Post os comunit ários:
uma alt ernat iva para o sist ema de saúde
Co mmunity he alth ce nte rs:
an alte rnative fo r the he alth syste m
1 Posto de Saúde da Associação dos Moradores e Am igos do Bairro Barcellos. Travessa Flores 4, Favela da Rocin h a, Rio de Jan eiro, RJ 22451-000, Brasil.
João Clau d io Lara Fern an d es 1
João Gu erra d e Castro Mon teiro 1
Abst ract Reflectin g on th e cu rren t reorgan ization of th e relation sh ip betw een th e state an d civ-il society, th e h ealth care field is in volved in an in ten se d ebate over th e organ iz ation an d u se of govern m en t an d p riv at e h ealt h serv ices. Th e au t h ors p rop ose an alt ern at iv e, con sist in g of t h e im p lem en tation of p rim ary h ealth care clin ics, m an aged by local in stitu tion s an d fu n d ed by th e Un ified Health System . To su p p ort th is p rop osition , th ey rep ort on th e cu rren t exp erien ce at th e Rocin h a slu m in Rio d e Jan eiro, w h ere a com m u n ity h ealth cen ter w as bu ilt by th e n eigh borh ood association 12 years ago an d h as been m an aged by th e com m u n ity sin ce th en . Th e h osp ital refer-ral rate at th e clin ic, requ ests for laboratory tests, an d u se of p recrip tion s h ave been con sid erably lim ited , alth ou gh th ese services are available. Th ese low rates are attribu ted to th e p ossibility of closer social con trol by th e com m u n ity, as w ell as to th e geograp h ical featu res of th e cen ter, fa-v orin g a broa d er p ercep t ion of bot h h ea lt h p roblem s a n d t rea t m en t . In ord er t o p rofa-v id e m ore su bstan tial su p p ort to th e p rop osed cen ters, som e su ggestion s are p resen ted , lik e th e im p lem en -tation of d irect agreem en ts betw een th e govern m en t an d n eigh borh ood association s (n ot allow ed u n d er cu rren t legisla t ion ) a n d ex p a n d in g p ot en t ia l sou rces of fu n d in g for t h e h ea lt h cen t ers, cu rren tly restricted to govern m en t p rogram s.
Key words Prim ary Health Care; Con su m er Particip ation ; Health System ; Health Policy
Resumo Con sid eran d o a atu al con ju n tu ra d e reorgan iz ação d as relações en tre o Estad o e a so-cied ad e civil, os au tores p rop õem , p ara a área d a saú d e, u m a altern ativa in term ed iária en tre as p rop ostas estatizan tes e p rivatizan tes, qu e con siste n a organ ização d e p ostos d e saú d e gerid os p or en tid ad es locais e con ven iad os ao Sistem a Ún ico d e Saú d e. Para su sten tar esta p rop osição, é ap re-sen tad a a ex p eriên cia d ere-sen volvid a h á 12 an os n a favela d a Rocin h a, on d e u m a associação d e m orad ores con stru iu e ad m in istra u m serviço d e saú d e. É d estacad a a eficiên cia d o trabalh o, o qu e é atribu íd o a u m m aior con trole social sobre o serviço, bem com o às su as características geo-gráficas, qu e favorecem a u tilização d e abord agen s terap êu ticas d iversificad as. São ap resen tad as p rop ostas qu e visam a d ar u m a m aior su sten tação a esta altern ativa, com o a elaboração d e con -v ên ios d iret os com a ssocia ções d e m ora d ores, a t u a lm en t e im p ed id os p ela regu la m en t a çã o d o Min istério d a Saú d e, e a am p liação a estes p ostos d e algu n s critérios d e rem u n eração, ora restri-tos a in stitu ições govern am en tais.
Introdução
As p ro fu n d a s m u d a n ça s q u e vêm o co rren d o n as relações en tre o Estad o e a socied ad e civil ten d em a co n ferir u m a im p o rtâ n cia ca d a vez m aior às organ izações com u n itárias, n ão só n o n ível d a rep resen tação p olítica, com o tam b ém n o cam p o d a im p lem en tação e gestão d e servi-ço s lo ca is. Esta ten d ên cia , en treta n to, tem se m a n ifesta d o d e fo rm a a in d a b a sta n te restrita n o q u e se refere à á rea d a a ssistên cia à sa ú d e. Nesta, n ão ob stan te os avan ços ob tid os com a Con stitu ição d e 1988, a realid ad e vivid a n o co-tid ia n o d e m ilh õ es d e cid a d ã o s se ca ra cteriza p or filas, aten d im en to p recário e falta d e esp a-ços p articip ativos. Ad em ais, o em b ate p olítico-id eológico existen te n esta área tem tolítico-id o com o p ro ta go n ista s p rin cip a is o s se to re s gove rn a -m en tal e p rivad o, e é ain d a rara a ap resen tação d e a ltern a tiva s b a sea d a s n a cria çã o d e p a rce-ria s e u tiliza çã o d o p o ten cia l d o s o rga n ism o s com u n itários. Isto d ecorre, en tre ou tras razões, d o fa to d e q u e a q u eles seto res en co n tra m -se p oliticam en te m ais organ izad os, en qu an to qu e este ú ltim o, ao con trário, m ostra-se ain d a frá-gil, p rin cip alm en te n esta área esp ecífica. Não d evem os esqu ecer, aqu i, qu e a p rob lem ática d a assistên cia à saú d e recai b asicam en te sob re as cam ad as com m en or p od er d e in flu ên cia p olí-tica e, p o rta n to, n ã o a lca n ça a p ercep çã o d e tra n scen d ên cia d e o u tra s q u estõ es, co m o a vio lên cia , o m eio a m b ien te etc., q u e a tin gem segm en tos m a is a m p los e p olitica m en te m a is a rticu la d o s d a p o p u la çã o. Em fu n çã o d isto, é fo rço so reco n h ecer q u e, a in d a q u e a crise n o setor saú d e p ossu a u m certo esp aço n a m íd ia, o q u e vem a co n tecen d o, n a rea lid a d e, é u m p rocesso d e n orm alização d a d esassistên cia e d a m o rte p o r fa lta d e cu id a d o s d e sa ú d e a d e-qu ad os.
O p resen te tra b a lh o tem a in ten çã o d e in -cen tiva r este d eb a te, a tra vés d a a p resen ta çã o d e u m a exp eriên cia q u e vem sen d o d esen vol-vid a h á 12 a n o s n a fa vela d a Ro cin h a , em u m p osto d e saú d e con stru íd o p ela com u n id ad e e ad m in istrado p ela Associação de Moradores lo-cal. O acom p an h am en to deste p rocesso p erm i-te, agora, d efen d er seu p oten cial com o u m a al-tern ativa viável p ara a organ ização d a aten ção p rim ária à saú de em áreas u rban as, abrin do u m ca m in h o in term ed iá rio, en tre o seto r p ú b lico govern am en tal e o setor p rivad o, n a p restação d e assistên cia. Devem os, d esd e já, d eixar claro qu e a con trib u ição qu e esp eram os d ar com este estexto referese b asicam en este ao tip o d e con ceitu ação qu e estam os d an d o àqu ela exp eriên -cia, já qu e a existên -cia, em si, d e u m serviço co-m u n itá rio d e sa ú d e n ã o é u co-m fa to q u e ten h a ,
em ab solu to, qu alqu er origin alid ad e. Devem os assin alar, tam b ém , qu e estarem os u tilizan d o o term o “com u n id ad e” n o sen tid o d e u m a p op u -la çã o socia l e cu ltu ra lm en te id en tifica d a com b a se em u m d eterm in a d o esp a ço geo grá fico, en fatizan d o, em b ora d e m od o n ão exclu d en te, os segm en tos p op u lares u rb an os.
Para u m m elh or en ten d im en to d esta ap re-sen tação, p recisarem os ab ord ar, su cin tam en te, algu m as qu estões p relim in ares qu e con stitu em p rem issas b ásicas d e n ossa p rop osição.
Pobreza e cidadania
cio n a l esp ecífica , d e vin cu la çã o d ireta a o go vern o, n a p rim eira situ ação, e sem este vín cu -lo, n a segu n d a.
Tra ta -se, p o rta n to, d e b u sca r a ltern a tiva s d e form u lação, gestão e execu ção d e p olíticas so cia is q u e a p resen tem u m a m elh o r rela çã o en tre a eficiên cia e a eq ü id a d e, ro m p en d o -se com p ostu ras ap riorísticas qu e acab am n ão levan do em con sideração, afin al, o bem estar p ú -b lico, n o seu sen tid o m a is o-b jetivo. Exem p los d estas altern ativas já têm sid o exp erim en tad os em situ a çõ es d iversa s, a lgu m a s d ela s co m re-su lta d o s en co ra ja d o res, co m o é o ca so d a ex-p eriên cia d as cid ad es sau d áveis, d esen volvid a p rin cip alm en te n o Can ad á (Lacom b e & Poirier, 1992). Po d e-se d izer q u e u m a verten te co n sid erável sid o m ovim en to sid as ONGs situ ase tam -b ém n esta p ersp ectiva, -b em com o várias ações d e so lid a ried a d e so cia l q u e vêm su rgin d o em n osso p aís, qu e visam a resgatar o asp ecto p rop ositivo d a cid ad an ia n a realização d o d esen -volvim en to social.
Esta ten d ên cia , en treta n to, a ssim co m o o p róp rio con ceito d e cid ad an ia a ela associad o n ão são isen tos d e p rob lem as, p articu larm en te q u a n d o a va lia d os sob a ótica d a rela çã o en tre a s d iversa s ca m a d a s so cia is. Du a rte et a l. (1993), p or exem p lo, an alisam o qu e eles d en o-m in ao-m de “p rocesso de cidadan ização”, e fazeo-m u m p aralelo deste com o con ceito de p oder dis-cip lin ar d e Fou cau lt, referin d o a existên cia d e u m a am b igü id ad e en tre “a legitim id ad e d o d is-cu rso e dos p rojetos dos ‘in terven tores’ e a legitim id ad e d a p ercep ção e d o cotid ian o d a gran -de m aioria da p op u lação”. De fato, é p reciso re-con h ecer qu e a m aior p arte dos m ovim en tos de so lid a ried a d e a q u e n o s referim o s a n terio r-m en te, er-m b o ra a p resen ter-m u r-m a série d e a sp ecto s sp o sitivo s, têm co m o ca ra cterística co -m u -m o fato d e p erten cere-m a setores d a classe m éd ia u rb a n a , q u e se p ro p õ em a “leva r” à s classes p op u lares p rojetos de desen volvim en to, geralm en te idealizados e p lan ejados p or aqu ele m esm o setor social.
Acre d ita m o s, n o e n ta n to, q u e a d in â m ica d e in clu são social d eve p ressu p or n ão só o d i-reito d e a cesso a o s eq u ip a m en to s p ú b lico s, m as o recon h ecim en to d a cap acid ad e criativa, p rop ositiva e geren cial d as cam ad as p op u lares, qu e, aliás, é d em on strad a con tin u am en te, atra-vés d e in ú m eras in iciativas e m ovim en tos p ró-p rio s. Em fu n çã o d a ró-p ró ró-p ria ró-p reca ried a d e em q u e vive este segm en to, a m a io ria d esta s in i-cia tiva s n ã o é co n h ecid a , so b reviven d o co m gran d es d ificu ld ad es, o q u e p rovoca u m a p er-cep ção com u m d e qu e in existem e reforça u m a im a gem p a ssiva d a s co m u n id a d es p o b res, qu an d o n ão a d e “lu gares d e m argin ais”.
É p reciso, p o rta n to, a n a lisa r m a is critica -m en te este p rocesso d e reorgan ização social, e reco n h ecer a im p o rtâ n cia d a legitim a çã o d o p oten cial organ izativo com u n itário n a estru tu ração d e altern ativas p ara u m d esen volvim en -to m ais equ ilib rad o. Não se trata, aqu i, d e fazer q u a lq u er a p o lo gia id ea lista d este p o ten cia l, cu ja s fra gilid a d es sã o b a sta n te co n h ecid a s, p rin cip a lm en te n o q u e d iz resp eito à fa lta d e estru tu ra, p ou ca p articip ação, fraca d en sid ad e rep resen ta tiva etc., m a s d e a ssin a la r su a exis-tên cia, qu e p od erá se con verter em u m a m aior força con stru tiva, à p rop orção q u e seja p erce-b id o e valorizad o.
Part icipação comunit ária e polít icas públicas
Co n sid era n d o esta s co lo ca çõ es, p o d em o s ap rofu n d ar u m p ou co m ais o asp ecto esp ecífi-co d a p a rticip a çã o so cia l n a s p o lítica s p ú b li-ca s. Em p rim eiro lu ga r, d eve-se a d m itir q u e, em term o s gera is, existe a in d a u m n ível b a s-ta n te b a ixo d e p a rticip a çã o d a p o p u la çã o n a d iscu ssã o d esta s p o lítica s, o q u e p o d e ser ex-p licad o ex-p or u m a série d e fatores cu ltu rais, h istóricos e p olíticos q u e n ão cab e aq u i ap rofu n -d a r. En treta n to, ta m b ém é p reciso co n si-d era r q u e a s form a s p a rticip a tiva s d a s ca m a d a s p op u la res n ã o sã o, n ecessa ria m en te, sem elh a n -tes às d e ou tros segm en tos p op u lacion ais. Des-ta fo rm a , n a s fa vela s, p o r exem p lo, p o d e-se con statar a p articip ação d os m orad ores em d i-versas ativid ad es, com o jogos, com em orações, n as escolas d e sam b a, em m ovim en tos solid á-rios esp on tân eos etc., reflexos d e seu u n iverso d e cu ltu ra , in teresses e p o ssib ilid a d es, e q u e, in clu sive, em m u ita s o ca siõ es, su p era a m p la m en te a s exp er iên cia s d e o u tra s ca m a d a s so ciais. Deste p on to d e vista, o con ceito d e “p ou -ca p a rticip a çã o” m o stra -se im p reciso, e seria m a is a d eq u a d o a va lia r d e “q u a l p a rticip a çã o” estam os tratan d o. É p reciso, en tão, b u scar en -ten d er p or qu e o p rocesso d e d iscu ssão d as p o-líticas p ú b licas n ão tem atraíd o a p articip ação d o s seto res p o p u la res d a m esm a fo rm a o u n a m esm a in ten sid a d e q u e a q u ela s o u tra s q u es-tões.
e so b re o s q u a is se sin ta m co m p o d er d e in -flu en cia r e a d a p ta r à s su a s n ecessid a d es. O p rocesso p articip ativo, p ortan to, en volve rela-ções cu ltu rais e p olíticas, qu e são m u itas vezes ocu ltas p or trás d e u m a p reten sa com u n h ão d e in teresses. Por exem p lo, u m a vez q u e, n as d is-cu ssões sob re p olíticas p ú b licas, são colocad os asp ectos técn icos, cu jas esp ecificid ad es as p es-soas leigas sen tem d ificu ld ad e em en ten d er, e ten d o em vista q u e este tip o d e situ a çã o tra -d u z, n a p rática, a existên cia -d e in stân cias -d ife-ren cia d a s d e p o d er (em fu n çã o d o sa b er), a a d esã o d a p o p u la çã o a estes d eb a tes a ca b a ten d o u m ca rá ter m era m en te legitim a d or d a s p osições d os “ou tros” (técn icos, p olíticos etc.). Pa ra ilu stra r este a sp ecto, p od em os cita r u m a p esq u isa p a ra a va lia çã o d o Sistem a Ún ico d e Sa ú d e (SUS), rea liza d a em q u a tro m u n icíp io s d o Rio d e Jan eiro, on d e foi relatad a a d ificu ld ad e ad e p articip ação p op u lar n os Con selh os Mu -n icip a is d e Sa ú d e, em fu -n çã o d a li-n gu a gem restritiva u tilizad a p elos técn icos, n estes esp a-ços (IMS-UERJ, 1993). Alm eida e Cam p os (1988) tam b ém referem , em relação a estes con selh os, qu e “a eru d ição d e algu m as d iscu ssões d ificu l-ta sob rem an eira a em issão d e op in ião p or p ar-te d o s ‘leigo s’”. Po d em o s su p o r co m isto q u e em m u itos fóru n s d e d eb ate d e p olíticas p ú b lcas d eve ocorrer a h egem on ia d e u m d eterm i-n ad o tip o d e coi-n h ecim ei-n to, am p lam ei-n te legi-tim ad o socialm en te, e q u e con fere aos p artici-p a n tes n ã o d eten to res d este co n h ecim en to u m a p osição d esvan tajosa p oliticam en te. Esta situ a çã o lem b ra a im a gem sem p re a tu a l d e Pa u lo Freire (1975), d a s “va silh a s a serem en -ch id as”, qu e é com o são tratad as as p essoas co-m u n s, cu jo con h ecico-m en to e exp eriên cia d e vi-d a n ão são valorizavi-d os, p erm itin vi-d o, com isto, a m an u ten ção d e u m a d eterm in ad a h egem on ia p olítica. Deste p on to d e vista, a falta d e p artici-p ação social em algu n s esartici-p aços e m ovim en tos b em p od e ser in terp retad a com o u m ato d e sa-b ed oria p op u lar.
Qu erem o s, co m esta s reflexõ es, situ a r a q u estã o d a p a rticip a çã o co m u n itá ria a p a rtir d as relações d e p od er su b jacen tes aos d iversos p rojetos p ú b licos. Neste sen tid o, o d esen volvi-m en to d e volvi-m od elos organ izativos d e p restação d e ser viço s – n o n o sso ca so, d e a ssistên cia à sa ú d e –, n o s q u a is a p o p u la çã o ten h a u m p o -d er o b jetivo, p o -d e co n -d u zir a u m n ível sen sivelm en te m ais elevad o d e p articip ação e con -tro le so cia l, co n trib u in d o, d e sta fo rm a , p a ra u m p ad rão d e d esen volvim en to m ais su sten ta-d o e p ara a p róp ria eficiên cia e ata-d equ ação ta-d es-tes serviços.
At enção primária à saúde e organização do sist ema de saúde
Fo ca lizem o s a go ra , m a is esp ecifica m en te, o ca m p o d a a ssistên cia à sa ú d e. Um a p rim eira q u estão a ser ressaltad a refere-se ao p ap el or-d en a or-d o r or-d a Aten çã o Prim á ria à Sa ú or-d e (APS), em relação ao sistem a d e saú d e em geral. Este a sp ecto já tem sid o b a sta n te reco n h ecid o, e a cred ita m o s n ã o ser n ecessá rio n o s a lo n ga rm os aq u i. Ap en as p ara sin alizarrm os este p on -to, p od em os citar a Organ ização Pan am erican a d e Saú d e (1987), q u e p rop õe a APS com o u m a “estra tégia o u u m a p o lítica in tegra l d e sa ú d e q u e co m p reen d e e a feta to d a a p o p u la çã o e o Sistem a d e Sa ú d e em to d o s o s seu s n íveis”. Mais con vin cen te ain d a, n a n ossa op in ião, é o rela to co tid ia n o d e d ireto res d e h o sp ita is p ú -b licos, cron icam en te às voltas com excessos d e d em an d a, em b oa p arte resu ltan tes d e u m a in fraestru tu ra am b u latorial in ad equ ad a d o p on -to d e vista qu an titativo e qu alitativo.
Um estu d o realizad o n o Posto d e Saú d e d a Associação d os Morad ores e Am igos d o Bairro Barcellos (PS.AMABB), em 1986 – ép oca em qu e o p o sto co b ra va d o s m o ra d o res a s co n su lta s fo rn ecid a s –, m o stra va q u e 64% d a d em a n d a ao serviço era con stitu íd a p or b en eficiários d o INAMPS, co m d ireito à a ssistên cia gra tu ita (PS.AMABB, 1986). Estas p essoas, em b ora p o-b res, p referia m p a ga r p a ra o o-b ter u m a ten d i-m en to p ró xii-m o à s su a s ca sa s, feito d e fo ri-m a a ten cio sa p o r p ro fissio n a is co n h ecid o s. Co m este exem p lo, q u erem os frisar q u e os esforços racion alizad ores d a assistên cia h osp italar q u e se b aseiam n a n oção d e q u e a p op u lação d eve ser “en sin ad a” a p rocu rar os locais ad eq u ad os p a ra o a ten d im en to a m b u la to r ia l tra d u zem u m a p ostu ra p recon ceitu osa, qu e leva, d e fato, a u m a p o lítica d e rep ressã o d e d em a n d a e d e d esassistên cia, em virtu d e d a p recaried ad e d a red e extra -h o sp ita la r. O m esm o p o d e ser d ito d a s p ro p o sta s d e regio n a liza çã o d o a ten d i-m en to, q u an d o, igu ali-m en te, b asead as ei-m táti-cas rep ressivas. Além d e eticam en te p rob lem á-ticas, estas atitu d es são, u su alm en te, con d en ad as ao fracasso, já qu e a p op u lação, n u m a con -tín u a d em on stração d e criativid ad e, d esen vol-ve u m sem n ú m ero d e estratégias p ara d rib lar o s co n tro les in stitu cio n a is. Um a a b o rd a gem m ais coeren te d este p rob lem a d eve recon h ecer o efeito ord en ad or d a assistên cia extra-h osp i-ta la r e d efen d er a n ecessid a d e d e d esen vo lvm en to d este ca lvm p o a ssisten cia l co lvm o co n d ição d e p ossib ilid ad e d e o rga n iza çã o d o siste -m a d e saú d e e-m geral.
istori-cam en te, as p olíticas d e saú d e têm tid o com o u m a d e su as características p rin cip ais o in ves-tim en to n o esp aço h osp italar. Este fato, p or su a vez, p od e ser atrib u íd o, em p arte, à h egem on ia d e u m m od elo assisten cial b asead o n a d ou tri-n a flextri-n eriatri-n a (Novaes, 1990), q u e p rivilegiou a form ação m éd ica h osp italar, em d etrim en to d o en sin o am b u latorial e com u n itário. Por u m ou tro viés, o p róp rio d esen volvim en to ep iste -m ológico d a -m ed icin a ap resen ta u -m a in ter-re-lação d ireta com o esp aço h osp italar, com o n os d em on strou Fou cau lt (1987), o qu e p od eria exp lica r u m certo d esco n fo rto co m u m en te o b -ser va d o en tre o s p ro fissio n a is d e sa ú d e n a a tu a çã o a m b u la to ria l. Em b o ra n ã o p o ssa m o s ap rofu n d ar aq u i estas q u estões, q u erem os in d ica r q u e existe u m req u isito teó rico d iferen -cia d o n a p rá tica a m b u la to r ia l e co m u n itá ria , qu e d em an d a a associação d o referen cial fisio-p atológico a ou tros cam fisio-p os d e con h ecim en to, e cu ja au sên cia acab a levan d o os p rofission ais a u m a a tu a çã o freq ü en tem en te d esin teressa d a, in eficaz e m ed icalizad ora, fru to d e su a in -cap acid ad e d e relacion am en to d as qu eixas clín icas aos seu s coclín textos su b jaceclín tes (Ferclín aclín -d es, 1996).
A in existên cia d este esta tu to d iferen cia d o p ara a p rática m éd ica am b u latorial e com u n i-tária p od eria exp licar o fato d e q u e, en q u an to a á rea h o sp ita la r a p resen ta u m a certa u n ifo r-m id ad e er-m relação às su as referên cias teóricas e p roced im en tos técn icos, o qu e se ob serva n o ca m p o extra -h o sp ita la r é u m a m u ltip licid a d e d e d efin içõ es, d en o m in a çõ es e tip o s d e a tu a -ção. O p róp rio con ceito d e APS tem se p resta-d o a u m a série resta-d e a m b igü iresta-d a resta-d es, o ra sign ifi-can d o u m tip o d e assistên cia seletiva, voltad o a gru p os p op u lacion ais esp ecíficos, a p artir d e u m a o b ser va çã o ep id em io ló gica , o ra u m tip o d e assistên cia ad ap tad a, através d e tecn ologias sim p lificad as, às con d ições d os p aíses p ob res, ou d e p op u lações p ob res em geral. De u m m o-d o co eren te co m a s o b ser va çõ es q u e fizem o s até aqu i, d efen d em os a APS en qu an to u m cam -p o es-p ecífico d e atu ação, d o -p on to d e vista d os in stru m en tais teóricos u tilizad os, e d iretam en -te rela cio n a d o, co m o referem Rifkin & Wa lt (1986), à d efin ição d e “qu em con trola os in ves-tim en tos e resu ltad os d as ações d e saú d e, e ao tem p o rea listica m en te n ecessá rio p a ra o b ter estes resu ltad os”. Este con ceito tem sid o d en o-m in a d o d e a ten çã o p rio-m á ria co o-m p reen siva , e se refere a u m p rocesso on d e a p a rticip a çã o é in eren te ao p róp rio m étod o d e trab alh o, já qu e este lid a com situ ações m ais ab ran gen tes d a vid a, con h ecivid as p ela clien tela, qu e são con fron -ta d a s co m o in stru m en -ta l técn ico -cien tífico, d a í resu lta n d o p ro p o siçõ es tera p êu tica s q u e
p od em ab ran ger d iversos cam p os d o con h eci-m en to, tan to ao n ível in d ivid u al, q u an to cole-tivo.
Ap esar d o tratam en to su p erficial d ad o a es-tas q u estões, q u erem os, ao levan tá-las, sin ali-za r q u e n ã o b a sta a sim p les estru tu ra çã o d e ser viço s a m b u la to ria is, se esta n ã o fo r a co m -p an h ad a tam b ém -p or u m a reestru tu ração cogn itiva , d a s referêcogn cia s teó rica s d o s p ro fissio -n ais e-n volvid os. Cab e às u -n iversid ad es p rop or-cio n a r o s m eio s p a ra u m a fo rm a çã o técn ica m ais sistem ática, o qu e, p or su a vez, p od erá ser in cen tivad o a p artir d a am p liação d este m erca-d o erca-d e trab alh o.
Hist órico do post o de saúde
da Associação dos M oradores e Amigos do Bairro Barcellos (PS.AM ABB)
A fa vela d a Ro cin h a p o ssu i cerca d e cem m il h a b ita n tes, q u e d ivid em u m a á rea d e a p roxi-m ad aroxi-m en te 6 kroxi-m2. Ap esar d e estar situ ad a em u m a regiã o d e a lta co n cen tra çã o d e u n id a d es h o sp ita la res p ú b lica s (Zo n a Su l d o Rio d e Ja n eiro), su a p op u lação n ão d isp õe d e assistên -cia ad equ ad a em virtu d e d o estran gu lam en to e excesso d e d em an d a ob servad os n aqu elas u n i-d a i-d es. Isto fo i m a n ifesta i-d o o b jetiva m en te q u an d o, em 1982, a Associação d os Morad ores e Am igo s d o Ba irro Ba rcello s (AMABB), q u e con grega os m orad ores d e u m a p arte d a favela, realizou u m in q u érito p ara sab er as d em an d as p rioritárias d a com u n id ad e. A p rin cip al n eces-sid ad e ap on tad a, n esta ocasião, referia-se à as-sistên cia à sa ú d e. A Associa çã o, en tã o, ob teve u m fin an ciam en to extern o e ap oio d a p refeitu -ra, con stru in d o, em m u tirão, u m p equ en o p os-to d e saú d e, in au gu rad o em 1983. Nos p rim ei-ros an os, este p osto foi fin an ciad o p or en tid a-d es estra n geira s, o u co b ra ra m -se co n su lta s, p ro ced im en to s in ca p a zes d e a ssegu ra r a m a -n u te-n çã o d e u m a eq u ip e p ro fissio -n a l está vel. Em 1987, ob teve-se u m p rim eiro con vên io com o govern o (m od elo In am p s/ Filan tróp icas), em con ju n to com as Associações d e Morad ores d o Ch a p éu Ma n gu eira , situ a d a n o Lem e, e Sa n ta Marta, n o b airro d e Botafogo, as qu ais tam b ém p ossu íam p ostos d e saú d e.
Associa-ção se m ob ilizava n o sen tid o d e ob ter u m n ovo con vên io com o govern o, m ais b em estru tu rad o q u e o an terior, o q u e foi fin alm en te con se gu ido em ju n h o de 1994, tam bém através da in -term ed iação d e u m a en tid ad e filan tróp ica.
Est rut ura gerencial do PS.AM ABB
O p o sto é a d m in istra d o p ela d ireto ria d a AMABB, qu e é resp on sável p or tod a a ad m in istração d e recu rsos h u m an os, m ateriais e fin an -ceiro s. Este geren cia m en to é su p er visio n a d o p ela Co m issã o d e Sa ú d e, q u e se reú n e sem a -n alm e-n te e é ab erta a m orad ores, d iretores d a associação e técn icos. A Com issão avalia o fu n -cion am en to d o serviço, ap resen ta reclam ações e su gestõ es d a clien tela , a p rova a s p resta çõ es d e con tas feitas p ela d iretoria, além d e d efin ir e p la n eja r a s a çõ es d e sa ú d e a serem rea liza -d a s. Além -d esta , existe u m a reu n iã o sem a n a l d a eq u ip e técn ica , o n d e sã o a p ro fu n d a d a s a s q u estões su rgid as n a Com issão d e Saú d e e d e-lin ead os os asp ectos m etod ológicos d o trab a-lh o.
Esta estru tu ra fo i sen d o cria d a em fu n çã o d os ob stácu los qu e su rgiam n o serviço. Um d e-les refere-se às d ificu ld ad es n o relacion am en to en tre d iretores d a associação e técn icos, d ecor-ren tes em b oa p arte d o fen ôm en o d e in versão d os p ap éis sociais, p ois os p rofission ais p assvam a ter com o p atrões p essoas d e u m a cam a-d a h istoricam en te in ferior n a h ierarqu ia social. Po r o u tro la d o, verifico u -se a n ecessid a d e d e garan tir form as d e su sten tação p olítica e con -trole sob re a d iretoria, em virtu d e d e su a fragi-lid ad e in stitu cion al. Deste m od o, a criação d e u m m od elo geren cial b asead o em três esp aços in stitu cion ais d istin tos – d iretoria, eq u ip e téc-n ica, com issão d e saú d e –, regu lam etéc-n tad os p or u m regim en to in tern o, p assou a p erm itir u m a m elh o r m ed ia çã o d o s co n flito s e u m a p rá tica p articip ativa m ais d in âm ica.
Aspect os t écnicos do post o de saúde
O m o d elo a ssisten cia l d esen vo lvid o n o p o sto se fu n d a m en ta n o con ceito d e APS já a p on ta d o, e tem com o m eta garan tir u m aten d im en to in d ivid u al d e b oa qu alid ad e, ao m esm o tem -p o em qu e -p rocu ra d ar res-p ostas coletivas, n os casos n ecessários. Bu scase, assim , u m d istan -ciam en to en tre d u as con cep ções assisten cia is b a sta n te in flu en tes, q u e p ro p õ em u m a a ssis-tên cia m a ssifica d a e b a sea d a em in d ica d o res e p id e m io ló gico s, p a ra a p o p u la çã o p o b re, e u m a t e n d im e n t o re st r it a m e n t e in d ivid u a
liza d o e b asead o em u m raciocín io fisiop atoló -gico, p a ra a s ca m a d a s d e m a io r p o d er a q u isi-tivo.
O p osto oferece aten d im en to m éd ico (q u e in clu i a acu p u n tu ra e fitoterap ia), od on tológi-co, p sico ló gitológi-co, fo n o a u d io ló gico e fisiá tr ico (an tigin ástica) e a clien tela, em b ora ten h a q u e ch ega r b a sta n te ced o a o loca l p a ra ob ter u m a p rim eira con su lta, é su b seq ü en tem en te agen -d a-d a, com h ora m arca-d a. Os exam es lab oratoria is sã o co lh id o s n a u n id a d e e en via d o s d ia -ria m en te a o Ho sp ita l d a La go a (Min istério d a Sa ú d e), o b ten d o -se a m a io r ia d o s resu lta d o s em 24 h oras. Existem d iversos acord os com ou -tros serviços d a região p ara referên cia/ con tra-referên cia d e p acien tes, qu e fu n cion am d e for-m a irregu la r. A for-m a io ria d o s for-m ed ica for-m en to s p rescrito s é fo rn ecid a n a u n id a d e, a p a rtir d e u m co n vên io co m a Secreta ria Mu n icip a l d e Sa ú d e – RJ, q u e ta m b ém fo rn ece m a teria l d e con su m o e a lgu n s eq u ip a m en tos. Além d isso, o p osto receb e d iversas d oações, tan to d e m o-rad ores q u an to d e in stitu ições filan tróp icas e, em casos esp ecíficos, com o p esq u isas ou p ro-jetos esp eciais, é solicitad o fin an ciam en to ex-tern o.
Po r o u tro la d o, a p a rtir d e q u estõ es su rgi-d a s n a s co n su lta s o u n a co m issã o rgi-d e sa ú rgi-d e, são organ izad as cam p an h as e p rogram as ep id em iológicos, id irigiid os ao con ju n to id a com u -n id ad e. Cab e ressaltar qu e, em fu -n ção d o -n ível d e p articip ação existen te, estas ações são reali-za d a s co m rela tiva fa cilid a d e e efetivid a d e, a u m cu sto b a sta n te red u zid o. Pa ra d a r a lgu n s exem p lo s d esta s a çõ es, p o d em o s referir u m a cam p an h a p ara con trole d e u m su rto d e esca -b io se, q u e resu lto u em d o is m il tra ta m en to s, u m a va cin a çã o d e b lo q u eio d e sa ra m p o, e o Pro gra m a Co m u n itá rio d e Co n tro le d a AIDS, q u e se d esen vo lve h á cin co a n o s sem co n ta r com n en h u m recu rso esp ecífico.
Da m esm a form a qu e o trab alh o m éd ico, os d em ais serviços b u scam d esen volver u m p erfil esp ecífico d e aten d im en to e, assim , são con s-ta n tem en te in vestiga d a s a s p ecu lia rid a d es d a a ten çã o à sa ú d e m en ta l n esta á rea , o m esm o ocorren do em relação à odon tologia e ao trab a-lh o d e agen tes d e saú d e. Não p od erem os, aqu i, ap rofu n dar todos estes asp ectos, m as vale a p e-n a ressaltar qu e o p róp rio am b iee-n te d e au toe-n o-m ia e con trole socia l sob re o serviço, é u o-m fa-tor d e gran d e im p ortân cia p ara a avaliação d as m etod ologias p rop ostas, e elab oração d e n ovas form as d e atu ação. Qu erem os, com esta ob ser-va çã o, a p o n ta r a existên cia d e in ter-rela çõ es en tre o m od elo organ izativo n a APS e o m od elo assisten cial, as q u ais em ergem a p artir d o d iá-logo en tre o con h ecim en to teórico-cien tífico e o con h ecim en to, p oliticam en te legitim ad o, d as p essoas sob re su as con d ições d e vid a.
Principais obst áculos encont rados no t rabalho
Em rela çã o a o s vá rio s p ro b lem a s en fren ta d o s a o lo n go d estes a n o s, d esta ca m o s d o is, q u e con sid eram os m ais im p ortan tes n esta d iscu ssã o. O p rim eiro referese à q u estã o d o geren -cia m en to d a u n id a d e: d u ra n te vá rio s a n o s a Asso cia çã o d isp ô s d e u m a ca p a cid a d e a d m i-n istra tiva b a sta i-n te red u zid a , reflexo d e su a p róp ria fragilid ad e in stitu cion al, q u e p rovoca-va u m a série d e d eficiên cia s n o ser viço. Ao s p ou cos, com o fortalecim en to d a en tid ad e, em b o a p a rte resu lta n te d o p ro cesso d e crítica e su p orte realizad o p ela Com issão d e Saú d e, foi sen d o criad a u m a estru tu ra q u e tem sid o su fi-cien te p a ra a m a n u ten çã o d a u n id a d e, p a ra a o rga n iza çã o d a d o cu m e n ta çã o e xiste n te e d a con tab ilid ad e. Um ou tro asp ecto qu e teve b as-tan te in flu ên cia n a m elh oria d a cap acid ad e geren cial foi a p ossib ilid ad e d e rem u n eração in -d ireta -d e a lgu n s -d ireto res -d a a sso cia çã o, q u e p u d eram , assim , ter m ais d isp on ib ilid ad e p ara se d ed icarem a este trab alh o. Um a ou tra alter-n ativa levaalter-n tad a d u raalter-n te as avaliações sob re o fu n cion am en to d a Associação, con sid eran d o-se os con stra n gim en tos esta tu tá rios d a m a io-ria d estas en tid ad es, qu e p roíb em a rem u n era-çã o d e d ireto res, co n sistia n a co n tra ta era-çã o d e u m secretá rio -gera l, q u e teria a fu n çã o a d m n istrativa cotid ian a, p restan d o con tas p eriod i-cam en te à d iretoria.
Um segu n d o p rob lem a, q u e tem tid o b as-tan te evid ên cia atu alm en te, refere-se à relação d as en tid ad es com u n itárias com o tráfico d e drogas, cuja p resen ça e in fluên cia n estes grup os p op u lacion ais é p aten te. No caso d a AMABB,
em b ora ten h am ocorrid o m om en tos d e ten são, com algu m as ten tativas p or p arte d o tráfico d e in terferir n a Associação, a p róp ria existên cia d e u m tra b a lh o d e sa ú d e resp eita d o n a co m u n i-d a i-d e, b em co m o a su sten ta çã o p o lítica exis-t e n exis-t e, a p a rexis-t ir d a Co m issã o d e Sa ú d e, fo ra m su ficien tes p ara m an ter u m a p osição d e in d ep en d ên cia n a en tid ad e. Aqu i estam os u tilizan -d o o con ceito -d e in -d ep en -d ên cia -d e u m a form a restrita , n o sen tid o d e liga çõ es d ireta s co m o tráfico, já qu e existe u m asp ecto b em m ais su til e sign ifica tivo d esta q u estã o, q u e refere-se a o p ró p rio p o d er d e n o rm a tiza çã o q u e o trá fico d e d ro ga s p o ssu i n a s fa vela s, e q u e cria u m a verd a d eira cu ltu ra p a ra lela , situ a n d o a q u ela in stâ n cia en q u a n to a p r in cip a l referên cia so -cia l d os m ora d ores. Neste sen tid o, o p rocesso q u e tem os ob servad o n a Associação vem in d i-can d o o p rogressivo fortalecim en to d e u m a al-tern ativa ético-n orm ativa b asead a n o recu rso aos equ ip am en tos d e estad o e n a p reocu p ação em in co rp o ra r a s n o rm a s d a so cied a d e m a is geral, o q u e p assa, p or exem p lo, p ela regu lari-zação d os d iversos asp ectos legais d a en tid ad e. Este p ro cesso su gere q u e, d e u m m o d o m a is geral, a q u estão d o tráfico d e d rogas en q u an to referên cia n orm ativa se fortalece n a exata m e-d ie-d a e-d a au sên cia e-d e ou tras altern ativas p ara o d esen volvim en to p essoal e coletivo, e aq u i es-tam os n os referin d o n ão só aos asp ectos m ate-riais e econ ôm icos, m as tam b ém , e p rin cip al-m en te, aos asp ectos su b jetivos relacion ad os à p ercep ção d e cid ad an ia e ao m od o d e in serção e recon h ecim en to social d os m orad ores. Deste m o d o, a cred ita m o s q u e, à p ro p o rçã o q u e a s en tid ad es com u n itárias p assem a ter u m a res-p on sab ilid ad e m ais form al e ob jetiva n a im res-p le-m en tação d e p olíticas locais, elas en con trarão o in cen tivo su ficien te p a ra p ro m overem u m a certa con tracu ltu ra, em relação ao q u e tem si-d o ch a m a si-d o si-d e “lei si-d o m o rro” (Du a rte et a l., 1993).
Post os comunit ários de APS: uma alt ernat iva para a organização do sist ema de saúde?
tem u m con teú do terap êu tico. Tam bém p ara os p rofission ais, a atu ação d en tro d a com u n id ad e p erm ite u m a qu alidade diferen ciada de visu ali-zação d os agravos à saú d e, em relação a ou tras á rea s d e a tu a çã o, p o ssib ilita n d o u m a ten d i-m en to rico, d o p o n to d e vista técn ico, e u i-m a m a ior p ossib ilid a d e d e retorn o e a va lia çã o d e seu s p roced im en tos. Ain d a n o asp ecto técn ico, a p ossib ilid ad e d e u m a m aior in tegração en tre as ações “p reven tivas” e “cu rativas”, con textu a-lizad as em u m local d efin id o e su sten tad as p e-la p a rticip a çã o d os m ora d ores, cria u m m a ior p o ten cia l d e co n tro le so b re a s en ferm id a d es, atin gin d o n íveis m ais altos d e eficiên cia e efe-tivid a d e, q u a n d o co m p a ra d a s à s a çõ es seleti-vas d esen volvid as p or estím u los extern os.
Po r o u tro la d o, u n id a d es co m o a q u e d es-crevem os p od em ser estru tu rad as com b ase n o p róp rio in teresse e d isp osição d os m orad ores e d e su a s en tid a d es, sem a n ecessid a d e d e u m p lan ejam en to cen tralizad o. Aq u i, cab e assin a-la r q u e d ezen a s d e co m u n id a d es já p o ssu em in stalações d esativad as, ou q u e p od em ser fa -cilm en te ad ap tad as p ara a assistên cia à saú d e. Assim , trata-se ap en as d e estim u lar esta alter-n a tiva , q u e, a lém d e a tealter-n d er à s d em a alter-n d a s sa-n itárias locais, p ossib ilita o fortalecim esa-n to d a au ton om ia e o d esen volvim en to com u n itário. Além d isso, ten d o em vista qu e estas en tid ad es n ã o têm fin s lu cra tivo s, p o d e-se esp era r u m a m a io r in versã o d o s recu rso s o b tid o s em m e -lh orias d o serviço ou d a p róp ria com u n id ad e. Esta ú ltim a afirm ação tem com o p ressu p osto a p ossib ilid ad e d e u m m aior con trole social so-b re o traso-b alh o, d ecorren te d e su as p róp rias ca-racterísticas locais, e, p articu larm en te, n a m e-d ie-d a em q u e a s en tie-d a e-d es resp o n sá veis p o s-su am u m caráter eletivo.
Um a ou tra q u estã o refere-se à situ a çã o d e violên cia vivid a atu alm en te n o in terior d as co-m u n id a d es, o q u e p o d eria rep resen ta r u co-m fa-tor lim itad or ao d esen volvim en to d a p rop osta. De fato, esta é u m a situ ação ob jetiva, e existem algu n s exem p los d e trab alh os qu e foram in via-b iliza d o s p o r este m o tivo. Pa ra a via-b o rd a r este p rob lem a, é n ecessário, em p rim eiro lu gar, re-con h ecer a n ecessid ad e d e avaliação p révia d a localização d as u n id ad es, p or p arte d as en tid a-d es resp o n sá veis, evita n a-d o -se a u tiliza çã o a-d e esp a ço s situ a d o s em á rea s vio len ta s. Em se -gu n d o, é p reciso ter claro qu e esta situ ação n ão é u n iform e, e existem d iversas com u n id ad es – n a verd ad e, a m aioria d elas – q u e ap en as raram en te con viveraram coraram raram oraram en tos d e raram aior ten -são, o q u e, aliás, é atu alm en te u m a caracterís-tica u rb a n a gera l. Po r ú ltim o, ca b e rea firm a r n ossa op in ião d e qu e é exatam en te a p ossib ili-d aili-d e ili-d e alcan çar u m a p osição social ili-d e m aior
p ro gre sso, re co n h e cim e n to e cid a d a n ia , u m d os fatores cru ciais p ara u m a red u ção su sten -tad a d o p erfil d e violên cia ora ob servad o.
Algumas propost as específicas para uma melhor est rut uração dos post os de APS
Ap re se n ta m o s, a go ra , a lgu m a s p ro p o sta s d e caráter p rático, qu e p od erão facilitar sign ifica -tivam en te a estru tu ração d e p ostos com u n itá-rios, sob a p ersp ectiva d e con vên io com o SUS, evitan d o-se, com isto, u m a b oa p arte d os p ro-b lem a s q u e fo ra m , o u a in d a sã o, en fren ta d o s n o Posto d a AMABB. Um a p rim eira qu estão re-fere-se à im p ortâ n cia d o a p oio à in form a tizaçã o d esta s u n id a d es, q u e fa cilita rá en o rm e -m en te tan to a avaliação técn ica, q u an to a ela-b oração d e fatu ras e ad m in istração con táela-b il d o serviço. Seria con ven ien te, n este sen tid o, o su -p orte -p ara a aq u isição d e eq u i-p am en tos, b em co m o p a ra o d esen vo lvim en to d e p ro gra m a s (softw ares) esp ecíficos, o q u e p od eria ser con -segu id o a tra vés d a in icia tiva p riva d a , o u d o p róp rio govern o.
Do p on to d e vista d o fin an ciam en to, as d i-ficu ld ad es en con trad as p ara a su sten tação d o trab alh o são as m esm as q u e, atu alm en te, tod a a red e con ven iad a ao SUS viven cia, isto é, a d e-fa sa gem n a rem u n era çã o d os p roced im en tos. Para m in orar os efeitos d esta situ ação, e con sid eran sid o os asp ectos sociais e assisten ciais en -vo lvid o s n a p ro p o sta , su gerim o s a s segu in tes m od ificações n a rem u n eração d os serviços: • In clu são d os cód igos d a tab ela SIA/ SUS d o gru p o AVEIANM, atu alm en te restritos ao servi-ço p ú b lico.
• Exten sã o d o s có d igo s 045-0 (co n su lta m éd ica éd iferen ciaéd a) e 0272 (p rogram a éd e agen -tes co m u n itá rio s d o Min istério d a Sa ú d e) a o s p ostos d e APS.
O p rim eiro item referese a to d o u m co n -ju n to d e p roced im en tos ligad o às p ráticas p re-ven tiva s e d e ed u ca çã o em sa ú d e, q u e a tu a lm en te en co n tra lm se vin cu la d o s exclu siva m en te a in stitu ições govern am en tais. O segu n -d o ab ran ge critérios esp ecíficos -d e rem u n era-ção d e serviços m éd icos execu tad os em regiões d e p o u ca co n cen tra çã o d estes p ro fissio n a is, co m o p eq u en a s cid a d es e á rea s ru ra is, e a s ações realizad as d en tro d e u m p rogram a d e ex-ten sã o d e co b ertu ra a ssisex-ten cia l b a sea d o n a atu ação d e agen tes d e saú d e, p atrocin ad o p elo Min istério d a Saú d e.
m orad ores, à sem elh an ça d o q u e já ocorre em relação a sin d icatos, coop erativas, clín icas p ri-vad as, p refeitu ras, u n iversid ad es, en tid ad es fi-lan tróp icas etc. Esta m ed id a, q u e n os p arece bastan te sim p les do p on to de vista técn ico-ju rídico, evitará um a série de in con ven ien tes oriun -d os -d a in term e-d iação -d os con vên ios p or en ti-dades filan tróp icas, com o o p agam en to de taxas d e ad m in istração e a falta d e au ton om ia even -tu alm en te gerad a p ela d ep en d ên cia form al d as associações d e m orad ores em relação àq u elas en tid ad es. Esta m ed id a sign ificará, tam b ém , o recon h ecim en to, p or p arte d o Estad o, d a legiti-m id ad e e ilegiti-m p ortân cia social d as en tid ad es re-p resen tativas d a com u n id ad e, e d e seu lu gar n a con stru ção e d em ocratização d a cid ad an ia.
Conclusão
A altern ativa qu e p rop u sem os n este texto con -cilia u m a série d e fa to res q u e fa zem p a rte d o atu al d eb ate sob re p olíticas p ú b licas, b em com o d as asp irações d e acom p los setores d a p op u -la çã o : m elh o r a ssistên cia à sa ú d e, reco n h eci-m en to d a cid ad an ia (p articu lareci-m en te d o d irei-to a id éia s e in icia tiva s), d esen volvim en irei-to
so-cial, p articip ação p olítica. Talvez, m ais d o q u e ap resen tar u m a p rop osta, b u squ em os d ar visi-b ilid ad e a u m a ten d ên cia qu e, acred itam os, irá se fortalecer, à m ed id a qu e as en tid ad es com u -n itárias tom em co-n h ecim e-n to d esta p ossib ili-d aili-d e, e tam b ém ili-d eviili-d o ao fato ili-d e qu e esta n ão n ecessita , a p riori,d e n en h u m a estra tégia es-p ecia l q u e en vo lva recu rso s o u a es-p o io es-p o lítico esp ecífico s. Certa m en te, a a ssin a tu ra d e co n -vên ios terá qu e con tar com a sen sib ilid ad e d os Secretários Mu n icip ais d e Saú d e, m as acred ita-m o s q u e a p ressã o d a s co ita-m u n id a d es, o u , p o r o u tro la d o, a a tra en te p o ssib ilid a d e d e a p o io p o lítico fu tu ro, serã o fa to res su ficien tes p a ra ob ter esta colab oração.
En tretan to, u m a série d e m ed id as p od e ser to m a d a p a ra in cen tiva r esta ten d ên cia , co m o exp u sem os ao lon go d este trab alh o. Cab erá ao Min istério d a Saú d e avaliar as con d ições p ara fa cilita r a ela b o ra çã o e fin a n cia m en to d estes con vên ios; cab erá às u n iversid ad es a form u la-çã o d e m o d elo s fo rm a tivo s a d a p ta d o s a estes serviços. Fin alm en te, será com p etên cia n ossa, p rofission a is d e sa ú d e, recon h ecer q u e p reci-sam os d as in iciativas e d a cap acid ad e criativa d a p op u lação p ara solu cion arm os os crôn icos p rob lem as d e tod os n ós.
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