PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA
TRAJETÓRIA DO IFRN EM INCLUSÃO ESCOLAR
MARIA RITA VITOR MARTINS RODRIGUES
MARIA RITA VITOR MARTINS RODRIGUES
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como pré-requisito para o título de Mestre.
Orientadora: Márcia Gorette Lima da Silva
BANCA EXAMINADORA
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Profa. Dra. Márcia Gorette Lima da Silva
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Profa. Dra. Eulália Raquel Gusmão de Carvalho Neto
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Profa. Dra. Claudianny Amorim Noronha
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Profª. Dra. Márcia Gorette Lima da Silva, por tudo que vem me
ensinando na área educacional, nos últimos dois anos, com amizade e respeito.
Aos dois alunos depoentes que me confiaram suas histórias tão particulares para publicação.
Às professoras Dra. Rosa Aparecida Pinheiro, Profa. Dra. Claudianny Amorim
Noronha e Eulália Raquel Gusmão de Carvalho Neto pela forma positiva com que aceitaram
partilhar seus conhecimentos.
À Profª. Narla Sathler Musse, pelo companheirismo e pela luta na educação de alunos com NEE.
Aos professores Dr. Isauro Beltran Nunez e Dra. Tereza Cristina Leandro de Faria e
aos meus colegas do Programa de Mestrado em Ensino de Ciências Naturais e Matemática, os
quais permitiram, através da troca e intenso debate de idéias, pontuar os limites e retomar a
direção. Especialmente, à professora Dra. Tereza, que me ajudou a discernir os rumos desta
pesquisa como co-orientadora deste estudo.
Ao colega professor Robson Canutto pelo apoio.
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em especial a Coordenação do Curso
de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática pela atenção e apoio.
Ao Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnológica do Rio Grande do Norte, pela
convivência, pelo carinho e atenção a mim dispensados.
Aos profissionais do IFRN, especialmente os que atuam no Núcleo, pelo compromisso
e dedicação ao mostrar que é possível ensinar aos alunos com NEE no ensino regular.
Aos meus queridos amigos e colegas do IFRN, por todo o afeto construído durante
nosso tempo de convivência.
Ao meu marido, meus filhos e sobrinha, pela força e estímulos recebidos durante esta
RESUMO
As discussões sobre inclusão de pessoas com necessidades especiais na escola são
relativamente recentes, mas toma corpo no âmbito internacional e nacional. Por outro lado, tal
discussão aos poucos vem se incorporando nos discursos e ações na instituição escolar e, mais
ainda na formação dos docentes. Esta investigação parte da necessidade de levantar elementos
para (re)pensar as ações propostas para inclusão de jovens com necessidade educativa
especial, neste particular com deficiência visual (DV), no Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN). Como apoio principal para as ações da
instituição encontra-se a criação do núcleo de apoio. Intenciona-se conhecer a voz de jovens
com DV para que as suas experiências possam sinalizar os caminhos e descaminhos tomados
pelo núcleo de apoio. Assim, neste relato a experiência vivenciada por estes jovens é de
fundamental importância. Para tanto, optou-se por utilizar elementos metodológicos apoiados
na história de vida de dois alunos com DV, aqui chamados de aluno (A1) e aluno (A2), desde
a infância até a entrada no IFRN. Deste relato emergiram como categorias: a infância e o
papel da família; a trajetória escolar e, por fim, relativas às ações do núcleo de apoio do
IFRN, dividindo-se em atitudes inclusivas e obstáculos. A primeira resgata as ações da família
no processo de ensino e aprendizagem destes alunos. A segunda categoria apresenta o
momento em que os alunos começaram a receberem a educação formal, propriamente dita. A
última categoria constitui o ponto fundamental da investigação, pois analisa o processo de
inclusão na instituição, na percepção dos próprios estudantes com deficiência visual. Os
resultados sinalizam para a necessidade de ações partilhadas entre alunos com NEE e
profissionais da escola na elaboração do Plano Educacional, que garantam a defesa dos
direitos a uma prática pedagógica eficiente e eficaz no processo de inclusão desses alunos.
ABSTRACT
Discussions over the topic of inclusion of handicapped people at school are considered recent, but they have become more and more frequent within the national and international scenario. Such discussion has also being inserted in the speeches and actions of the school institution and with the formation of educators. This investigation is made necessary as a way to collect elements to reconsider the actions for the inclusion of the special education need youth. In special the visually handicapped ones, at Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN). The creation of a support unit functions as main vehicle for the actions of the institution. It is intended to know what young people with limitations have to say regarding their experiences as a way to signal paths to be and not to be followed by the support unit. Therefore, the experience which these young boys and girls have is of crucial importance. In order to accomplish the task, it was decided to use methodological elements based upon elements supported by the life reports of two deficient students here called Borges and Stéfano. Their reports are from childhood to their arrival at IFRN. From their reports, categories appeared: childhood and the role of family; school life and, finally, related to the actions of the support unit of IFRN, being divided in inclusive actions and obstacles. The first one takes a second look at the actions of the family within the learning-teaching process of these students. The second category presents the moment in which students started to receive formal education per se. The last category constitutes the cornerstone of the investigation, for it analyses the process of inclusion in the institution, according to the perception of the students with visual limitations. The results signaled the need for shared intervention between students with Special Education Needs and school professionals in the elaboration of the Educational Planning, which guarantees the defense of the rights to an efficient teaching practice and effective in the process of inclusion of these students.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES
ABNT - Associação Brasileira de Normas e Técnicas
APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
CEFET-RN - Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte
CENESP - Secretaria de Educação Especial do MEC, em 1989
CID - Classificação Internacional de Doenças
CFE - Conselho Federal de Educação
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
ETFRN - Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte
IBC - Instituto Benjamim Constant
ICEVI - Conselho Internacional de Educação de Pessoas com Deficiência Visual
IFRN - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte
DV - Deficiência Visual
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC - Ministério da Educação
NEE - Necessidade Educativa Especial
ONU - Organização das Nações Unidas
OMS - Organização Mundial de Saúde
PNE - Plano Nacional de Educação
PPGECNM - Pós-graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática
SETEC - Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
TECNEP - Educação, Tecnologia e Profissionalização para Pessoas com Necessidades
Educacionais Especiais
UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SEESP - Secretaria de Educação Especial
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Foto 01 - Máquina de escrever em Braille... 56
Foto 02 - Texto escrito em Braille... 56
Foto 03 - Objeto representando uma flor...57
Foto 04 - Maquete de areia...57
Foto 05 - Mapa Potiguar...57
Foto 06 - Globo e Mapa Mundial...58
Foto 07 - Painéis dos cursos de formação continuada em inclusão – Núcleo- IFRN...68
Foto 08 - Funcionários e alunos do Núcleo - IFRN...69
Foto 09 - Banner de divulgação do material didático tátil desenvolvido no Núcleo...70
Foto 10 - Painel com exposição de material didático – IFRN...70
Foto 11 - Professores da rede estadual de Natal junto com profissionais do IFRN...71
Foto 12 - Sala de atividades do Núcleo IFRN...73
Foto 13 - Material didático elaborado no Núcleo IFRN...73
Foto 14 - Mesa de atividades pedagógicas no Núcleo...74
Foto 15 - Acervo de livros do Núcleo...75
Foto 16 - Material didático adaptado pelo Núcleo IFRN...75
Foto 17 - Exposição de material do Núcleo – IFRN...75
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 10
Capítulo I: A INCLUSÃO ESCOLAR E AS POLÍTICAS PÚBLICAS ... 15
1.1 Cultura e Escola... 15
1.2 Situando o contexto da Educação Inclusiva... 17
1.3 As políticas públicas de inclusão no Brasil... 21
Capítulo II: A APRENDIZAGEM DE ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS ... 29 2.1 O sentido do termo deficiência visual no contexto escolar ... 29
2.2 Alunos cegos na escola ... 34
2.3 Sinalizações das principais mudanças nas políticas públicas brasileiras ... 38
Capítulo III: CONHECENDO A HISTÓRIA ESCOLAR À LUZ DO SEU OLHAR ... 43 3.1 Nossos objetivos... 44
3.2 A metodologia assumida, os sujeitos e o contexto... 45
3.3 A infância e o papel da família ... 48
3.4 A trajetória escolar... 52
Capítulo IV: A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DO IFRN A PARTIR DO OLHAR DE ALUNOS COM NEE ... 62 4.1 O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte ... 63 4.2 Núcleo e o apoio às políticas de inclusão ... 67
4.3 A inclusão escolar do IFRN na percepção dos alunos com NEE ... 76
4.3.1 Atitudes Inclusivas no IFRN... 77
4.3.2 Os obstáculos encontrados... 82
CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 89
INTRODUÇÃO
Ao pensar no objeto da pesquisa e nos interesses pessoais motivadores, são
vivências/experiências pessoais e profissionais que vêm à tona. Neste trabalho não foi
diferente. Atuo como orientadora pedagógica no Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) e participo do grupo de trabalho de inclusão na
instituição com ações mais próximas ao Núcleo de Apoio. Tais atividades estão diretamente
relacionadas com minha vida pessoal.
Há vinte anos nascia o meu segundo filho, com um problema a superar, nascera com a
Síndrome de Down. A nova situação que vivenciávamos nos levava a questionar onde buscar
ajuda para superá-las? Precisava de informações para compreender e com orientação de
profissionais da saúde, comecei mergulhando em leituras na área da Psicologia e Medicina.
Porém, os esclarecimentos eram superficiais já que não respondiam às minhas inquietações.
Como bem destacava a Profª Kortmann (MOSQUERA, STOBAUS, 2003), o nascimento de
um filho perfeito e saudável é o desejo dos pais ao longo da gestação.
Esta busca incessante por informações foi o estímulo para retornar aos estudos, e em
1992 reingressei na Academia, no curso de Pedagogia. Minhas inquietações e
questionamentos se moveram em primeiro lugar para o entendimento de como educar meu
filho, o que foi gradualmente se ampliando para entender todos aqueles que, por alguma
razão, não acompanhavam seus colegas na escola, o que levava muitos destes a exclusão.
Durante a graduação, os questionamentos dirigiam-se a pensar na educação e na escola para
aqueles que têm alguma deficiência. A participação em reuniões e o trabalho voluntário em
escolas que recebiam alunos especiais foi outra forma de aproximação.
Ao longo desses anos, vivencio, dia a dia, de forma diferenciada, mas não separada, o
desafio da inclusão; seja como mãe, professora, orientadora educacional e pedagoga.
Em 2005, ingressei na UFRN como aluna especial do doutorado em educação com um
projeto de pesquisa voltado para a questão de alfabetização de crianças com Síndrome de
Down. O interesse era o desenvolvimento da linguagem e cognição destas crianças. Mas, por
questões diversas de foco institucional não foi possível seguir o projeto.
Nessa mesma época, no IFRN, no papel como coordenadora pedagógica do Núcleo de
Apoio que é uma sala de recursos da instituição que desenvolve uma política inclusiva sobre
necessidades educacionais especiais no ensino regular, tive a oportunidade de participar de
um curso de formação continuada para professores das redes públicas estadual e municipal de
Natal. No decorrer do curso foi possível o envolvimento com um estudante com deficiência
visual que participava como aluno bolsista do mesmo. Este aluno relatava suas dificuldades
referentes aos conteúdos da área de Ciências quando cursara o Ensino Médio.
O papel que desempenhava como coordenadora pedagógica possibilita mediar com
dois professores de Física do Instituto a elaboração de material tátil para auxiliar o
aprendizado do aluno, visto que o mesmo havia terminado o Ensino Médio e tinha interesse
em fazer o vestibular.
As dificuldades relatadas pelo aluno trouxeram elementos importantes para a reflexão
e discussão no curso de formação continuada que estava acontecendo. Os professores
elaboravam e adaptavam materiais e, através do diálogo estabelecido entre o aluno com NEE
e professores, o aluno compreendia os conceitos da Física. Este trabalho foi importante para
fortalecer a concepção de uma educação inclusiva para os profissionais do IFRN, como
também para o aluno bolsista com NEE, como pudemos verificar mais tarde pelos
depoimentos do aluno, visto que hoje é estudante da Instituição cursando o Ensino Superior
de Geografia e foi colaborador deste estudo.
O interesse pela aprendizagem de alunos com NEE no IFRN ampliou quando, em
2006, ocorreu o ingresso no Curso Superior de Informática, de outro aluno com deficiência
visual. A iniciativa como orientadora pedagógica do Núcleo foi de procurar promover a
integração dos alunos, em articulação com o processo de aprendizagem, visto que apesar de
toda uma política institucional para a inclusão dos alunos, ainda se observavam algumas
dificuldades de aprendizagem e de envolvimento de outros professores.
Estudos de Mantoam (2003), Ferreira (2004), Padilha (2005) e outros revelam que, a
inclusão escolar de alunos com NEE é dificultada, quando professores e escolas não
conseguem atender as especificidades de aprendizagens dos mesmos. Estes estudos
denunciam ainda que, quando os alunos não trazem os pré-conhecimentos supostos pelos
currículos escolares as escolas não avaliam as necessidades de aprendizagens e nem elaboram
propostas diferenciadas. A situação experiencial diferente vai-lhes, exigir adaptações dolorosas, para chegar ao estágio “idealizado”, com o devido amoldamento aos programas e tarefas escolares. Isto determina, às vezes, um longo e difícil período de adaptação. Neste, o
aluno vai ficando calado, desinteressado, desmotivado, tomado por um sentimento de
Um aspecto que auxiliariam seria o envolvimento dos próprios alunos nas propostas
curriculares e a escola proporcionando apoio pedagógico nas dificuldades detectadas.
Foi refletindo no que produzir e no que está sendo produzido a partir da conexão
desses dois temas – inclusão e apoio pedagógico aos alunos com NEE - que me lancei à
pesquisa de mestrado. As inquietações se dirigiam para várias perspectivas, desde pensar a
formação dos professores no IFRN, até escutar os alunos para que juntos nos auxiliassem a
identificar as lacunas em nossa proposta em incluir alunos com NEE. Deste modo, o que
eleger como objeto de análise? Como compor um estudo que fosse relevante e que pudesse de
alguma forma, contribuir para a inclusão escolar do IFRN?
Neste sentido, de maneira ainda bastante ampla, tracei um primeiro delineamento da
pesquisa. O interesse estava sendo colocado na formação do professor de ciência com o
componente curricular em inclusão. Assim, almejava problematizar a aprendizagem dos
alunos com deficiência visual considerando alguns aspectos do currículo. Iniciei a pesquisa de
campo em agosto de 2008, sendo que em novembro do mesmo ano havia construído um
banco de dados extenso, verifiquei que muitos caminhos poderiam ser tomados.
Os dados selecionados possibilitavam verificar o objeto de análise em diversos
ângulos, desde as condições estruturais na promoção a acessibilidade das pessoas com
deficiência, transtornos do desenvolvimento ou outras necessidades educacionais especiais,
por meio da redução de barreiras comunicacionais, arquitetônicas, como, também, através das
reformas curriculares metodológicas, instrumentais, programáticas e atitudinais enfrentadas
pela comunidade interna e externa do IFRN.
As longas conversas com a orientadora, o ir e vir e o diálogo aberto me possibilitavam
o amadurecimento necessário. Deste modo, uma questão que se colocava referia-se ao
inter-relacionamento desses diversos ângulos e os próprios dizeres dos alunos com deficiência
visual. Assim, concentrei o problema nos dizeres dos sujeitos sobre a própria inclusão escolar
vivenciada por eles. Neste sentido, sintetizamos o nosso problema indagando: como os alunos
com NEE percebem a inclusão escolar do IFRN? Deste modo buscamos, neste estudo, (re)
pensar as ações de inclusão do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio
Grande do Norte (IFRN) trazendo as vozes dos alunos que tecem a inclusão escolar do IFRN,
que carregam nestes dizeres o entrecruzamento com suas historias familiares e escolares
O Instituto Federal de Educação do Estado do Rio Grande do Norte (IFRN), situado
em Natal/RN, que, ao longo de um século vem primando por um ensino de qualidade, tem a
meta de continuar avançando em suas práticas pedagógicas. Apesar do reconhecimento da
ação pedagógica da escola em inclusão ser recente, são muitas as dificuldades encontradas nas
escolas para atender os alunos com necessidades educacionais especiais em geral. A
instituição pesquisada aponta para uma prática educativa onde a interação com o outro de
forma respeitosa se torna imprescindível. Como também, a necessidade em reavaliar-se
constantemente, a fim de melhorar suas habilidades de trabalho, de avaliação e de registro de
suas práticas educativas, como evidencia o trabalho em questão.
Assim, o interesse em conhecer a voz dos alunos que estão vivenciando diretamente a
inclusão escolar tem o intuito de proporcionar maiores conhecimentos sobre como a mesma
vem ocorrendo. A esse respeito Pedroso (2001) destaca que devido à complexa condição do
aluno com algum tipo de deficiência no Ensino Regular, o seu processo educacional precisa
ser acompanhado de forma sistemática e criteriosa, evitando as avaliações superficiais, que
não são capazes de revelar a realidade deste processo.
Entendemos que ao resgatar a própria experiência do IFRN com a inclusão escolar, até
chegar à implantação de um núcleo para dar apoio pedagógico aos alunos que apresentam
necessidades educativas especiais, possibilitará reflexões nos caminhos tomados, favorecendo
aos próprios profissionais da instituição avaliar o processo e socializar as conquistas e
desafios com outros profissionais e instituições.
A proposta de ensino da referida instituição insere elementos importantes na reforma
curricular; considera as condições estruturais concretas necessárias aliadas às condições de
estudo, discussão e pesquisa nas práticas inclusivas. Neste sentido, é que representa um
recurso de apoio para a disseminação de atividades exitosas em inclusão, como também
constitui uma fonte de pesquisa para profissionais da área de educação interessados em
identificar alternativas para iniciar ou aperfeiçoar o processo ensino/aprendizagem.
Por meio das experiências relatadas pelos alunos em aprender com professores que
não foram formados para atuarem com alunos com NEE, a dificuldade de lidar com o novo, a
falta de experiência, o desconhecimento da deficiência, a importância da formação e o apoio
pedagógico, bem como os próprios depoimentos dos alunos com NEE sobre as interações
com os professores, as buscas coletivas de soluções para ensinar e aprender os conteúdos
reflexão e representam referenciais para a criação ou aperfeiçoamento de espaços escolares
inclusivos.
A dissertação está organizada em quatro capítulos. O primeiro capítulo analisa como
as políticas mundiais entendem e valorizam a inclusão escolar do aluno com NEE no Ensino
Regular, relacionando-as com o que prescrevem os marcos legais brasileiros em vigor.
O segundo capítulo aborda algumas concepções sobre aprendizagem de alunos com
NEE e aponta sinalizações das principais mudanças nas políticas públicas brasileiras trazendo
algumas reflexões sobre a inclusão de alunos com deficiência visual na escola. Fato
relativamente recente e sobre o qual existe um desconhecimento quase que generalizado por
parte dos educadores.
No terceiro capítulo ocupamo-nos em discorrer sobre os objetivos da pesquisa, os
sujeitos e o caminho percorrido. Justificamos a opção pelos autores e as nossas escolhas
metodológicas. Descrevemos minuciosamente as técnicas e procedimentos de coleta de dados
que ancoram a investigação.
O quarto e último capítulo resgatam de forma reflexiva a trajetória do Instituto
Federal do Estado do Rio Grande do Norte no que se refere à inclusão de alunos com
necessidades especiais, especialmente alunos com deficiência visual, materializada na criação
de um Núcleo de Apoio Pedagógico. Este capítulo constitui o ponto fundamental da nossa
investigação, pois possibilitou nossa reflexão, entre outros aspectos, sobre as práticas
pedagógicas desenvolvidas no IFRN com alunos com NEE.
A conclusão apresenta os delineamentos de alguns caminhos derivados e apreendidos
na inter-relação dos discursos dos sujeitos e, consequentemente, a interpretação dos dados
iluminados no aporte teórico, vislumbrando que os mesmos possam contribuir para melhor
compreensão de quem é a pessoa com NEE. As possibilidades que, os alunos têm em avaliar
o ensino que recebem e a contribuição para as escolas avançarem nas suas práticas em
inclusão escolar, da mesma forma irá promover uma educação que possibilite não só às
pessoas com deficiência visual, mas a todos os considerados especiais, a oportunidade de
CAPÍTULO I
A INCLUSÃO ESCOLAR E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
Um tempo de crise global, em que os velhos paradigmas da modernidade estão sendo contestados e em que o conhecimento, matéria-prima da educação escolar, passa por uma reinterpretação. A inclusão é parte dessa contestação e implica a mudança do paradigma educacional atual, para que se encaixe no mapa da educação escolar que precisamos retraçar. As diferenças culturais, sociais, étnicas, religiosas, de gênero, enfim, a diversidade humana está sendo cada vez mais desvelada e destacada e é condição imprescindível para o entender como aprendemos, e como percebemos o mundo e a nós mesmos. O modelo educacional já mostra sinais de esgotamento e, no vazio de idéias que acompanha a crise paradigmática, surge o momento oportuno das transformações (MANTOAN, 2006, p. 188 -189).
Neste capítulo abordamos de forma sucinta o conceito de cultura e o papel da escola,
como espaço social, esses temas foram inseridos neste estudo em respeito à pluralidade e aos
direitos dos chamados excluídos de participarem da escola pública como sujeitos. Procuramos
fazer um breve resgate da discussão em diferentes fóruns internacionais que levaram a
proposição de documentos sinalizadores para a urgência de políticas públicas que garantissem
o direito à inclusão escolar.
1.1 Cultura e Escola
A visibilidade das minorias e o debate sobre as diferenças na educação são recentes no
Brasil e no mundo. Inicia-se sob influência de estudos culturais que vem se elaborando na
Europa e na América do Norte. Conhecimentos e cultura veiculados que, hoje sabemos, não
pertencem propriamente à humanidade, mas, a homens de origem européia, brancos, letrados,
de formação judaico-cristã, colonizadores. Logo, não podemos mais continuar pensando que cultura se refere ao suposto “conhecimento universal”, patrimônio da “humanidade”. Por tratar de um conceito fechado e contraproducente quando se trata de dar conta da diversidade
de posições no mundo.
nas ciências sociais e histórias” (1994: p, 41). Assim, também pensa Raymond Williams
(1979, p, 13) classificando cultura como “uma das palavras mais difíceis da língua inglesa”.
Forquim (1993) situa cultura como o conjunto dos traços característicos dos modos de
vida de uma sociedade, de uma comunidade ou de um grupo. Aí compreendidos os aspectos
que se podem considerar como os mais cotidianos, os mais triviais ou os mais inconfessáveis.
Na mesma direção, Suart Hall descreve cultura como “o terreno real, sólido das práticas,
representações línguas e costumes de qualquer sociedade histórica específica, bem como as formas contraditórias de „senso comum‟; que se enraizaram na vida popular e ajudaram a moldá-la” (apud NELSON, TREICHELER e GROSSBERG, 1995, p. 15). Além destes
entendimentos, considera-se útil, destacar a compreensão da cultura a partir de perspectiva
pós-moderna, NA QUAL, como destaca Donald e Ratansi, esta é assumida como um conjunto dos “processos, categorias e conhecimentos através dos quais as comunidades são definidas e se definem de formas específicas e diferenciadas” (apud MEYER, 2000, p. 76).
Isto significa não apenas descrever os elementos culturais, mas também, desvendar a
forma pela quais os fenômenos manifestos são produzidos por intermédio da significação,
estruturas de poder e instituições. Como afirmam Moreira (1995, p. 27) “a cultura é o terreno
em que se enfrentam diferentes e conflitantes concepções de vida social, é aquilo pelo qual se luta e não aquilo que recebemos”.
Nesta perspectiva, a escola é o lugar de prática social onde as políticas e as
determinações mais amplas incidem, influenciando, as atitudes, inter e intrasubjetivas do
professor e dos alunos. É onde se realiza a educação efetiva dos sujeitos reais, marcados pela
cultura dos grupos sociais em que vivem e trabalham os indivíduos: seu contexto cultural.
À medida que os sujeitos vivem, que elaboram suas vidas e os sentidos que a ela dão,
constroem seus diferenciados modos de vida. A psicologia aponta alguns determinantes do
comportamento e da psiquê humanos que, não se localizam nem na fisiologia, nem na
atividade externa do indivíduo, mas na cultura, organizada em forma de signos, conforme
coloca Davidov “estes signos possuem significados estáveis, pois são formados no curso do
desenvolvimento da cultura” (apud BOLZAN, 2002, p. 25). Neste mesmo sentido Vigotsky destaca que “o signo inicialmente, é um meio de vinculação social, um meio de ação sobre os outros e somente mais tarde se converte em um meio de ação sobre si mesmo” (apud
As formas de internalizar comportamentos culturais envolvem a reconstrução da
atividade psicológica humana, tendo como básicos os instrumentos e os signos. Os
comportamentos são construídos e reconstruídos culturalmente, dando espaço a uma nova
entidade psicológica. Assim a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas,
uma relação mediada pela cultura, que vai configurando as estruturas psíquicas.
O desenvolvimento das funções psíquicas superiores têm na perspectiva vigotskyana
como suporte a base natural das formas culturais de comportamento.
A cultura engloba múltiplos aspectos: conceitos, explicações, raciocínios, linguagem, ideologia, costumes, valores, crenças, sentimentos, interesses, atitudes, pautas de conduta, tipos de organização familiar, de trabalho economia social, tecnologia, tipos de habitat, etc. O conjunto de respostas coletivas que os membros de um determinado grupo social gerou para poder superar as inúmeras dificuldades encontradas ao longo de sua história configura a sua cultura particular. Vigotsky (apud COLL, 1998, p. 123).
Na concretização desta compreensão estão os princípios da escola pós-moderna que
chamam atenção para a necessidade do reconhecimento da fragmentação de uma noção de
identidade fixa e bem localizada, enfatizando a pulverização das identidades culturais de
classe, gênero, etnia, raça, padrões culturais e nacionalidade a serem levadas em consideração
em práticas pedagógico-curriculares voltadas para a construção de uma sociedade plural e
igualitária comprometida com a ética e o desenvolvimento da cidadania plena.
1.2Situando o contexto da Educação Inclusiva
Em vários documentos oficiais do início da década de 1990 (UNESCO, 1994; PNUD;
1993), entre outros, apontavam que nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, mais
de 100 milhões de crianças e jovens não tinham acesso à escolarização básica e que, apenas
2% de uma população com deficiência, estimada em 600 milhões de pessoas, recebia qualquer
modalidade de educação. Assim, os "organismos internacionais de desenvolvimento
decidiram abraçar a meta de inclusão social e apoiar não apenas pesquisas sobre as causas da
pobreza e da desigualdade, mas também as medidas necessárias para combatê-las"
Tais evidências estimularam o consenso sobre a necessidade de concentrar esforços
para atender as necessidades educacionais de inúmeros alunos até então privados do direito de
acesso, ingresso, permanência e sucesso na escola básica. Essas mesmas estatísticas
revelavam que pessoas negras, mulheres, pobres e com alguma deficiência, encontram
maiores dificuldades tanto para ingressar no sistema formal de ensino bem como para
concluírem a educação básica.
Seria justamente a educação que poderia contribuir para a promoção dessas pessoas ditas „excluídas‟. Mesmo assim, não basta qualquer educação, mas, aquela que coloca a diferença num campo de significação positiva onde a tolerância não pareça uma concessão
indiferente, distante, que se faz ao outro. Uma escola onde os processos de desigualdade são
combatidos com a afirmação da igualdade de direitos.
É neste movimento em torno destas necessidades que leva, entre outros, a um marco nesta discussão em 1990 com a realização, em Jomtien, da “Conferência Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de aprendizagem” promovida pelo
Banco Mundial, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciências e a Cultura
(UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Participaram desta conferência educadores de diversos países do mundo, sendo nessa ocasião aprovada a “Declaração Mundial sobre Educação para Todos”.
Os princípios e fundamentos norteadores da declaração mundial reconhecem a
profunda desigualdade econômica que resulta em forte estratificação social. A partir da matriz
cultural ocidental européia, construíram-se representações sobre diversos povos,
fundamentadas em ideias ligadas a déficit, carência entre outros. Num contexto, onde as
supremacias econômicas e tecnológicas, com as conseqüentes relações de poder entre os
países, e mesmo no interior de uma nação, provocam e provocaram a marginalização de
certos grupos sociais em detrimento de outros.
A crítica a este fenômeno vai ganhando visibilidade na sociedade. Consequentemente,
práticas democráticas exigiram/exigem o reconhecimento e a valorização da diferença como
condição básica para a prática política em todos os níveis. Tal motivação na busca de
igualdade para todos os grupos diferia-se da matriz subjacente à globalização da economia,
Os princípios que norteiam as declarações advogam ainda a necessidade de acesso à
educação de qualidade para todos independentes das condições físicas e sociais, apontam para
a relevância de discussões sobre a dignidade do ser humano, igualdade de direitos e recusa
categórica das formas de discriminação destacam a necessidade, mais do que nunca da escola
assumir-se como espaço social dos significados étnicos necessários e constitutivos de toda e
qualquer ação de cidadania (DECLARAÇÃO DE JOMTIEM, 1990).
Nesta direção, o princípio da inclusão passa então a ser defendido como uma proposta
da aplicação prática ao campo da educação de um movimento mundial, denominado inclusão
social. Implicaria, portanto, na construção de um processo bilateral nas quais as pessoas
excluídas e a sociedade buscam, em parceria, efetivar a oportunidades para todos, construindo
uma sociedade democrática e cidadã, em que a diversidade seria respeitada e reconhecida
politicamente.
Outro marco histórico foi a Declaração dos Direitos Humanos de Viena (UNESCO,
1993) que trouxe o princípio da diversidade, colocando o direito à igualdade no mesmo
patamar do direito à diferença. Neste documento afirma-se “o reconhecimento da pluralidade
de sujeitos portadores de direitos e de seus direitos específicos como parte integrante e indivisível da plataforma universal dos Direitos Humanos” (UNESCO, 1993, p. 7). Assim, vem à tona a ética da diversidade na implantação de uma política inclusiva.
Tal debate insere-se nos grandes movimentos contra a exclusão social, como é o caso
da emancipação feminina, tendo como princípio a defesa da justiça social celebrando a
diversidade humana (AINSCOW, FERREIRA, 2003).
A escola, como espaço social, é inserida nesta discussão sobre o respeito à pluralidade e aos direitos dos chamados „excluídos‟. Entretanto, o entendimento sobre a inclusão escolar, teve diferente nuances. Alguns entendiam que a inclusão escolar era para os jovens em
situação de deficiência pelo fato de ter as suas origens no centro dos movimentos contra
exclusão social e não, a todas as crianças e jovens com Necessidades Educativas Especiais
(NEE).
Neste contexto, em 1994 na Espanha, a UNESCO promove a “Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: acesso e qualidade”, que levou a elaboração da Declaração de Salamanca (1994), considerada como o mais importante marco mundial na
A partir de então a expressão “necessidades educativas especiais” ganha força no
campo educacional, referindo-se a todas as crianças e jovens que revelam precocidade ou
atraso na aprendizagem do conhecimento escolar comparados a estudantes da mesma faixa
etária. Assim, era necessário que a escola se adapte às suas características e lhes proporcione
experiências facilitadoras da aprendizagem e de uma progressiva autonomia.
O conceito de pessoas com necessidades educativas especiais, apresentado na
Declaração de Salamanca, relaciona “a expressão necessidades educativas especiais referindo-se a todas as crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua capacidade ou de suas dificuldades de aprendizagem” (UNESCO, 1994, p. 18). Esse mesmo documento fortalece que as escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de suas condições físicas,
intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras, com utilização de uma pedagogia
equilibrada, capaz de beneficiar todas as crianças.
Outros documentos têm vindo a ser produzidos para apoiar e ajudar a implementar as
ideias expressas na Declaração de Salamanca, entre elas a Carta de Luxemburgo (1996) com a
proclamação européia do princípio da não-discriminação, consagrada também no artigo 13 do
Tratado de Amsterdam (1997) e a Declaração de Madrid (2002), com o princípio de
não-discriminação como ação positiva que fazem a inclusão social.
Outro marco importante na difusão da educação inclusiva foi a realização em 2000 do
Fórum Mundial de Educação, realizado em Dakar, Senegal que contou com representantes de
vários países. Esse encontro ocupou-se, segundo diretor geral adjunto da UNESCO, John
Daniel (2002) em revisar e avaliar a situação da educação básica no mundo. O diretor destaca
no relatório sobre esta situação que, apesar dos constantes debates sobre a necessidade da
escolarização para todos ainda são diagnosticados um significativo percentual de excluídos do
acesso escolar.
Neste sentido, assumimos esta posição de que a maioria das pessoas com
Necessidades Educativas Especiais (NEE) são alunos portadores de alguma deficiência,
alunos com desigualdades de recursos econômicas somadas as discriminações baseadas no
gênero, na raça, na incapacidade de aprender, que marcam as desigualdades educacionais.
O breve relato sinaliza que nas últimas duas décadas houve uma significativa produção
de documentos por organizações mundiais que, expressam a urgência do combate à exclusão
e a necessidade de serem criadas disponibilidades e condições de operacionalização da
Este avanço do pensamento mundial em torno da educação inclusiva abre os
horizontes das políticas nacionais educacionais, mas traz a difícil tarefa de romper com
paradigmas tradicionais e propor ações mais amplas que estejam de acordo com a realidade
histórico-cultural de cada país. Assim sendo, como se configura esta temática na educação
brasileira?
1.3As políticas públicas de inclusão no Brasil
No Brasil, o movimento de transformação do sistema educacional brasileiro que vem
se dando nas últimas duas décadas, mais especificamente com a Constituição de 1988, o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, e a própria Lei de Diretrizes e Bases
(1996). Estes documentos têm se caracterizado pela tarefa gigantesca de transformá-lo em um
sistema escolar com qualidade, que reconheça a diversidade e favoreça a todos o acesso ao
conhecimento escolar para a transformação da própria sociedade.
O papel das políticas públicas brasileiras tem sido fundamental neste processo, com destaque a, pelo menos três momentos relevantes em relação à compreensão da educação de
pessoas com NEE: o Paradigma da Institucionalização1, o da Integração e finalmente a
Inclusão.
O primeiro atendimento às pessoas com NEE no Brasil foi denominado Paradigma da
Institucionalização, constata-se que à pessoa portadora de deficiência era considerada
desnecessária para o sistema de produção então vigente no país, ameaçadora para a Saúde
Pública, ônus para a família e para a comunidade. Segundo Aranha (2001, p.31), só restava à
segregação social, mascarada sob um conjunto de argumentos científicos, religiosos e
assistenciais.
Assim, inicia-se no Brasil, em 1854, a educação para as pessoas com NEE em forma
de internato, com a fundação do Imperial Instituto de Meninos Cegos, hoje conhecido como
Instituto Benjamin Constant e, em 1857 com a criação do Instituto dos Surdos-Mudos, hoje,
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), ambos na cidade do Rio de Janeiro
(JANNUZZI, 1992; BUENO, 1993; MAZZOTTA, 1996). Esses dois estabelecimentos foram
1
precursores da criação de outras instituições similares. Seguindo o modelo europeu então
vigente.
A introdução no Brasil, de formas de estudar e ler para as pessoas cegas iniciou-se
com o brasileiro José Álvares de Azevedo que realizou seus estudos em Paris, no Instituto
Real dos Jovens Cegos, onde fora aprender a nova técnica e o método Braille. Chegando ao
Brasil, ensinou o sistema Braille a Adéle Sigaud, filha do Dr. Xavier Sigaud, médico do Paço,
que logo levou a D. Pedro II a ideia de criar em nosso país um colégio destinado à educação e
residência de pessoas cegas (BUENO, 1993, p. 94).
As ideias que davam sustentação à criação das instituições totais para pessoas com
NEE, por isso denominado Paradigma da Institucionalização, manifestavam-se no argumento
de que a manutenção dos diferentes locais segregados era útil para eles, que encontravam na
instituição, uma forma de abrigo, alimentação e cuidado.
Ao enfatizar a necessidade de encontrar espaços educativos segregados para as
pessoas com necessidades educativas permite pensar avanços e alternativas para a época
sendo que a mesma até então não possuía uma educação formal. Mas, por outro lado, pode
justificar múltiplas barreiras, criando a fragmentação ou a criação de guetos culturais, de
fundamentalismos, que reproduzem as desigualdades e discriminações sociais.
Segundo Bueno (1993), o surgimento de internatos parece ter sido determinado muito
mais pelo interesse de figuras próximas ao poder constituído, do que pela real necessidade.
Entendia-se a deficiência como um atributo do indivíduo, incurável, que requeria, para seu
enfrentamento, a segregação institucional da pessoa. Para Jannuzzi (1985), a criação dessas
primeiras instituições especializadas.
[…] não passaram de umas poucas iniciativas isoladas, as quais abrangeram os mais lesados, os que se distinguiam, se distanciavam ou pelo aspecto social ou pelo comportamento divergentes. Os que não o eram assim a “olho nu” estariam incorporados às tarefas sociais mais simples. Numa sociedade rural desescolarizada (JANNUZZI, 1985, p. 28).
O fortalecimento do capitalismo no Brasil no final da década de 50, aliado aos
movimentos do mundo ocidental, baseado nos princípios dos direitos universais encaminhou
uma mudança de paradigma. Esses movimentos passaram a defender que as pessoas
frequentar a corrente principal da sociedade devendo usufruir dos bens públicos como saúde,
lazer, educação de forma não segregadas.
Tais movimentos em defesa da garantia dos direitos universais ganharam força,
particularmente nos países europeus, onde ocorreu uma grande motivação social, por parte de
pais e parentes de pessoas com deficiência, visto que as reivindicações eram restritas as
pessoas com algum tipo de deficiência e visava coibir a discriminação e as segregações
sofridas por esses. Começa a ser enfatizado o Paradigma da Integração2, uma bandeira
defendida dentro destes movimentos que entendiam ser a adaptação do deficiente à sociedade
o pressuposto da sua normalização.
O Paradigma da Integração no Brasil foi importante no atendimento educacional às
pessoas com NEE visto que ainda não possuía legislação específica e,
[…] somente a partir dos anos 50, mais especificamente no ano de 1957, que o atendimento educacional aos indivíduos que apresentavam deficiência foi assumido explicitamente pelo governo federal, em âmbito nacional, com a criação de campanhas voltadas especificamente para este fim (MAZZOTA, 2002, p. 51).
Assim, o primeiro movimento foi feito em 1957 com a Campanha para a Educação do
Surdo Brasileiro que tinha por objetivo promover medidas necessárias para a educação e
assistência aos surdos, em todo o Brasil. Os movimentos seguintes tiveram, em 1958, a
Campanha Nacional da Educação e Reabilitação do Deficiente da Visão e a Campanha
Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes Mentais (MAZZOTTA, 1996, p. 52)
A concepção da sociedade brasileira sobre a educação das pessoas com necessidades
educativas especiais dentro do contexto da integração esta refletida nos documentos legais. A
legislação (Lei nº 4.024/61) previa o atendimento ao aluno com NEE na rede regular de
ensino e sua integração na comunidade – no artigo 88 –, garantindo apoio financeiro do poder
público àquelas instituições privadas consideradas especializadas pelos conselhos estaduais
de educação – no artigo 89. No entanto, esse texto legal não imputava responsabilidade ao
poder público para com a educação das pessoas com NEE (MAZZOTTA, 1999). Somente em
2
1971, a Lei nº 5692/71 reafirmou a necessidade de conferir um tratamento adequado a esses
alunos.
A educação das pessoas com NEE foi assegurada pelo Parecer nº 848/1972, o qual
solicitava ao poder público á viabilização de subsídios para o equacionamento do problema
relacionado com a educação dessas pessoas (MAZZOTTA, 1999, p.68). Segundo esse autor,
essa solicitação ministerial estava também acompanhada de carta do presidente da federação
nacional das APAEs, Dr. Justino Alves Pereira. O referido documento reivindicava:
[…] a adoção de medidas urgentes para que também o campo do ensino e amparo ao excepcional seja dinamizado numa hora em que todos os outros setores educacionais são reformulados e acionados. Conforme comenta o próprio relator, os dois documentos se completam e esta área, que até há pouco era uma atividade igualmente excepcional, tem sido objeto de atenção do MEC, do Conselho Federal de Educação, no sentido de cercá-la de garantias que respondam por seu êxito. (MAZZOTA, 1996, p. 56)
Nos documentos apontados aqui, os termos; excepcional e portador de deficiência são
sempre recorrentes.Sobre essa questão Sassaki (2003, p. 160-165)destaca queos termos são
considerados corretos em função de certos valores e conceitos vigentes em cada sociedade e
em cada época.
Assim, eles passam a ser incorretos quando esses valores e conceitos vão sendo
substituídos por outros, o que exige o uso de outras palavras. Estas outras palavras podem já
existir na língua falada e escrita, mas, neste caso, passam a ter novos significados.
As orientações encontradas nos documentos legais da época sobre o atendimento
educacional brasileiro para as crianças com NEE, recomendavam ações criteriosas não só na
observação de suas condições individuais, mas quanto ao grau da deficiência, das condições
físicas, humanas, geográficas, sociais e financeiras, ficando o encaminhamento aos serviços
sob a responsabilidade de uma equipe interdisciplinar. Conforme expressa o documento
relativo à organização e funcionamento de serviços às pessoas com NEE:
Collares e Moysés (1986, p. 10), pesquisadoras que se dedicam ao estudo da relação
entre a Saúde e a Educação, denominam essa concepção de medicalização do fracasso escolar,
ou seja, a busca de causas e soluções médicas ao nível organicista e individual para problemas
pedagógicos. O envio de alunos para os serviços de saúde, em busca de solução para supostos
distúrbios ou problemas de aprendizagem. Implica a adoção de medidas que objetivam a
eliminação ou a minimização dos problemas para uma aproximação de um padrão
considerado pela sociedade normal.
O Paradigma da Integração é caracterizado, neste contexto, como o princípio de
normalização, que não sendo específico da vida escolar, atinge o conjunto de manifestações e
atividades humanas e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afetadas ou não por uma
incapacidade, dificuldade ou inadaptação. Segundo Mantoan (1998) a normalização visa
tornar acessível às pessoas socialmente desvalorizadas condições e modelos de vida análogos
aos que são disponíveis de um modo geral ao conjunto de pessoas de um dado meio ou
sociedade.
Estudos de Edler (1998) sobre o mesmo tema refere-se à integração como um processo
que consiste em educar na escola regular, crianças com NEE juntamente com crianças chamadas “normais” podendo a criança permanecer período integral na ou parcial, utilizando o contra turno para frequentar locais especializados, conforme a sua necessidade. Segundo
esta autora:
[…] trata-se de um processo gradual e dinâmico que assume distintas formas, segundo as necessidades e características de cada aluno, considerando o seu contexto sócio–econômico. Este conceito se traduz o que se conhece como a teoria do ambiente o menos restritivo possível (AMR) centrada nas aptidões dos alunos que devem ser “preparados” para a integração total, no ensino regular (EDLER, 1998, p. 158-159).
Nesse sentido, fica clara a intenção social de preparar, ensinar, oferecer condições a
pessoa com deficiência para que esta passasse a frequentar e funcionar no espaço comum da
vida em comunidade. Segundo Aranha (2001) este fato, ao longo do tempo, foi ficando claro
para a comunidade acadêmica, pais e professores e até mesmo as próprias pessoas com
deficiência, que testemunhavam, na realidade educacional, que, conquanto o objetivo formal
fosse integrar, as ações institucionais permaneciam voltadas exclusivamente para a
modificação da pessoa com deficiência, e que esta permanecia sendo considerada uma pessoa
A análise crítica dessa realidade aliadas às transformações sociais ocorridas na década
de oitenta ligados aos avanços científicos e culturais, provocaram novas visões e proposições
educacionais na medida em que deram lugar a novos valores e estabelecendo novas
necessidades a serem atendidas a partir do ensino. Surgindo assim, o Paradigma da Inclusão3.
No ano de 1981, foi instituído o ano internacional das pessoas com deficiência,
apoiado pela ONU defendendo a igualdade de oportunidade para todos. Esse posicionamento
repercutiu e trouxe desdobramentos no Brasil com a formulação de vários planos, tais como o
Plano de Ação da Comissão Internacional de Pessoas Deficientes (1981) e o Plano Nacional
de Ação Conjunta para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (1985).
Esses movimentos provocaram uma mudança, traduzindo ruptura com uma
perspectiva benevolente na adoção de uma posição política, centrada na garantia de direitos e
de acesso à cidadania, para as pessoas com NEE. Assim, os principais argumentos
apresentados nos movimentos defendiam que essas pessoas tinham, sim, o direito a receber
todo e qualquer serviço necessário para seu desenvolvimento alcançando melhor nível de
autonomia social e pessoal. Acrescentavam, entretanto, ainda, que o critério da normalização
não pode ser uma condição para que o indivíduo possa participar regularmente da vida na
comunidade.
A inclusão social é considerada um processo pelo qual a sociedade se adapta para
poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e,
simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. Trata-se de um
processo bilateral nos quais as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade buscam estratégias para
equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para
todos.
As ideias postas em referência à Inclusão Social aplicam-se igualmente à Inclusão
Educacional. Assim, na inclusão educacional, torna-se necessário o envolvimento de todos os
membros da equipe escolar no planejamento de ações e programas voltados à temática.
Docentes, diretores e funcionários apresentam papéis específicos, mas precisam agir
coletivamente para que a inclusão escolar seja efetivada nas escolas. Por outro lado, torna-se
3
essencial que esses agentes deem continuidade ao desenvolvimento profissional e ao
aprofundamento de estudos, visando à melhoria do sistema educacional.
Segundo (ARANHA, 2001), o sistema educacional brasileiro tomou a decisão política
de se transformar, promovendo os ajustes para atender às necessidades educacionais de todo
seu alunado.
Os documentos legais elaborados dentro desse contexto enfatizam o direito das
pessoas com NEE de frequentarem a escola regular sem restrição. Em 1989, a Lei Federal nº
7.853, preconiza a educação para as pessoas com NEE em instituições públicas de ensino e
considera crime passível de punição e reclusão de um a quatro anos, além de multa, a atitude
de dirigentes de instituição de ensino público ou particular que recusarem ou suspenderem,
sem justa causa, a matrícula de um aluno com deficiência.
Outro documento importante é o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), criado
pela Lei nº 8.069/1990, que trata da proteção integral da criança e estabelece o direito à
educação como prioritário para o pleno desenvolvimento humano e preparo para o exercício
da cidadania. Esse mesmo documento estatui que "os pais ou responsáveis têm a obrigação de
matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino" (Art. 55 do E.C.A.). Esta
disposição, que estabelece a responsabilidade do pai pela matrícula do filho no sistema
regular de ensino, significa o direito de todo cidadão, desde os primeiros anos de vida, a uma
educação pública, universal, gratuita e obrigatória.
Visando ajustar-se a lei educacional à legislação federal brasileira, em 1996
homologa-se a LDBEN nº 9394/96, a qual entende que a educação de pessoas com
necessidades especiais deve dar-se preferencialmente na rede regular de ensino e que vai além
das iniciativas até então aventadas, ou seja, de fato normativa a educação de sujeitos com
alguma deficiência. Assim, a responsabilidade isolada e retórica das Constituições anteriores
ganha um sentido mais amplo e mais abrangente com as novas redações. O pai negligente,
tanto quanto o Poder Público desleixado, pode ser chamado a responder pela não matrícula da
criança na escola.
Pelo relatado até o momento, observa-se tanto por documentos legais como pelos
movimentos sociais, o incremento das preocupações com a educação das pessoas com NEE.
Sinalizam também o questionamento do papel dos discursos e práticas curriculares, na
cultural e, no desafio a preconceitos ligados as determinantes de gênero, raça, religião,
deficiências, padrões culturais e outros.
Mesmo quanto à proposta de inclusão escolar, ora em curso, muitos são os
desencontros e problemas na implementação de inovações efetivas. Persistem as dificuldades
das instituições de ensino no sentido de reorientarem suas práticas numa linha de promoção
das possibilidades dos sujeitos e de atuação com caráter mais prospectivo, não só no que
concerne aos conteúdos especificamente acadêmicos, mas também na formação do indivíduo,
no sentido de ajudá-lo socialmente a crescer, a ocupar espaços da cultura, conforme os
diferentes momentos de sua existência. Destas experiências, explicitaremos no próximo
capitulo algumas das idéias de alguns estudiosos em relação à aprendizagem do aluno com
deficiência visual, no sentido de estarmos mais atentos às pesquisas sobre o tema, e,
dialeticamente como as políticas em inclusão escolar vão se constituindo. Ambas são
igualmente necessárias, pois capazes de nos instrumentalizar para continuarmos a produzir
CAPÍTULO II
A APRENDIZAGEM DE ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS
A exclusão escolar manifesta-se das mais diversas e perversas maneiras, e quase sempre o que está em jogo é a ignorância do aluno, diante dos padrões de cientificidade do saber escolar. Ocorre que a escola se democratizou abrindo-se a novos grupos sociais, mas não aos novos conhecimentos. Exclui, assim, os que ignoram o conhecimento que ela valoriza e, assim, entende que a democratização é a massificação de ensino e não cria a possibilidade de diálogo entre diferentes lugares epistemológicos, não se abre a novos conhecimentos que não couberam, até então, dentro dela (MANTOAN, 2006, p.190).
As discussões sobre inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais na
escola são relativamente recentes, mas há situações em que a prática escolar para esses alunos
já faz parte do cotidiano como é o caso da escola pesquisada. Dentro desse contexto,
questionamentos emergem como, por exemplo, como ensinar para alunos com NEE sem uma
formação especifica? De que forma as escolas se organizam para receber esses alunos? O que
dizem os estudos sobre a aprendizagem de alunos sem o sentido da visão? A partir dessas
indagações e das inferências obtidas através de conversas informais com pais, professores e
alunos a respeito da inclusão escolar de alunos com deficiência visual no ensino regular, fato
que vem sendo priorizado muito recentemente no campo da educação ainda com
pouquíssimos estudos realizados, que apenas em raros casos chegaram até aos professores. E
que, buscamos, neste capitulo, apresentar medidas de apoio disponibilizadas pelo MEC/
SEESP às escolas como também abordar algumas concepções sobre a aprendizagem de
alunos com necessidades especiais no ensino regular.
2.1 O sentido para o termo deficiência visual no contexto escolar
Ao se tratar especificamente da educação da pessoa com deficiência visual, pode-se
dizer que a falta de visão é percebida, a priori, como ponto frágil e vulnerável, causando
curiosidade, piedade, surpresa e admiração, de forma que a pessoa é vista como dependente,
pessoas não sabem o que é ser cego, o que é ser alguém com uma capacidade visual limitada e
não conhecem as formas de interação desses com o meio.
De forma semelhante, os professores que recebem alunos cegos ou com baixa visão
em sala de aula, na sua maioria, têm apenas informações superficiais sobre a questão e não
conhecem as potencialidades e possibilidades destes alunos. O fato de não enxergar impõe
limites, é certo. E exige adaptações, mas se as informações não chegam ao cego pela visão, é
justamente pelos outros sentidos que ele tem infinitas possibilidades de conhecer o mundo em
que vive. Esse processo não se dá de forma automática, como uma substituição de um sentido
por outro como pressupunham muitos.
Há uma tendência cultural de que a pessoa vidente4 considera este indivíduo como
limitado, e, consequentemente, incapaz ou deficiente. No entanto, a pessoa cega, ainda que
com um sentido prejudicado, tem capacidades de desenvolvimento como qualquer pessoa,
desde que lhe sejam dadas às condições adequadas para tal. Quer dizer, é necessário que o
ambiente onde ela vive seja adaptado para sua limitação e possibilite o acesso às informações
visuais por outras vias.
A deficiência visual, assim como os outros tipos de deficiência, assume na sociedade
em que vivemos uma diferença impedindo que a pessoa deixe de ser vista como um ser
humano integral e passa a ser percebida frequentemente como um ser imperfeito. Nos últimos
anos, travou-se uma longa discussão a respeito de qual seria o termo adequado para se referir a este segmento: “portador de deficiência”, “pessoa com necessidades especiais”, “portador de necessidades especiais”, “deficiente visual”, “cego”, “baixa visão” e, finalmente, “pessoa com deficiência”.
Para Vivarta (2003, p. 39), “a terminologia correta é especialmente importante quando abordamos temas tradicionalmente derivados de preconceitos, estigmas e estereótipos”. Este autor destaca que o problema decorrente do uso de termos incorretos reside no fato de
conceitos obsoletos, ideias equivocadas e informações inexatas serem inadvertidamente
reforçadas e perpetuadas.
Na legislação brasileira verificamos que é utilizada a expressão “portador de deficiência”. Entretanto, tem-se rejeitado a palavra “portador”, alegando que é penoso atrelar ao comprometimento a condição de portá-lo. Foi a partir desta insatisfação que surgiu o termo “pessoa com necessidade especial”.
4
Entretanto, levando-se em consideração que todas as necessidades dos indivíduos são
de alguma forma especial, essa expressão provocava uma diferenciação discriminatória e foi amplamente recusada. Já a palavra “deficiente” se tornou reducionista estigmatizante, pois toma a parte pelo todo e sugere que a pessoa inteira é deficiente, incapaz. Assim, uma
tendência foi utilizar a expressão “pessoa com deficiência”, pois permite um distanciamento
entre a pessoa propriamente dita e sua condição de dificuldade. Conforme os artigos 3 e 4 do
capítulo 1, do Decreto Federal nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, entende-se que:
Deficiência é todo e qualquer comprometimento que afeta a integridade da pessoa e traz prejuízos na sua locomoção, na coordenação de movimentos, na fala, na compreensão de informações, na orientação espacial ou na percepção e contato com as outras pessoas.
Deficiência Visual é a perda ou redução da capacidade visual em ambos os olhos em caráter definitivo e que não possa ser melhorada ou corrigida com uso de óculos ou tratamento cirúrgico, clínico e/ou lentes (BRASIL, 1999, p. 12).
Com relação ao deficiente visual, o mesmo documento trata da pessoa que tem
dificuldade ou impossibilidade de enxergar, a uma distância de 6 metros o que uma pessoa
sem deficiência enxergaria a 60 metros, após a melhor correção, ou que tenha o campo visual – área de percepção visual – limitada a 20% ou com ambas as situações (BRASIL, 1999).
A cegueira pode estar presente desde o nascimento ou ser adquirida ao longo da vida.
É frequente imaginar que toda pessoa cega nasceu com tal deficiência visual, porém, muitos
são os casos de aquisição da doença. A perda da visão antes dos cinco anos de idade é
chamada cegueira congênita. Já os cegos que perdem a visão a partir dessa idade são
considerados cegos adventícios.
O MEC classifica que “são cegas as crianças que não têm visão suficiente para aprender a ler em tinta, necessitam, portanto, utilizar de outros sentidos (tátil, auditivo, olfativo, gustativo e sinestésico) no seu processo de desenvolvimento e aprendizagem” (BRASIL, 2002, p. 13).
Além das crianças cegas, também são consideradas com deficiência visual, as com
visão para explorar o ambiente, conhecer o mundo e aprender a ler e escrever” (BRASIL, 2002, p. 13). Já o Instituto Benjamin Constant classifica-se como visão subnormal ou baixa
visão como:
A perda significativa da visão, que não pode ser corrigida por tratamento clínico ou cirúrgico, nem por óculos de correção. O portador de visão subnormal, dependendo da patologia, apresenta comprometimentos relacionados à diminuição da acuidade visual e/ou campo visual, à adaptação à luz e ao escuro e à percepção de cores (NABAIS, 1996, p.1).
Em 1992, em Bangkok, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Conselho
Internacional para Educação de Pessoas com Deficiência Visual (CIEVI), ao discutirem o
atendimento às crianças com baixa visão incluem uma avaliação clínica funcional realizada
por oftalmologista e pedagogo especializados em baixa visão. Considerando que o
desempenho visual é mais um processo funcional do que simples expressão numérica de
acuidade visual5.
Os critérios visuais incluídos nessa definição seguem a Classificação Internacional das
Doenças (CID) e não devem ser, portanto, utilizados para elegibilidade de educação ou
reabilitação sem incluir dados de avaliação de outras funções visuais igualmente importantes
como, a sensibilidade a contrastes e adaptação à iluminação.
Na avaliação clínica compreende o diagnóstico e prognóstico; a avaliação da acuidade
visual para perto e longe; a avaliação do campo visual; a avaliação da sensibilidade aos
contrates e visão de cores; a prescrição e orientação de recursos ópticos especiais. A avaliação
funcional é a observação do desempenho visual do aluno em todas as atividades diárias, desde
como se orienta e se locomove, alimenta se, brinca e até como usa a visão para realizar tarefas
escolares ou práticas.
A avaliação funcional da visão revela dados qualitativos de observação informal
sobre: o nível de desenvolvimento visual do aluno, o uso funcional da visão residual para as
atividades educacionais, da vida diária, orientação, mobilidade e trabalho, a necessidade de
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