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Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 3 7 ( 4 ) :2 9 6 -2 9 9 , jul-ago, 2 0 0 4
A epidemia de dengue/dengue hemorrágico no município
do Rio de Janeiro, 2 0 0 1 /2 0 0 2
The epidemic of dengue and hemorrhagic dengue fever in the city
of Rio de Janeiro, 2001/2002
Clarisse Guimarães Casali
1, Marcelo Ricardo Reis Pereira
1, Luciana Maria Jabor Garcia
Santos
1, Maíla Naves Pereira Passos
1, Bruno de Paula Menezes Drumond Fortes
1, Luis Iván
Ortiz Valencia
2, Aline de Jesus Alexandre
1e Roberto de Andrade Medronho
1 ,2RESUMO
O o b je ti vo d e ste e stu d o f o i a va li a r a o c o rrê n c i a d o s p ri n c i p a i s si n a i s e si n to m a s d o s c a so s d e d e n gu e c lá ssi c o e d e n gu e h e m o rrá gi c o n a e p i d e m i a d e 2 0 0 1 - 2 0 0 2 d o m u n i c í p i o d o Ri o d e Ja n e i ro . Fo ra m a n a li sa d o s o s 1 5 5 .2 4 2 c a so s n o ti f i c a d o s a o Si ste m a d e In f o rm a ç õ e s d e Agra vo s d e No ti f i c a ç ã o , d e sd e ja n e i ro /2 0 0 1 , a té ju n h o /2 0 0 2 ; d e ste to ta l, e x c lu i n d o - se o s i gn o ra d o s, 8 1 .3 2 7 c a so s f o ra m c la ssi f i c a d o s c o m o d e n gu e c lá ssi c o e 9 5 8 c o m o d e n gu e h e m o rrá gi c o , c o m u m to ta l d e 5 4 ó b i to s. Ava li a ra m - se a s va ri á ve i s re f e re n te s à si n to m a to lo gi a d a d o e n ç a . Ma n i f e sta ç õ e s ge ra i s c o m o f e b re , c e f a lé i a , p ro stra ç ã o , m i a lgi a , n á u se a s e d o r re tro - o rb i tá ri a ti ve ra m a lta i n c i d ê n c i a ta n to n o d e n gu e c lá ssi c o c o m o n o d e n gu e h e m o rrá gi c o . Po r o u tro la d o , m a n i f e sta ç õ e s h e m o rrá gi c a s e a lgu m a s d e m a i o r gra vi d a d e c o m o c h o q u e , h e m o rra gi a d i ge sti va , p e té q u i a s, e p i sta x e , d o r a b d o m i n a l e d e rra m e p le u ra l, e sti ve ra m si gn i f i c a ti va m e n te a sso c i a d a s a o d e n gu e h e m o rrá gi c o . Alé m d i sso , a e vo lu ç ã o d o q u a d ro c lí n i c o p a ra o ó b i to f o i 3 4 ,8 ve ze s m a i o r n o d e n gu e h e m o rrá gi c o q u e n o d e n gu e c lá ssi c o ( OR= 3 4 ,8 ; IC 1 9 ,7 - 6 1 ,3 ) .
Pal avr as-chave s: De n gu e . Ep i d e m i o lo gi a . Si n a i s e si n to m a s. Vi gi lâ n c i a e p i d e m i o ló gi c a .
ABSTRACT
Th e f o llo wi n g stu d y wa s i n te n d e d to e va lu a te th e o c c u rre n c e o f typ i c a l si gn s a n d sym p to m s i n th e c a se s o f c la ssi c d e n gu e a n d h e m o rrh a gi c d e n gu e f e ve r, d u ri n g th e 2 0 0 1 - 2 0 0 2 e p i d e m i c i n th e c i ty o f Ri o d e Ja n e i ro . Th e a u th o rs re vi e we d 1 5 5 ,2 4 2 c a se s n o ti f i e d to th e In f o rm a ti o n Syste m o f No ti f i c a ti o n Di se a se s, f ro m Ja n u a ry/2 0 0 1 to Ju n e /2 0 0 2 : 8 1 ,3 2 7 c a se s we re c la ssi f i e d a s c la ssi c de n gu e a n d 958 a s he m o rrha gi c de n gu e f e ve r, wi th a to ta l o f 60 de a ths. Co m m o n sym pto m s, su c h a s f e ve r, h e a d a c h e , p ro stra ti o n , m ya lgi a , n a u se a a n d re tro - o rb i ta l p a i n , h a d a h i gh i n c i d e n c e i n b o th c la ssi c a n d h e m o rrh a gi c d e n gu e f e ve r. On th e o th e r h a n d , h e m o rrh a gi c si gn s a n d o th e r si gn s o f se ve re d i se a se , su c h a s sh o c k , ga stro i n te sti n a l b le e d i n g, p e te c h i a e , e p i sta x i s, a b d o m i n a l p a i n a n d p le u ra l e f f u si o n , w e re stro n gly a sso c i a te d to h e m o rrh a gi c d e n gu e f e ve r. Be si d e s, th e o c c u rre n c e o f d e a th wa s 3 4 .8 ti m e s h i gh e r i n h e m o rrh a gi c d e n gu e f e ve r th a n i n c la ssi c d e n gu e ( OR = 3 4 .8 ; CI 1 9 .7 – 6 1 .3 ) .
Ke y-words: De n gu e . Ep i d e m i o lo gy. Si gn s a n d sym p to m s. Ep i d e m i o lo gi c su rve i lla n c e .
1 . Departamento de Medic ina Preventiva da Fac uldade de Medic ina da Universidade Federal do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro , RJ. 2 . Núc leo de Estudo s de Saúde Co letiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro , Rio de Janeiro , RJ.
En dereço para correspon dên cia: Dr. Roberto de Andrade Medronho. DMP/FM/UFRJ. Av. Brigadeiro Trompowsky s/nº, Cidade Universitária, 2 1 9 4 9 -9 0 0 Rio de Janeiro, RJ. Telefax: 5 5 2 1 2 2 7 0 -0 0 9 7
e-mail: medro nho @ nesc .ufrj .br Rec ebido para public aç ão em 1 1 /7 /2 0 0 3 Ac eito em 1 9 /5 /2 0 0 3
O vírus do dengue pertencente ao gênero fla vivírus, família
fla vivirida e, apresenta quatro sorotipos ( 1 , 2 , 3 , 4 ) . Fatores c omo a urbanizaç ão ac elerada, fac ilidades de transporte entre regiões e falênc ia dos programas de c ontrole do Ae de s a e gypti
favorec em o aumento da transmissão do dengue9 1 0 1 1.
A infec ç ão possui um espec tro que varia desde a forma assintomátic a até quadros de hemorragia e c hoque, podendo evoluir, inc lusive para o êxito letal. O dengue é uma doenç a febril aguda, c om duraç ão de 5 a 7 dias. O dengue c lássic o apresenta quadro c línic o muito variável, geralmente c o m
2 9 7 febre alta ( 3 9 ° a 4 0 ° ) de início abrupto, seguida de cefaléia,
mialgia, prostração, artralgia, anorexia, astenia, dor retro-orbitária, náuseas, vômitos e exantema. Associada à síndrome febril, em a lguns c a so s po de o c o r r e r he pa to m e ga lia do lo r o sa e , principalmente, nas crianças, dor abdominal generalizada. Os adulto s po de m apr e se ntar m anife staç õ e s he m o r r ágic as, c o m o pe té q uia s , e pis ta xe , ge n givo r r a gia , s a n gr a m e n to gastrintestinal, hematúria e metrorragia. Com o desaparecimento da febre, há regressão dos sinais e sintomas, podendo ainda persistir a fadiga1 3 4.
Por outro lado, os sintomas iniciais do dengue hemorrágico, apesar de semelhantes aos do dengue clássico, podem evoluir rapidamente para manifestações hemorrágicas e choque. Os casos típicos do dengue hemorrágic o são c arac terizados por febre alta, fenômenos hemorrágicos, hepatomegalia e insuficiência circulatória. Nos casos graves, o choque ocorre entre o 3º e 7º dia de doença, geralmente precedido por dores abdominais. Sua duração é curta, podendo levar ao óbito em 12 a 24 horas ou à recuperação rápida após terapia apropriada. Um ac hado laboratorial importante do dengue hemorrágic o é a tromboc itopenia c om hemoc onc entraç ão concomitante. A gravidade do dengue hemorrágico está relacionada à efusão do plasma, caracterizada por valores crescentes do hematócrito1 3 4.
Convém ressaltar que, diante da gravidade da epidemia 2001-2002, na qual circularam os sorotipos 1, 2 e 3, com predomínio deste último e da ameaça de reurbanização da febre amarela, tr ansmitida pe lo me smo ve to r5, to r na-se ne c e ssár ia uma investigaç ão aprofundada desta epidemia. Logo, um estudo descrevendo o perfil clínico e epidemiológico dos casos de dengue e dengue hemorrágico, notificados na epidemia 2001/2002 no município do Rio de Janeiro é importante para que se conheça melhor a gravidade e a magnitude do processo epidêmico.
MATERIAL E MÉTODOS
Ár ea de estudo. O munic ípio do Rio de Janeiro possui um a po pulaç ão de 5 . 8 5 7 . 9 0 4 hab itante s ( IB GE, 2 0 0 0 ) . Constitui-se em um importante pólo turístic o, além de polític o e e c o nô m ic o ; o q ue favo r e c e o apar e c im e nto de no vas do e nç as e a r e - intr o duç ão de o utr as j á e r r adic adas. O munic ípio possui elevado grau de desigualdade soc ial c om parte da populaç ão vivendo em c ondiç ões prec árias, c omo em áreas de favelas. Além disso, o Rio de Janeiro apresenta e le vada de nsidade de mo gr áfic a e so fr e um pr o c e sso de urbanizaç ão desordenada.
Coleta e análise do mater ial. Neste estudo, analisaram-se 1 5 5 .2 4 2 c asos notific ados pelo Sistema de Informaç ões de Agravos de Notific aç ão ( SINAN) , no período entre 1 º de j aneiro de 2 0 0 1 e 2 2 de j unho de 2 0 0 2 , fo rnec ido s pela Sec r etar ia Munic ipal de Saúde do Rio de Janeir o ( SMS) . Foram c onsiderados apenas os c asos c lassific ados pelo SINAN c omo dengue c lássic o e dengue hemorrágic o.
Aná lis e de da do s. A análise fo i fe ita utilizando as variáveis referentes à sintomatologia, à evoluç ão do quadro c línic o ( óbito) , ao sexo e à idade em funç ão do diagnóstic o
final, através dos programas Ep i i n f o 6 .0 4 d e o S- Plu s 2 0 0 0 ( Release 3 Copyright 1 9 8 8 -2 0 0 0 Math Soft, Inc ) . Foi utilizado o te ste
χ
2 pa r a dife r e nç a de pr o po r ç õ e s c o m níve l de signific ânc ia menor que 5 % e c álc ulo do o dds ra ti o ( OR) c om intervalo de c onfianç a de 9 5 % .RESULTADOS
De ac ordo c om o c ampo d i a gn ó sti c o f i n a l ( DIAGFINT) do banc o de dados do SINAN foram c lassific ados, segundo c ritérios da Organizaç ão Mundial de Saúde ( OMS) , 8 1 .3 2 7 c asos c omo dengue c lássic o, 9 5 8 c omo dengue hemorrágic o, 1 .4 4 8 c asos desc artados, 3 .2 0 2 c asos inc onc lusivos, 3 8 .1 6 3 c asos ignorados, além de 3 0 .1 4 4 notific aç ões sem nenhuma informaç ão referente ao c ampo di a gn ó sti c o f i n a l. No c ampo
e vo lu ç ã o ( EVOLUÇÃO) existia um total de 6 0 óbitos, dos quais 2 3 oc orreram no c asos c lassific ados c omo dengue c lássic o, 3 1 nos c asos de dengue hemorrágic o, além de 6 óbitos entre os c asos desc artados.
A Figura 1 mostra que a sintomatologia mais freqüente nos c asos de dengue c lássic o na epidemia de 2 0 0 1 /2 0 0 2 no munic ípio do Rio de Janeiro fo i: febre ( 9 8 ,8 % ) , c efaléia ( 9 5 ,8 % ) , mialgia ( 9 2 ,4 % ) , pro straç ão ( 9 0 % ) , do r retro -orbitária ( 8 2 ,5 % ) , artralgia ( 7 6 ,4 % ) e náusea ( 7 0 ,8 % ) .
Fi gu ra 1 - Si n to m a to lo gi a d o d e n gu e c lá ssi c o n a e p i d e m i a d e 2 0 0 1 / 2 0 0 2 , Mu n i c í p i o d o Ri o d e Ja n e i ro .
A Figura 2 apresenta a sintomatologia dos casos de dengue hemorrágico. Os sinais e sintomas mais freqüentes são febre ( 99,2%) , cefaléia ( 94,7%) , mialgia ( 94,4%) , prostração ( 91,9%) , dor retro-orbitária ( 83,7%) , náusea ( 81,9%) e artralgia ( 76%) .
É importante ressaltar que as manifestações hemorrágicas e de maior gravidade como dor abdominal ( 5 5 ,4 %) , petéquias ( 5 1 ,6 %) , hemorragia digestiva ( 3 7 ,6 %) , gengivorragia ( 3 4 ,6 %) , epistaxe ( 3 4 ,1 % ) , c hoque ( 1 5 ,3 % ) , hepatomegalia ( 6 ,4 % ) , ascite ( 3,1%) e derrame pleural ( 3,1%) estiveram mais presentes nos casos de dengue hemorrágico.
Avaliou-se também a c hanc e de um indivíduo c om dengue he mo r r ágic o apr e se ntar de te r minada sinto mato lo gia e m relação ao dengue clássico ( Tabela 1) . Constatou-se que não houve
Fo nte: SINAN, Sec retaria Munic ipal de Saúde - RJ
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diferenças significativas entre as manifestações gerais como: febre, cefaléia, dor retro-orbitária, mialgia, prostração e artralgia entre as duas apresentações da doença. Por outro lado, manifestações hemorrágicas e outras indicadoras de maior gravidade como náusea, dor abdominal, petéquias, epistaxe, gengivorragia, hepatomegalia, hemorragia digestiva, choque, ascite e derrame pleural estiveram mais presentes nos casos de dengue hemorrágico. Além disso, a evolução do quadro clínico para o óbito foi 34,75 vezes maior no dengue hemorrágico que no dengue clássico.
A média das idades tanto nos casos de dengue clássico como no s de dengue hemo rrágic o fo i de 3 2 ,8 ano s. Não ho uve diferença significativa entre os sexos.
A Figura 3 apresenta a evolução das principais epidemias de dengue ocorridas no município do Rio de Janeiro, sendo elas: 1 9 8 6 /1 9 8 7 ( introdução do sorotipo 1 do vírus) ; 1 9 9 0 /1 9 9 1 ( intro duç ão e predo minânc ia do so ro tipo 2 ) ; 2 0 0 1 /2 0 0 2 ( introdução e predominância do sorotipo 3 ) . Constatou-se que, em um primeiro momento, logo após a entrada de um novo
Fi gu ra 2 - Si n to m a to lo gi a d o d e n gu e h e m o rrá gi c o n a e p i d e m i a d e 2 0 0 1 /2 0 0 2 , Mu n i c í p i o d o Ri o d e Ja n e i ro .
Ta b e la 1 - Ri s c o d e u m i n d i ví d u o c o m d e n gu e h e m o r r á gi c o a p re se n ta r u m d e te rm i n a d o si n a l o u si n to m a e m f u n ç ã o d o d e n gu e c lá ssi c o n a e p i d e m i a 2 0 0 1 /2 0 0 2 , Mu n i c í p i o d o Ri o d e Ja n e i ro .
Sintomatologia OR IC ( 95%) p-valor
Mialgia 1,39 1,03-1,87 0,03
Náusea 1,86 1,53-2,26 0,00
Exantema 3,96 3,35-4,69 0,00 Dor abdominal 1,59 1,35-1,87 0,00 Petéquia 13,89 11,80-16,36 0,00 Epistaxe 14,89 12,44-17,83 0,00 Gengivorragia 15,80 13,18-18,92 0,00 Hepatomegalia 6,90 4,58-10,41 0,00 Hemorragia digestiva 19,73 16,53-23,55 0,00
Choque 2,05 1,59-2,63 0,00
Ascite 4,36 2,48-7,67 0,00
Derrame pleural 7,64 4,31-13,54 0,00 Óbitos 34,75 19,69-61,30 0,00
Fo nte: SINAN, Sec retaria Munic ipal de Saúde - RJ.
sorotipo, oc orreu um aumento da inc idênc ia da doenç a, em uma primeira fase de c ada período epidêmic o. Seguiu-se um período em que o número de c asos reduziu-se drastic amente. Após este período, oc orreu um grande aumento no número de c asos, c oinc idindo, aproximadamente, c om o verão.
Figu ra 3 - Sé rie s histó ric a s de trê s e pide m ia s de de n gu e n o m u n ic ípio do Ri o de Ja n e i ro .
Fo nte: SINAN, Sec retaria Munic ipal de Saúde - RJ.
2 9 9 DISCUSSÃO
O munic ípio do Rio de Janeiro vem sofrendo suc essivas epidemias de dengue desde 1 9 8 6 , predominantemente no período de verão. Em 2 0 0 1 /2 0 0 2 ocorreu a maior e mais grave delas.
As manifestações gerais da doença tiveram alta ocorrência tanto no dengue clássico como no dengue hemorrágico, não havendo diferença estatisticamente significativa. Isso pode ser j ustific ado pela c arac terístic a fisio pato ló gic a do pro c esso infeccioso, onde tais manifestações fazem parte do quadro clínico inicial, constituindo-se, inclusive, em critério diagnóstico para a doença. Por outro lado, manifestações hemorrágicas e, algumas indicativas de maior gravidade, como náusea, dor abdominal, petéquias, epistaxe, gengivorragia, hepatomegalia, hemorragia digestiva, c hoque, asc ite e derrame pleural estiveram mais presentes no s c aso s de dengue hemo rrágic o . Além disso , verificou-se que a evolução para o óbito foi significativamente maior no dengue hemorrágico.
No s tr ê s pe r ío do s e pidê m ic o s analisado s o c o r r e u a intr o duç ão de um no vo so r o tipo do vír us no munic ípio , c o nstatando -se um c o mpo r tame nto muito se me lhante na dinâmica do processo infeccioso na população afetada. Logo após a introdução do sorotipo, ocorre um aumento do número de c asos em funç ão da densidade vetorial e da populaç ão suscetível. Em seguida, verifica-se uma drástica queda do número de casos, coincidente com o período de meses frios, entretanto, sem que o vírus deixe de circular na população. Com a chegada dos meses quentes, há uma elevação da temperatura, dos índices pluviométricos e da umidade relativa do ar, fatores ambientais altamente propícios à proliferação do vetor da doença. Assim, uma nova onda epidêmica ocorre, desta vez, assumindo um caráter explosivo. Este fato possivelmente está relacionado ao controle ineficiente do vetor da doença, tendo o comportamento do processo epidêmico sido regulado fundamentalmente por questões de ordem climática e populacional. Destaca-se também que, ao se comparar a incidência do dengue na epidemia de 2 0 0 1 /2 0 0 2 , com as demais epidemias, é possível aferir que esta apresentou maior magnitude.
O elevado número de c asos de dengue hemorrágic o e de óbitos é, possivelmente, justific ado pelo predomínio de c asos do so r o tipo 3 na e pide mia de 2 0 0 1 /2 0 0 2 , e nq uanto e m epidemias passadas predominaram os sorotipos 1 e 26 7 8. Tal fato se relac iona à introduç ão de um novo sorotipo em uma determinada região, onde a populaç ão já foi previamente exposta à infec ç ão por outros sorotipos do dengue, possuindo, entretanto, susceptibilidade ao novo sorotipo. Neste caso, pode o c o rrer uma respo sta imuno ló gic a exac erbada à segunda infec ç ão , po dendo resultar em uma fo rma mais grave da doenç a. Além disso, a gravidade desta epidemia pode estar relac ionada à introduç ão de uma c epa do sorotipo 3 c om virulênc ia elevada em uma região c om alta densidade vetorial. Auto r e s c ub ano s tê m pr o po sto uma hipó te se inte gr al de
m ultic a us a lida de , o n de a inte r aç ão de fato r e s de r isc o individuais, virais e epidemiológicos promoveria condições para a ocorrência do dengue hemorrágico4.
Por fim, é necessário ressaltar possíveis viéses nos resultados. A provável subnotificação de casos poderia acarretar um viés de seleç ão. Além disso, a despeito de existir um instrumento padronizado de coleta de dados não se pode assegurar que o mesmo foi preenchido de maneira homogênea. Tal fato pode ocasionar erros na aferição das variáveis em estudo levando a uma distorção nas estimativas de efeito, caracterizando-se assim um possível viés de informação1 2.
AGRADECIMENTOS
Às Dr as. Me r i B ar an e Ce c ília Nic o lai da Se c r e tar ia Munic ipal de Saúde do Rio de Janeiro pelo fornec imento dos dados.
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