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Onde está a Justiça Eleitoral?

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Academic year: 2017

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Onde está a Justiça Eleitoral?

Folha de S. Paulo

Marcos Cintra – 19-09-2005

O que é a honestidade senão o medo da prisão, indagava um escritor italiano do século 19?

Tal pergunta já sugere uma resposta. A de que as pessoas são inerentemente desonestas e que apenas o medo da punição evita condutas egoístas e anti-sociais.

Mesmo concedendo certa dose de veracidade à afirmação do poeta latino Juvenal de que “a honestidade é elogiada por todos, mas morre de frio”, não há que se exagerar no cinismo sobre a natureza humana. A herança cultural e a formação ética e moral adquirida durante a fase de formação da personalidade dos indivíduos contribuem para conter os vícios de conduta que o homem poderá possuir como instinto natural. Contudo não há como negar os efeitos dissuasivos da punição no controle do comportamento criminoso.

Nesse sentido, é estarrecedor verificar que a revelação dos escândalos e da generalizada corrupção que passou a imperar no seio do governo brasileiro foi travestida para transformar-se em crime meramente eleitoral. Como são tidos como crimes de menor potencial ofensivo, e as punições previstas em lei são mais brandas, o suborno, o mensalão, o desvio, o superfaturamento e a propina tornaram-se, confessadamente, meros repasses para o financiamento de campanhas eleitorais. Como se irregularidade não houvesse. A desfaçatez é tanta a ponto de atribuírem a pessoas falecidas a responsabilidade por gastos eleitorais custeados por “doações” que jamais serão confirmadas ou desmentidas.

O surpreendente é que a confissão de crimes eleitorais tornou-se a válvula de escape para todos os tipos de delitos. E que, apesar de as confissões terem jorrado escancaradamente das telas de televisão para todo o país, nenhuma punição foi aplicada aos partidos políticos, aos seus dirigentes ou aos candidatos conscientemente beneficiados. Salvo engano, nenhum mandato foi cassado, nenhuma multa foi aplicada e nenhum registro partidário foi suspenso. Apesar das centenas de milhões de reais que foram desviados de suas finalidades públicas, nenhuma punição parece ter sido aplicada, pois subitamente foram maquiados e transformados, para todos os efeitos práticos, em meras contravenções eleitorais. Ou seja, é permitido praticar impunemente qualquer crime, desde que tenha como finalidade o financiamento de campanha eleitoral.

O Brasil vive um momento de perplexidade. A Justiça Eleitoral deve ser respeitada, e para tanto tem que se fazer respeitar.

É certo que os recursos são escassos, que as formas de fiscalização são ineficazes e que a legislação é imprecisa e tolerante. Contudo, tais limitações não se aplicam ao momento atual. As provas e evidências não precisam ser investigadas. Caíram no colo da lei ao serem confessadas em série nos monótonos e bem ensaiados bordões desfilados nas passarelas das CPIs. Caixa dois, doações fraudulentas e sonegação de impostos perderam sua conotação criminosa nessa triste seqüência de confissões. Tornaram-se fatos atenuantes, em vez de serem agravantes, em crimes eleitorais.

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Proponho que todas as contas de campanha, ainda que de titularidade dos candidatos, sejam geridas pelo próprio TSE, que emitiria todos os cheques de pagamentos após a devida autorização dos candidatos. Qualquer despesa de campanha realizada sem a cobertura do respectivo cheque emitido pelo próprio TSE implicará na imediata cassação do registro da candidatura.

Em suma, o TSE passaria a ter o controle dos valores recebidos e de todos os pagamentos efetuados. O caixa dois desapareceria de imediato. Os gastos irregulares seriam praticamente inviabilizados.

Outro aspecto inaceitável diante do atual cenário é a omissão do Congresso na aprovação da reforma eleitoral. Não há como aceitar a continuidade de um sistema que distancia o eleitor de seu representante e que torna a disputa eleitoral um torneio para premiar os que detêm maior poderio econômico. A inapetência do Congresso para aprovar a reforma político-eleitoral terá como inevitável resultado um novo Congresso a tomar posse em 2007 que poderá apresentar elevados índices de renovação de pessoas. Mas seus perfis serão os mesmos. Serão caras novas com os mesmos velhos comportamentos.

Deixo aqui alguns questionamentos sobre os quais o país exige respostas convincentes: afinal, onde está a Justiça Eleitoral? Por que não age? Por que não pune? O que falta para tipificar o crime? Por que não se torna uma mola propulsora das reformas?

E até quando deve a sociedade fingir que acredita que tudo o que está sendo revelado são apenas crimes eleitorais?

Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 59, doutor pela Universidade Harvard, professor titular e vice-presidente da FGV, foi deputado federal (1999-2003). Atualmente é secretário das Finanças de São Bernardo do Campo. É autor de “A verdade sobre o Imposto Único” (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

Internet: www.marcoscintra.org

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