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Escravos daqui, dali e de mais além: o tráfico interno de cativos em Constituição (Piracicaba), 1861-1880.

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o tráfico interno de cativos em

Constituição (Piracicaba), 1861-1880

José Flavio Motta USP

RESUMO

Estudamos as características do tráfico interno de cativos registrado entre 1861 e 1880 em Constituição (Piracicaba), ci-dade paulista que, naquele período, vi-venciou o impacto da expansão da ca-feicultura em direção ao Oeste da província. Com base nas escrituras refe-rentes a transações envolvendo escravos, analisamos o comportamento no tem-po de um conjunto de variáveis demo-gráficas e econômicas (sexo, idade, ori-gem, preço) das pessoas transacionadas. Consideramos, também, os informes so-bre o local de residência dos demais en-volvidos, mapeando os atributos dos trá-ficos inter e intraprovincial, levando em conta, igualmente, os efeitos da legisla-ção atinente à questão servil. Nossa aná-lise compara os períodos 1861-1869, 1870-1873 e 1874-1880.

Palavras-chave: Tráfico interno de escra-vos; Expansão cafeeira paulista; Piraci-caba.

ABSTRACT

We study the internal slave trade charac-teristics in Constituição (Piracicaba) in the period 1861-1880, when the provin-ce of São Paulo was under the impact of the coffee culture expansion from the Paraíba Valley to the West. Using the re-gisters of the transactions of slaves, we analyze some demographic (sex, age, origin) and economic (price) variables of the commercialized people. We con-sider, also, the information about the lo-cal of residence of the other people in-volved in the transactions, mapping the attributes of the inter- and intra-provin-cial trades. Finally, we analyze some ef-fects of slave legislation. Our analysis compares the periods 1861-1869, 1870-1873, and 1874-1880.

(2)

C

ONSTITUIÇÃO

:

DA CANA

-

DE

-

AÇÚCAR AO CAFÉ

Em seu trabalho sobre a expansão e o declínio da lavoura canavieira em São Paulo, Maria Thereza Schorer Petrone, ao analisar as distintas áreas pau-listas produtoras de cana, escreveu:

No vale do Paraíba, apesar de certa importância, a cana-de-açúcar nunca teve o papel que teve na outra área de ‘serra acima’, ou seja, no quadrilátero formado por Sorocaba, Piracicaba, Mogi Guaçu e Jundiaí ... [Tratava-se, o quadrilátero mencionado, de] área de eleição da cana-de-açúcar em São Paulo, na segunda metade do século XVIII e na primeira do século XIX, e que já em 1797 produzia 83.435 arrobas de açúcar destinadas à exportação.1

No que respeita especificamente a Constituição (Piracicaba), a autora em questão afirmou que, em 1816, “a produção de açúcar constituía aí a prin-cipal atividade da população”.2Em 1836, segundo Daniel Pedro Müller,3

pro-duziram-se 115.609 arrobas de açúcar em Constituição; nesse mesmo ano, a produção cafeeira igualou-se a 4.699 arrobas. Tal supremacia do açúcar manter-se-ia até a metade do Oitocentos; valendo-nos uma vez mais das pa-lavras de Petrone,

Em 1854 existiam 51 fazendas de cana com uma produção de 131 mil arrobas ... A obsessão do café não atingiu a região, pelo menos até essa data. O cultivo da cana em Piracicaba, como em Itu, continuou progredindo, não sendo afetada pela penetração do café, como aconteceu em Campinas. Itu e Piracicaba, os va-les do Tietê e do Piracicaba, portanto, eram, em meados do século passado [XIX], os redutos da cana-de-açúcar. (Petrone, cit., p.49)

E foi exatamente em meados do século XIX, na região do ‘quadrilátero do açúcar’ como um todo, que o café assumiu posição de maior relevância.

Depois de 1850-1851, temos uma exportação de café sempre maior do que a de açúcar ... O destino da lavoura canavieira já está decidido, portanto, a partir de 1846-1847, mas torna-se mais patente a começar a segunda metade do sécu-lo. O ‘quadrilátero do açúcar’ deixou de sê-lo, para se dedicar com verdadeira obsessão à cultura do café.4

(3)

Consi-derando as quantidades e a procedência dos produtos exportados pelo porto de Santos, verificamos que, em 1846-1847, foram enviadas da localidade em foco 50.633 arrobas de açúcar e 2.597 arrobas de café; já em 1854-1855, a quan-tidade de açúcar reduziu-se para 38.707 arrobas, ao passo que a de café multi-plicou-se por fator superior a sete, para 19.213 arrobas. (cf. Petrone, cit., p.166) Daí as características da lavoura cafeeira, na abertura da década de 1860, na localidade de Constituição, conforme explicitadas por Zaluar:

A sua produção de café e açúcar regula, termo médio, em cento e cinqüenta mil arrobas.É preciso notar que a cultura do café é aqui de data muito recente, pois ainda há muito pouco tempo os Piracicabanos se entregavam exclusivamente ao cultivo da cana, que com esta inovação tem consideravelmente diminuído.5

Na década de 1870, tanto no Almanak da Província de São Paulo para 1873, como nos Apontamentosde Manuel Eufrásio de Azevedo Marques, ain-da que sejam mencionados o café e o açúcar como principais produções de Piracicaba, é aquele, e não este, o que vem em primeiro lugar. No Almanak, lemos: “A exportação média do café, no Município, é de 150 mil arrobas. Além de café, açúcar e algodão, produz algum fumo em rolos, e começa a produzir vinho...”.6Por seu turno, escreveu Marques:

A sua única indústria é a lavoura, sobressaindo a do café e a da cana, de que conta muitas e importantes fazendas ... Também produz com abundância e faci-lidade algodão e toda a sorte de gêneros alimentícios. A exportação do municí-pio regula, termo médio, 130 mil arrobas de café, 50 mil de açúcar e 20 mil de algodão.7

E, em 1886, Milliet referiu uma produção cafeeira de 300 mil arrobas em Piracicaba.8

Alguns indicadores demográficos selecionados para Constituição são apresentados na Tabela 1.9Tais indicadores foram calculados a partir dos

(4)

1.370 para 5.627.10Todavia, entre 1874 e 1886, o total de cativos reduziu-se

em termos absolutos, para 3.820 pessoas. Com isso, a participação relativa da população cativa, que se alçara de 22,0 por cento em 1854 para 26,1 por cen-to em 1874, declinou substancialmente, para 11,6 por cencen-to, em 1886.

As razões de sexo computadas para os piracicabanos livres mostraram-se, como esperado, mais próximas do equilíbrio quando comparadas às vigentes para os cativos. Além disso, há que referir a presença crescente de estrangeiros.11

De fato, por exemplo, Taunay, ao analisar o relatório da administração do Con-selheiro Saldanha Marinho (24.10.1867 a 24.4.1868), apresentado à Assembléia Legislativa Provincial em fevereiro de 1868, refere a enumeração das colônias fundadas por particulares, fazendeiros de café, havendo duas em Piracicaba.12E

há que mencionar também o movimento imigratório de norte-americanos, di-recionado para Santa Bárbara. No Almanakde 1873, quando esta última locali-dade pertencia ao Termo de Constituição, observa-se que

o desenvolvimento que tem tido a lavoura em seu Município [de Santa Bárba-ra], principalmente na cultura de algodão, café, cana-de-açúcar e fumo, tem si-do extraordinário, desde a vinda si-dos imigrantes norte-americanos, e em breve a sua exportação competirá com a de outros Municípios mais adiantados, já pela

Tabela 1

Alguns indicadores demográficos de Constituição/Piracicaba (1854 a 1886)

Indicadores 1854 1874 18862

População total 6.228 21.569 33.055

População escrava (%) 22,0 26,1 11,6

Razão de sexo (livres) 93,2 104,0 92,8

Razão de sexo (escravos) 177,3 134,4 144,4

Cativos homens (20 a 40 anos; %) 1 40,6 31,8

Cativas (20 a 40 anos; %) 1 30,6 34,5 32,33

1Para 1854 computaram-se os escravos com idades de 20 a 39 anos; para 1874, dos 21 aos 40; e, para

1886, dos 30 aos 40;

2Os cálculos das razões de sexo, bem como dos porcentuais indicados acerca dos escravos, foram

efe-tuados com base no informe da população cativa matriculada até 30 de março de 1887;

3Este percentual refere-se aos escravos, homens + mulheres, de 30 a 40 anos de idade.

(5)

boa qualidade de seus produtos, já pela quantidade enviada ao mercado. (Luné & Fonseca, cit., p.465-6)

O

COMÉRCIO DE ESCRAVOS EM

C

ONSTITUIÇÃO NA DÉCADA DE

1860

No período de 1861 a 1869 foram registradas em Constituição 206 tran-sações envolvendo 399 cativos. Na Tabela 2 fornecemos a distribuição dessas pessoas segundo o ano do lançamento nos livros de notas. Esses escravos, afri-canos alguns, brasileiros a maioria, homens, mulheres e crianças, foram, no tocante à sua movimentação, objeto de negócios de tipo variado (Tabela 3). Nesse variado espectro de possibilidades, as transações mais comuns foram as similares à operação de compra e venda da cativa Thereza, de 12 anos de idade, cuja escritura foi lançada em Constituição aos 22 de maio de 1866. Es-sa menina, crioula, preta, solteira e natural da província de São Paulo, foi ven-dida por Rs. 1:400$000. Tratou-se de um negócio restrito ao âmbito local, em que tanto o vendedor, Laureano Lopes de Morais, como o comprador, José Romão Leite Prestes, residiam no próprio termo de Constituição.13O preço

ajustado foi pago no ato e ambos os contratantes assinaram a escritura, assim como as duas testemunhas de praxe.

Tabela 2

Escravos transacionados segundo ano do registro (Constituição, 1861-1869)

Anos Escravos Anos Escravos

1861 32 1866 46

1862 78 1867 28

1863 26 1868 61

1864 42 1869 42

1865 44 Totais: 399

(6)

das escrituras essa cifra teria sido maior. Porém, a consulta ao Almanak da

pro-víncia de São Paulo para 1873permitiu-nos computar como moradores na

própria localidade muitos dos contratantes cuja residência não foi declarada no documento. Nos casos de compras e vendas que ainda assim permanece-ram não identificados (73 pessoas), notamos o seguinte: para 24 não sabemos onde moravam os compradores, e em 62 desconhecemos o local de residência dos vendedores (para 13 desses cativos comprados/vendidos não identifica-mos o local de moradia de vendedores e de compradores); dez escravos foram vendidos e 48 comprados por moradores em Constituição; um comprador re-sidia em Capivari (SP) e um vendedor em Vassouras (RJ). Esses números refle-tem, assim o cremos, de um lado, a importância que tiveram em Constituição as transações que extrapolaram o universo local e, de outro, um dinamismo econômico, em boa medida assentado na expansão da cafeicultura na região, que implicava maior relevância do fluxo de entrada de cativos.

Compunham essas movimentações não identificadas 16 africanos, 11 de-les do sexo masculino. Dentre os 71 não africanos, dispomos do informe da naturalidade para trinta indivíduos: 4 eram da própria Constituição (2 de ca-da sexo), outros 8 eram paulistas (4 homens e 4 mulheres, de Campinas, 1; Indaiatuba, 2; Jundiaí, 2; Botucatu, 1; Rio Claro, 1; e o restante descrito como natural “desta província”), um homem era do Rio de Janeiro e 17 escravos eram naturais de províncias do Norte-Nordeste (16 homens, 13 da Bahia e 3 identificados como “do Norte”; e uma mulher, de Pernambuco).

Se tomássemos esses dados da naturalidade dos cativos como critério al-ternativo para estabelecermos o tipo do tráfico, esses trinta casos apontariam o predomínio das entradas; por exemplo, os escravos baianos, a pernambu-cana e os “do Norte” foram todos vendidos por indivíduos cuja residência não foi declarada, mas sabemos que 11 dos baianos e a pernambucana foram com-prados por residentes em Constituição.15Mais ainda, enquanto no hipotético

comércio intraprovincial haveria equilíbrio entre os sexos e os municípios ar-rolados seriam todos próximos à localidade examinada (os mais distantes se-riam Jundiaí e Botucatu, ambos a menos de cem quilômetros), no interpro-vincial a supremacia masculina seria quase absoluta e apenas um cativo seria fluminense, ao passo que os demais teriam provavelmente trilhado percursos bem mais extensos.

(7)

dessa participação estaria, de resto, refletido no valor da razão de sexo (155,9). Efetivamente, se excluíssemos os indivíduos identificados como naturais de outras províncias, o mencionado indicador reduzir-se-ia para 109,1, cifra muito mais próxima do equilíbrio entre os sexos.

Enquanto, como vimos, aproximadamente um quinto dos escravos foi classificado na categoria do tráfico “não identificado”, quase dois quintos (38,1%) foram transacionados localmente (foram 152 cativos, dos quais 146 comprados/vendidos, quatro permutados e dois doados). No conjunto das pessoas negociadas no âmbito local, os africanos somaram 29 (19,1%), com marcado predomínio masculino. As mulheres, por seu turno, compuseram a

Tabela 3

Escravos negociados segundo sexo, origem e tipo do tráfico (Constituição, 1861-1869)

Tráfico / Origem Homens Mulheres Razões de Sexo

Local

africanos 22 7 314,3

demais 54 69 78,3

total 76 76 100

Intraprovincial

africanos 4 2 200

demais 68 33 206,1

total 72 35 205,7

Interprovincial

africanos 1 – –

demais 47 5 940,0

total 48 5 960,0

Não identificado

africanos 1 5 220,0

demais 42 29 144,8

total 53 34 155,9

Totais: 249 150 166

(8)

maioria dos 123 cativos não africanos. Para pouco mais da metade (64) des-tes últimos obtivemos o informe da naturalidade: 29 eram de Constituição, outros 28 eram igualmente paulistas (1 de Indaiatuba, 1 de Santana de Par-naíba, 2 de Itu e 24 “naturais desta província”) e tão-somente 7 eram de ou-tras regiões (3 baianos, 2 fluminenses, 1 pernambucano e 1 maranhense). Por conseguinte, nas transações locais, nos casos em que podemos afirmar ter existido ao menos um deslocamento prévio dos escravos crioulos negocia-dos, a maioria dessas movimentações não foi além do território de São Pau-lo, embora não fossem inexistentes os trânsitos mais extensos.

Tabela 4

Entradas e saídas segundo sexo e tipo do tráfico (Constituição, 1861-1869)

Tráfico / Sentido do fluxo Homens Mulheres Totais

Intraprovincial

entradas 50 25 75

saídas 21 8 29

Totais1 71 33 104

Interprovincial

entradas 40 50 45

saídas 1 – 1

Totais2 41 5 46

1Excluídos um homem e duas mulheres, ele negociado por moradores em Pirapora (SP) e elas por

contratantes residentes em Capivari (SP);

2Excluídos sete homens, seis deles comercializados por vendedor residente no Rio de Janeiro e

com-prador de Capivari (SP), e o outro cujo vendedor morava em Porto das Caixas (RJ) e o comcom-prador em Botucatu (SP).

(9)

Tabela 5

Escravos negociados no tráfico intraprovincial (Constituição, 1861-1869)

Distância / Local de moradia dos contratantes Entradas Saídas

menos de 50 km

Limeira 1 3

Capivari 3 5

Rio Claro 1 4

de 50 a 100 km

Porto Feliz 9 1

Indaiatuba 1 –

Campinas 3 2

Brotas 1 –

Itu 8 1

Tatuí 12 2

São Carlos 2 –

Botucatu 1 1

Sorocaba 2 9

Pirapora 1 –

de 101 a 150 km

Santana de Parnaíba 3 –

Araraquara 5 –

Cotia 1 –

São Paulo 17 1

de 151 a 200 km

Jacareí 1 –

Itapeva 1 –

Santos 1 –

Xiririca 1 –

(10)

Os municípios nos quais residiam os contratantes nomeados nas escri-turas atinentes aos 104 escravos negociados no comércio intraprovincial es-tão listados na Tabela 5. Tais localidades aparecem ordenadas de acordo com a distância computada a partir de Constituição, desde as mais próximas, as vizinhas Limeira e Capivari, situadas a menos de trinta quilômetros, até a mais distante, Xiririca (atual Eldorado), localizada a pouco menos de duzen-tos quilômetros. Foram 21 os municípios paulistas onde moravam proprietá-rios que venderam seus escravos para Constituição; em nove deles residiam também indivíduos que realizaram negócios no sentido inverso.16Se

traçásse-mos uma circunferência com centro em Constituição e um raio de cem qui-lômetros, verificaríamos que a maioria dos municípios arrolados (13) estaria nela inserida, ao passo que apenas quatro deles ficariam de fora de uma cir-cunferência cujo raio fosse de 150 quilômetros (Jacareí, Itapeva, Santos e Xi-ririca).

A informação acerca da naturalidade dos cativos brasileiros negociados internamente aos limites do território paulista evidenciou que, ao menos em alguns casos, essas pessoas haviam já sofrido deslocamentos anteriores. As-sim, dos 29 escravos ‘exportados’ da localidade, um era natural de Itu e foi vendido para um morador em Capivari, outro era natural de Cuiabá, na pro-víncia de Mato Grosso, e o terceiro era do Maranhão, os dois últimos com-prados por escravistas residentes em Rio Claro. Dentre as 75 pessoas ‘impor-tadas’ de outras localidades paulistas, 20 foram descritas como naturais de outras províncias e negociadas por moradores em Itu, Porto Feliz, Jacareí, Santana de Parnaíba e Itapeva: 7 desses cativos eram naturais de Pernambu-co, 4 do Rio de Janeiro, 4 de Minas Gerais, 4 da Bahia e um do Ceará. Houve também um cativo natural de São Sebastião (SP), vendido por um morador em Itu. E identificamos ainda 4 casos de escravos naturais de Constituição que estavam ‘voltando’ para a localidade, vendidos por residentes em São Pau-lo (1), São CarPau-los (2) e Capivari (1).

(11)

Ma-ranhão (3), Piauí (2), Ceará (2) e Pernambuco (1). Para 34 desses indivíduos negociados no tráfico entre províncias foi informada a naturalidade, a qual revela uma distribuição entre províncias um tanto diferente vis-à-visa dis-posta na tabela em questão. Em especial, os fluminenses foram apenas sete, enquanto os baianos somaram 13. As demais naturalidades foram: Maranhão (4), Minas Gerais (3), Ceará (2), Piauí (2), Pernambuco (1), Sergipe (1) e Rio Grande do Norte (1).17

Do conjunto de 399 cativos negociados em Constituição no período em tela, para 99 (24,8%) houve a intermediação de procuradores representando

Tabela 6

Escravos negociados no tráfico interprovincial (Constituição, 1861-1869)

Local de moradia dos contratantes Entradas Saídas

Cabo Frio (RJ) 1 –

Campos (RJ) 1 –

Niterói (RJ) 2 –

Corte (RJ) 10 1

Rio de Janeiro 10 1

Alfenas (MG) 3 –

Inhambupe (BA) 4 –

Jacobina (BA) 4 –

Vitória (BA) 1 –

Salvador (BA) 4 –

Príncipe Imperial (PI) 1 –

Teresina (PI) 1 –

Aracati (CE) 1 –

Ceará 1 –

Pernambuco 1 –

Maranhão 1 –

(12)

ao menos uma das partes contratantes. Essa proporção, como esperado, foi menor no tráfico local (11,2%) em comparação ao intra (26,2%) e interpro-vincial (86,8%). No comércio entre províncias, apenas sete escravos foram transacionados por proprietários que se fizeram presentes na lavratura das respectivas escrituras, todos eles residentes no Rio de Janeiro. Ademais, nas operações de compra e venda de 36 pessoas no tráfico interprovincial, obti-vemos o informe acerca do local de moradia dos procuradores dos vendedo-res: cidade de São Paulo (2 casos), Jacareí (3), províncias paulista (9) e flumi-nense (22). A consideração conjunta dos dados sobre a naturalidade dos cativos, os locais de residência de vendedores, compradores e eventuais pro-curadores, bem como acerca dos subestabelecimentos de procurações, per-mitiu-nos verificar ter sido decerto bastante extenso o caminho percorrido por alguns dos escravos transacionados.

Por exemplo, aos 24 de novembro de 1868, Antonio Bruno de Araújo Lei-te, morador no Rio de Janeiro, vendeu nove cativos para Albano de Toledo Silva, residente em Constituição. Antonio Leite efetivou essa venda na quali-dade de procurador de sete escravistas. Florentino, uma das pessoas comer-cializadas, era natural do Piauí. Seu proprietário, Francisco Ignácio da Fonse-ca, morava no município de Príncipe Imperial (PI); todavia, estava outorgando a procuração em Fortaleza (CE). Florentino, portanto, pode ter transitado pe-las províncias do Piauí, Ceará, Rio de Janeiro e São Paulo. Outro dos escra-vistas residia e passou sua procuração em Aracati (CE) para venda de um seu cativo natural do Rio Grande do Norte. Antonio Bruno recebeu também pro-curação da firma Morais & Irmão, sediada no Maranhão, para venda de Ju-lião (piauiense) e Francisco (baiano). Mais dois baianos foram vendidos por proprietários moradores em Teresina (PI) e na Corte do Rio de Janeiro. Por fim, completando a aludida transação, Leon Cohen, negociante da Corte, ou-torgou procuração a Antonio Leite para venda de dois escravos fluminenses.

(13)

de-las tinham menos de 15 anos de idade, proporção que ia pouco além de um quarto (26,6%) entre eles. Essa diferença explica-se, ao menos em parte, pela participação distinta dos africanos de acordo com o sexo: eles perfaziam 15,3 por cento dos homens e 9,3 por cento das mulheres.

Gráfico 1

Escravos negociados: Faixas etárias, origem e e sexo (Consituição de 1861-1869)

Gráfico 2

Escravos negociados: Faixas etárias e tipo de tráfego (Consituição de 1861-1869)

As mesmas faixas etárias dos cativos, agora consideradas juntamente com o tipo do tráfico, compõem o Gráfico 2. Verificamos o peso relativo crescente das pessoas com menos de 30 anos: 67,6 por cento no comércio local, 86,8 por cento no intraprovincial e 92,4 por cento no tráfico entre províncias;

nes-0% 20% 40% 60% 80% 100%

Local Intraprovincial Interprovincial Não identificado

0 a 14 anos 15 a 29 anos 30 a 44 anos 45 e + anos 0%

20% 40% 60% 80% 100%

Africanos Demais Homens Mulheres

(14)

te último, não foi negociado nenhum escravo de idade igual ou superior a 45 anos. A esse comportamento correspondeu uma razão de sexo igualmente crescente (100,0, 205,7 e 960,0, respectivamente, nos três tipos de comércio). Vale dizer, embora as transações em geral privilegiassem os cativos mais jo-vens, em especial os de 15 a 29 anos, a ‘qualidade’ da escravaria negociada, em termos de sua distribuição sexual e etária, mormente da perspectiva do tra-balho na lavoura, crescia à medida que os negócios envolviam deslocamentos por maiores distâncias. Por seu turno, o comércio “não identificado” apresen-tou uma distribuição etária que mais se assemelhou à dos indivíduos transa-cionados localmente.18

Para cerca de dois quintos (40,6%) dos cativos negociados obtivemos o informe do preço (Tabela 7). Não consideramos os preços individuais de sete escravos que foram descritos com os seguintes atributos: “meia idiota”, “ren-dido das virilhas”, “doente de uma ferida na perna”, “com defeitos”, “louco”, “tem falta de vista e é surdo” e “tem duas rendeduras nas virilhas”. Restaram 162 observações: eram os preços de 97 homens e de 65 mulheres. Eles custa-ram em média 20,5 por cento mais do que elas. Levando em conta apenas o contingente dos adultos jovens, notamos que se manteve praticamente inal-terada essa diferença em favor do sexo masculino (20,2%).19

Tabela 7

Preços médios nominais dos escravos em geral e dos cativos adultos jovens, segundo sexo

(Constituição, 1861-1869)

Sexo Número de escravos Preço médio (em réis)

Homens 97 1:537$766

Mulheres 65 1:275$954

Homens de 15 a 29 anos 49 1:819$388

Mulheres de 15 a 29 anos 35 1:513$171

O

COMÉRCIO DE ESCRAVOS EM

P

IRACICABA NO PERÍODO

1870-1880

20

(15)

(866, isto é, 99,4%) objeto de operações de compra e venda, sendo efetuadas ainda duas doações e uma permuta (duas escravas, de 16 e 13 anos de idade, por um rapaz de 25 anos).

Tabela 8

Escravos transacionados segundo o ano do registro (Constituição, 1870-1880)

Anos Escravos Anos Escravos

1870 93 1876 41

1871 10 1877 32

1872 95 1878 124

1873 116 1879 115

1874 69 1880 55

1875 120 TOTAIS 871

(16)

Tabela 9

Escravos negociados segundo sexo, origem e tipo do tráfico (Constituição, 1870-1880)

Tráfico / Origem Homens Mulheres Razões de Sexo

Local

africanos 21 3 700,00

demais 325 194 167,5

total 346 197 175,6

Intraprovincial

africanos 5 1 500,00

demais 121 51 237,3

total 126 52 242,3

Interprovincial

africanos 1 – –

demais 96 33 290,9

total 97 33 293,9

Outros e Não identificado

africanos – 1 zero

demais 11 8 137,5

total 11 9 122,2

TOTAIS 580 291 199,3

Nota: A razão de sexo é definida como o número de homens para cada grupo de 100 mulheres.

(17)

comércios local, intra e interprovincial, e atentamos para o evolver dos seus respectivos pesos relativos (Gráfico 3), percebemos que no quatriênio 1870-1873 teve lugar uma pronunciada queda na participação dos negócios reali-zados por residentes em outros municípios e províncias do Império. Em con-trapartida, as transações locais responderam por cerca de metade (48,7%) dos cativos nas escrituras registradas em 1861-1869, proporção que superou os três quartos (76,6%) em 1870-1873.

Dessa forma, naqueles anos fundamentais para o evolver da legislação abo-licionista, os negócios com escravos em Constituição estiveram em especial con-centrados nos limites da própria localidade. No restante do decênio, o impacto da intensificação do tráfico interprovincial fez-se sentir. Contudo, ao menos em uma primeira aproximação, esse impacto foi apenas suficiente para tornar o peso relativo do comércio entre províncias (16,6%), que declinara para 13,0 por cento em 1870-1873, praticamente igual àquele verificado na década de 1860 (17,0%). Os negócios locais, apesar de menos importantes do que em iní-cios da década, ainda respondiam, no período 1874-1880, pela maioria absolu-ta (56,6%) dos indivíduos comercializados nos três tipos de tráfico em tela. Por fim, o comércio intraprovincial, à semelhança do realizado entre províncias, também se recuperou, mas não atingiu a mesma relevância observada em 1861-1869 (34,3% versus10,4% em 1870-1873 e 26,8% em 1874-1880).

Gráfico 3

Escravos negociados segundo tipo do tráfego (Consituição de 1860-1870)

Não obstante, os efeitos indiretos da intensificação do trânsito de cativos entre províncias igualmente se mostraram presentes. Consideremos um pou-co mais detalhadamente os negócios locais. Em tais transações foram negocia-dos 152 escravos em 1861-1869, 235 em 1870-1873 e 308 em 1874-1880. No

0% 20% 40% 60% 80% 100%

1861-69 1870-73 1874-80

Interprovincial

Intraprovincial

(18)

primeiro desses períodos, como vimos na seção anterior, apenas sete pessoas eram naturais de outras províncias (Bahia, 3; Rio de Janeiro, 2; Pernambuco e Maranhão); elas correspondiam a 4,6 por cento do total de indivíduos transa-cionados localmente, ou a 10,9 por cento se computados apenas os não africa-nos, para os quais obtivemos o informe da naturalidade. Para o quatriênio 1870-1873 os porcentuais correlatos mostraram-se semelhantes, igualando-se a, respectivamente, 4,2 e 9,3 por cento: foram 107 os cativos não africanos com a naturalidade descrita, e dez dentre eles eram naturais de outras províncias (Bahia e Maranhão, 3; Rio de Janeiro, 2; Minas Gerais e Pernambuco).

Em meio ao intervalo 1870-1873, passamos a dispor também da infor-mação da matrícula das pessoas negociadas: 113 casos no tráfico local, todos eles matriculados na província de São Paulo (na própria Constituição, 108; em Rio Claro, 2; Itu, 2; e Campinas). Para os anos de 1874 a 1880, essa infor-mação foi obtida para a totalidade dos indivíduos comercializados. Como se-ria o esperado, a grande maiose-ria dos negócios locais envolveu cativos matri-culados na própria localidade (76,3%) ou em outros municípios paulistas (7,5%). Todavia, foi inequívoco o aumento no peso relativo dos escravos ma-triculados em outras províncias: 16,2 por cento. Outrossim, o ‘aquecimento’ no comércio da mercadoria humana evidenciou-se na maior diversidade ob-servada no tocante ao elenco de províncias onde essas pessoas haviam sido matriculadas: Bahia, 15; Minas Gerais, 10; Rio de Janeiro e Maranhão, 6; Pa-raíba, 3; Santa Catarina e Rio Grande do Sul, 2; Espírito Santo, Paraná, Piauí, Pernambuco, Pará e Sergipe, 1.

(19)

entradas e saídas, foram negociadas no âmbito intraprovincial, em média, 11,6 pessoas por ano em 1861-1869, 7,5 em 1870-1873 e 19,9 em 1874-1880.

Desses dois movimentos aqui identificados, ocorridos no decênio de 1870, o primeiro — o arrefecimento nos negócios intraprovinciais em 1870-1873 — é igualmente percebido ao arrolarmos os distintos locais de moradia dos contratantes de tais transações (Quadro 1). Assim, o elenco de 21 muni-cípios mencionados nas escrituras de 1861-1869 mostrou-se bem menos di-versificado no quatriênio 1870-1873: apenas 13 localidades foram referidas. Além disso, enquanto oito dos municípios arrolados na década de 1860 dis-tavam mais de cem quilômetros de Constituição, e quatro deles mais de 150 quilômetros, tão-somente dois distavam mais de cem e nenhum mais de 150 quilômetros em 1870-1873. Quanto à segunda parte da década de 1870, os locais de moradia dos contratantes não permitem inferir um maior ritmo do tráfico intraprovincial em comparação ao período 1861-1869; porém obser-vamos, no mínimo, a retomada de características das quais se havia afastado em inícios da década. Dessa forma, em 1874-1880 foram descritos vinte mu-nicípios paulistas no tráfico em tela, seis deles distantes mais de cem, três mais de 150 e um, Apiaí, mais de duzentos quilômetros de Piracicaba.

Tabela 10

Entradas e saídas segundo sexo e tipo do tráfico (Constituição, 1870-1880)

Tráfico / Sentido do fluxo Homens Mulheres Totais

Intraprovincial

entradas 94 37 131

saídas 25 13 38

totais1 119 50 169

Interprovincial

entradas 88 30 118

saídas – – –

totais2 88 30 118

1Excluídos sete homens e duas mulheres vendidos por escravistas moradores em Itu, Capivari e

Iguape, e comprados por residentes em Capivari, Jaú, Limeira, Monte Mor, Rio Claro e Tietê.

2Excluídos nove homens e três mulheres, vendidos por escravistas moradores nas províncias da

(20)

Distância Distância Distância

Local de moradia Local de moradia Local de moradia

dos contratantes. dos contratantes. dos contratantes.

1861-9 1870-3 1874-80

menos de 50 km menos de 50 km menos de 50 km

Limeira Limeira Limeira

Capivari Capivari Capivari

Rio Claro Monte Mor Rio Claro

de 50 a 100 km São Carlos de 50 a 100 km

Porto Feliz de 50 a 100 km Porto Feliz

Indaiatuba Porto Feliz Campinas

Campinas Itu Tatuí

Brotas São Carlos Botucatu

Itu Botuicatu Cabreúva

Tatuí Sorocaba Pirassununga

São Carlos São Roque Sorocaba

Botucatu Jaú Itatiba

Sorocaba Jundiaí

de 101 a 150 km de 101 a 150 km de 101 a 150 km

Santana de Parnaíba Lençóis Ararquara

Araraquara São Paulo São Paulo

Cotia São Paulo

de 151 a 200 km de 151 a 200 km

Jacareí Itapeva

Itapeva Santos

Santos Xiririca

Xiririca

de 201 a 250 km

Apiaí

(21)

Ainda com relação ao comércio intraprovincial, os informes sobre as na-turalidades e os locais de matrícula dos indivíduos comercializados confir-mam, a sua vez, os dois movimentos referidos. Se, na década de 1860, pouco mais de um quinto (21,2%) dos cativos ‘importados de’ ou ‘exportados para’ diversos municípios paulistas foram identificados como naturais de outras províncias (Pernambuco, 7; Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia, 4; Ceará, Mato Grosso e Maranhão, 1), o mesmo ocorreu em tão-somente dois casos (6,7%) em 1870-1873: um alagoano e um fluminense. No período 1874-1880 verificamos que as 43 pessoas matriculadas em outras províncias — 34 delas no Nordeste do Império — corresponderam a 30,9 por cento do conjunto ‘importado’ para ‘exportado’ de Piracicaba.

Em suma, a consideração mais minuciosa que vimos fazendo, nos últi-mos parágrafos, dos tráficos local e intraprovincial em Constituição, permi-te-nos afirmar que, para além do comportamento dos pesos relativos desses tráficos durante os três períodos contemplados (1861-1869, 1870-1873 e 1874-1880), no último desses intervalos temporais não apenas se recompuseram em certa medida as participações relativas calculadas para a década de 1860, mas essa recomposição lastreou-se, decerto, em um mercado de escravos que se mostrava muito mais aquecido do que estivera no decênio anterior, ali-mentado agora também por um afluxo bem mais significativo de cativos vin-dos “do Norte”.

Essas assertivas vêem-se corroboradas pelo cômputo das entradas de es-cravos registradas em Constituição por intermédio do comércio interprovin-cial. Essas entradas, no período 1861-1869, equivaleram à média de 5,0 indiví-duos por ano, cifra que se alçou a 9,0 em 1870-1873 e a 11,7 em 1874-1880. Os locais de moradia dos contratantes residentes em outras províncias com-plementam o informe dessas médias (Quadro 2). Comparado à década de 1860, quando foram vários os escravistas moradores nas províncias “do Norte” (Ba-hia, Piauí, Ceará, Pernambuco e Maranhão), no quatriênio 1870-1873 a totali-dade dos proprietários residia em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Em 1874-1880, as províncias “do Norte” fizeram-se novamente presentes. De fato, a diversidade dessas províncias — Bahia, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Paraí-ba, Rio Grande do Norte, Ceará, Sergipe e Pará — foi maior do que em 1861-1869, e a elas se juntaram, além das sempre presentes Rio de Janeiro e Minas Gerais, as províncias do sul: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

(22)

Local de moradia Local de moradia Local de moradia

dos contratantes, dos contratantes, dos contratantes,

Número de escravos. Número de escravos. Número de escravos.

1861-1869 1870-1873 1874-1880

Cabo Frio (RJ), 1 Corte (RJ), 25 Corte (RJ), 11 Campos (RJ), 1 Niterói (RJ), 2 Rio de Janeiro, 2

Niterói (RJ), 2 Rio de Janeiro, 1

Corte (RJ), 11 Grão-Mogol (MG), 5

Rio de Janeiro, 10 Minas Novas (MG), 5 Montes Claros (MG), 2 Bagagem (MG), 2 Rio Pardo (MG), 1

Alfenas (MG), 3 Grão-Mogol (MG), 1 Castro (PR), 4

Inhambupe (BA), 4 São José (SC), 3

Jacobina (BA), 1 Lages (SC), 1

Vitória (BA), 1 Tijucas (SC), 1

Salvador (BA), 4 Porto Alegre (RS), 1

Príncipe Imperial (PI), 1 Rio Grande do Sul, 1

Teresina (PI), 1 Caetité (BA), 11

Aracati (CE), 1 Monte Alto (BA), 7

Ceará, 1 Salvador (BA), 2

Pernambuco, 1 Macaúbas (BA), 1

Maranhão, 3 Bahia, 10

São Luiz (MA), 1 Cururupu (MA), 1

Maranhão, 4 Recife (PE), 1 Bom Conselho (PE), 1

Trunfo (PE), 1 Teresina (PI), 1 Oeiras (PI), 1 Campo Maior (PI), 1

Piauí, 1 Pilar (PB), 1

Paraíba, 1 Rio Grande do Norte 1

Ceará, 1 Sergipe, 1

Pará, 1 Quadro 2 – Localidades participantes do tráfico interprovincial

(23)

período em tela, a venda de cativos a partir das províncias do Sul evidencia, sobretudo, o lado da demanda, isto é, as condições propícias de realização do ativo representado pelos escravos num mercado condicionado pela expansão dos cafezais.22Adicionalmente, aos locais de moradia dos vendedores,

discri-minados na última coluna do Quadro 2, corresponderam as localidades e/ou províncias dispostas no Quadro 3, nas quais foram matriculadas as pessoas negociadas para Piracicaba, no período 1874-1880, pelo comércio entre pro-víncias. Comparando os dois quadros, percebemos que os escravos transacio-nados por escravistas residentes no Rio de Janeiro, quase todos na Corte, eram mais numerosos do que os cativos matriculados naquela província, ocorren-do o inverso, em especial, no caso ocorren-do Maranhão. Tal observação aponta para a intermediação dos negociantes especializados na mercadoria humana.

Essa intermediação dos traficantes de escravos ocorria, amiúde, median-te o artifício do encadeamento de procurações. Como vimos na seção anmedian-te- ante-rior, para quase um quarto (24,8%) dos cativos negociados em 1861-1869, ao menos um dos contratantes fez-se representar por um procurador. Essa pro-porção cresceu na década de 1870, chegando a 36,9 por cento em 1870-1873 e a 36,3 por cento em 1874-1880. Tomando o primeiro e o último desses pe-ríodos, notamos que esse crescimento foi comum aos distintos tipos de tráfi-co: local (de 11,2% para 20,8%), intraprovincial (26,2% para 34,9%) e entre províncias (86,8% para 88,9%). Claro que nem todos os procuradores eram traficantes de cativos, mas vários sem dúvida o eram, mormente nas transa-ções envolvendo maiores distâncias.

Esse o caso, por exemplo, de José de Castro Eusébio. Esse negociante, que em escrituras registradas em outro município paulista (Areias, no Vale do Pa-raíba) era descrito como residente em São Luiz (MA), em Constituição foi identificado como morador na Corte do Rio de Janeiro. Entre 28 de fevereiro e 13 de março de 1874, conforme documentado em várias escrituras, dito tra-ficante vendeu 13 pessoas, oito de sua propriedade e as demais como procu-rador. Três dos seus representados residiam no Piauí e os outros dois eram comerciantes matriculados no Tribunal do Comércio do Maranhão. Um dos cativos vendidos, maranhense, havia sido matriculado no município de San-tos (SP); os 12 restantes, todos nascidos no Maranhão ou no Piauí, foram ma-triculados nessas mesmas províncias.

(24)

redu-Local de matrícula, Local de matrícula,

Número de escravos Número de escravos

Santos (SP), 1 Cururupu (MA), 5

Corte (RJ), 3 Codó (MA), 2

Grão-Mogol (MG), 5 São Luiz (MA), 1

Montes Claros (MG), 2 Coroatá (MA), 1

Rio Pardo (MG), 1 Viana (MA), 1

Castro (PR), 4 N. Sra. da Conceição (MA), 1

São José (SC), 4 Maranhão, 2

Tijucas (SC), 1 Teresina (PI), 1

Porto Alegre (RS), 1 Oeiras (PI), 1

Bagé (RS), 1 Campo Maior (PI), 1

Caetité (BA), 11 Piauí, 1

Monte Alto (BA), 8 Bom Conselho (PE), 1

Salvador (BA), 2 Triunfo (PE), 1

Cachoeira (BA), 2 Pernambuco, 1

Campo Largo (BA), 2 Catolé do Rocha (PB), 1

Maragogipe (BA), 1 Pilar (PB), 1

Caité (BA), 1 Paraíba, 1

Macaúbas (BA), 1 Fortaleza (CE), 1

Nazaré (BA), 1 Santa Quitéria (CE), 1 Pilão Arcado (BA), 1 Estância (SE), 1

Ouriçangas (BA), 1 Belém (PA), 1

Brejo Grande (BA), 1

Quadro 3

(25)

ziu-se, no intervalo 1874-1880, para menos de um quinto (respectivamente, 15,9 e 19,7 por cento dos indivíduos dos sexos masculino e feminino). Toma-dos eles e elas conjuntamente, tal participação chegou a 17,2 por cento em 1874-1880; entretanto, se somássemos ao contingente de cativos as 59 crian-ças ingênuas que acompanharam seus pais e/ou mães negociados naqueles sete anos, o mesmo porcentual elevar-se-ia para 25,1, bem mais próximo do observado no decênio anterior (30,0%).

Gráfico 4

Escravos negociados: Faixas etárias e sexo (Consituição de 1860-1870)

Como esperado, a presença de ingênuos foi pouco expressiva no quatriê-nio 1870-1873: apenas sete crianças. Levando em conta os 66 ingênuos iden-tificados de 1870 a 1880, notamos que a participação relativa dos adultos jo-vens (de 15 a 29 anos de idade, homens e mulheres), diminuiu entre 1861-1869 e 1870-1873, retornando aproximadamente aos mesmos níveis em 1874-1880. Assim, no total dos dois sexos, dita participação foi de, respectivamente, 46,6, 38,6 e 47,5 por cento, nos três períodos analisados.

A consideração da distribuição etária mostra-se mais reveladora quando vinculada ao tipo do tráfico (Gráfico 5). Verificamos, no comércio entre pro-víncias, o incremento da participação relativa dos adultos jovens — de 54,7 por cento em 1861-1869 para 62,5 por cento em 1870-1873 e 61,1 por cento em 1874-1880 —, mormente em detrimento da faixa etária até 14 anos. Sa-lientemos que esses percentuais em quase nada se alterariam pelo cômputo dos ingênuos, uma vez que tão-somente uma dentre as 66 crianças nessas con-dições foi transacionada no tráfico interprovincial. Por seu turno, nos negó-cios locais inseriram-se mais de dois terços dos ingênuos (69,7%). Os pesos

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Homens 1861-69

Homens, 1870-73

Homens, 1874-79

Mulheres, 1861-69

Mulheres, 1870-73

Mulheres, 1874-79

(26)

relativos dos adultos jovens negociados localmente, representados no Gráfico 4 e respectivamente iguais a 41,1, 34,9 e 43,0 por cento nos três períodos con-templados, alterar-se-iam, pelo cômputo das 46 crianças ingênuas, para 41,1, 34,2 e 37,9 por cento. E no comércio intraprovincial, muito embora respon-dendo por 28,8 por cento dos ingênuos presentes, percebemos, ao menos na segunda parte da década de 1870, o aumento na participação relativa dos adul-tos jovens, à semelhança do tráfico entre províncias. Dessa forma, os percen-tuais representados no gráfico em tela para a faixa de 15 a 29 anos no trânsi-to intraprovincial — 55,7 por centrânsi-to em 1861-1869, 50,0 por centrânsi-to em 1870-1873 e 67,3 por cento em 1874-1880 —, ‘ajustados’ pelo número res-pectivo de ingênuos, modificar-se-iam para 55,7, 47,1 e 60,2 por cento.

Em suma, o que podemos inferir de todos esses números extraídos a par-tir da distribuição etária das pessoas comercializadas em Constituição? Em primeiro lugar, e em que pese haver crescido a média de escravos negociados por ano entre 1861-1869 e 1870-1873, vemos reafirmada a idéia de que, em certa medida, e sobretudo nos comércios intra e interprovincial, o tráfico de cativos perdeu, em inícios do decênio de 1870, algo do vigor que apresentara nos anos 60. Em segundo lugar, notamos que o fôlego do comércio humano recuperou-se no restante da década de 1870, para o que foi decisiva a presen-ça dos adultos jovens, muitos dos quais trazidos de outras províncias do Im-pério, quer tenham vindo nas transações coletadas ou em algum momento anterior.

Gráfico 5

Escravos negociados: Faixas etárias e tipo do tráfico (Consituição de 1860-1870)

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Local 61-69

Local 70-73

Local 74-80

Intra 61-69

Intra 70-73

Intra 74-80

Inter 61-69

Inter 70-73

Inter 74-80

(27)

Obtivemos a informação do preço individual para 219 das 871 pessoas transacionadas de 1870 a 1880. Foram 148 homens e 71 mulheres, dos quais, respectivamente, 93 e 43 inseriam-se na faixa etária dos 15 aos 29 anos. Além desses, apenas um preço individual foi por nós descartado, por ter sido o es-cravo em questão caracterizado como ‘doentio’.

Na Tabela 11 fornecemos os preços médios nominais, segundo sexo, dos escravos em geral, bem como dos adultos jovens.23Os homens foram em

mé-dia 52,9 por cento mais caros do que as mulheres. Esse porcentual reduziu-se ligeiramente, para 49,6 por cento, quando computamos apenas os indivíduos de 15 a 29 anos de idade. E os adultos jovens, como esperado, foram negocia-dos a preços, em média, mais elevanegocia-dos do que os negocia-dos escravos de todas as ida-des (10,1 por cento maiores, no caso das pessoas do sexo masculino e 12,5 por cento no caso das cativas).

Tabela 11

Preços médios nominais dos escravos em geral e dos cativos adultos jovens, segundo sexo (Constituição, 1870-1880)

Sexo Número de escravos Preço médio (em réis)

Homens 148 1:865$135

Mulheres 71 1:220$155

Homens de 15 a 29 anos 93 2:053$763

Mulheres de 15 a 29 anos 43 1:372$814

Com o intuito de enfocarmos o comportamento dos preços de homens e mulheres ao longo do tempo, levamos em conta os períodos 1861-1869, 1870-1873 e 1874-1880 e fixamos nossa atenção no contingente dos adultos jovens. Além disso, deflacionamos os valores coletados valendo-nos do índice elabora-do por Mircea Buescu.24Trabalhamos com preços reais do início do período,

vale dizer, tomando 1861 como ano-base. Os resultados desse procedimento são apresentados na Tabela 12. Antes do mais, notamos que, nos três períodos considerados, os homens foram em média mais caros; esse diferencial, igual a 17,8 por cento em 1861-1869, cresceu apenas ligeiramente em 1870-1873 (19,4%), todavia sofreu pronunciado incremento em 1874-1880 (64,4%).25

(28)

me-nores do que em 1861-1869; e os preços praticados em 1874-1880 eram, a sua vez, 15,4 por cento menores do que em 1870-1873. Os homens igualmente experimentaram uma desvalorização em inícios da década de 1870, quando seus preços médios reais foram 9,7 por cento menores do que no decênio an-terior. Entretanto, tomados os sete anos de 1874 a 1880, observamos que os preços dos homens se recuperaram, sendo mesmo superiores (5,2%) aos ob-servados em 1861-1869. Entre os fatores explicativos desses comportamentos distintos, decerto não foram dos menos importantes o impacto da legislação abolicionista — mormente a libertação do ventre escravo como condicionan-te da desvalorização das cativas — e a expansão da cafeicultura paulista, esta última condimentada, também, pelas condições vivenciadas pelas demais ati-vidades econômicas em São Paulo, bem como nas outras províncias brasilei-ras. Os preços dos adultos jovens corroboram, portanto, a ocorrência dos dois movimentos aventados anteriormente: de um lado, o arrefecimento que em alguma medida marcou o comércio de escravos em Constituição nos anos iniciais da década de 1870; de outro, a retomada do ritmo dos negócios em 1874-1880, ainda que com características em parte modificadas.

Tabela 12

Preços médios reais dos cativos adultos jovens segundo sexo (Constituição, décadas de 1860 e 1870)

Sexo Preço médio, Preço médio, Preço médio,

1861-1869 1870-1873 1874-1880

(em réis; ano-base 1861) (em réis; ano-base 1861) (em réis; ano-base 1861)

Homens 1:603$834 1:447$586 1:687$234

Mulheres 1:361$349 1:212$660

C

ONSIDERAÇÕES FINAIS

(29)

questão vivenciou o avanço da lavoura cafeeira. Ainda que o progresso do cul-tivo da cana-de-açúcar, em meados da década de 1850, tornasse Piracicaba em certa medida resistente àquele avanço, com o passar dos anos mostrou-se inequívoco o crescimento da produção de café. Assim sendo, o município não se manteve alheio ao movimento da onda verde proveniente do Vale do Pa-raíba e demandante do Oeste histórico da Província.

Sobre esse pano de fundo econômico realizaram-se as transações objeto de nossa atenção. Nas escrituras coletadas, foram negociadas 1.270 pessoas durante aqueles vinte anos. A maior parte desses negócios foi realizada no âmbito local, atingindo proporções superiores a três quartos dos escravos co-mercializados de 1870 a 1873. Aproximadamente um sétimo daquele contin-gente foi transacionado no tráfico interprovincial, o qual apresentou partici-pações mais expressivas na década de 1860 e no período 1874-1880. Por fim, o comércio efetuado entre distintas localidades da província paulista respon-deu por pouco mais de um terço dos cativos negociados de 1861 a 1869, pro-porção que se reduziu a um décimo de 1870 a 1873 e recuperou-se para mais de um quarto de 1874 a 1880.

Percebemos, portanto, um ritmo diferenciado do tráfico de escravos: em especial, patenteou-se certa perda de intensidade daquele comércio nos anos iniciais da década de 1870, particularmente nos negócios intra e interprovin-ciais, para o que contribuíram, decerto, as incertezas que acompanharam a promulgação e a regulamentação da Lei do Ventre Livre. Tal perda de intensi-dade refletiu-se nas características demográficas (sexo, iintensi-dade) das pessoas transacionadas e, correspondentemente, nos preços praticados. De fato, co-mo uma decorrência direta da libertação dos nascituros, verificaco-mos inequí-voca desvalorização das mulheres escravas, efeito que se manteve por todo o decênio de 1870. Os cativos do sexo masculino, por seu turno, atingiram seus preços mais elevados exatamente no período que se abre em 1874.

(30)

poderiam estar, amiúde, percorrendo os mais recentes metros de longos tra-jetos, alguns ainda iniciados no continente africano, mas a maioria começa-dos em distantes províncias, situadas em tocomeça-dos os quadrantes, o mais das ve-zes no Nordeste do Império.

NOTAS

1PETRONE, M. T. S.A lavoura canavieira em São Paulo. Expansão e declínio (1765-1851).

São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1968, p.38 e 41. Caio Prado Júnior, cabe referir, es-tabeleceu os marcos limítrofes do ‘quadrilátero do açúcar’ nas cidades de Mogi Guaçu, Jundiaí, Porto Feliz e Piracicaba, o que também é feito por Ernani Silva Bruno (cf. PRADO

JR., C.Formação do Brasil Contemporâneo — Colônia. 17.ed. São Paulo: Brasiliense, 1981,

p.81; e BRUNO, E. S.Viagem ao país dos paulistas. Ensaio sobre a ocupação da área

vicen-tina e a formação de sua economia e de sua sociedade nos tempos coloniais. Rio de Janei-ro: Livr. J. Olympio, 1966, p.117). A esse respeito, Petrone empregou a seguinte argumen-tação:“Preferimos Sorocaba a Porto Feliz, como um dos pontos formadores do quadrilátero, pois em Sorocaba o cultivo da cana-de-açúcar ainda teve relativa importância e, porque, dessa maneira, Itu, importantíssimo centro canavieiro e outras áreas produtoras de açúcar ficam decididamente enquadrados” (PETRONE, M. T. S., op. cit., p.24).

2PETRONE, M. T. S., op. cit., p.49. Em 1769 foi criada a Freguesia de Santo Antonio de

Pi-racicaba, elevada à “categoria de Vila em 1822, sendo substituído o seu primitivo nome pelo de Constituição, e foi elevada a cidade em 1856” (LUNÉ, J. B.; FONSECA, P. D. (Org.)

Almanak da província de São Paulo para 1873. Ed. fac-similada. São Paulo: Imprensa Ofi-cial do Estado — Imesp, Arquivo do Estado de São Paulo, 1985, p.462). Apenas na segun-da metade do decênio de 1870 o nome do município foi alterado para Piracicaba.

3MÜLLER, D. P.Ensaio d’um quadro estatístico da província de São Paulo: ordenado pelas

leis municipais de 11 de abril de 1836 e 10 de março de 1837. 3.ed. fac-similada. São Pau-lo: Governo do Estado, 1978, p.127.

4PETRONE, M. T. S., op. cit., p.163. De fato, observou Sergio Milliet: “O café,

excessiva-mente lucrativo, progride. Em 1854, vemo-lo instalado em quase toda a região central, com pontos de concentração maior em Campinas, Bragança, Itu e Jundiaí. Paralelamente, a produção de açúcar aumenta, ultrapassando 100.000 arrobas em Itu, Piracicaba e

Capi-vari” (MILLIET, S.Roteiro do café e outros ensaios: contribuição para o estudo de história

econômica e social do Brasil. São Paulo: s.n., 1939, p.46).

5ZALUAR, A. E.Peregrinação pela província de São Paulo (1860-1861). Belo Horizonte:

Ita-tiaia; São Paulo: Edusp, 1975, p.151, grifo nosso.

6LUNÉ, J. B.; FONSECA, P. D. (Org.), op. cit., p.462. Nesse mesmo Almanak, acham-se

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tabernas) e aqueles vinculados às artes, indústrias e ofícios (fábrica e loja de chapéus, pa-darias, olarias, carpinteiros, ferreiros, ourives etc.).

7MARQUES, M. E. de A.Apontamentos históricos, geográficos, biográficos, estatísticos e

no-ticiosos da Província de São Paulo, seguidos da cronologia dos acontecimentos mais notáveis desde a fundação da Capitania de São Vicente até o ano de 1876. São Paulo: Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo, 1953, v.1, p.198.

8Produção que se elevou para 486.761 arrobas em 1920, aí somados os cafés de

Piracica-ba, Santa Bárbara, Rio das Pedras e São Pedro (cf. MILLIET, op. cit., p.43).

9Tendo em vista a manutenção,grosso modo, de uma mesma unidade territorial, optamos

por não compor a tabela em questão com os informes do recenseamento de 1836. Como es-creveu Müller, naquele ano “compreende no distrito [de Constituição] as Freguesias da Li-meira ... e a do Ribeirão Claro ... assim como as Capelas Curadas ... de Pirassununga ... e a de Santa Bárbara ... Contêm em todo o seu distrito 10.291 habitantes” (MÜLLER, D. P., op. cit., p.64-5). Considerada a classificação por idades tabulada pelo autor citado, a participação da população escrava nesse total de habitantes correspondeu a 33,8%, e as razões de sexo igua-laram-se a 100,6 (livres) e 184,3 (escravos); tomada a discriminação por classes, as discre-pâncias conduzem a uma participação dos cativos um pouco maior (35,4%) e a razões de sexo respectivamente iguais a 100,1 e 189,9. A parcela dos escravos homens de 20 a 40 anos de idade compunha, em 1836, a maioria (50,7%) dos cativos do sexo masculino, proporção que diminuiu para pouco mais de dois quintos (41,1%) no caso das mulheres.

10A cifra concernente aos cativos matriculados até 30 de setembro de 1872 em

Constitui-ção foi um pouco menor do que esse último número, igualando-se a 5.339 pessoas (cf. LUNÉ & FONSECA, op. cit., p.172).

11No censo de 1854, foram apenas 19 os estrangeiros identificados em Constituição, ou

0,3% da população total, mas esse porcentual alçou-se a 4,3% no primeiro recenseamento geral do Império, e a 6,4% em 1886, valores bem superiores aos encontrados nas localida-des do vale do Paraíba analisadas anteriormente. Dentre os 926 estrangeiros livres recen-seados em Piracicaba em 1874, a maioria era de alemães (53,2%); as outras nacionalida-des mais relevantes eram os africanos (11,6%), americanos (10,8%, todos eles computados em Santa Bárbara D’Oeste), portugueses (10,6%), suíços (9,0%) e italianos (3,7%); havia também uns poucos espanhóis e franceses. Em 1886, os estrangeiros somaram 2.102 pes-soas. Os numericamente mais importantes eram os portugueses (20,8%), italianos (19,6%), africanos (17,8%), alemães (17,4%) e austríacos (8,8%), havia também algumas dezenas de espanhóis, franceses e ingleses, além de pouco mais de duas centenas (10,4%) de

indi-víduos classificados na categoria “outros” (cf. BASSANEZI, M. S. C. B. (Org.) São Paulo do

passado: dados demográficos. Campinas: Nepo — Núcleo de Estudos em População / Uni-camp, 1998. 1 cd-rom).

12Cf. TAUNAY, A. d’E.História do café no Brasil. Rio de Janeiro: Departamento Nacional

do Café, 1939, v.3, p.203-4. E Emilia Viotti da Costa, referindo-se à década de 1850, obser-vou: “Em seu relatório de 1855, Saraiva dava uma relação das principais colônias

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Ubatuba” (COSTA, E. V. da.Da senzala à colônia. 3.ed. São Paulo: Brasiliense, 1989, p.115, grifo nosso).

13Os tabeliões valiam-se das expressões “morador”, ou “residente”, “desta cidade”, “deste

município”, “deste termo”. Quaisquer desses casos, desde que referidos a todos os contra-tantes, foram por nós computados como integrando o comércio local. Por conseguinte,

embora façamos amiúde menção, de forma simplificada no texto, ao município,

entende-mos como transações de natureza local as realizadas no município e seu termo.

14A maioria deles foi comprada/vendida (73, um deles apenas “em parte”), 9 foram

per-mutados e 5 doados (uma das doações somente de parte do cativo).

15O raciocínio desenvolvido neste parágrafo, portanto, tem tão-somente um caráter

hipo-tético, uma vez que não sabemos se os deslocamentos aventados estariam ligados às tran-sações registradas ou se teriam ocorrido em algum momento anterior.

16Não será demais lembrarmos que esses números estão limitados às transações cujas

es-crituras foram lançadas em Constituição, com o que decerto não se referem à totalidade dos negócios havidos.

17Não obstante a menor intensidade relativa do tráfico interprovincial no geral da década

de 1860, identificada, por exemplo, por Jacob Gorender (O escravismo colonial. 4.ed. rev. e

ampliada. São Paulo: Ática, 1985, p.327-8), Maria José Souza de Andrade observou: “Os dados oficiais mostram que no início da década de 60 aumentou o movimento de escra-vos que deixavam a Bahia ... [Todavia] O início da guerra civil nos Estados Unidos e o crcimento da produção do algodão no Nordeste contribuíram para reduzir o êxodo de

es-cravos da Bahia, após 1861” (ANDRADE, M. J. S. de.A mão-de-obra escrava em Salvador,

1811-1860. São Paulo: Corrupio; Brasília: CNPq, 1988, p.125). Dessa forma, a severa seca verificada em fins do decênio anterior parece ter imposto seus efeitos, mormente no mo-vimento dos escravos baianos: “A grande seca de 1857-1860, suas trágicas conseqüências e o tráfico interno deixaram o Nordeste com maioria de escravos idosos e crianças, propor-cionando sobrevida à escravidão no Sudeste cafeeiro, postergando a gradual extinção com mancípios jovens, sadios e em pleno vigor físico” (NEVES, E. F. Sampauleiros traficantes:

comércio de escravos do alto sertão da Bahia para o oeste cafeeiro paulista.Afro-Ásia,

Sal-vador, n.24, p.97-128, 2000, p.104).

18Não obstante, como chamamos a atenção anteriormente, o informe da naturalidade dos

escravos indicar ser possível haver movimentações entre províncias no conjunto dos trân-sitos não identificados. Considerando, no aludido conjunto, apenas os 18 indivíduos que sabemos serem naturais de outras províncias, observamos, de fato, uma distribuição etária que se diferencia da verificada no comércio local e se aproxima da percebida no trânsito interprovincial: todos os 18 tinham menos de 30 anos de idade, e 5 deles inseriam-se na faixa até 14 anos.

19Em ambos os casos — no geral e na faixa etária mencionada — as diferenças entre

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20Dentre os documentos por nós compulsados, foi na escritura lançada aos 21 de maio de

1877 que, pela primeira vez, o Tabelião fez referência à “cidade de Piracicaba”; até então — o assento anterior era datado de 25 de abril do mesmo ano — escreveu-se sempre “Cons-tituição”. Nesta seção adotamos o seguinte procedimento: quando nos referirmos no texto a datas específicas, como nos exemplos com os quais abrimos esta seção, utilizaremos o nome vigente nas mesmas datas; e ao nos referirmos a períodos — os quais, amiúde, abar-caram datas quando um e outro dos nomes estavam vigentes —, valer-nos-emos de qual-quer um deles, indistintamente.

21Computado, neste último porcentual, o homem classificado na categoria “outros”,

ven-dido por escravista residente no Reino de Portugal para um morador em Piracicaba.

22Como observou Robert Slenes, se os cativos, via de regra, eram já mais caros no Sudeste

cafeeiro nos anos de 1858 e 1859, eles passaram a ser, na maior parte dos casos, significati-vamente ainda mais caros em fins do decênio de 1870 e em inícios da década de 1880. Pa-ra tanto contribuíPa-ram a dinâmica diferenciada das atividades de exportação nas distintas

províncias e as secas sofridas pelo Nordeste entre 1877 e 1880 (cf. SLENES, R. W.The

de-mography and economics of Brazilian slavery: 1850-1888. Tese (doutorado em História). Stanford: Stanford University, 1976, p.183 e notas 4 e 5, p.215-6).

23Em ambos os casos, as diferenças entre os preços médios de homens e mulheres foram

estatisticamente significantes (nível de significância de 0,01%).

24Cf. BUESCU, M.300 anos de inflação. Rio de Janeiro: Apec, 1973.

25Nos três períodos, as diferenças entre os preços médios reais de homens e mulheres

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