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Discurso lexicográfico: as reedições do Dicionário da língua portuguesa de Morais

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DISCURSO LEXICOGRÁFICO: A S REEDIÇÕES DO

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DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA

D E M O RA IS

Jo sé Ho rta NUNES1 Kátia SELIGM A N2

• RESUMO: Este artig o ap resenta um a análise d iscursiv a de um a amo strag em d e v erbetes d a

p rim eira ed ição e d e algumas das reed içõ es do

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Dicionário da língua portuguesa, d e A ntó nio de M o rais Silva (1789,1813,1831,1844,1858,1877,1889).3 A p ersp ectiv a teó rica é a d a A

ná-lise d o Discurso d e linha francesa, aliad a ao camp o d a Histó ria das Id éias Ling üísticas. O

corpus é fo rmad o d e v erbetes dos d o mínio s d e no mes d e árvo res, no mes d e animais, no mes de p artes d o co rpo , d esig naç õ es so ciais, verbo s d e estad o e m o v im ento e v erbo s d e aç õ es so ciais. M o stramo s as transfo rmaçõ es no d iscurso , as rup turas, os d eslo camento s d e sentid o de u m a ed ição a o utra, exp licitand o a histo ricid ad e d as d efiniçõ es e a co nfig uração d as for-m açõ es d iscursiv as.

• PA LA V RA SCH A V E: A nálise d o d iscurso ; d icio nário ; d efinição ; lexico g rafia; língua p o rtu -guesa.

Este artig o abo rd a o d icio nário co mo u m o bjeto d isc u rsiv o .4 O o bjetiv o é analisar a p rimeira ed ição e as reed içõ es do Dicionário da língua portuguesa, de A ntó nio de Mo rais Silva. Trata-se do p rim eiro mo no língüe do p o rtug uês, o mais utiliz ad o d urante o século XIX, que tev e sua Ia ed ição em 1789 e co nto u co m o ito reed içõ es (1813,1823, 1831, 1844, 1858, 1877, 1889, [19-?] ) ,5 tend o o auto r p articip ad o até a 3a ed ição . Na análise, co nsid eraremo s também a ed ição de Silva (1949). O d icio nário de M o rais p ro -põe realizar, em 1789, uma red ução do d icio nário de Bluteau (1712), o que de fato o co

r1 Docente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários, IbilceUNESP r15054000 São Jo sé do Rio Preto -SP - Brasil. Endereço eletrônico: hortaeiev.ibilce.unesp.br.

2 Graduanda de Letras no Ibilce-UNESP -15054-000 - São Jo sé do Rio Preto - SP - Brasil. Endereço eletrônico: katiaseligman@yahoo.com.

3 Visto que não localizamos a edição de 1823 e a 9.ed. [19-?], elas não foram analisadas.

4 Este artigo fo i concebido com base em um trabalho de Iniciação Científica realizado por Kátia Seligman com apoio da Fapesp (processo n.01-10546-3), relacionado ao projeto Dicionários Brasileiros de Língua Portuguesa do Século XX:

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re, quand o o auto r (SILVA, 1789) reduz a do is vo lumes os o ito de Bluteau, p erm itind o uma circulação mais ampla, inclusiv e nas escolas, Esse, como ap o nta Verd elho (2002), é u m do s mo tiv o s de seu sucesso ed ito rial. Co nsid erem-se também as m ud anças na fo rma da d efinição , que d eixa de apresentar os co mentário s etimo ló gico s e enciclo p é-d ico s é-de Bluteau (1712) e passa a mo strar fo rmulaçõ es breves, características é-de u m d icio nário de língua,

A p ersp ectiv a teó rica ad o tad a é a da A nálise do Discurso , inaug urad a na França por Pêcheux (1990) e tal co mo trabalhad a no Brasil por O rland i (1999). Dessa perspec-tiva, pro cura-se co mpreend er a língua fazendo sentid o , enquanto trabalho simbó lico , parte do trabalho so cial geral, co nstitutiv o do ho mem e da sua histó ria. A A nálise do Discurso co ncebe a ling uag em co mo med iação entre o ho m em e a realid ad e natural e so cial, por meio do d iscurso .

Seg uind o alguns trabalho s em A nálise do Discurso (COLLIN OT; MA Z 1ÈRE, 1997; DELESSA LE; VA LEN SI, 2002; NUNES, 1996) e em Histó ria das Id éias Ling üísticas (A UROUX, 1992; A UROUX; MA Z IÈRE; O RLA N DI, 1998), co nsid eramo s o d icio -nário co mo u m o bjeto histó rico e d iscursiv o . Dessa p ersp ectiv a, realiza-se um a críti-ca à transp arência das d efiniçõ es e ao sentid o literal, p o is co nsid era-se que os sentid o s do d icio nário co nstituemse histo ricamente. Tanto as d efiniçõ es do d icio -nário co mo os sujeito s que as p ro d uz em (as p o siçõ es de sujeito dos lexicó grafo s) ap arecem em d eterminad o s co ntexto s histó rico s. A análise d iscursiv a v isa relacio -nar a sup erfície textual d o d icio nário (as seq ü ênc ias textuais ling u istic am ente reali-zadas) co m sua exterio rid ad e, isto é, co m suas co nd içõ es de pro d ução , incluind o -se aí o co ntexto enunciativ o e o co ntexto mais amp lo , o u seja, a co njuntura só cio histó -rica de um perío do . Objetiv a-se, desse mo d o , co mp reend er o pro cesso de p ro d ução dos sentid o s, relacio ná-lo s co m a id eo lo gia e mo strar as reg ularid ad es do funcio na-m ento do d iscurso .

A s reed içõ es do dicio nário de Mo rais (SILVA, 1789) ap resentam mud anças sig ni-ficativ as, so bretud o em algumas ed içõ es. Nesses mo mento s o co rrem transfo rmaçõ es sig nificativ as, as quais estão relacio nad as co m mud anças histó ricas que afetam a or-d em or-do or-d iscurso . Exp licitaremo s os or-d eslo camento s or-d iscursiv o s p ro or-d uzior-d o s nessas cir-cunstâncias, o ap arecimento e as transfo rmaçõ es de certas fo rmaçõ es d iscursiv as (re-ligio sa, po lítica, científica, juríd ica), as mud anças na estrutura dos verbetes e o mo d o de sig nificação dos d o mínio s lexicais em questão .

O

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corpus de base d esta pesquisa reuniu 240 verbetes relativo s a seis d o mínio s le-xicais. Para cada u m desses domínios, selecio namo s cinco entradas, as quais fo ram co-letadas em to das as ed içõ es mencio nad as. Os domínios e as entradas são os seguintes:

N o m es de an i m ai s

N o m es de árv o re s

N o m es de p artes do

corpo

D e s i g n açõ e s so ciais

V erb o s de estado/ m o v i m e n to

V erb o s de açõ e s s o ci ai s Cachorro Castanheira Perna Habitante Ser Conquistar

Gato Mangueira Orelha Proletário Estar Emprestar

Tigre Paineira Nariz (i)migrante Permanecer Doar Urso Pinheiro Tornozelo População Andar Reivindicar

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Neste artigo , vamo s apresentar as análises de seis séries de v erbetes, cad a um a

delas co rresp o nd ente a um a entrad a de cada do mínio , a saber:

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castanheiro, urso, tor-nozelo, povo, ser, doar. N a série de verbo s de estado , incluiremo s tam bém o verbo

permanecer.

Definição, interdiscurso, formação discursiva

Para a análise d o d icio nário co mo u m objeto d iscursiv o , utiliz amo s os p ro ced i-mentos meto d o ló gico s d esenvo lvid o s por Co llino t & Mazière (1997). Estes auto res mo stram que a hetero geneid ad e das d efiniçõ es faz sentid o : as v ariaçõ es das fo rmas lingüísticas (sintáticas e enunciativ as) d o enunciad o d efinid o r p ro d uz em d iferentes discurso s. O co njunto d e verbetes selecio nad o s co nstitui, assim, um a red e de v aria-çõ es fo rmais, a partir de relaaria-çõ es de substituição , paráfrase, sino nímia. Essa rede é interp retad a de aco rd o co m os percurso s temático s ado tado s na análise.

O co njunto das séries d e verbetes co nstitui u m co rp us histó rico que nos p erm ite mo strar os d eslo camento s d a memó ria d o dizer, o u mais tecnicamente, do interdiscur-so. Este é co mp o sto pelo co mp lexo das fo rmaçõ es d iscursiv as p resentes em d eterm i-nadas co njunturas histó ricas. Chegamo s aí no co nceito de fo rmação d iscursiv a. Para a A nálise do Discurso , as palavras, as fo rmulaçõ es, não têm sentid o em si mesmas. Elas g anham sentid o no interio r das formações discursivas às quais se filiam . A s for-m açõ es d iscursiv as são d efinid as co for-mo "o que po d e e deve ser d ito " a p artir de ufor-ma po sição em d eterminad a co njuntura (PÊCHEUX, ap ud O RLA N DI, 1999, p"43).

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A s condições de produção

Co m relação ao co ntexto amplo , po d emo s situar a p rimeira ed ição do M o rais (SIL-VA , 1789) co mo relacio nad a ao m o v im ento das Luzes em Po rtugal, o que im p lica a passagem de u m sujeito religio so a u m sujeito de d ireito , A g ramática filo só fica subs-titu i a g ramática dos jesuítas. Do mesmo mo d o , o dicio nário de d efiniçõ es curtas e breves substitui o dicio nário enciclo p éd ico e etimo ló gico : ocorre uma sep aração entre o d icio nário de língua e o dicio nário histó rico e de especialid ad es. A co m p anha esse pro cesso a fo rmação do Estad o N acio nal, que ado ta a co ncep ção da co rrelação entre u m Estad o e uma língua. A língua nacio nal p o rtuguesa passa a ter seus instrumento s rep resentativ o s, que co nstro em uma im ag em ho mo g ênea da língua p o rtuguesa e, em seguid a, do "enriquecimento " dessa língua co m os brasileirismo s.

A co m p anhand o as reed içõ es, co nstatamo s que o co rrem mud anças sig nificativ as nas co nd içõ es de pro d ução . No século XIX, a crescente ind ustrialização e o d esenvo l-v im ento das ciências trazem mud anças para a relação do lexicó grafo co m seu público leitor. De u m lado, o d iscurso d a ciência ganha terreno co m o d esenv o lv imento das ciências, das técnicas e co m a ind ustrialização , de o utro , o d iscurso sofre m o d ifica-çõ es co m as transfo rmaifica-çõ es da co njuntura po lítica e so cial. Desse mo d o , as fo rmaifica-çõ es d iscursiv as científica e po lítica co nco rrem para as transfo rmaçõ es que o d icio nário sofre no perío do analisado . A crescente-se a isso a p red o minância da fo rmação d iscur-siva juríd ica em relação à fo rmação d iscursiv a religio sa. Para tratar desses fato s, v a-mos nos ater ao mo d o co mo , a partir do próprio texto do d icio nário , po d emo s remeter a tais transfo rmaçõ es id eo ló gicas.

Em mead o s do século XX a lexico grafia brasileira ganha auto no mia em relação à lexico grafia p o rtuguesa, co m o ap arecimento dos d icio nário s brasileiro s de língua

p o rtuguesa. O d iscurso do

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Dicionário da língua portuguesa (SILVA, 1789) p o d e ser co nsid erad o u m dos d iscurso s fund ad o res da lexico grafia brasileira.

A nálise das séries

Passaremos à análise de cad a um a dessas séries, apresentand o -as co m os v erbe-tes o rganizad o s em o rd em cro no ló gica. A d ata da ed ição será ind icad a no início de cada v erbete.

Nomes de árvores:

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castanheiro

1789: Substantiv o masculino . Á rvore que dá castanhas de que há duas esp écies, lo ngáes e rebo rd ao s.

1813: Id em.

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1844: Substantiv o M asculino . Á rvore que dá castanhas de que há duas esp é-cies, lo ngáes e rebo rdao s. Camõ es Soneto, 271: "so mbra dos verd es". A rr.44.f.l07.4. "castanheiro ".

1858: Substantiv o M asculino . Á rvore que d á castanhas d e que há d uas esp é-cies, lo ng áes e rebo rd ao s. Camõ es Soneto, 271: "so mbra dos v erd es". A rr.44.f.l07.4. "castanheiro " § da índ ia, da árvore que dá castanhas amar-gas, mas que tem folhas lind as.

1877-1878: Id em.

1889-1891: Substantiv o M asculino . Á rvore da família das

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amentáceas eupuiíferas, que d á castanhas: há d uas esp écies, lo ngáes e rebo rd ao s. Camõ es So neto ,

271: "so mbra dos verd es". A rr.44.f.l07.4. "castanheiro ." § da índ ia, da ár-vo re que dá castanhas amargas, mas que tem folhas lind as.

1949-1959: Substantiv o M asculino . Á rvore da família das íagáceas o u das castaná-ceas. Castanea sativa e castanea vulgaris, que dá castanhas vulgar. Em Po rtugal d á-se em quase to d a a p arte, exceto nos terreno s calcário s, e abund a esp ecialmente na região mo nto nho sa do interio r, cultiv and o -se em pequeno s grup o s (soutos) para fruto ou em m aciço s de talhad ia (soutos bravo s), "os castanheiro s, titulad o s nas serras co m respeituo so carinho os ossos de Po rtuga! que lev am trezento s ano s a crescer, trezento s ano s a nascer e trezento s amo res." A q uilino Ribeiro , a voz dos nossos avó s, 272.

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Nomes de animais:

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urso

1789: Substantiv o masculino . A nim al feroz, quad rúped e, p elud o , de grand es unhas ro mbas. V. Usso.

1813: Id em.

1831: Substantiv o masculino (do latim ursus). A nim al feroz, quad rúp ed e, p elu-do, de grand es unhas ro mbas. V. Usso.

1844: Id em. 1858: Id em. 1877-1878: Id em .

1889-1891: Substantiv o masculino . Z o o l.: Gênero de mamífero s da o rd em dos carní-vo ro s, tip o d a família dos ursíd eo s, que encerra animais de g rand e estatu-ra, fo rmas pesad as, c ab eç a term inad a em fo cinho d elgad o e suscep tív el de se d o mesticar. Indivíduo feio e desairo so . Indivíduo m u ito m etid o co n-sigo . V. Usso.

19491859: Substantiv o masculino . Z o o l.: Gênero de mamífero s da o rd em dos carnívo -ros, tip o da família dos ursíd eo s, que encerra animais de grand e estatura, fo rmas pesadas, c ab eç a terminad a em fo cinho d elgad o e suscep tív el de se d o mesticar. Indivíduo feio e desairo so . Indivíduo m uito m etid o co nsigo . N o me vulgar (Brasil) das larvas de inseto lepid ó ptero , da subo rd em do he-tero neuro s. Gíria. Indivíduo de p o uco senso; im becil. Fam. Indivíduo que é o bjecto de zo mbaria. Bras. Mand atário de assassino s. A d j. Falso.

A ssim co mo na série de no mes de árvores, na série de no mes de animais o co rre uma rep etição da fo rma da d efinição "natural" que v ai d esd e a ed ição de 1789 até a de 1877. A p artir da ed ição de 1889-1891, entra em cena o d iscurso científico , que em 1949-1959 assenta-se d efinitiv am ente.

Nas p rimeiras ed içõ es prevalece uma d escrição natural do animal

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(Animal feroz, quadrúpede, peludo, de grandes unhas rombas). Em seguid a, a p artir da ed ição de

1889-1891, d esp o ntam a classificação naturalista e a d escrição científica (Gênero de mamíferos da ordem dos carnívoros, tipo da família dos ursídeos ...). A marca de do mí-nio de esp ecialid ad e (Z o o lo gia) é intro d uz id a a p artir da ed ição de 1889-1891, o que mo stra o estabelecimento do d iscurso científico no interio r do d icio nário . Os co men-tário s enciclo p éd ico s também surg em a p artir da ed ição de 1889-1891 e se acentuam em 1949-1959. Vemo s, p o is, que as regularid ad es p resentes na série de castanheiro se rep etem co m relação à série de no mes de animais: os d iscurso s científico e enciclo p é-d ico g anham terreno nas é-d efiniçõ es é-dos elemento s naturais.

Nomes de partes do corpo:

cotovelo

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enseadas, e co to velo s (da co sta ao mar) se enco lhem ou bo jão . § Pera de 7 co to velo s, que tem p ro eminências angulo sas, o u angulares.

1877-1878: Id em.

1889-1891: Substantiv o M asculino . (Derivado do latim cubilis. do grego ky bilo n). O ângulo exterio r do braço , no lugar em que se articulam o cúbito co m o nú-mero ; é a tubero sid ad e superio r deste que fo rma a saliência do co to velo . § Fig urativ o : Coisa que tem essa figura.v .g. : "a rua faz u m co to velo ", o rio co m suas to rturas, que faz ângulo s ressaltados, o u salientes. Barros, D.L.L.4.C.7, segund o as enseadas, e co to velo s (da co sta ao mar) se enco -lhem ou bojao. Pera de sete co to velo s, que tem p ro eminências angulo sas, ou angulares. § Dor de co to velo , d esco nfiança, ciúmes.

1949-1959: Substantivo masculino . A nat. Parte exterio r do braço que faz u m ângulo saliente no sítio co rrespo nd ente a articulação do húmero co m o cúbito , pro -tuberância exterio r fo rmad a pela articulação do braço co m o antebraço , ân-gulo saliente, esquina, canto . Nó da v id eira o nde rebenta o cacho . Ensead a em baía o u rio . Parte recurvad a e cilíndrica da baio neta, em que a folha se liga ao alvado. Falar pelos cotovelos, falar m uito . Dor de co to velo , ciúmes.

Essa série apresenta regularid ad es que mo stram perío do s de estabilid ad e e al-guns mo mento s de transfo rmação dos sentid o s. A s partes do co rpo são apresentad as, desde a p rimeira ed ição até a de 1877, co mo elemento s o bserv áv eis pelo ho mem co-m u co-m . A p artir da ed ição de 1889-1891, passaco-m a ser sig nificad as por u co-m olhar que não co incid e co m o ho mem co m um e que po d e ser id entificad o co mo o da p o sição do sa-ber med icai. Tal olhar se acentua na ed ição de 1949-1959, co m a p resença do d iscurso de especialid ad e da A nato m ia.

A d efinição que p ermanece desde a p rimeira ed ição até a de 1877 apresenta um a

d escrição externa do "co to velo ":

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A ponta que se faz no meyo do braço, quando o co-brimos, e juntamos a mão ao seu hombro respectivo. A cena enunciativ a dessa d

efini-ção é co nstruíd a co m a p resença de u m sujeito co tid iano que o bserva o co rpo e o des-creve. A marca da p resença desse sujeito está nos verbo s "co brimo s" e "juntamo s" em p rimeira pessoa do plural, o que apo nta para as açõ es de u m sujeito pessoal. No te-se também o vo cabulário básico dos no mes do co rpo humano e de caracterização da for-ma de objetos tais co mo o bservado s externamente {ponta, braço, mão, ombro). Ne-nhuma menção é feita aí à parte interio r do braço . Já na ed ição d e 1889-1891, não apa-rece a p rimeira pessoa, que é substituíd a pela terceira pessoa do p lural, aco mp anhad a de u m p ro no me ind eterminad o (se articulam): O ângulo exterior do braço, no lugar em que se articulam o cúbito com o húmero; é a tuberosidade superior deste que forma a saliência do cotovelo. Nessa d efinição , p o rtanto , mud a o mo d o de enunciação : desa-parece a fig ura humana que observa o co rpo e surge u m olhar impesso al, em uma des-crição sem marcas de uma p rimeira pessoa que enuncia. Podemos remeter esse olhar 1813:

1831:

Id em. Id em. Id em. Id em. 1844

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ao d iscurso da ciência que irro mp e no d icio nário , co m as p ro p ried ad es da impesso

a-lid ad e, das fo rmas d escritiv as e do vo cabulário de especiaa-lid ad e

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{ângulo, cúbito, hú-meio, tuberosidade). Por fim , na ed ição de 1949-1959, o d iscurso científico é amp liad o

na mesma d ireção co m o acréscimo de termo s técnico s e das exp licaçõ es que co nsi-d eram os elemento s interno s para interp retar a ap arência externa: Parte exterior do braço que faz um ângulo saliente no sítio correspondente a articulação do húmero com o cúbito, protuberância exterior formada pela articulação do braço com o antebraço. Saliente-se a m arcação de domínio da Anatomia, que d elimita u m lugar para o d iscur-so de esp ecialid ad e.

A ed ição de 19491959 apresenta aind a duas mo d ificaçõ es em relação às anterio -res. Primeiramente quanto às citaçõ es. A té a ed ição de 1889-1891, temo s a citação de uma frase de uso: "a rua faz u m co to velo " e de uma frase de Barro s: "segund o as enseadas, e co to velo s (da co sta ao mar) se enco lhem o u bo jao ". Em segund o lugar, a marcação de d o mínio figurativo, presente até a ed ição de 1889-1891, é retirad a na de 1949-1959. A ssim , nessa ed ição , há u m av anço do d iscurso científico e u m recuo das citaçõ es literárias, bem como da ind icação de sentid o figurad o . No te-se, po rém, que nas ed içõ es de 1889-1891 e 1949-1959 é acrescentad o o sentid o de dor de cotovelo, co mo ciúmes, que não aparecia anterio rmente. Desse mo d o , ao mesmo temp o em que o d iscurso científico av ança quanto à d escrição física, aparecem sentid o s relacio na-dos ao sujeito enquanto entid ad e p sico ló gica: u m sujeito das emo çõ es.

Nomes de designações sociais:

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povo

1789: Substantiv o masculino . Os mo rad o res da cid ad e, villa ou lugar. Povo miú-do; a plebe, gentalha. Povo; nação , gente; V.g. O po vo de M arte. O que tem os co stumes, usos e cred ulid ad e do po vo . V.g. "nuns rumo s p o v o ": por v ul-gares, po pulares. "A char os mares leite".

1813: Id em. 1831: Id em.

1844: Substantiv o masculino . Os mo rad o res da cid ad e, villa o u lugar. Povo miú-do; a plebe, gentalha. Povo; nação , gente; V.g. O po vo de M arte. O que tem os co stumes, usos e cred ulid ad e do po vo . Povo d iz-se m u i p ro p riamente dos habitantes de uma cid ad e, pro víncia, o u reino , em geral, e sem relação alguma a d istinção de classes.

1858: Substantiv o masculino . Id em.

1877-1878: Substantiv o masculino . Todos os indivíduos que co nstituem uma nacio na-lid ad e to mad o s co llectiv amente: o po vo p o rtuguez, o americano . Os mo ra-dores da cid ad e, villa o u lugar. Povo miúdo; a plebe, gentalha. Povo; nação , gente; V.g. O po vo de M arte. O que tem os co stumes, usos e cred ulid ad e do po vo . Povo diz-se m u i p ro p riamente dos habitantes de uma cid ad e, pro víncia, o u reino , em geral, e sem relação alguma a d istinção de classes. 1889-1891: Substantiv o masculino . Id em.

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indivíduo s que co nstituem uma das classes p rim itiv as da so cied ad e po r-tuguesa. A ld eia o u lugarejo . Plebe. Fig .: Grand e número , quantid ad e. Bras. Família. PI. A s naçõ es.

Os verbetes de

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povo trazem sentid o s ora de uma to talid ad e de mo rad o res (Os mo-radores da cidade, villa ou lugar), ora de uma divisão so cial (Povo miúdo; a plebe,

gen-talha). Neste último caso, aparece co mo uma caracteriz ação p ejo rativ a de u m grup o so cial. A p resenta-se aind a como equiv alente de "nação ", "gente". A p artir da ed ição de 1844, é acrescentad a a acep ção de "habitantes de um a cid ad e, pro víncia, o u reino , em geral, e sem relação alguma a d istinção de classes". Desse mo d o a co ntrad ição se instala no interio r do verbete quand o são mencio nad o s na seq üência os sentid o s da to talid ad e "sem d istinção de classe" e os da caracterização de u m segmento (a plebe, gentalha).

A p artir da ed ição de 1877, a d efinição de povo passa a relacio nar-se co m a ques-tão da nacio nalid ad e: Todos os indivíduos que constituem uma nacionalidade toma-dos collectivamente: o povo portuguez, o americano. Há assim u m d eslo camento de cidade para nação. Isso v ai de par co m o co ntexto do século XIX, em que ganha esp aço o d iscurso de fo rmação e defesa das nacio nalid ad es. Já no verbete de 1949-1959, o sentid o de nacio nalid ad e co ntinua, mas então asso ciado à questão das "leis": Nome colectivo de todos os indivíduos do mesmo país e que vivem sujeitos as mesmas leis. Vemos isso co mo u m índ ice do d iscurso jurídico que passa a co nstituir o sentid o de povo. E se, de u m lado, povo como nacio nalid ad e está relacio nad o co m o d iscurso ju -rídico, de o utro , o sentid o de povo, como asso ciad o a um povo ("a so cied ad e p o rtug ue-sa"), é d elimitad o e marcad o como "A ntig o ". Observe-se aind a a marcação do do mínio "Brasileirismo " que, ao instaurar o efeito de co mp lementarid ad e do esp aço brasileiro em relação ao p o rtuguês, traz o sentid o de família para p o v o , d eslo cand o -se assim o

sentid o iurid ico e de nacio nalid ad e p ara o sentid o do co ntexto p riv ad o d a família.

Verbos de ações sociais: doar

1789: Verbo ativ o . Tratad o forense. Dar alguma co isa a alguém, fazer d o ação . Or-d em.

1813: Id em. 1831: Id em. 1844: Id em. 1858: Id em. 1877-1878: Id em.

1889-1891: Verbo Transitiv o (Do latim do nare). Trat. Forens: Dar, transferir o do micílio d 'alg uma co isa a alguém, fazer d o ação . Ord ,

1949-1959: Verbo transitiv o . Fazer d o ação de, legar, transmitir g ratuitam ente a al-guém os próprios bens.

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i-çõ es de 1889-1891 e 1949-1959, ocorre a intro d ução de alguns elemento s:

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transferir o domicílio d'alguma coisa a alguém; legar, transmitir gratuitamente a alguém os

pró-prios bens. Tais acréscim o s são o ind ício do av anço da fo rmação d iscursiv a juríd ica no dicio nário . Os termo s juríd ico s [domicílio, bens, legar) são exp licitad o s e a d efinição ganha, na fo rmulação , os co nto rno s da fraseo lo gia juríd ica.

Verbos de estado/movimento:

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ser

e

permanecer

1789: Verbo N eutro . Existir. Deste verbo usamo s para afirmar o u negar, que h u m attributo existe em o sujeito . Eufr. 4. 5. ser de alguém: i . é. Seu criad o , seu cativ o , seu p arcial, pessoa de sua o brigação . Ser exemplo a; servir de exemplo . Barros: á manha serei de Lisbo a: Estarei.

1813: Id em. 1831: Id em.

1844: Verbo N eutro , (do italiano essere; do latim esse). Existir. V.g. Era m eu mes-tre, fo i m uito d o uto . Deste verbo usamo s para affirmar, o u, negar que u m attributo existe em o sujeito . Ser de alguém, o u de alguma coisa, é, ser seu criad o , ser cap tiv o , ser p arcial, pessoa de sua o brigação .

1858: Id em. 1877-1878: Id em. 1889-1891: Id em.

1949-1959: Verbo Transitiv o . A firm a no sujeito a existência de u m atributo , para atri-buir a alguém o u a alguma co isa uma qualid ad e, u m mo d o de existir, ter a(s) qualid ad e(s) d esignad as pelo(s) o bjectivo (s) que d etermina(m) o ver-^. bo . Suceder, ocorrer. Ind ica o mo mento , o d ia, o ano, a ép o ca. É verbo au-xiliar co njugand o co m o particípio de o utro s verbo s e, neste caso, rep re-senta a voz passiva.

A d efinição do verbo ser, desde a p rimeira ed ição até a de 1889-1891, coloca em cena u m sujeito que "usa" {usamos) o verbo para estabelecer um a relação ló gica (exis-tência o u não de u m atributo no sujeito ). Nos exemplo s aparece u m d iscurso que ten-de a mo strar u m sujeito id eo lo g icamente passivo : Ser de alguém, ou de alguma coisa, é, ser seu criado, ser captivo, ser parcial, pessoa de sua obrigação; Ser exemplo a; ser-vir de exemplo; Barros: á manha serei de Lisboa. A p artir da ed ição de 1844 e até a de 1889-1891, surge a d efinição sino nímica (Existir), ao mesmo temp o em que é intro -d uzi-d o um exemplo que foge -do -d iscurso -da p assiv i-d a-d e: Era meu mestre, foi muito douto. O verbo no pretérito ind ica que o sentid o da p assiv id ad e é co lo cado em u m passado . Desse mo d o , mesmo mantend o os exemplo s que trazem os sentid o s da pas-siv id ad e, percebe-se já aí u m d eslo camento , uma resistência a esses sentid o s. Tal d eslo camento se acentua na ed ição de 1949-1959, quand o os exemplo s ligad o s à pas-siv id ad e são retirad o s. No te-se que o sentid o da p aspas-siv id ad e, rejeitad o co mo exemp lo , aparece co mo sentid o g ramatical, med iante a d istinção voz ativa/ voz passiva.

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Ser:

1789: Substantiv o M asculino . O existir, existência. Ente, co isa que existe, o u se

co ncebe co mo existente sobre si, ou em o utra coisa.

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O ser Supremo: Deus; Ser, infinito verbal, é também u m no me. Sujeito de si mesmo : "vosso

natu-ral não era serdes Pastora". Cam. Filo d .

1813 Id em.

1831 1844

Id em.

Substantiv o M asculino (do verbo ser). O existir, existência. Ente, co usa que existe, o u se co ncebe co mo existente sobre si, o u em o utra cousa. 1858: Id em.

1877-1878: Id em.

1889-1891: Substantiv o M asculino (do verbo ser). O existir, existência. Ente, co usa que existe, o u se co ncebe como existente sobre si, o u em o utra cousa. A q uilo que é, que existe, ente. O ente humano .

1949-1959: Substantiv o Masculino . A quilo que é, que existe, ente. O ente humano . Essência, natureza, qualid ad e do que é. Existência, nascimento , v id a. Qualid ad es físicas ou mo rais de uma pessoa.

A té a ed ição de 1831, a d efinição de ser (O existir, existência. Ente, coisa que existe, ou se concebe como existente sobre si, ou em outra coisa.) é aco mp anhad a de um exemplo do d iscurso religio so : O ser Supremo: Deus. No ta-se que ser é sig nificad o de início na fo rma de sinô nimo s abstrato s (o existir, existência), em seguid a co mo u m ser d iv ino , marcad o co m letra maiúscula (Ente), e, por f im , co mo uma co isa o u a con-cepção de alguma co isa como existente. A ssim , o sentid o v ai do abstrato ao co rtcreto e do d iv ino ao humano .

A p artir d a ed ição de 1844, o exemplo religio so é retirad o . A d efinição permanece, porém o d iscurso religio so é d eixad o de lado , ao meno s co mo fórmula do dizer, co mo exemplo . Na ed ição de 1889-1891, além disso, aparece uma d efinição enc ab eç ad a por p ro no me ind efinid o {aquilo que é, que existe, ente), seguid a de um exemplo ligad o ao humano : o ente humano. Oco rre, como se vê, uma passagem, nos exemplo s, do d iv ino ao humano , ao passo que a d efinição co m p ro no me ind efinid o p ro d uz u m d eslo camen-to do abstracamen-to (existência) ao co ncreto (aquilo que existe). Tal pro cesso se intensifica na ed ição de 1949-1959, quand o a d efinição co m p ro no me ind efinid o passa a figurar na p rim eira acep ção . A lém disso, são acrescentad as acep çõ es co m os sentid o s de "nascimento " e "v id a", bem como de qualidades físicas ou morais de uma pessoa. Po-demos ver aí os ind ício s do d iscurso da bio lo gia, da fisio lo gia e da mo ral, relacio nad as co m a caracteriz ação do ser humano . Tais fo rmaçõ es d iscursiv as av ançam, enquanto a fo rmação d iscursiv a religio sa (o ser d iv ino ) recua.

A nalisemo s a seguir o verbo permanecer.

Permanecer:

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1813: Id em. 1831: Id em.

1844: Verbo N eutro (do latim permanecere) Durar, existir, aliviar, conservar-se no mesmo estado : V. g. A ind a p ermanece esse tracto , esta amizad e. 1858: Id em.

1877-1878: Verbo N eutro (do latim permanecere) Durar, existir, aliviar, co nservar-se no mesmo estado : V. g. A ind a p ermanece esse trato , esta amizad e. Perma-necer nessa mesma opinião - insistir, durar nela, estar afincad o .

1889-1891: Verbo N eutro (do latim permanecere) Durar, existir, aliviar, conservar-se no mesmo estado, lugar, o pinião : V. g. A ind a p ermanece esse trato , esta amizad e. Permanecer nessa mesma o pinião - insistir, d urar nela, estar afincad o .

1949-1959: Verbo Intransitiv o . Demorar-se em alguma p arte. Perseverar. Ficar, co nser-var-se, durar. Manter-se no estado o u no lugar em que se enco ntra.

A d efinição de

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permanecei mantém-se inalterad a da p rim eira ed ição até a de 1831. A ssim co mo ocorre co m o no me ser, prevalece nesse p erio d o o sentid o da

pas-siv id ad e, co m o sinô nimo aturar e a co lo cação permanecer na obediência ao soberano. O sentid o de opinião aparece so mente na última acep ção . Nas ed içõ es d e 1844 e 1858, o sinô nimo aturar é substituíd o po r aliviar. A co lo cação relativ a à "o bed iência ao so-berano " é apagad a e surge a acep ção permanecer a amizade. No ta-se nesse percurso a paráfrase: [aturar - » aliviar —> insistir], que mo stra os sucessivo s d eslo camento s de sentid o que vão d a "p assiv id ad e" à "amizad e" e à "insistência". Emerge assim, pro -gressiv amente, um sujeito de opinião e p o sicio namento , em d etrim ento da situação de o bed iência e p assiv id ad e. Essa mud ança pode ser remetid a à p assagem do sujeito religio so , ligad o ao Estado abso lutista, ao sujeito de d ireito na relação co m seus "ig uais" ("amizade").

Conclusão: interpretação de redes

A análise mo stro u que o co rrem transfo rmaçõ es sig nificativ as em algumas reed i-çõ es e exp licito u as filiai-çõ es d iscursiv as que se d ep reend em d a análise dos verbetes. Faremos agora uma reflexão final reto mand o as co nclusõ es p arciais d e cad a série e realizand o a interp retação das redes, o u seja, d o co njunto das séries.

A s transfo rmaçõ es mo strad as co nstituem ora d eslo camento s de sentid o s, que não cheg am a p ro d uzir rup turas p ro fund as, mas que ind ic am transfo rmaçõ es locais nas fo rmaçõ es d iscursiv as; ora rup turas que ind ic am o ap arecimento de no vas fo rma-çõ es d iscursiv as. De mo d o geral, po d em-se no tar pro cesso s d iscursiv o s que, de um a co njuntura a o utra, fazem avançar algumas fo rmaçõ es d iscursiv as e recuar o utras.

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a-de em relação às anterio res como as a-de 1813 e 1858. Quanto às rup turas mais significativ as, mo stramo s que há um a passagem da fo rmação d iscursiv a religio sa à ju -rídica, do d iscurso que chamamo s eco nò mico -natural ao d iscurso da ciência, do d is-curso literário ao d isis-curso científico -enciclo p éd ico (so bretudo na ed ição de 1949-1959).

Podemos tecer algumas co nclusõ es a respeito d o co njunto do s d o mínio s analisa-dos. Os d o mínio s de no mes de árvo res, no mes de animais e partes d o co rpo humano apresentam u m esp aço d iscursiv o que reúne a fo rmação d iscursiv a eco nò mico -natu-ral, a fo rmação d iscursiv a científica e a fo rmação d iscursiv a literária. Tais fo rmaçõ es d iscursivas enco ntram-se em relação de substituição o u de co mp lementarid ad e. O d iscurso utilitarista da FD eco nô mico -natural prevalece nas ed içõ es iniciais, enquanto a FD cientifica prevalece nas duas últimas ed içõ es (1889-1891 e 1949-1959), esta v ind o substituir o u co mp lementar aquela. Enquanto isso, a FD literária v ai ganhand o esp aço p ro gressiv amente, até ser substituíd a na ed ição de 1949-1959 pelo d iscurso científi-co -enciclo p éd icientífi-co . Já os d o mínio s de d esig naçõ es so ciais, verbo s d e aç õ es so ciais e verbos de estad o e m o v im ento ap resentam u m esp aço d iscursiv o em que co existem as fo rmaçõ es d iscursiv as religio sa, so cial, juríd ica e também a literária. A FD religio sa prevalece nas p rimeiras ed içõ es. A p artir da ed ição de 1844, e mais d ecid id am ente nas ed içõ es de 1889-1891 e 1949-1959, cede esp aço para a FD so cial (significação dos segmento s so ciais e da nacio nalid ad e) e juríd ica (relação co m as leis, sujeito co mo o ri-gem de seus atos). A FD literária também aparece nesses d o mínio s (citaçõ es, provérbios), assim co mo as co lo caçõ es. No tese que, nesse caso, a ed ição de 19491959 tam -bém substitui a FD literária pela científica e enciclo p éd ica.

No s v erbetes de árvo res e animais é marcante a p assagem d o d iscurso que cha-mamo s eco nô mico -natural ao d iscurso científico . Tal p assagem po d e ser lo calizad a em uma regularid ad e freqüente: nas ed içõ es de 1889-1891 e 1949-1959 são inserid as d efiniçõ es de tip o científico , co m a classificação das esp écies e a d escrição

naturalis-ta. A ssim , a d efinição do tip o

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que dá, presente nas ed içõ es anterio res, é substituíd a por d efiniçõ es do tip o árvore da família das... . Por vezes, não chega a ocorrer uma

substituição to tal, mas apenas u m acréscimo , co mo em castanheiro, que antes apre-sentava so mente a d efinição em gue dá: Árvore que dá castanhas, e nas ed içõ es d e 1889-1891 e 1949-1959 registra a d efinição científica em p rim eiro plano e a utilitária em segund o : Árvore da família das am entác eas eupulíferas, que dá castanhas: há duas espécies, longáes e rebordaos.

No do mínio de no mes de partes do co rpo humano também está p resente o deslo-camento do d iscurso natural ao d iscurso científico . Há aí uma transfo rmação no mo d o de o bserv ação do co rpo humano . Nas p rimeiras ed içõ es as partes do co rpo são d efini-das da p o sição de u m sujeito observador do corpo humano : uma p o sição que po de ser relacio nad a ao sujeito que observa co tid ianamente o co rpo , sua ap arência externa, sem a med iação de instrumento s. A p artir da ed ição d e 1889-1891, surge a p o sição que remetemo s ao saber med icai, que observa os ó rgão s interno s d o co rpo humano . Na ed ição de 1949-1959 aparece também a marcação do domínio da A nato m ia, que atesta a estabilid ad e desse d iscurso no dicio nário , d elimitad o em u m esp aço esp ecí-fico na estrutura do v erbete.

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situaçõ es de "o bed iência ao soberano", que po d emo s localizar no co ntexto histó rico

do A bso lutismo , em que Estado e religião estão aliado s. O verbo

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permanecer é um exemplo ilustrativ o dessa passagem, em que se no ta o d eslo camento do sentid o de

aturar para o de insistir. Tal processo se apresenta também na análise de ser, em que se p ercebe o d eslo camento do "ser d iv ino " ao "ser humano ", este último caracterizad o como o rig em de seus atos. A passagem do religio so ao jurídico também se mo stra nos verbo s de d esig nação so cial, como em doar, em que o sujeito de d ireito aparece de fo rma mais acentuad a nas ed içõ es de 1889-1891 e 1949-1959, e também em povo, que apresenta na ed ição de 1949-1959 a d efinição que relacio na a nacio nalid ad e co m a lei. No te-se aí ig ualmente a passagem do d iscurso so cial ao d iscurso juríd ico : o povo pas-sa, de u m co njunto to tal de mo rado res da cid ad e, a um ou o utro segmento so cial e, finalmente, a u m esp aço nacio nal regulado por leis.

A análise da estrutura dos verbetes mo stro u que há regularid ad es em alguns p o n-tos e v ariaçõ es em o utro s. De início , os verbetes apresentam-se co mo u m d icio nário de língua, co m a p resença no início do verbete da marcação g ramatical. Em seguid a aparecem as d efiniçõ es, co m as v ariaçõ es sintático -enunciativ as que mo stramo s. A s citaçõ es e os exemplo s vão sendo intro d uzid o s, p rincip alm ente a p artir da ed ição de 1844. Na ed ição de 1949-1959, essas citaçõ es são retirad as e aparecem as m arcaçõ es de do mínio de especialid ad e, bem como de brasileirismo , de maneira que os verbetes transitam da tend ência literária para a tend ência técm co -enciclo p éd ica.

A amo stragem analisada apresento u, assim, um a série de transfo rmaçõ es nas re-ed içõ es. Isso p erm itiu observar regularid ad es na co nstituição d iscursiv a do d icio nário de Mo raes, os d eslo camento s e as v ariaçõ es entre d o mínio s e no interio r de u m mes-mo do mínio . Po ssibilito u, enfim, co mpreend er a histo ricid ad e das d efiniçõ es e dos o u-tros mecanismo s inserid o s na estrutura do verbete. A s regularid ad es apo ntad as per-m itiraper-m per-mo strar os percurso s de sentid o s de alguper-mas fo rper-maçõ es d iscursiv as, d emo nstrand o que as transfo rmaçõ es d iscursiv as do dicio nário estão relacio nad as co m o jo go das FDs em d eterminad as co njunturas.

HORTA , J. H . ; SELIG M A N , K. Lexico g rap hic d isco urse: the reed itio ns of the Dicionário da lín-gua portuguesa by M o rais. Alfa, v.47, n . l , p .37-51, 2003.

• ABSTRACT: This paper presents a d isco urse analysis of a sample of entries from the first edi-tion and some of the reediedi-tions of the Dicio nário da língua p o rtug uesa, by António de Morais Silva (1789, 1813, 1831, 1844, 1858, 1877, 1889). The theoretical approach is based on the French Discourse Analysis and on the History of Linguistic Ideas. The corpus includes en-tries of names of trees, names of animals, names of parts of the body, verbs of state and movements and verbs of social actions. We show the discourse transformations, the rup-tures, the displacements of sens from one edition to another and we explicit the historicity of definitions and the configuration of the discoursive formations.

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