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Discussão de famílias na estratégia saúde da família: processo de trabalho em construção.

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Discussão de famílias na estratégia saúde da

família: processo de trabalho em construção

*

FAMILY DISCUSSION IN THE FAMILY HEALTH STRATEGY: A WORKING PROCESS UNDER CONSTRUCTION

DISCUSIÓN DE FAMILIAS EN LA ESTRATEGIA DE SALUD FAMILIAR: PROCESO DE TRABAJO EN CONSTRUCCIÓN

RESUMO

Objetivou-se acompanhar o processo de trabalho de uma equipe de saúde da famí-lia em suas reuniões de discussão de casos de famílias. Estudo de abordagem qualita-tiva, apoiado no referencial teórico-meto-dológico da análise institucional, linha es-quizoanalítica. Acompanhou-se 17 reuni-ões, com participação média de 7 a 8 dos 17 trabalhadores que foram sujeitos do es-tudo. A equipe realizou discussão sobre as famílias, classificando-as segundo critérios de risco, refletiu sobre o que foi realizado e buscou possibilidades de ação. Houve estra-nhamentos ao se depararem com diferen-ças e dificuldades de escuta entre seus membros, que gradativamente foram venci-das, possibilitando situações de cuidado compartilhadas. A equipe empreendeu es-forços para analisar o modo como cuida das famílias e para conseguir integração. Con-cluímos que as reuniões favoreceram a pro-dução de cuidados e a construção da gru-palidade na medida que a equipe, no cui-dar lida com a subjetividade produzidas no trabalho.

DESCRITORES

Acolhimento

Enfermagem em saúde pública Atenção primária à saúde

Equipes de administração institucional Saúde da família

* Extraído da tese “Encontros e desencontros entre trabalhadores e usuários na Saúde em transformação: um estudo cartográfico do acolhimento, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, 2003. 1 Professora Doutora do Departamento Materno-Infantil e Saúde Pública da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. smatumoto@eerp.usp.br 2 Professora Associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. smishima@eerp.usp.br 3 Professora Doutora do Departamento Materno-Infantil e Saúde Pública da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. fortuna@eerp.usp.br 4 Professora Associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ribeirão Preto, SP, Brasil. zezebis@eerp.usp.br

A

R

TIGO

O

RIGINAL

Silvia Matumoto1, Silvana Martins Mishima2, Cinira Magali Fortuna3, Maria José Bistafa Pereira4, Maria

Cecília Puntel de Almeida5

ABSTRACT

The objective was to follow the working pro-cess of a family health team in their regular meetings held to discuss family cases. This study used a qualitative approach, founded on the theoretical and methodological framework institutional schizoanalytic analy-sis. Seventeen meetings were followed, which counted with the participation of an average of 7 to 8 of the 17 workers partici-pating in the study. The team held discus-sions on the families, and classified them according to the risk criteria, reviewed what had been accomplished in the meting and searched for action alternatives. There were disagreements when participants faced dif-ferences and difficulties to be heard by their colleagues, which were gradually overcome, and made it possible for the members to share care situations they had in common. The team made an effort to analyze the how they take care of the families and to get them to integrate. It was concluded that the meet-ings favor the production of care and the con-struction of group work as the team, while delivering care, deals with the subjectivities produced in their practice.

DESCRIPTORS

User embracement Public health nursing Primary health care

Institutional management teams Family health

RESUMEN

Se objetivó acompañar el proceso de tra-bajo de un equipo de salud familiar en sus reuniones de discusión de casos de familias. Estudio cualitativo, apoyado en referencial teórico-metodológico de análisis institucio-nal, línea esquizoanalítica. Se acompañaron 17 reuniones, con participación media de 7 a 8 de los 17 trabajadores sujeto del estu-dio. El equipo discutió sobre las familias, clasificándolas según criterios de riesgo, reflexionó sobre lo realizado y buscó posi-bilidades de acción. Hubo sorpresa al repa-rarse en dificultades de escucha entre sus miembros, que gradualmente fueron ven-cidas, posibilitando situaciones de cuidado compartidas. El equipo emprendió esfuer-zos para analizar el modo de cuidar a las familias y para conseguir integración. Con-cluimos en que las reuniones favorecieron la producción de cuidados y la construcción de grupalidad en la medida en que el equi-po, al cuidar, se enfrenta con la subjetivi-dad generada en el trabajo.

DESCRIPTORES

Acogimiento

Enfermería en salud pública Atención primaria de salud

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INTRODUÇÃO

A Estratégia Saúde da Família (ESF) foi proposta como resposta à crise da saúde, para quebrar a lógica de presta-ção de serviços de saúde médico-centrada, biologicista com ênfase na produtividade. Preconiza a prática assistencial em equipe, centrada nas necessidades da população, pro-movendo processos de produção das ações de saúde atra-vés da participação social e do respeito aos saberes de to-dos os envolvito-dos por meio do vínculo e na responsabiliza-ção pelas ações de saúde coletivas e individuais(1).

A ESF constitui o foco principal da atenção básica como reorganizadora do sistema de saúde no Brasil. Como porta de entrada principal do usuário, atende pessoas em todas as fases do ciclo vital, com demandas e problemas varia-dos, inespecíficos e nem sempre enquadráveis aos padrões e protocolos(2).

Desta forma, tanto a proposta da ESF como as características da atenção básica colocam as equipes em permanente situação de necessidade de transformação de seu pro-cesso de trabalho, sempre tendo por referên-cia a concepção de saúde-doença que em-basa a ESF(3).

No formato instituído, o processo de tra-balho na atenção básica segue a dinâmica da organização hospitalar em relação ao modo conhecido dos trabalhadores se conduzirem e dos usuários se portarem, ou seja, a dinâ-mica das relações de poder, destacando-se a dependência dos usuários, a centralidade em procedimentos, o ato de cuidar mais episó-dico, entre outros(2-3).

No entanto, a complexidade da vida e as questões que as pessoas têm demandado aos

serviços de saúde desafiam os trabalhadores, em quais-quer níveis que se encontrem (gestores, gerentes, traba-lhadores da rede básica e outros) a buscar novos modos de lidar e de produzir saúde(4).

O espaço das reuniões de discussão de família, no pro-cesso de trabalho das equipes, representa potencialidade para criar projetos coletivos(5) de atenção à saúde e de

cons-tituição deste grupo de trabalhadores enquanto equipe, à medida que efetua sua tarefa de cuidar dos usuários(6). No

entanto, é preciso estar atento para reconhecer a lógica que constitui o eixo da organização do processo de traba-lho da equipe, ou seja, se trata da lógica da organização hospitalar ou se há nova lógica em construção prevista para atenção básica.

Desta forma, o presente trabalho, ainda que tenha sido realizado em 2002, mantém sua importância uma vez que o desafio da reorganização do processo de trabalho na ESF ainda persiste como problema(2). O artigo contribui com

produção cientifica atual pelo referencial teórico-metodo-lógico e pela explicitação de tensões do processo de traba-lho na produção de cuidado junto às famílias acompanha-das. Trata-se de artigo original, não divulgado anteriormen-te, recorte de estudo maior sobre as relações trabalhador-usuário na perspectiva do acolhimento em uma equipe de saúde da família.

Utilizamos como referencial teórico-metodológico a esquizoanálise(7), uma das correntes da análise

institucio-nal(8), através do qual exploramos diferentes superfícies que

compõem uma realidade, no nosso caso, o processo de tra-balho de uma equipe de saúde da família em reuniões de discussão de casos das famílias acompanhadas.

A esquizoanálise se adequa a aplicação dirigida a gru-pos(9), para que estes empreendam análise e

auto-gestão. Auto-análise consiste no processo em que os cole-tivos podem enunciar e compreender seus problemas, ne-cessidades, não-saberes no mesmo movimento em que produzem a auto-gestão, isto é, se organizam para produzir os dispositivos necessários para melhorar a sua vida a partir de própria e nova compreensão de sua realidade. Ao realizar tais análises, a equipe pode descobrir aspec-tos oculaspec-tos que se constituem nas relações de trabalho. Estas têm implicação direta com o modo como as instituições que compõe a sociedade conformam as normas e regras de funcionamento dessa mesma sociedade. Po-demos citar alguns exemplos de instituições presentes no campo de atuação da ESF: a saú-de, a família, o hospital, a medicina, as pro-fissões, a igreja, entre outros. As instituições estão sempre em movimento, na oscilação entre manutenção e criação, conservação e dissolução. Os processos manutenção são de-nominados instituídos e os de transformação e criação resultam de forças que compõem os movimentos instituintes(7-8).

Os trabalhadores e a população estão acostumados ao modo tradicionalmente instituído da lógica hospitalar com a atenção médica individual, tecnológica. É preciso cons-truir uma cultura da atenção familiar, de atenção à saúde, de atenção cuidadora de emancipação e cidadania. Esta mudança pode operar-se na medida em que a equipe tra-balha, reformulando gradativamente as expectativas e os conceitos de saúde, doença e atenção em saúde da famí-lia. Trabalha-se para que a população compreenda que pode demandar à equipe questões que vão além do adoe-cimento biológico, ou seja, demandas da produção social do processo saúde/doença como violência, drogas, desem-prego, desigualdade, carências sociais. A produção desta demanda se faz pelo vínculo estabelecido nas relações co-tidianas entre os usuários e a equipe. Destacamos que quando a equipe se depara com a demanda que ela ofertou, sente falta de instrumentos em sua caixa de ferramentas para enfrentar tais problemas.

O espaço das reuniões de discussão de família, no processo de

trabalho das equipes, representa potencialidade para criar projetos coletivos

de atenção à saúde e de constituição deste grupo de trabalhadores

enquanto equipe, à medida que efetua sua

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A inserção do agente comunitário na equipe é uma mudança concreta. Este deve ser morador da área, conhe-cer o modo de viver das pessoas, sua história, seus sofri-mentos e a forma de expressá-los, elesofri-mentos que fazem parte de seu saber e instrumental de trabalho.

Quando chega, o agente comunitário desencadeia na equipe processos de estranhamento, de desterritorialização dos trabalhadores, que não sabem como lidar com o novo integrante da equipe e com as informações que ele traz. Essa desterritorialização – estado no qual não se pode mais voltar àquele imediatamente anterior, pois já se é outro, algo se sucedeu, procedeu-se o novo(10), tem grande

po-tência para abrir fissuras, para invenção de novas formas de agir, a partir do vivido, ou seja, do modo de vida, das dores e sofrimentos, com o compartilhamento entre tra-balhadores e usuários de decisões, alegrias e frustrações. Esta é a potência que acarreta a introdução do agente co-munitário. Põe em funcionamento uma “máquina” que não vê tempo nem lugar normatizados ou qualquer outro im-pedimento, e cria no encontro, único e irrepetível, uma ação, um ato singular cuja diferença se dá pelo sentido que tem e faz para os envolvidos.

Mas, essa força instituinte pode ser capturada. O agente comunitário também está sujeito à lógica hospitalar e às ne-cessidades dos trabalhadores em detrimento das necessida-des da população. Orienta-se, por exemplo, pelas regras e nor-mas, especialidades, número de vagas e horários, área de abran-gência. O agente comunitário também pode ser capturado nas relações em equipe. Pesa o poder-saber dos técnicos sobre o poder-saber dos usuários-população. Numa luta desigual, o povo se cala, o usuário se submete, o agente comunitário se adapta (para garantir o emprego, talvez)(11). Pesa igualmente a

impotência dos trabalhadores quando não sabem o que fazer com problemas nunca antes enfrentados no âmbito de sua es-pecialidade e que agora atravessam seu dia-a-dia, mesmo que não queiram, com a presença e a voz do agente comunitário. Não encontram ferramentas para enfrentá-los, então os repe-lem. Assim, se produz a não escuta dos usuários e dos agentes comunitários, e, se não há escuta, não há porque falar, não há troca nem diálogo, não há possibilidade de construir a integra-ção da equipe para produintegra-ção das ações de saúde(12).

A esquizoanálise(7) se propõe a explorar o mapa das

li-nhas e superfícies predominantes que constituem a reali-dade em produção, ou seja, reconhecer tanto as institui-ções presentes quanto o modo de funcionamento do gru-po em estudo; as gru-potências e as resistências para produ-ção de novas formas de cuidar das famílias. O mapa é construído na experiência de análise com a própria equipe de trabalhadores de saúde da família, descobrindo os sen-tidos e não-sensen-tidos que empreendem no processo de tra-balho, produzindo conhecimentos acerca da realidade vi-vida. A esse processo, a esquizoanálise denomina carto-grafia, que se constitui seu método de pesquisa(13).

Precisamos pensar a mudança na saúde e efetivá-la a partir da criação de agenciamentos para produção de ações

que satisfaçam usuários e trabalhadores, realização de de-sejos e outras demandas subjetivas. Os agenciamentos são coletivos e põem em jogo, em nós e fora de nós, multiplici-dades, afetos, acontecimentos. As reuniões de discussão de casos pela equipe de saúde da família representam im-portante momento para integração e articulação das ações de cuidado e enfrentamento da complexidade dos proble-mas e necessidades de saúde dos indivíduos, famílias e comunidade(14).

O funcionamento das sociedades modernas atuais nos submete a um sistema político global, unificado e estrutu-rado através de linhas de segmentaridade. Somos segmen-tarizados por linhas que definem estratos do nosso viver. Há três tipos de linhas que nos compõe, emaranhadas umas nas outras – lineares, circulares e de fuga(10). As duas

pri-meiras fixam códigos, territórios e formas de deslocamen-tos, por exemplo, a linear como oposição certo-errado, e a circular partindo de um ponto central, como o trabalho do médico, faz orbitar os círculos das demais categorias. As linhas de fuga emergem no e do cotidiano, quase imper-ceptíveis, surgem no ato de produção do trabalho em saú-de, emaranhadas às outras linhas, abrindo espaço para a quebra das rotinas estabelecidas, possibilitando criar no-vas formas de cuidar.

Na saúde, a segmentaridade(7,10) instituída nos

aprisio-na ao já conhecido, às atribuições e funções, núcleos de competência e responsabilidade de cada profissão defini-das regulamentadefini-das por conselhos profissionais; sem ob-servar os movimentos das linhas fuga que passam no meio dessas linhas de delimitação de fazeres, que tensionam as relações de trabalho(4) na produção do cuidado.

Conhecer o modo como as equipes vem se produzindo como coletivo e construindo o processo de trabalho na ESF nos mobilizou ao estudo a partir do referencial da esquizo-análise que nos aponta também brechas com potenciali-dade para ruptura e busca de um novo na saúde.

OBJETIVO

O objetivo deste artigo foi acompanhar o processo de trabalho de uma equipe de saúde da família em suas reu-niões de discussão de casos de famílias.

MÉTODO

Realizamos um estudo de abordagem qualitativa, por meio de estudo de caso apoiado no referencial teórico metodológico da análise institucional, linha esquizoanalí-tica(7-8), trabalhando com uma equipe de saúde da família

que vivenciou processo de auto-análise e auto-gestão com foco em seu processo de trabalho.

A esquizoanálise propõe que os registros sejam feitos em uma espécie de diário de bordo de uma viagem,

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im-portante é a novidade, a diferença e a singularidade. Carto-grafar é compor a partir de relatos objetivos e subjetivos, uma espécie de mapa em que se registram os sentidos e as perdas de sentidos percebidos pelos sujeitos do estudo e pelo pesquisador a partir do vivido(7).

O processo de pesquisa e coleta de dados se deu através da participação do pesquisador nas de reuniões de discussão de casos de famílias da equipe, no período de janeiro a de-zembro de 2002. Durante as reuniões, os membros da equipe apresentavam os casos das famílias para discussão e o pes-quisador participava principalmente através de indagações com a intenção de favorecer a auto-análise da equipe no pro-cesso de cuidar daquela família; as perguntas buscavam explicitar o foco de preocupação da equipe, o modo como se relacionavam durante o trabalho de cuidar. Acompanhamos 17 reuniões de discussão de casos de família. A média de par-ticipantes nas reuniões foi de 7 a 8, de um conjunto de 17 trabalhadores que trabalhavam na unidade no período da pesquisa, sendo a equipe de saúde da família constituída por 5 agentes comunitárias de saúde, 1 enfermeira, 1 médico generalista, 1 técnica de enfermagem, e outros trabalhado-res da unidade: 1 enfermeira, 1 ginecologista, 2 pediatras, 3 técnicos de enfermagem e 1 gerente (médica). As reuniões foram gravadas e posteriormente transcritas.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pes-quisa do Centro de Saúde Escola da Faculdade de Medici-na de Ribeirão Preto-USP, protocolo nº 0027-CEP-CSE-FMRP-USP. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, observando a Resolu-ção nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Optamos por apresentar os resultados e as discussões entrelaçados para manter a coerência com a opção teóri-co-metodológica adotada nesse estudo. Também a forma de narrar os resultados por meio de cenas se fez pela op-ção política da narratividade(13).

As reuniões de discussões de caso eram uma das primei-ras atividades da equipe. Essas reuniões estavam instituídas na unidade com o objetivo de a equipe discutir as famílias e classificá-las segundo um critério de risco(15) por cores

(ver-de, amarelo e vermelho) do menor para o maior risco, de forma que pudessem sistematizar a atenção às famílias.

Cena 1 - Colorindo rapidamente as famílias.

O primeiro contato com essa atividade nos causou certo mal-estar. Início da manhã, rostos sonolentos, corpos vaga-rosamente vão tomando os lugares da sala, aos poucos. Os que chegam mais tarde entram trazendo cadeiras. Alguns se sentam quase sempre na mesma posição na sala, outros em lugares mais ou menos fixos. Aguardam em silêncio, com olhares perdidos. Outras vezes discutem em sub-grupos al-gum caso ou questões administrativas enquanto aguardam. Até que alguém propõe: Podemos começar?

Parece-nos mais tarefa obrigatória de classificar as fa-mílias segundo o risco de adoecer. Mas, qual seria o enten-dimento acerca do objetivo da atividade para cada mem-bro da equipe? A equipe reproduz o fazer técnico da lógica hospitalar, a produção de procedimentos. O usuário está incluído como um elemento do processo, mais objeto que gente, igual a qualquer outro, sem singularidades, e não como ator, sujeito co-produtor da ação de saúde possível no encontro.

Há sempre alguém que apresenta o caso, há poucas complementações por outros trabalhadores e as pergun-tas são em geral para esclarecimento de questões pontu-ais, de caráter mais individual: o que ela faz? Ela cuida da

casa, vai no Programa de Integração Comunitária? Há uma

certa hierarquia refletidana ordem em que as perguntas são feitas: os médicos, as enfermeiras e os demais. Pedi-dos de esclarecimento de termos técnicos são prontamen-te respondidos, prontamen-tecnicamenprontamen-te: O que é bolsa de colostomia?

As intervenções mais predominantes são as voltadas para a produção de procedimentos, empurradas pela força do modelo médico-assistencial hegemônico: ACS2 - Vou visi-tar, ver se ela fez os exames, se ela vai fazer a cirurgia.

Impressiona também a rapidez com que vão passando os casos! Não sabemos se por serem conhecidos pela equi-pe; mas com certeza, não por todos. Mais parece uma ve-locidade vertiginosa para não se pensar muito, e menos para sentir, uma velocidade tecnológica para obter domí-nio e poder, que leva a uma morte lenta, corpos despoten-cializados, sem identidade, excluídos do processo.

Alguém sugere a cor, que desbota rapidamente, não tem brilho. Ninguém faz comentários, a palavra fica solta no ar, e já se vai passando para outro caso. A expressão

Família número... parece ser uma marcação do ritmo da

reunião. Monótono. E os afetos passam pelo corpo:

ACS2 - Ai que sono! Silêncio

ACS2 - Deixa eu ver o que tem de bom! Família número... (Reunião - 05/02/02).

Colorir parece mais brincadeira de criança. Um certo devir-criança da equipe que poderia trazer vida e energia para esta tarefa, que de tão maçante, precisa ser termina-da rapitermina-damente.

A apresentação dos casos se faz em meio a um intenso movimento de entradas e saídas da sala. Alguns trabalha-dores parecem estar ali de passagem, entram para pegar carimbos, impressos, medicamentos, aparelhos e saem para atender telefonemas ou chamados de outros traba-lhadores para outras atividades, com grande variação dos presentes na reunião e na participação da discussão dos casos para a busca de alternativas de cuidar.

(5)

ser considerado, dificultam o desenvolvimento da perten-ça do trabalhador na equipe e da pertinência do que está sendo falado em relação ao que o grupo entende como sua tarefa ali naquele momento.

A cena revela os fenômenos envolvidos na relação equi-pe-família, trabalhador-usuários, representa a atenção da equipe para com a família em discussão, mostrando o lu-gar reservado para o usuário, ou talvez, a falta desse lulu-gar ou de condições, de disposição para dar atenção, em fun-ção da própria complexidade de alguns casos, geradores de muita ansiedade.

A forma de a equipe trabalhar – em meio a tantas en-tradas e saídas, afetos e desafetos, dificulta o exercício do trabalho em equipe, não favorece sua estruturação enquan-to equipe, pois isso se dá na medida em que opera(6).

Alguns dos trabalhadores são mais constantes nas reuni-ões: as agentes comunitárias e a médica/gerente da unidade. Esta desempenha um papel essencial: é a principal ouvinte a quem se relata os casos, apesar do aparente caos e desinte-resse geral. Cuidadosa e atenta, se esforça na escuta, anota, pergunta, demonstra interesse, insiste, com grande empenho em produzir uma espécie de liga no entre, abrir fissuras na-quele modo tradicional, das disciplinas, hierarquias e regras.

As reuniões de discussão de caso representam o mo-mento de reflexão sobre o que foi realizado e poderia ser o modo de multiplicar outras possibilidades de ação, desco-berta de interesses e desejos, potências e impotências, pre-dominantemente encobertos pelo fazer técnico.

O que se tem à mão para este trabalho são prontuários de famílias, fichas de cadastramento, de acompanhamen-to e moniacompanhamen-toramenacompanhamen-to quanacompanhamen-to ao risco, relatórios das visitas, prontuários individuais, e principalmente as intensidades de sentimentos e outras ressonâncias geradas pelas deman-das que os usuários apresentaram para os trabalhadores, em especial, às agentes comunitárias de saúde. Ressonân-cias decorrentes do contato direto com o modo de viver das pessoas, nas casas, na rua, com as dores, a fome, os conflitos familiares, a morte, a prole numerosa, a sujeira, a limpeza, a comida cheirosa, um convite para um café, ser recebido pela fresta do portão... Ressonâncias decorren-tes da identificação com as famílias, e outras tantas possí-veis quando se está na rua, batendo de porta em porta, trabalhando na saúde da família.

No momento das discussões revive-se intensamente os afe-tos. Processos conscientes e inconscientes. Não há como fugir deles apesar do grande esforço em fazê-los despercebidos.

ACS2: Dona Y tem 24 anos e é analfabeta! [...] Insisto, ima-gina! ela tem a minha idade. Ela não parece ter 24 anos de forma alguma! [...] exame ginecológico, tem que fazer, é importante.

Enf2 - Ela nunca passou em consulta? (Reunião - 05/02/02).

O estranhamento e a indignação da agente comunitá-ria frente à situação da usuácomunitá-ria ser analfabeta não

ecoa-ram nos presentes a ponto de mobilizá-los para a discus-são e busca de formas de intervenção individual ou coleti-va, caso a mesma problemática fosse identificada em ou-tras famílias. A desterritorialização expressa: Insisto,

ima-gina! ela tem a minha idade; se perde, ou melhor, se

re-territorizaliza no campo conhecido e seguro das questões técnico-científicas instituídas: fazer exame ginecológico certamente é importante também, mas não só isso.

As discussões são o tempo todo tomadas por temas complexos os mais variados, que se repetem em vários en-contros, como violência, abandono, alcoolismo, planeja-mento familiar para famílias numerosas em condições de vida precárias, homossexualismo, casas abandonadas, medo da morte, e muitos outros. A equipe identifica pro-blemas sem conseguir arquitetar alguma alternativa para abordá-los, deixando-os no ar. Paira um não-saber-fazer não dito e ficam no território de referência conhecido, o modo técnico-científico da medicina moderna.

Esse despreparo da equipe, na verdade, revela o des-preparo da sociedade, dos órgãos formadores de profissi-onais, das autoridades sanitárias, enfim de todos nós. Abor-dagens isoladas e desarticuladas sobre esses temas com-plexos não provocam impacto.

Med1 - Como tem casa abandonada aqui! ACS4 - Essa casa é de um médico [...]

ACS2 - Um terreno na [rua] LC [...] tá muito mato, tem mui-to bicho. O dentista mandou construir um muro do dinheiro dele.

ACS4 - aquela casa que tem placa de venda, tem lixo. ACS1 - Tem uma na esquina que está até pior.

Med1 - Talvez fazer uma lista das casas abandonadas, ca-sas invadida. (Reunião - 08/02/02).

O desafio da construção da intersetorialidade, interdis-ciplinaridade e da transdisinterdis-ciplinaridade parece estar rela-cionado com a capacidade de superar segmentaridades da sociedade e as delimitações de poder-saber instituídas pe-las disciplinas, de se permitir a incompletude, o não-saber e a necessidade do outro para agir.

No contexto de velocidade tecnológica, a equipe não dá conta de escutar, de abrir espaço para a dor de uma das agentes comunitárias frente à morte de um morador acom-panhado por ela.

ACS1 - Deixa eu falar uma coisa, a TE4 (técnica de enferma-gem) me chamou e falou que o senhor JD morreu (Lágrimas). Med1 - Ele tinha algum problema?

ACS1 - Ele ia fazer uma cirurgia de próstata.

Med7 - Outro dia, uma paciente ia fazer uma cirurgia, [...] (ACS1 olha para o chão (Reunião - 08/02/02).

(6)

consegue se solidarizar com a dor da colega. Ou, se há im-plicação por parte dos trabalhadores, eles não se sentem à vontade para manifestarem-se. Predomínio da concepção do trabalho em saúde como um saber técnico que exclui emoções e sentimentos. Não se permite viver o momento, sequer planejar uma proposta de cuidado para a família, de acolher a dor da perda como alguém que se importa, pois, se foi um que estava sob nosso cuidado(16).

Rapidamente passam para outros assuntos. Mas, sem per-ceber vão lentamente se aproximando do tema da morte atra-vés da discussão dos outros casos, lembrando de experiênci-as negativexperiênci-as e positivexperiênci-as, e indiretamente manifestam o pró-prio medo, num movimento de aproximações sucessivas e gradativas a este objeto de aprendizagem tão obscuro.

E quase ao final da reunião esboçam uma proposta de atenção aos acamados. Seria esta uma forma indireta de li-dar com o tema da morte e do morrer? E, ao mesmo tempo, de abrir uma brecha para produção de cuidado, para os acamados (mais próximos da morte?). Seria também para a equipe, que se aproxima do tema do modo como pode.

Med7 - A gente poderia pegar esses casos mais complica-dos, de pacientes acamados (...)

Med1 - pra gente aprender [...]

Enf2 - A gente tem uma lista. Os pacientes que estão acamados são 21. [...] São 24.

ACS1 - Sendo que 11 são meus (Reunião - 08/02/02).

Esta agente, timidamente, recoloca sua dor ao anunci-ar que metade dos acamados a serem acompanhados mo-ram em sua área de atuação. Dentre o emaranhado de questões apresentadas, discutidas ou não, consideradas ou não, ela permanece à espera de atenção e acolhimento.

Cena 2 - Um olhar um pouco mais atento. Expressando algumas dificuldades

Aqui a classificação das famílias é realizada, mas não como foco principal. Observa-se ênfase no nome dos com-ponentes das famílias. Os motivos de escolha dos casos não são colocados explicitamente, mas há espaço para expres-são de afetos e das dificuldades em lidar com os casos.

Parece haver uma relação entre a construção da gru-palidade da equipe, a possibilidade de expressar suas ne-cessidades, ansiedades e a capacidade de escuta, de ser continente e de cuidar uns dos outros. No entanto, a equi-pe não consegue ainda modificar muito o tipo de inter-venção às situações criticas com os usuários.

ACS3 – [...] porque ontem, a hora que eu tava saindo pra visita, eu vi ela sentadinha ali, né? Aí eu olhei, achei ela com uma carinha de choro, eu falei: – quê que foi, R? Você tá triste, parece... Aí chorou, chorou, não parava mais de chorar. [...] eles estavam em reunião né? Estavam o dr. Med7, a dra. Med1 e a Enf1 né? E... [...] Falava que não tinha... nada valia a pena... que não... que queria acabar

com a vida, né? Eu fiquei angustiada, eu falava: – ai meu Deus! Eu não sabia nem o que falar pra ela né? [...] Aí ela começou a contar toda a história né? [...] Então, diz que ele falava assim: – mamãe, compra um Danone pra mim né? e não tinha né? e ela choraaava, falava: – nossa! Ela falou: – ele não tem mais o que vestir, [...]

SILÊNCIO (Reunião - 23/04/02).

Mais ao final da discussão do caso vemos o predomínio do modo de funcionamento da nossa sociedade que é de responsabilização/culpabilização individual pela própria situação, sem considerar o complexo processo de produ-ção histórico-social. A resposta revela o possível naquele momento, proteger-se da dor, que a dor do outro lhe cau-sa, da incapacidade de se solidarizar com essa dor e sofri-mento do usuário, responsabilizando-o; proteger-se da impotência frente ao caso; proteger-se de seu próprio so-frimento causado pelo modo de funcionamento do esta-belecimento e da rede assistencial(5); amparando-se na

oni-potência encarnada como trabalhador de saúde.

Parece que o espaço das discussões de caso está reser-vado para uma espécie de administração das relações en-tre os vários trabalhadores e seus núcleos de saber profis-sional(4), sem, no entanto, definir claramente quem seria o

gerenciador desse cuidado, qual seria atribuição das agen-tes comunitárias. Paradoxalmente, este trabalhador com menor qualificação técnica, com menos poder na equipe, é quem é mais capaz de escutar e cuidar das questões com delicadeza e sutileza.

Assim, as agentes compartilham a experiência de serem cuidadoras, do modo como podem e, ao mesmo tempo, bus-cam sensibilizar os demais membros da equipe a se impor-tarem com o caso, com a família, abrindo brechas para pas-sar as potências cuidadoras da equipe, para cuidar dos ca-sos, dar apoio às agentes e o cuidado de si como equipe.

Gradativamente, a equipe se implica. E, a partir de um caso, descobre uma fissura por onde pode passar uma li-nha de fuga, no território do planejamento familiar, esbo-çando um fazer transversal na ótica do ser mulher, do rela-cionamento conjugal:

Med1 – [...] É... na verdade isso é um acontecimento em relação às mulheres, né? Essa baixa auto-estima. E não é só na classe pobre não! A gente tem visto aí, meninas, que estudam, universitárias, que se envolvem em relacionamen-tos... [...] Relacionamentos totalmente patológicos, de sub-missão né? [...]

Integrante – E também isso não acontece só com menina nova não. Pessoa já com idade também. E aconteceu... Med1 – Então, eu acho que essa coisa com a mulher preci-sa se resgatar. Ela não é apêndice de homem né? [...] eu acho que tem que conversar com essa moça né? E... as-sim, a gravidez também é um risco pra ela nessa situação [...] (Reunião - 23/04/02).

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má-quina desejante, de um corpo que vibra e encontra outro corpo em ressonância compatível, capaz de produzir um dispositivo. Um dispositivo que detone novas formas de

ser mulher numa sociedade como a nossa, capaz de

mobi-lizar mulheres e homens a romper com os modos instituí-dos e descobrir moinstituí-dos mais criativos do viver afetuoso, delicado, com suavidade, produzindo e reproduzindo-se.

E assim, há certa cegueira da equipe, certa dificuldade de aprofundar a implicação, talvez por que a maioria seja de mulheres. E nessas circunstâncias, frente a dores e difi-culdades vividas tão intensamente próximas, como ser ca-paz de lidar com a necessidade do outro? Como produzir ações cuidadoras, se o contato com o caso, com a ansieda-de dos outros trabalhadores, gera granansieda-de dificuldaansieda-de ansieda-de suportá-lo?

Enf2 - [...] tudo bem, mas se a gente entrar no nervo dela (a usuária) [...] se entrar no nervoso dela, aí que a corda [...] ACS2 - nenhuma de nós faz isso!

Enf2 - Vocês chegam aqui como se [...] Nossa! A dor! ACS2 - [...] Ela não está se alimentando [...] Aí era para ele ir lá ontem e ele falou que não podia sair para visita porque ia fazer supervisão do residente. Você não tava aqui ontem (Reunião - 08/02/02).

Há dificuldade de suportar o sofrimento decorrente do trabalho. Os trabalhadores não se atentam para os ruídos denunciadores do modo de trabalhar da equipe: um movi-mento de recusa da dor. Exemplos disso são: a ansiedade da enfermeira ao não suportar a depositação da agente, a insatisfação da agente porque o médico não fez a visita à paciente ontem e porque não pode contar com a enfer-meira que estava fora da unidade. São ingredientes que compõem a rede de relações da equipe.

Cena 3 - A construção da grupalidade da equipe e o enfrentamento das dificuldades na produção do cuidado

A grupalidade vai sendo construída. A equipe vai en-frentando a dor de se ver imperfeita, dependentes uns dos outros. Empreende um esforço para conseguir realizar a tarefa de analisar-se, apesar dos movimentos de resistên-cia. A equipe esforça-se em conseguir uma integração.

No esforço de se ver, a equipe encontra uma forma para enfrentar as dificuldades de interação entre os trabalha-dores e escolhem para discussão casos de famílias que fa-zem atendimento médico em convênios ou em outros ser-viços. Gradativamente a equipe passa a trazer casos segui-dos por ela própria, muitas vezes explicitando as diferen-ças, desencontros e competição.

Med2 - E aí aqui, marcaram comigo. Eu falei...E depois fica essa história, ah não é da Saúde da Família, [...]. Eu tô na minha sala, atendo com a maior boa vontade. Não tenho vínculo nenhum com a criança e... o pessoal que tava vendo vai perder o vínculo com essa criança, ...e eu fico assim

per-dida não sei o que fazer, porque eu peguei uma criança que eu não sigo e que era... Que tinha um retorno em cinco dias e não fez nenhuma busca ativa. Se a criança não veio... Isso fica por isso mesmo... (Reunião - 03/09/02).

Quando o trabalhador explicita seu limite em lidar com o caso, apesar da explosão dos sentimentos represados, medo, dor, insegurança, impotência, ocorre a possibilida-de possibilida-de criar uma ação possibilida-de apoio mútuo para se fortalecer, para ajudar o usuário a suportar a sua dor.

Enf2 - E eu acho que a gente precisa olhar pra gente, pro serviço, e ver uma outra coisa também. Algumas pessoas têm facilidade pra umas coisas, outras têm facilidades pra outras, ninguém é obrigado a gostar de tudo a dar conta de todas as situações, e... tá preparado pra aquilo, entendeu? [...] Med1 - E as pessoas se sentem muito bem sendo apoiadas, né? [...] Eu, lembrar de novo [...] diante dessa coisa, que a dificuldade que a Enf2 colocou né, eu também não sou super-homem mas, [...] Eu tenho essa disponibilidade de tá acom-panhando, eu gosto de ir né? (Reunião - 01/10/02).

Aos poucos os trabalhadores encontram formas de co-operar entre si para lidar com as dificuldades encontradas no trabalho e assim produzir as ações de saúde.

No movimento de buscar formas de ajudar o usuário a lidar com seus problemas, as reuniões de discussão de ca-sos também tratam do caso da equipe(17). Tratam de

assun-tos administrativos, aproveitando o momento para comu-nicações e informes gerais. Em alguns dos encontros a dis-cussão centrou-se nas dificuldades entre os trabalhadores, possibilitando explicitar diferenças no modo como traba-lham, cuidam de si, dos outros, dos materiais e equipa-mentos do serviço, como se ajudam e se permitem ser aju-dados, explicitam dúvidas, dificuldades, ressentimentos, in-dignações, e muitos outros afetos produzidos nos encon-tros do dia-a-dia.

CONCLUSÃO

As discussões de casos de famílias nos abrem a possibi-lidade de perceber as paisagens escondidas e assim criar outras. Partindo da superfície da classificação das famílias, critérios de riscos técnicos, abrem-se possibilidades pro-duzir cuidados pela produção de subjetividades.

O palco da apresentação dos casos se abre para a mul-tiplicação de possibilidades de ação e de produção de cui-dado, que podem emergir de linhas de fuga, em pequenas fissuras, fazendo passar fluxos, intensidades e desejos, po-rém, nem sempre cuidadores, nem sempre libertadores.

(8)

As discussões de caso representam o ponto de partida para expressar e lidar com as ansiedades, medos, inseguranças, fan-tasias que a equipe enfrenta ao se deparar com o diferente. Representa também espaço para depositação e elaboração das ansiedades inerentes ao processo de trabalho na atenção básica, de modo que os próprios trabalhadores possam apoi-ar-se mutuamente, fazendo-se protagonistas das ações de saúde, capazes de aprender com a experiência, de se deixar amparar e ser cuidado e de amparar e cuidar.

Ressaltamos ser importante que as equipes discutam não somente casos mais difíceis ou insolúveis, mas

apre-sentem também aqueles com os quais obteve sucesso e resultados positivos.

Aprender e ensinar é a labuta do dia-a-dia. Poderia a família participar da discussão do próprio caso? Aqui apon-tamos uma limitação deste estudo, a participação da famí-lia junto com a equipe na busca de modos de lidar com os problemas, limites e potencialidades, como forma de criar protagonismo, rompendo com o instituído. As discussões de caso das famílias com as famílias seria uma forma dife-rente e corajosa de agir na saúde da família.

REFERÊNCIAS

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2. Cunha GT. A construção da clínica ampliada na atenção básica. 2ª ed. São Paulo: Hucitec, 2007.

3. Junges JR, Selli L, Soares NS, Fernandes RBP, Schreck M. Work processes in the Family Health Program: crossings and transverses. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(4):937-44.

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8. Baremblitt G. Compêndio de análise institucional e outras cor-rentes: teoria e prática. 3ª ed. Rio de Janeiro: Rosa dos Tem-pos; 1996.

9. Deleuze G. Conversações. São Paulo: Ed. 34; 1992.

10. Deleuze G, Guattari F. Mil platôs: capitalismo e esquizofre-nia. Rio de Janeiro: Ed. 34; 1999. v. 3.

11. Matumoto S. Encontros e desencontros entre trabalhadores e usuários na Saúde em transformação: um ensaio cartográfico do acolhimento [tese doutorado]. Ribeirão Pre-to: Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo; 2003.

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