale dize r, é funda-m e ntal co njugar a ve rte nte re pre ssiva punitiva co funda-m a ve rte nte pro funda-m o cio nal.

Faz-se ne ce ssário co m binar a pro ibição da discrim inação co m po líticas co mpe nsató rias que ace le re m a igualdade e nquanto co mo pro ce sso . Isto é , para asse gurar a igualdade não basta ape nas pro ibir a discrim inação , m e diante le -gislação re pre ssiva. São e sse nciais as e straté gias pro m o cio nais capaze s de e s-tim ular a inse rção e inclusão de grupo s so cialm e nte vulne ráve is no s e spaço s so ciais. C o m e fe ito , a igualdade e a discrim inação pairam so b o binô m io inclu-são /e xcluinclu-são . Enquanto a igualdade pre ssupõ e fo rm as de incluinclu-são so cial, a dis-crim inação im plica vio le nta e xclusão e into le rância à dife re nça e à dive rsidade . O que se pe rce be é que a pro ibição da e xclusão , e m si m e sm a, não re sulta auto m aticam e nte na inclusão . Lo go , não é suficie nte pro ibir a e xclusão , quan-do o que se pre te nde é garantir a igualdade de fato , co m a e fe tiva inclusão so cial de grupo s que so fre ram e so fre m um co nsiste nte padrão de vio lê ncia e discri-m inação .

N e sse se ntido , co m o po de ro so instrum e nto de inclusão so cial, situam -se as açõ e s afirm ativas. Elas co nstitue m m e didas e spe ciais e te m po rárias que , buscando re m e diar um passado discrim inató rio , o bje tivam ace le rar o pro ce s-so co m o alcance da igualdade substantiva po r parte de grupo s vulne ráve is, co m o as m ino rias é tnicas e raciais e as m ulhe re s, e ntre o utro s grupo s.

As açõ e s afirm ativas, co m o po líticas co m pe nsató rias ado tadas para aliviar e re m e dialiviar as co ndiçõ e s re sultante s de um passado de discrim inação , cum -pre m um a finalidade pública de cisiva para o pro je to de m o crático : asse gurar a dive rsidade e a pluralidade so cial. C o nstitue m m e didas co ncre tas que viabilizam o dire ito à igualdade , co m a cre nça de que a igualdade de ve m o ldar-se no re s-pe ito à dife re nça e à dive rsidade . Po r m e io de las transita-se da igualdade fo r-m al para a igualdade r-m ate rial e substantiva.

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pro m o ve r sua asce nsão na so cie dade até um níve l de e quiparação co m o s de -mais. As açõ e s afirmativas co nstitue m me didas e spe ciais e te mpo rárias que , bus-cando re me diar um passado discriminató rio , o bje tivam ace le rar o pro ce sso co m o alcance da igualdade substantiva po r parte do s grupo s so cialm e nte vulne rá-ve is, co m o as m ino rias é tnicas e raciais, e ntre o utro s grupo s.

A C o nve nção so bre a Elim inação de To das as Fo rm as de D iscrim inação co ntra a Mulhe r tam bé m co nte m pla a po ssibilidade jurídica de uso das açõ e s afirm ativas, pe la qual o s Estado s po de m ado tam m e didas e spe ciais te m po rá-rias, visando a ace le rar o pro ce sso de igualização de status e ntre ho m e ns e m u-lhe re s. Tais m e didas ce ssarão quando alcançado o se u o bje tivo . São , po rtan-to , m e didas co m pe nsató rias para re m e diar as de svantage ns histó ricas, aliviando o passado discrim inató rio so frido pe lo grupo so cial e m que stão .

Q uanto ao prisma racial, importa destacar que o documento oficial brasilei-ro apresentado à Conferência das N ações Unidas contra o Racismo, em Durban, na África do Sul (31 de ago sto a 7 de se te mbro de 2001), de fe nde u, do me smo mo do , a ado ção de m e didas afirm ativas para a po pulação afro -de sce nde nte nas áre as de e ducação e trabalho . O do cum e nto pro pô s a ado ção de açõ e s afirm ativas para garantir o m aio r ace sso de afro -de sce nde nte s às unive rsida-de s públicas, be m co m o a utilização , e m licitaçõ e s públicas, rsida-de um crité rio rsida-de de se m pate que co nside re a pre se nça de afro -de sce nde nte s, ho m o sse xuais e m ulhe re s no quadro funcio nal das e m pre sas co nco rre nte s. A C o nfe rê ncia de D urban, e m suas re co m e ndaçõ e s, po ntualm e nte no s parágrafo s 107 e 108, e ndo ssa a im po rtância de o s Estado s ado tare m açõ e s afirm ativas para aque le s que fo ram vítim as de discrim inação racial, xe no fo bia e o utras fo rm as de into -le rância co rre latas.

N o D ire ito brasile iro , a C o nstituição Fe de ral de 1988 e stabe le ce im po r-tante s dispo sitivo s que de m arcam a busca da igualdade m ate rial, que transce nde a igualdade fo rm al. A título de re gistro , de staca-se o artigo 7º , inciso XX, que trata da pro te ção do m e rcado de trabalho da m ulhe r m e diante ince ntivo s e s-pe cífico s, be m co m o o artigo 37, inciso VII, que de te rm ina que a le i re se rvará pe rce ntual de cargo s e e m pre go s público s para as pe sso as po rtado ras de de fi-ciê ncia. Acre sce nte -se ainda a cham ada “Le i das C o tas”4 de 1995 (Le i n. 9.100/

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95), que o briga se jam re se rvado s às m ulhe re s ao m e no s 20% do s cargo s para as candidaturas às e le içõ e s m unicipais. Adicio ne -se tam bé m o Pro gram a N acio nal de D ire ito s H um ano s, que faz e xpre ssa alusão às po líticas co m pe nsató -rias, pre ve ndo co m o m e ta o de se nvo lvim e nto de açõ e s afirm ativas e m favo r de grupo s so cialm e nte vulne ráve is. So m e -se , ade m ais, o Pro gram a de Açõ e s Afirm ativas na Adm inistração Pública Fe de ral e a ado ção de co tas para afro -de sce n-de nte s e m unive rsida-de s – co m o é o caso da U nive rsida-de Estadual do Rio de Jane iro – UERJ –, da Unive rsidade do Estado da Bahia – Une b –, da Uni-ve rsidade de Brasília – U nB –, da U niUni-ve rsidade Fe de ral do Paraná – U FPR –, e ntre o utras.

O ra, se a raça e e tnia no país se m pre fo ram crité rio s utilizado s para e x-cluir o s afro -de sce nde nte s, que se jam ho je utilizado s para, ao re vé s, incluí-lo s. N a e sfe ra unive rsitária, po r e xe m plo , dado s do Instituto de Pe squisa Eco nô m ica Aplicada – Ipe a – re ve lam que m e no s de 2% do s e studante s afro -de sce n-de nte s e stão e m unive rsida-de s públicas o u privadas. Isso faz co m que as unive rsidade s se jam te rritó rio s branco s. N o te -se que a unive rsidade é um e spaço de po de r, já que o diplo ma po de se r um passapo rte para asce nsão so cial. É ne ce ssário de mo cratizar o po de r e , para isso , há que se de mo cratizar o ace sso ao po de r, vale dize r, o ace sso ao passapo rte unive rsitário .

Em um país e m que o s afro -de sce nde nte s são 64% do s po bre s e 69% do s indige nte s5, faz-se ne ce ssária a ado ção de açõ e s afirm ativas e m be ne fício

da po pulação afro -de sce nde nte , e m e spe cial nas áre as da e ducação e do tra-balho . Q uanto ao traballho , o “Mapa da Po pulação N e gra no Me rcado de Tra-balho ”, do cum e nto e labo rado pe lo Instituto Sindical Inte ram e ricano pe la Igual-dade Racial – Inspir –, e m co nvê nio co m o D e partam e nto Inte rsindical de Estatística e Estudo s Só cio -Eco nô m ico s – D ie e se –, e m 1999, de m o nstra que o (a) trabalhado r(a) afro de sce nde nte co nvive m ais inte nsam e nte co m o de se m -pre go , o cupa o s po sto s de trabalho m ais -pre cário s o u vulne ráve is e m re lação ao s não afro de sce nde nte s, te m m ais instabilidade no e m pre go , e stá m ais pre -se nte no “chão da fábrica” o u na ba-se da pro dução , apre -se nta níve is de instru-ção infe rio re s ao s do s trabalhado re s não afro -de sce nde nte s e po ssui uma jo rna-da de trabalho maio r do que a do trabalhado r não afro -de sce nde nte .

5. Segundo dados do Ipea, no Índice de Desenvolvimento Humano geral – IDH (2000), o Brasil ocupa o 74o lugar, mas no recorte étnico -racial, o IDH relativo à população afro -descendente

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É ne ce ssário ainda re co nhe ce r que a co m ple xa re alidade brasile ira tra-duz um alarm ante quadro de e xclusão so cial e discrim inação co m o te rm o s in-te rligado s a co m po r um ciclo vicio so e m que a e xclusão im plica discrim inação e a discrim inação im plica e xclusão .

N e sse ce nário , as açõ e s afirm ativas surge m co m o m e dida urge nte e ne ce ssária. Tais açõ e s e nco ntram am plo re spaldo jurídico , se ja na C o nstitui-ção (ao asse gurar a igualdade m ate rial, pre ve ndo açõ e s afirm ativas para o s grupo s so cialm e nte vulne ráve is), se ja no s tratado s inte rnacio nais ratificado s pe lo Brasil.

A e xpe riê ncia no D ire ito C o m parado (e m particular a do D ire ito no rte -am e ricano ) co m pro va que as açõ e s afirm ativas pro po rcio n-am m aio r igualda-de , na m e dida e m que asse guram m aio r po ssibilidaigualda-de igualda-de participação igualda-de gru-p o s so ciais vulne ráve is nas instituiçõ e s gru-p úb licas e gru-p rivad as. A re sgru-p e ito , a Platafo rm a de Ação de Be ijing de 1995 afirm a, e m se u parágrafo 187, que e m alguns paíse s a ado ção da ação afirm ativa te m garantido a re pre se ntação de 33,3% (o u m ais) de m ulhe re s e m cargo s da adm inistração nacio nal o u lo cal.

Isso significa que e ssas açõ e s co nstitue m re le vante s m e didas para a im -ple m e ntação do dire ito à igualdade . Faz-se , assim , e m e rge ncial a ado ção de açõ e s afirm ativas que pro m o vam m e didas co m pe nsató rias vo ltadas à co ncre -tização da igualdade racial.

PERSPECTIVAS E DESAFIOS PARA A IMPLEMEN TAÇÃO DA IGUALDADE ÉTN ICO -RACIAL N A O RDEM CO N TEMPO RÂN EA

A im ple m e ntação do dire ito à igualdade é tare fa fundam e ntal à qualque r pro je to de m o crático , já que e m últim a análise a de m o cracia significa a igualda-de no e xe rcício do s dire ito s civis, po lítico s, e co nô m ico s, so ciais e culturais. A busca de m o crática re que r fundam e ntalm e nte o e xe rcício e m igualdade de co ndiçõ e s do s dire ito s hum ano s e le m e ntare s.

Se a de m o cracia co nfunde -se co m a igualdade , a im ple m e ntação do di-re ito à igualdade , po r sua ve z, im põ e tanto o de safio de e lim inar to da e qual-que r fo rm a de discrim inação co m o o de safio de pro m o ve r a igualdade .

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-ple m e ntação do dire ito à igualdade . Re ite re -se que a C o nve nção so bre a Eli-m inação de To das as Fo rEli-m as de D iscriEli-m inação Racial, ratificada ho je po r Eli-m ais de 167 Estado s (de ntre e le s o Brasil), apo nta para a dupla ve rte nte : a re pre ssiva punitiva e a pro m o cio nal. Vale dize r, o s Estado sparte s assum e m não ape -nas o de ve r de ado tar me didas que pro íbam a discriminação racial, mas també m o de ve r de pro mo ve r a igualdade me diante a imple me ntação de me didas e spe -ciais e te mpo rárias que ace le re m o pro ce sso de co nstrução da igualdade racial. C o nside rando as e spe cificidade s do Brasil, que é o se gundo país do m undo co m o m aio r co ntinge nte po pulacio nal afro -de sce nde nte (4 5 % da po pulação brasile ira, pe rde ndo ape nas para a N igé ria), te ndo sido , co ntudo , o últim o país do m undo o cide ntal a abo lir a e scravidão , faz-se e m e rge ncial a ado ção de m e didas e ficaze s para ro m pe r co m o le gado de e xclusão é tnico -racial, que co m pro m e te não só a ple na vigê ncia do s dire ito s hum ano s, m as tam bé m a pró pria de m o cracia no país – so b pe na de te rm o s de m o cracia se m cidadania.

Se no início de ste te xto ace ntuava-se que o s dire ito s hum ano s não são um dado , m as um co nstruído , e nfatiza-se ago ra que a vio lação de sse s dire ito s tam bé m o é . O u se ja, as vio laçõ e s, as e xclusõ e s, as discrim inaçõ e s, as into le -râncias, o s racism o s, as injustiças raciais são um co nstruído histó rico a se r ur-ge nte m e nte de sco nstruído , se ndo e m e rur-ge ncial a ado ção de m e didas e ficaze s para ro m pe r co m o le gado de e xclusão é tnico -racial. H á que se e nfre ntar e s-sas am arras, m utilado ras do pro tago nism o , da cidadania e da dignidade da po pulação afro -de sce nde nte .

D e stacam -se , ne sse se ntido , as palavras de Abdias do N ascim e nto , ao apo ntar a ne ce ssidade da

...inclusão do po vo afro -brasile iro , um po vo que luta duram e nte há cinco sé

cu-lo s no país, de sde o s se us prim ó rdio s, e m favo r do s dire ito s hum ano s. É o

po vo cujo s dire ito s hum ano s fo ram m ais brutalm e nte agre dido s ao lo ngo da

histó ria do país: o po vo que durante sé culo s não m e re ce u ne m o re co nhe

ci-m e nto de sua pró pria co ndição huci-m ana.

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REFERÊN CIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Recebido em: outubro 2004

Referências

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