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Avaliação da presença e extensão dos atributos da atenção

primária em dois modelos coexistentes na rede básica de

saúde do município de São Paulo

Tese apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Ciências

Programa de: Clínica Médica

Área de Concentração: Educação e Saúde

Orientadora: Profa. Dra. Isabela Judith Martins Benseñor

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Preparada pela Biblioteca da

Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

reprodução autorizada pelo autor

Brunelli, Bruno

Avaliação da presença e extensão dos atributos da atenção primária em dois modelos coexistentes na rede básica de saúde do município de São Paulo / Bruno Brunelli. -- São Paulo, 2016.

Tese(doutorado)--Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Programa de Clínica Médica. Área de Concentração: Educação e Saúde.

Orientadora: Isabela Judith Martins Benseñor.

Descritores: 1.Atenção primária à saúde 2.Medicina de família e comunidade 3.Avaliação de serviços de saúde 4.Estratégia saúde da família 5.Assistência ambulatorial 6.Brasil

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Primeiramente, a Deus, por todas as oportunidades, pela inspiração e pelo sustento nos momentos de maior ansiedade.

À Professora Isabela Benseñor, por tanta dedicação, acessibilidade e paciência.

Ao Professor e amigo Gustavo Gusso, por proporcionar minha iniciação na Medicina de família e comunidade com tantas boas lições e com tantos conselhos nos tempos de Liga de Saúde da Família. Pelas tantas oportunidades oferecidas desde então, incluindo este doutorado, pelos incentivos, pelo suporte e pela paciência.

Ao Professor Itamar Santos, cujos conhecimentos estatísticos ajudaram em muito a construção desse trabalho.

Ao Professor Erno Harzheim e à Fundação de Apoio à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, por disponibilizarem o instrumento em formato otimizado e financiarem a aplicação dos questionários deste trabalho.

Aos meus pais, que sempre acreditaram que o sonho deles era possível.

A minha esposa Wesllanny, pelo amor dedicado, pelo incentivo e pela compreensão nos momentos de ausência.

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Esta tese está de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta publicação:

Referências: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors

(Vancouver). Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Divisão de Biblioteca e Documentação. Guia de apresentação de dissertações, teses e monografias. Elaborado por Anneliese Carneiro da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Aragão, Suely Campos Cardoso, Valéria Vilhena. 3a ed. São Paulo: Divisão de Biblioteca e Documentação; 2011.

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SUMÁRIO

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS LISTA DE FIGURAS

LISTA DE TABELAS LISTA DE QUADROS RESUMO

ABSTRACT

1 INTRODUÇÃO ... 3

1.1 Sistemas de Saúde ... 3

1.2 Definição de Atenção Primária à Saúde ... 5

1.3 Histórico do Sistema de Saúde Brasileiro ... 7

1.4 O Sistema Único de Saúde ... 9

1.5 PACS, PSF e a Estratégia Saúde da Família (ESF) ... 12

1.6 A Implantação da ESF na cidade de São Paulo ... 14

1.7 A ESF e o Problema da Acessibilidade ... 15

1.8 As Unidades de Atendimento à Demanda Espontânea ... 17

1.9 Comparação com os Walk-in Centres ... 21

1.10 Avaliações ... 23

1.11 O Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica ... 26

1.12 O Primary Care Assessment Tool (PCATool) ... 31

2 OBJETIVOS ... 37

3 MÉTODOS ... 41

3.1 Características do Local de Estudo e dos Serviços ... 41

3.2 População incluída no estudo ... 43

3.3 Aplicação do PCATool ... 44

3.4 Avaliação sociodemográfica ... 46

3.5 Sistematização das entrevistas ... 47

3.6 Ética ... 48

3.7 Análise estatística ... 49

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5.2 Limitações ... 94

6 CONCLUSÃO ... 97 7 REFERÊNCIAS ... 101 8 APÊNDICES

8.1 Apêndice A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 8.2 Apêndice B - Questionário Auxiliar

8.3 Apêndice C - PCATOOL – Brasil Versão Adulto - Versão do Entrevistador

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ABEP Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa

ABRASCO Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva ACS Agente Comunitário de Saúde

AMA Assistências Médicas Ambulatoriais

AMQ Avaliação para Melhoria da Qualidade da Estratégia Saúde da Família

APS Atenção Primária em Saúde

APSS Atenção Primária à Saúde Seletiva

CASSI-RS Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil CEBES Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

CHCs Community Health Centers

CONASS Conselho Nacional de Secretários de Saúde CSEM Centro de Saúde Escola Murialdo

DAB Departamento de Atenção Básica ESF Estratégia de Saúde da Família EUA Estados Unidos da América

HMO Health Maintenance Organizations

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INPS Instituto Nacional de Previdência Social INS Índice de Necessidades de Saúde

IPRS Índice de Responsabilidade Social do Estado de São Paulo IQs Intervalos Interquartis

OMS Organização Mundial de Saúde ONGs Organizações não Governamentais

PACS/PSF Programas de Agentes Comunitários de Saúde e de Saúde da Família

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Básica

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PSF Programa Saúde da Família

SEADE Sistema Estadual de Análise de Dados SES-RS Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul

SUS Sistema Único de Saúde

UBS Unidade Básica de Saúde

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LISTA DE FIGURAS

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Tabela 1 Distribuição da Amostra de acordo com as principais variáveis sociodemográficas ... 53

Tabela 2 Características gerais da amostra estudada de acordo com a afiliação aos serviços de saúde ... 55

Tabela 3 Distribuição dos entrevistados por equipe e por serviço afiliado (UBS, AMA e Outros) ... 57

Tabela 4 Características gerais da amostra estudada de acordo com equipe a que pertence. ... 57

Tabela 5 Comparação entre a Equipe Amarela e o conjunto das outras equipes em relação às variáveis que apresentaram diferença estatisticamente significante. ... 59

Tabela 6 Comparação entre o conjunto das Equipes Amarela e Verde, e com outras equipes em relação às variáveis que apresentaram diferença estatisticamente significante. ... 60

Tabela 7 Escores de Atenção Primária por atributo para a UBS Luar do Sertão e a AMA Parque Fernanda: Atributos A a D. ... 61

Tabela 8 Escores de Atenção Primária por atributo para a UBS Luar do Sertão e a AMA Parque Fernanda: Atributos E a H. ... 61

Tabela 9 Escores de Atenção Primária por atributo para a UBS Luar do Sertão e a AMA Parque Fernanda: Atributos Derivados I e J e Escore Geral... 62

Tabela 10 Escores médios dos itens do PCATool por Local de atendimento. ... 62

Tabela 11 Comparação dos Escores de APS entre Estudos Brasileiros que compararam ESF com UBST. ... 80

Tabela 12 Comparação dos Escores de APS entre Estudos Brasileiros que avaliaram serviços de APS como um todo. ... 81

Tabela 13 Comparação dos Escores dos Atributos de APS entre Estudos Internacionais Ocidentais. ... 84

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Itens que não apresentaram diferença estatisticamente significante para seus escores médios entre AMA e UBS ... 68

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Brunelli B. Avaliação da presença e extensão dos atributos da atenção primária em dois modelos coexistentes na rede básica de saúde do município de São Paulo [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo; 2016.

INTRODUÇÃO: Serviços de saúde desenvolvidos para a atenção à demanda espontânea de baixa complexidade como as Walk-in Clinics canadenses e britânicas estão sendo oferecidos no Brasil como alternativa à Estratégia de Saúde da Família (ESF). Em São Paulo, recebem o nome de Assistências Médicas Ambulatoriais (AMA). Entretanto, não há estudos comparativos entre eles. OBJETIVO: Comparar aspectos estruturais e processuais de uma Unidade Básica de Saúde (UBS), vinculada à ESF, e de uma AMA utilizando a ferramenta de avaliação PCATool. METODOLOGIA: Trata-se de um estudo transversal utilizando o instrumento para avaliação de qualidade de serviços de APS, Primary Care Assessment Tool, – versão validada para o Português (PCATool Brasil), em uma área da Zona Sul da cidade de São Paulo coberta por dois modelos de serviços voltados para a APS: uma Unidade Básica de Saúde (UBS), parte integrante da ESF, e uma AMA. Participaram da pesquisa 616 adultos maiores de 18 anos, residentes na área adstrita à UBS, cadastrados ou não à UBS. Foi considerado como fator de exclusão não estar afiliado a nenhum dos dois serviços de interesse do estudo, o que, na prática, se traduziu por não ter passado nenhuma vez em consulta na UBS ou na AMA durante último ano. Além do questionário do PCATool Brasil, composto por 87 perguntas focadas na mensuração dos atributos essenciais e derivados da APS, um questionário sociodemográfico foi aplicado para incluir dados como idade, sexo, profissão, escolaridade e classe social. A coleta dos dados aconteceu na casa dos usuários, em horários variados, entre novembro de 2013 e julho de 2014, por meio de entrevistadores capacitados previamente. Cada visita demorou entre 20 a 40 minutos. Não houve contato telefônico anterior. Os escores individuais do PCATool Brasil dos serviços AMA e UBS foram calculados conforme manual do instrumento. RESULTADOS: Dos 616 questionários, 76,3% eram afiliados à UBS e 12,3% a AMA. Os frequentadores da UBS pertenciam a uma classe social mais baixa comparados aos da AMA. A UBS apresentou escores essencial e geral maiores: 5,64 (IC95% 5,53-5,74) e 5,58 (IC95% 3,44-3,95), respectivamente, contra 3,70 (IC95% 3,44-3,95) e 3,38 (IC95% 3,08-3,59) da AMA. Teve médias superiores em quase todos os

atributos, alcançando alta orientação à APS em dois: “utilização” (7,22 – IC95% 6,97-7,47) e “sistemas de informação” (7,31 – IC95% 7,15-7,47). A AMA

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do considerado satisfatório, embora os escores da UBS sejam mais elevados do que os da AMA em 8 dos 10 atributos. CONCLUSÃO: A UBS Luar do Sertão e a AMA Pq. Fernanda não estão cumprindo suas potencialidades de maneira satisfatória. Seus usuários percebem pouco os atributos de APS propostos por Starfield nos dois serviços avaliado pelo PCATool Brasil. Embora a UBS apresente uma performance melhor do que a AMA, ela ainda está muito abaixo do esperado, sendo necessária implementação de mudanças que melhorem seu desempenho, assim como o da AMA.

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Brunelli B. Assessment of the presence and extent of primary care attributes in two health services of the primary health care network of the city of São Paulo

[Thesis]. São Paulo: "Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo"; 2016.

INTRODUCTION: In Brazil, Health Care Services focused on low-complexity demand as the Canadian and British walk-in clinics are available in Brazil as an alternative option to the Family Health Strategy (FHS - Estratégia Saúde da Família). In the city of São Paulo, they are called Outpatient Medical Care units (Assistências Médicas Ambulatoriais - AMA). However, there are no studies comparing the performance of these two strategies. OBJECTIVE: To compare structural and procedural aspects of two services in the city of São Paulo: a Basic Health Unit (BHU) of the FHS, and an AMA using the Primary Care Assessment Tool – Portuguese validated version (PCATool Brazil). METHODS: A cross-sectional study to assess the presence and extent of primary health care (PHC) attributes in an area covered by two Primary Care units of São Paulo: a Basic Health Unit (Unidade Básica de Saúde – BHU), part of the FHS, and an AMA. PCATool Brazil questionnaire were applied to 616 adults older than 18 years, living in the area linked to the BHU, registered or not in the BHU. Individuals with affiliation to none of the two services, i.e., that did not used the units in the last year, were excluded from the analysis. Besides the PCATool Brazil questionnaire, composed by 87 questions focused on the measurement of the essential and derived PHC attributes, the researchers applied a sociodemographic questionnaire to evaluate sociodemographic characteristics such as age, sex, occupation, education and social class. Data collection occurred between November 2013 to July 2014 in the participant household at different schedules during the day by previously trained interviewers. Each visit demanded 20 to 40 minutes. There was no previous phone contact. PCATool Brazil scores for AMA and BHU units were calculated as instructed by

PCATool’s manual. RESULTS: Of the 616 questionnaires, 76.3% reported an

affiliation with the BHU and 12.3% with the AMA. BHU users were from lower social level compared to the AMA. BHU presented higher essential and general scores: 5.64 (95%CI, 5.53 to 5.74) and 5.58 (95%CI, 3.44 to 3.95), respectively, compared to 3.70 (95%CI 3, 44 to 3.95) and 3.38 (95%CI 3.08 to 3.59) of the AMA. BHU showed higher average scores in almost all attributes, reaching high PHC orientation in two of them: "First Contact - Utilization" (7.22 - 95%CI, 6.97 to 7.47) and "Coordination - information systems" (7.31 - 95%CI, 7,15 to 7.47). In the AMA, the only attribute that scored higher than in BHU was "accessibility" with a score of 3.68 (95%CI, 3.38 to 3.98) compared to 2.46 (95% CI 2.34 to 2.58) in the BHU. Therefore, AMA did not present any attributes with high PHC orientation (no attributes had scores > 6.6). DISCUSSION: In general, the users identified a very low level of satisfactory development of PHC attributes in the

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10 attributes. CONCLUSION: UBS Luar do Sertão and AMA Pq. Fernanda did not fulfill all their possible potentials. Users realize few of the attributes proposed by Starfield for each one of the services. Although the UBS present a better performance compared to the AMA, it is lower than expected. It is necessary to make some changes to improve the performance of these units.

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1 INTRODUÇÃO

Diversos modelos de atendimento convivem no sistema de saúde brasileiro. É foco deste trabalho a comparação entre dois deles e a implicação disso para a qualidade dos serviços oferecidos à população.

1.1 Sistemas de Saúde

Não há concordância absoluta entre os autores sobre a definição de sistema de saúde (VIACAVA et al., 2004). As definições e os conceitos variam de acordo com os valores, os princípios e as concepções do que é saúde e qual o papel do Estado em relação ao provimento de serviços de saúde para suas populações. Talvez a definição mais clássica seja a de Roemer (1991):

“um sistema de saúde é a combinação de recursos, organização, financiamento e gerenciamento que culmina na prestação de serviços de saúde

para a população” (ROEMER, 1991). A Organização Mundial de Saúde (OMS) define sistema de saúde como o “conjunto de atividades cujo principal

propósito é promover, restaurar e manter a saúde de uma população” (WHO,

2000).

A organização de um sistema de saúde é complexa. Os serviços que o compõe não apresentam uma relação harmônica, mas funcionam de forma conflitiva por meio de trajetórias próprias. Podem ser internos ao sistema, mas são influenciados profundamente por elementos externos a ele como instituições geradoras de recursos, de conhecimento e de tecnologias. Seus objetivos e suas funções dependerão dos interesses dos diversos segmentos da sociedade e de seu momento histórico.

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Ocidente viveu um processo de racionalização que, invariavelmente, atingiu a formação médica e os modelos de organização dos serviços de saúde (STARFIELD, 2002).

Para Pagliosa et al. (2008), a publicação do estudo Medical Education in the United States and Canada – A Report to the Carnegie Foundation for the Advancement of Teaching, que ficou conhecido como o Relatório Flexner (Flexner Report), em 1910, legitimou a consolidação do modelo científico na medicina norte-americana e transformou o hospital no centro da assistência durante o século XX (PAGLIOSA et al., 2008). Os avanços científicos que ocorreram após a Segunda Guerra Mundial consolidaram esta ênfase biologicista abrindo caminho para especializações e subespecializações cada vez mais reducionistas, sobrando pouco espaço para as dimensões social, psicológica e econômica na saúde. A atenção à saúde tornou-se gradativamente mais multifacetada e menos preventiva (QUEIROZ, 1986).

Pagliosa et al. (2008) colocam que as críticas a esse sistema se

intensificaram a partir da década de 60, no que ficou conhecido como a “crise da medicina”. O otimismo que havia por se acreditar que a tecnologia

erradicaria a maioria das doenças cedeu lugar à percepção da realidade das limitações da ciência (PAGLIOSA et al., 2008). Ehrenreich (1978) mostrou em artigo de 1978 que, em vários países, o aumento do nível de atividade médica numa certa sociedade, a partir de certo ponto, não correspondia a um aumento proporcional do nível de saúde da população, observando-se a crescente alocação de recursos para a área médica com ganhos em saúde pública cada vez menores (EHRENREICH,1978). Powles (1980) chamou isso de “um dos

mais notáveis paradoxos da cultura médica” (POWLES, 1980)

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uma população específica da forma mais eficiente possível, minimizando desigualdades (OPAS, 1964).

Muitos países europeus, como a Holanda e a Dinamarca, imitaram o modelo britânico antes que sua eficácia fosse comprovada. Eles investiram em sistemas baseados nos centros de saúde primários e alcançaram ótimos indicadores (GÉRVAS & FERNÁNDEZ, 2006). Estas experiências e outras de países com recursos para a saúde limitados, como China, Tanzânia, Sudão e Venezuela, nas décadas de 60 e 70, influenciaram a OMS na construção de políticas de saúde nesses moldes para países em desenvolvimento. Este movimento culminou na Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde de 1978, no Cazaquistão (RIVERO, 2003)

Sob o tema “Saúde para todos no ano 2000”, a conferência concluiu seus

trabalhos com a criação e publicação da Declaração de Alma-Ata, documento norteador que comprometia os países signatários a promover um nível satisfatório de saúde a seus cidadãos até o fim do milênio. Orientava os investimentos no nível primário de atenção, promovendo a aproximação do sistema de saúde aos cidadãos por meio da regionalização, melhorando a equidade no cuidado ao promover a resolução dos principais problemas sanitários, e o foco na necessidade de integração e coordenação com os demais níveis de atenção.

O Conceito de Atenção Primária em Saúde (APS) adquiriu relevância mundial a partir deste momento. Muitos países falharam na aplicação das mudanças propostas pelo documento de Alma-Ata, mas os que obtiveram sucesso mostraram, por meio de estudos de comparação, que investir no nível primário de atenção promovia melhores índices de saúde (STARFIELD, 2002).

1.2 Definição de Atenção Primária à Saúde

Segundo Starfield (2002), a atenção primária é o “nível de um sistema de

serviços de saúde que oferece a entrada para todas as novas necessidades e

problemas”, “aborda os problemas mais frequentes na comunidade, oferecendo

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bem-estar”, “fornece atenção para todas as condições, exceto as muito incomuns ou raras”, coordena e integra a atenção, formando a base e determinando “o trabalho de todos os outros níveis”. “Não é um conjunto de tarefas ou

atividades clínicas exclusivas”, mas se diferencia da atenção secundária por

lidar com problemas mais frequentes e menos definidos, ser menos intensiva e hierárquica, e atuar em unidades comunitárias mais próximas do ambiente no qual as pessoas vivem (STARFIELD, 2002).

A Charter for General Practice/Family Medicine in Europe, Carta para Clínica Geral/Medicina de Família na Europa, desenvolvida por um grupo de trabalho da OMS, define a APS como um sistema acessível e aceitável; que distribui equitativamente os recursos de saúde; integra e coordena os serviços curativos, paliativos, preventivos e promotores de saúde; controla de forma racional a tecnologia e aumenta a relação custo-efetividade por meio de seus atributos. De acordo com Starfield4, são quatro os atributos essenciais da APS: longitudinalidade, integralidade, coordenação e acessibilidade. Ela ainda enumera três atributos derivados: atenção centrada na família, orientação comunitária e competência cultural (WHO, 1994).

Entende-se por longitudinalidade a atenção contínua oferecida ao usuário que resulta em uma relação interpessoal intensa e de confiança mútua com o profissional de saúde; integralidade é o leque de serviços disponíveis suficientes para tratar, prevenir ou reabilitar, incluindo os encaminhamentos para especialidades focais e serviços de urgência; coordenação da atenção é a capacidade do nível primário de integrar todo o cuidado oferecido ao usuário, inclusive os efetuados em outros níveis de atenção; e acessibilidade é o primeiro contato do usuário com o sistema de saúde (exceto em caso de verdadeiras urgências e emergências médicas) e envolve a localização do estabelecimento, seus horários de funcionamento, o grau de tolerância para consultas não agendadas e o quanto a população percebe a conveniência destes aspectos da acessibilidade.

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como a equipe de saúde se adapta às características culturais específicas da comunidade.

Estas doutrinas de cuidados de saúde primários influenciaram vários países em desenvolvimento logo após Alma-Ata. Críticos, porém, consideravam uma APS abrangente como algo extremamente idealista. Argumentavam que os custos de se cobrir toda a população de um país eram exorbitantes, uma meta praticamente inatingível(WARREN, 1988). Por isso, a maior parte dos países em desenvolvimento, na época, preferiram seguir um

conceito alternativo de “Atenção Primária à Saúde Seletiva” (APSS):

intervenções de baixo custo alocadas em programas verticais direcionados, principalmente, ao binômio materno-infantil, como mensuração de peso, aplicação de vacinas e práticas de estímulo à amamentação. Embora essa postura tenha contribuído para a diminuição da mortalidade infantil nos países nos quais foi implantada, não houve a preocupação de se organizar os sistemas de saúde a partir do primeiro nível de atenção, não resultando, portanto, em melhor acesso para a população, ou melhor longitudinalidade ou mesmo uma melhor coordenação entre os níveis de atenção (UNGER & KILLINGSWORTH, 1986). Governantes apenas viram na APSS uma maneira de reduzir custos em saúde, mantendo, ao mesmo tempo, o discurso populista

de comprometimento com o lema “Saúde para todos no ano 2000” firmado em

Alma Ata. Assim, o termo APS, durante a década de 80, se restringiu a um jargão usado como slogan na maioria dos países em desenvolvimento, sendo que a maior parte dos recursos continuava a ser direcionada para complexos hospitalares urbanos.

1.3 Histórico do Sistema de Saúde Brasileiro

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sem a devida fiscalização tornara-se uma fonte incontrolável de corrupção. A construção ou reforma de inúmeras clínicas e hospitais privados, além das faculdades de Medicina particulares, com dinheiro público por meio de financiamento a fundo perdido, foi prática corrente. Os cursos de Medicina desconheciam, de maneira geral, a realidade sanitária da população brasileira, pois estavam voltados para a especialização e para a sofisticação tecnológica. A saúde pública, relegada a um segundo plano, com menos de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), tornara-se uma máquina ineficiente e conservadora, cuja atuação se restringira a programas verticais de baixa eficácia, na prática, uma atenção primária à saúde seletiva (ESCOREL et al., 2005).

Escorel et al. (2005) ainda acrescentam que a associação desse quadro com a elevação dos preços das commodities como o petróleo, a desvalorização dos principais produtos de exportação brasileiros, o intenso processo de migração da população do campo para as cidades e a queda do poder aquisitivo do salário mínimo levou os habitantes das principais regiões metropolitanas do país, desempregados e sem acesso à previdência social, a enfrentarem péssimas condições de vida que resultavam em altas taxas de mortalidade.

Aos poucos, o regime ia perdendo seu apoio popular, enquanto estudos mostrando os efeitos do modelo de desenvolvimento adotado pelo país ganhavam visibilidade (MELLO et al., 1982). Tornavam-se mais frequentes seminários e congressos de sindicatos e grupos de diversas categorias discutindo as epidemias, as endemias e os problemas da população empobrecida. Este movimento pela transformação do setor saúde, cuja base se deu nos Departamentos de Medicina Preventiva das principais faculdades de Medicina do país, recebeu o nome de Movimento pela Reforma Sanitária (ESCOREL et al., 2005).

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municipais e outros movimentos sociais (incluindo sindicatos e partidos de esquerda na ilegalidade) culminou na criação do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), na 8ª Conferência Nacional de Saúde e na própria criação do Sistema Único de Saúde (SUS) por meio da Assembleia Nacional Constituinte de 1987-88.

A reforma do setor saúde no Brasil estava na contramão das reformas de ideologia neoliberal difundidas no mundo da época, que questionavam a manutenção do estado de bem-estar social (ALMEIDA, 1995). Por isso mesmo, enfrentaram forte oposição de um setor privado mobilizado e poderoso num momento de instabilidade econômica e perda do poder de compra.

O Sistema de saúde brasileiro nasce da conciliação entre estes segmentos em conflito. É um híbrido composto por dois eixos: o sistema público, o SUS, financiado e provido pelo Estado nos níveis municipal, estadual e federal; e o privado, ou suplementar. O SUS ainda aceita ter seus serviços públicos realizados por empresas privadas, por meio de subsídios fiscais, mas sem fins lucrativos (PAIM et al., 2011). Para Arretche (2005), na criação do

SUS, ganharam todos: “o setor privado lucrativo conservou seu papel na provisão de serviços, sem garantir exclusividade ao SUS”, “os médicos

mantiveram a possibilidade de prestar simultaneamente serviços ao SUS e ao

exercício liberal da medicina” e políticos agradaram “seus eleitores com o aumento da provisão de serviços gratuitos” (ARRETCHE, 2005).

1.4 O Sistema Único de Saúde

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 Universalidade: todo e qualquer cidadão tem por princípio a atenção à saúde garantida pelo sistema;

 Equidade: atendimento proporcional às necessidades do cidadão;

 Integralidade: promoção, prevenção, cura e reabilitação;

 Descentralização: responsabilidades distribuídas entre os vários níveis de governo;

 Regionalização e Hierarquização: organização em níveis de complexidade crescentes, sendo o nível primário a porta de entrada; áreas geográficas determinadas e população definida;

 Controle Social: participação da população na formulação das políticas de saúde em todos os níveis por meio de entidades representativas (BRASIL, 1990).

Entretanto, seu financiamento por meio de impostos, tendo como fonte as receitas estatais, não tem sido suficiente para assegurar recursos adequados e estáveis para os variados serviços. Em 2007, apenas 8,4% do PIB foi gasto com saúde, sendo a participação pública de apenas 41%. Reino Unido (82%), Itália (77,2%), Espanha (71,8%) e até os Estados Unidos (45,5%) apresentaram maior participação do Estado na organização da atenção à saúde (PAIM et al., 2011). O exemplo norte-americano é ainda mais relevante quando assumimos que seu sistema de saúde é considerado o padrão de modelo liberal. Dados da OMS colocam o Brasil entre os países que destinam menos recursos públicos para a saúde por habitante em cada ano, perdendo para vizinhos como Argentina, Chile, Uruguai e Costa Rica (SANTOS, 2013).

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brasileira, com um índice de Gini de 0,57, ter um financiamento proporcional é fortemente questionável sob a ótica da justiça social, sendo evidente a necessidade de uma reforma tributária (UGÁ & SANTOS, 2006).

Se, no financiamento, o SUS ainda carece de avanços, os últimos 25 anos representaram melhora considerável na distribuição de infraestrutura de serviços, cobertura e acesso (COHN, 2009). A inclusão social proporcionada pelo SUS alcançou, em 2005, o volume de 1,3 bilhões de atendimentos básicos em 64 mil unidades ambulatoriais, 1,1 bilhão de procedimentos especializados, 600 milhões de consultas, 11,6 milhões de internações em 5.900 hospitais, importantes avanços no desenvolvimento de conhecimentos e tecnologias em áreas críticas como imunobiológicos, fármacos, informação, gestão descentralizada e outras, o maior programa público e mundial de imunização (representando 152 milhões de doses de vacinas), e o programa de controle da AIDS mais eficaz dentre países em desenvolvimento, sendo referência internacional (SANTOS, 2013).

Um dos passos mais importantes na universalização dos cuidados foi dado por meio dos Programas de Agentes Comunitários de Saúde e de Saúde da Família (PACS/PSF). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 1981 (portanto, antes da criação do SUS), mostrava apenas 8% da população (9,2 milhões de pessoas) usando algum serviço de saúde nos últimos trinta dias, enquanto em 2008, 14,2% da população (26.866.869 pessoas) relatou uso nos últimos quinze dias, representando um aumento de 174%. (BRASIL, 2015b).Quando focado o uso específico da atenção primária, o aumento é de cerca de 450% (BRASIL, 2015c).

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1.5 PACS, PSF e a Estratégia Saúde da Família (ESF)

Criado como uma estratégia governamental para reestruturar o sistema e o modelo assistencial do SUS, o PACS surgiu em 1991 com o objetivo de interiorizar e promover saúde nas regiões mais pobres do Norte e Nordeste do país. Inicialmente, era idealizado como um programa vertical que oferecia, principalmente, serviços de saúde materno-infantis a populações de alto risco (Atenção Primária à Saúde Seletiva). Consistia na criação e manutenção de equipes de saúde compostas de quatro a seis profissionais de nível fundamental, os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), supervisionados por um enfermeiro. Cada ACS tinha a função de realizar atividades de promoção à saúde para 100 a 250 famílias. Apesar dos bons resultados, a medida era insuficiente para suprir todas as necessidades daquelas populações. Então, em 1994, foi criado o Programa Saúde da Família (PSF), nos mesmo moldes do PACS, mas com o acréscimo de mais dois profissionais: um médico generalista e dois auxiliares de enfermagem que, juntos com a equipe anterior, se responsabilizariam por 600 a 1000 famílias. Nos primeiros anos, o PSF priorizou o Mapa da Fome: rincões do Brasil caracterizados pela pobreza e falta de recursos. A partir de 1997, entretanto, se configurou como a principal estratégia de estruturação da atenção primária dos sistemas locais de saúde e vem reorganizando unidades básicas de saúde para que se concentrem nas famílias e comunidades, e tenham enfoque especial para atividades de promoção e prevenção à saúde, integrando-as à assistência médica.

As equipes de saúde da família representam a porta de entrada ao sistema local. Coordenam a atenção e procuram oferecer integralidade ao se comunicar com os outros pontos da rede. A expansão do PSF para os grandes centros urbanos, fruto de estímulos de financiamento do Governo Federal aos municípios a partir de 1998, levou ao fortalecimento das estruturas regulatórias nas secretarias municipais de saúde e estimulou o desenvolvimento do SUS.

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Embora, originalmente, rotulado como programa, suas especificidades fugiram à concepção de programa concebida pelo Ministério da Saúde (MS). Não se tratava mais de uma intervenção vertical e paralela às atividades dos serviços de saúde, uma Atenção Primária a Saúde Seletiva, mas uma estratégia visando à integração e à reorganização das atividades, apresentando-se como modelo substitutivo da rede básica tradicional (BRASIL, 1997). De acordo com o Ministério da Saúde (2002), são objetivos da Estratégia Saúde da Família (ESF):

 Prestar assistência integral e contínua às necessidades de saúde da população adstrita, utilizando a família como núcleo básico de abordagem no atendimento à saúde, seja nas unidades de saúde sejam em domicílio;

 Humanizar as práticas de saúde ao estabelecer vínculo entre os profissionais de saúde e a população;

 Estabelecer parcerias ao desenvolver ações intersetoriais;

 Democratizar os conhecimentos relacionados à saúde e à organização dos serviços;

 Estimular a organização da comunidade para o efetivo exercício do controle social (BRASIL, 2002).

(29)

1.6 A Implantação da ESF na cidade de São Paulo

De acordo com Coelho et al. (2014), em 1995, o ministro da saúde Adib Jatene, o secretário estadual da saúde José da Silva Guedes, e Davi Capistrano, médico e ex-prefeito de Santos, se reuniram para apoiar a implementação de um programa-piloto de saúde da família nas periferias da cidade de São Paulo: o Qualis, construído com a participação de organizações não governamentais (ONGs). Ao final de 1999, o Qualis possuía, aproximadamente, 140 equipes de saúde da família, que chegaram a atender cerca de 400 mil paulistanos residentes em distritos periféricos (COELHO et al.,

2014).

Entre 1993 e 2000, vigorou, contemporaneamente, na cidade, o PAS (Plano de Atendimento à Saúde), sistema municipal de saúde próprio, resultado do rompimento entre a gestão Paulo Salim Maluf e o SUS, que propunha que os médicos se organizassem em cooperativas para prestar serviços públicos de saúde aos moradores da cidade. Ao optar pelo PAS, a cidade se distanciou do processo de municipalização e descentralização dos serviços de saúde que estavam em andamento no restante do país, sendo impedida de receber o repasse de recursos financeiros dos outros níveis governamentais para o sistema de saúde municipal (COELHO et al., 2014).

A partir de 2001, a gestão Marta Suplicy decide acabar com o PAS e aderir ao SUS, e expandir o Programa de Saúde da Família (PSF) para além do Qualis. Até aquele momento, a população usuária do SUS estava concentrada nas periferias da cidade, mas a oferta de equipamentos e serviços estava alocada nas regiões mais centrais e antigas da cidade de São Paulo. (COELHO & PEDROSO, 2002; COELHO & SILVA, 2007). De 2001 a 2004, entretanto, o número de UBS com ESF saltou de 135 para 382, um incremento de 282,9% (COELHO et al., 2014).

Infelizmente, tal avanço não proporcionou o aumento na satisfação dos eleitores esperados pelos políticos e as próximas gestões preferiram priorizar outro modelo de atendimento que oferecesse respostas mais imediatas às demandas espontâneas, a Assistência Médica Ambulatorial (AMA) (COELHO

(30)

1.7 A ESF e o Problema da Acessibilidade

Estudiosos da APS brasileiros afirmam que a ESF estaria legitimando a natureza privatista e neoliberal do sistema ao criar um programa pobre para pobres, utilizando, propositalmente, baixa tecnologia, profissionais mal preparados e infraestrutura de qualidade inferior. Um modelo com pouca ênfase à saúde individual e de atendimento à demanda espontânea insatisfatório, afetando, contraditoriamente, um dos princípios-chave da APS: a acessibilidade (GUSSO, 2004).

Franco et al. (1999) assim caracterizam a ESF: “apesar de se constituir

em uma estratégia com potencial para equalizar a relação oferta-demanda, na

prática, ainda não conseguiu desburocratizar o acesso aos serviços” (FRANCO et al., 1999). O próprio Ministério da Saúde reconhece, em seu Manual

Técnico, “Acolhimento à Demanda Espontânea” a questão do acesso como

sendo um dos grandes desafios atuais da ESF. Reconhece, ainda, a dificuldade que as dicotomias individual/coletivo, clínica/saúde pública, cura/prevenção e demanda espontânea/agenda programada representam para a organização de um serviço de APS (BRASIL, 2011c).

A ESF não pode se restringir a realizar apenas consultas e procedimentos, assim como também precisa ser resolutiva e não focar somente na promoção e prevenção ao nível coletivo. Precisa estar aberta e preparada para acolher os imprevistos sem se reduzir a um pronto-atendimento; nisso consiste o desafio (SOUZA & LOPES, 2003).

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demandas, explicar com clareza os serviços ofertados pela unidade e apresentar algum grau de resolutividade (BRASIL, 2011c).

Vários modelos de acolhimento já foram tentados para proporcionar atendimento a quem não agendou consulta. Lima et al. (2007) relatam que havia unidades que distribuíam fichas para as queixas espontâneas nos primeiros horários de atendimento, produzindo longas filas de usuários durante a madrugada; e outras que só fixavam um período de 2 a 3 horas para este tipo de consulta, obrigando quem aparecesse fora do horário a esperar até o dia seguinte (LIMA et al., 2007). Assim, de forma não intencional, foi construída, na sociedade, a imagem de que a APS é apenas para pessoas saudáveis; devendo os doentes se dirigir ao pronto-atendimento ou hospital mais próximo.

Em Campinas/SP, um estudo acompanhou as consultas de acolhimento de 5 centros de saúde da cidade. Em 4 deles, a proposta do acolhimento de ampliar a resolubilidade dos profissionais não médicos não ocorreu na prática, funcionando apenas como uma espécie de triagem sem muita autonomia. Havia a escuta da queixa e a avaliação da necessidade de consulta médica imediata, mas não uma mudança na lógica hegemônica: a dispensa do usuário permaneceu a critério da avaliação médica. Construiu-se, assim, uma atividade de apoio ao trabalho médico, organizando a demanda espontânea e agilizando os atendimentos, mas ainda centralizada nos saberes e nas práticas do médico, sobrecarregando todos os profissionais, inclusive os médicos (TAKEMOTO & SILVA, 2007).

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Medeiros et al. (2010) apontam que o Governo Federal tem feito esforços para incentivar acolhimentos como os de Campinas e Betim, que durem enquanto a unidade estiver aberta, mas não tem sido suficiente (MEDEIROS et al., 2010). Usuários reclamam que a quantidade de profissionais de saúde nas UBS ainda é insuficiente.

Cerca de 70% dos profissionais que atuam na ESF não contam com especialização em APS (GIL, 2005). Até 1999, apenas 36,7% dos médicos trabalhando na ESF havia concluído algum programa de residência médica. (CAMPOS & MALIK, 2008). Há destaque para dois grupos preponderantes dentro dessa situação: recém-formados, que veem a ESF como emprego provisório até passarem na prova para a residência, e profissionais com longa trajetória profissional, aposentados ou prestes a se aposentar (COSTA et al.,

2009).

Esta situação remete a outro problema grave para a prática de um atendimento à demanda espontânea satisfatório: a rotatividade do médico generalista. Em São Paulo, 37,4% dos médicos não permanecem em suas vagas de emprego por mais de 1 ano, um índice considerado ruim. Em um modelo que se fundamenta na longitudinalidade, no vínculo entre profissionais e população, esta rotatividade compromete a sua eficácia (CAMPOS & MALIK, 2008).

1.8 As Unidades de Atendimento à Demanda Espontânea

(33)

A implantação das AMA foi organizada utilizando-se o Índice de Necessidades de Saúde (INS), considerando vinte indicadores epidemiológicos agrupados em cinco grupos (crianças e adolescentes, gestantes, adultos, idosos e doenças crônicas). Na gestão Kassab, que se seguiu à gestão Serra, a cidade assistiu a uma forte expansão das AMA, e ao crescimento das consultas de urgência e emergência em todas as regiões. Entre 2005 e 2010, 131 AMA foram inauguradas (COELHO et al., 2014).

A Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU) de 2006 coloca como sendo funções dessas unidades em nível nacional:

 Descentralizar o atendimento de pacientes com quadros agudos de média complexidade;

 Dar retaguarda às unidades básicas de saúde e de saúde da família;

 Diminuir a sobrecarga dos hospitais de maior complexidade que hoje atendem esta demanda;

 Ser um local de estabilização do paciente crítico para o serviço de atendimento pré-hospitalar móvel;

 Desenvolver ações de saúde com o objetivo de acolher, intervir em sua condição clínica e referenciar para a rede básica de saúde, para a rede especializada ou para a rede hospitalar, proporcionando uma continuidade do tratamento com impacto positivo no quadro de saúde individual e coletivo da população usuária;

 Articular-se com unidades hospitalares, unidades de apoio diagnóstico e terapêutico, e com outras instituições e serviços de saúde do sistema locorregional, construindo fluxos coerentes e efetivos de referência e contrarreferência;

(34)

 Atender aos usuários do SUS portadores de quadro clínico agudo de qualquer natureza, dentro dos limites estruturais da unidade e, em especial, os casos de baixa complexidade, à noite e nos finais de semana, quando a rede básica não estiver ativa (BRASIL, 2006).

Entretanto, os casos de baixa densidade tecnológica são a grande maioria dos atendimentos, mesmo quando as UBS estão abertas. Estudo elaborado por Oliveira e Scochi (2002) abordando uma UPA em Maringá mostrou que 53% das queixas não eram próprias a um serviço de urgência. Consistiam, em sua maioria, de crianças até 12 anos com queixas respiratórias leves (OLIVEIRA & SCOCHI, 2002). Rocha (2005), em Belo Horizonte, corroborou com este achado ao afirmar que as UPAs vêm atuando como importante porta de entrada do sistema para consultas simples e de cuidados básicos, apesar do fluxo hierarquizado contrário ao proposto na estruturação do modelo de atenção (ROCHA, 2005).

Conceitualmente, atender demanda espontânea de baixa densidade tecnológica não é a função da UPA em nível federal. No documento norteador sobre acolhimento do MS, encontra-se o texto: “o atendimento a demanda

espontânea deve ser realizado pelas UBS, principalmente os casos de

pacientes crônicos em agudização e urgências de menor gravidade” (BRASIL,

2011c).

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A Secretaria da Saúde do Município de São Paulo (SMS-SP) tem assumido postura mais coerente ao considerar as AMA, como sendo, de fato, parte da APS (SÃO PAULO, 2009). Isso fica claro no documento norteador que orienta o funcionamento dessas unidades. A SMS-SP entende que a existência

das AMA garante que a UBS possa enfocar “o risco e a continuidade das atividades de promoção, prevenção e assistência à saúde” (SÃO PAULO,

2009).

A proposta oficial para essas unidades é que devam funcionar de segunda-feira a sábado, das 7 às 19 horas, com equipe médica composta por dois médicos clínicos, dois médicos pediatras e um médico cirurgião ou ginecologista. Para Puccini (2008), entretanto, a AMA não tem respondido satisfatoriamente (PUCCINI, 2008).

Puccini verificou que, de 30 AMA avaliadas, 23 foram instaladas de forma acoplada a uma unidade básica de saúde e, raramente, houve expansão de área física; em geral, não estavam adequadas para o primeiro atendimento de urgência ou emergência; os registros dos atendimentos eram feitos em folhas avulsas de atendimento e, em 9 AMA, foi encontrada marcação frequente de retorno, sem apropriada abertura de prontuário para o seguimento da pessoa em tratamento. Segundo ele, a instalação das unidades resultou, em 2006, em aumento de consultas médicas de urgência e redução de consultas médicas da rede básica e de pronto-socorro especializado, dando a entender que os usuários diminuíram o uso da atenção secundária, mas também diminuíram a frequência à UBS, havendo competição entre os dois serviços (PUCCINI, 2008).

(36)

1.9 Comparação com os Walk-in Centres

Serviços ambulatoriais para o atendimento de demanda espontânea de baixa complexidade não são realidade apenas no Brasil. Os primeiros Walk-in centres, como são chamados nos países de Língua Inglesa, surgiram nos Estados Unidos em 1973 para preencher a lacuna que havia entre os médicos de família e os serviços de emergência sobrecarregados (MILLER & NANTES, 1989). O principal objetivo desses centros, em sua definição, é acolher pacientes sem agendamentos ou referência, funcionando em horários estendidos num espaço físico separado de hospitais. Hoje, são comuns em diversos sistemas de saúde, principalmente nos Estados Unidos, Reino Unido, Canadá e Austrália (JONES, 2000).

No Reino Unido, os Walk-in Centres foram implantados em 1999 em locais de grande circulação, como aeroportos e supermercados. Surgiram, a partir da nova reforma do sistema de saúde britânico, o National Health System

(NHS), ocorrida em 1997, com o objetivo de completar o trabalho dos general pratictioners, reafirmando o caráter universal do sistema britânico enquanto direito básico de toda a população (COLISTETE et al., 1997). Assim como no modelo americano, as unidades britânicas também não exigem o agendamento, mas o trabalho é realizado por enfermeiros clínicos e é direcionado para aconselhamento em saúde e atendimentos para queixas de menor densidade tecnológica, como gripes, resfriados, vômitos e diarreia, pequenos ferimentos, urgências hipertensivas e contracepção de emergência, entre outras (TANAKA & OLIVEIRA, 2007). O resultado dessa inovação, associado a outras medidas tomadas na reforma de 1997, foi avaliado por pesquisa de resolutividade realizada em 2004 pelo Departamento de Saúde do NHS que demonstrou que 98% dos pacientes conseguiam atendimento de urgência e emergência dentro de, no máximo, 4 horas (UNITED KINGDOM, 2007).

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tradicional de APS (como homens brancos solteiros), e oferece um serviço primário considerado como acessível, satisfatório e conveniente (GRANT, SALISBURY et al., 2002; SALISBURY & MUNRO, 2003). Aliás, é a conveniência de horários e localização, e a anonimidade que o serviço oferece, que são interpretados pelos usuários como os principais atrativo (MUNRO et al., 2001).

No Canadá, há dois tipos de serviços ambulatoriais para o atendimento de demanda espontânea de baixa complexidade: os também chamados Walk-ins centres, lá dirigidos por médicos, com horas de atendimento estendidas,

mas pouca conexão com os médicos de família locais; e os serviços “after hours”, que acontecem conectados às equipes de saúde da família (Health Family Teams), como plantões após o expediente formal (RACHLIS, 1993).

As clínicas estilo Walk-in canadenses oferecem uma gama maior de serviços, como farmácia, serviço social, fisioterapia e até serviços comerciais, como bronzeamento artificial (MILNE, 1987; MILLER et al., 1989; BORKENHAGEN, 1996). Cerca de 27,3% da população de Alberta havia usado esse serviço em um período de 6 meses, a maioria referindo a localização e os horários convenientes como os principais motivos de procura (BELL & SZAFRAN, 1992).

(38)

Apesar dessa satisfação alta, poucos usuários canadenses preferem as

Walk-ins por considerá-las com melhor atendimento do que o oferecido pelo seu médico de família oficial. Novamente, a localização conveniente e a facilidade para passar em consulta em horários não convencionais são os principais argumentos referidos em Toronto a favor desses serviços (RIZOS et al., 1990).

Exatamente por conta dessa competição, os médicos de família canadenses consideram as walk-ins: “serviços de alto volume, mas baixa intensidade”; “medicina estilo McDonald’s”; em que estão “treinando os

pacientes para usar os serviços de forma inapropriada, inadvertidamente ensinando as pessoas a procurar o serviço por qualquer nível menor de

estresse” (JONES, 2000).

Apesar de tanta controvérsia envolvendo a implementação e expansão desses serviços no país, Borkenhagen (1996) cita o Canadian College of Family Physicians, órgão que representa os médicos de família canadenses, que reconhece que as clínicas Walk-ins “chegaram para ficar”

(BORKENHAGEN, 1996). Isto, inevitavelmente, desafia todo os médicos de família a tornar os seus serviços de atenção primária mais adaptados e acessíveis para as demandas espontâneas (MILNE P, 1987). Inspiradas nas

“Walk-ins”, as AMA paulistanas ainda precisam ser avaliadas no contexto

brasileiro. No caso da AMA, há, deliberadamente, maior sobreposição de ações com a UBS.

1.10 Avaliações

Conforme o Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, a palavra avaliação significa atribuir valor a algo (FERREIRA, 2009). No sentido geral, não exige compromisso com fundamento nenhum de juízo ou método específico, ou seja, é subjetiva. Entretanto, conforme Aguillar e Ander-Egg (1994), para avaliar serviços ou programas, é necessário apoiar-se no uso de

(39)

pertinente e julgar o mérito e o valor de algo de maneira justificável”, o que chamamos de avaliação sistemática (AGUILLAR & ANDER-EGG, 1994).

Sem os instrumentos adequados, é difícil dizer o quanto uma nova política de saúde está atendendo as expectativas dos gestores ou da própria população. O desenvolvimento de avaliações com bom rigor metodológico e marcos teóricos apropriados tornam possível estabelecer sua eficiência. Facchini et al. (2008), porém, alertam que “a literatura especializada está

repleta de exemplos de programas bem-intencionados, existentes em alguns casos por décadas, até avaliações rigorosas revelarem que seus resultados

não eram os esperados” (FACCHINI et al., 2008).

Porém, há dúvidas sobre quais seriam esses marcos teóricos apropriados. Foi tendência histórica no país a valorização de dados quantitativos para a construção de julgamentos sobre a eficácia de programas e serviços de saúde, segundo o rigor positivista. (LOBO, 1998). Determinada atividade era considerada eficaz se fosse possível estabelecer uma relação de causalidade entre ela e o resultado esperado. Isso aconteceu, por exemplo, com a ESF nos artigos de Macinko et al. (2007b), Aquino et al. (2009) e Rasella

et al. (2010), já mencionados anteriormente, que demonstraram melhora da mortalidade infantil nos locais em que havia sido implementado o programa. (MACINKO et al., 2007a; AQUINO et al., 2009; RASELLA et al., 2010). Há, todavia, dúvidas se os resultados positivos atrelados à ESF nestas pesquisas seriam consequência também da melhora de vários fatores no Brasil durante o mesmo período como renda, saneamento básico e educação. Faltavam, nesse contexto, avaliações que mensurassem o desempenho da ESF seguindo outra lógica (ALMEIDA & MACINKO, 2006).

A partir da década de 90, vários autores começaram a realizar experiências de avaliação que não se prendiam a avaliações quantitativas de indicadores, mas incorporavam a subjetividade ao processo avaliativo da qualidade dos serviços de saúde (UCHIMURA & BOSI, 2002). Para a saúde pública, isto foi extremamente relevante.

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Para Silver (1992), pesquisar qualidade utilizando apenas seus componentes

objetivos é “rejeitar uma parte da realidade” (SILVER, 1992). Donabedian

(1966) propôs um método baseado em análise de estrutura, processos e resultados, apresentando grande aceitabilidade e sendo amplamente difundido por todo o mundo. É, talvez, o método de avaliação mais conhecido e utilizado (DONABEDIAN, 1966). É de sua autoria o seguinte trecho, conforme Oliveira

(1992): “A satisfação do paciente é de fundamental importância como uma

medida de qualidade da atenção, por que proporciona informação sobre o êxito do provedor em alcançar os valores e expectativas do paciente (...). A medição da satisfação é, portanto, um instrumento valioso para a investigação,

administração e planejamento” (OLIVEIRA, 1992). O NHS recomenda claramente a análise das percepções e das expectativas de pacientes e da comunidade na avaliação de serviços públicos de saúde desde 1983 (WILLIAMS, 1984).

Não é sem críticas, porém, que esse modelo vem sem sendo aplicado. Williams (1984) considera que as percepções e expectativas dos usuários não poderiam ser reduzidas a meras expressões de satisfação. Os usuários estariam utilizando termos estranhos ao seu vocabulário quando respondiam os questionários, criando inferências falseadas acerca de suas opiniões sobre os serviços (WILLIAMS, 1984).

A satisfação do usuário é um indicador muito valorizado pelos gestores para orientar os investimentos públicos, mas, isolada, é extremamente subjetiva, passível de interferência de emoções, crenças e preconceitos, e ainda não é completamente compreendida pela ciência (FENTON et al., 2012). O usuário não possui conhecimento técnico-cientifico suficiente para avaliar todas as nuances de seu cuidado. É preciso aliar a satisfação do usuário com variáveis que avaliem estrutura e processos do serviço, e que, indiretamente, estejam relacionadas à satisfação do usuário.

(41)

entre os profissionais e seus clientes (DONABEDIAN, 1985). Almeida e Giovanella (2008) consideram processos as atividades realizadas por provedores no sentido de: reconhecer as necessidades dos usuários, estabelecer diagnósticos, instituir tratamentos e protocolos, e fazer reavaliações. Incluem, ainda, a forma como os usuários interagem com o serviço: sua decisão em usá-lo, sua compreensão do que lhes é oferecido, sua participação no que lhes é proposto e sua satisfação final (ALMEIDA & GIOVANELLA, 2008). Entender estes processos e saber em que nível estão os recursos necessários para desenvolvê-los é essencial para estabelecer o planejamento estratégico de um serviço, orientar a tomada de decisões, descrever e caracterizar a realidade, testar hipóteses, construir recomendações e estabelecer normas.

1.11 O Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica

O conceito de avaliação de programas públicos de saúde surgiu com o estado de bem-estar social, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, para guiar a aplicação dos recursos do Estado (UCHIMURA E BOSI, 2002). No Brasil, começou a se desenvolver a partir da década de 80 e até o início do século XXI era muito incipiente (RUS-PEREZ, COTTA, 1998).

(42)

esta data, a maior parte das avaliações realizadas no país focava nos processos de implementação da ESF por meio de indicadores fortemente influenciados por outros fatores como renda, saneamento e educação, sendo muito raros os estudos que se propusessem a avaliar o desempenho da atenção básica de forma global (ALMEIDA & MACINKO, 2006).

Em 2005, uma proposta de avaliação formativa específica para a ESF foi apresentada pelo MS: a Avaliação para Melhoria da Qualidade da Estratégia Saúde da Família – AMQ, definida não como uma atividade-final, mas uma atividade-meio, com o intuito de estimular e orientar colaboradores a alcançar padrões melhores de qualidade para o serviço (SILVA & CALDEIRA, 2010). Composto por duas grandes unidades de análise, sendo um componente focado na gestão e outro nas equipes da ESF; subdivididas em grandes eixos de análise totalizando 5 dimensões, abordadas por 5 instrumentos diferentes; e desdobradas em subeixos com 23 subdimensões, foi desenvolvida para ser aplicada aos secretários de saúde municipais (subdimensão “Desenvolvimento da ESF”); aos gestores municipais (subdimensão “Coordenação Técnica das Equipes”); aos gerentes de unidades (subdimensão “Unidade de Saúde da Família); aos profissionais de nível superior (subdimensão “Atenção à Saúde”);

e a todos os integrantes da Equipe de Saúde da Família (subdimensão

“Consolidação do Modelo de atenção”). A proposta do Ministério da Saúde

(2005B) era que se fizesse uma “autoavaliação orientada por instrumentos” “voluntária e participativa”, “protagonizada por aqueles que desenvolvem as

ações na estratégia” e “ser utilizada como referência para a organização da

ESF nos municípios devido ao seu forte aspecto orientador, pedagógico e

indutor de boas práticas em saúde”. (BRASIL, 2005b). Por isso mesmo, não

estava relacionada a nenhum tipo de premiação ou à sanção financeira relacionados aos resultados.

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objetivo (SILVA & CALDEIRA, 2010). Mais do que realizar um inquérito avaliativo, o AMQ buscava cultivar a busca da excelência, apresentando padrões de referência de qualidade a serem atingidos.

No início, 25 municípios participaram como pilotos para avaliação do método e sua posterior validação. Foram escolhidos municípios com tamanhos e tempos de implantação da ESF diferentes. Estudo realizado em Petrópolis, uma das cidades-piloto, por Moura (2010), mostrou que a adesão voluntária das equipes no município prejudicou bastante a continuidade da coleta de dados, sendo possível observar melhora nos indicadores apenas naquelas que aderiram aos dois momentos de coleta. O problema da adesão voluntária ficou mais evidente quando a proposta da AMQ foi lançada: 20% dos municípios brasileiros aderiram à metodologia, mas só 4,4% (227 municípios) entregaram os questionários do primeiro momento respondidos, sendo que apenas 1,5% (80 municípios) devolveu as respostas do segundo momento (MOURA, 2010).

O AMQ auxiliou no processo de estabelecer os pontos fortes e fracos de cada equipe, mas não serviu para os gestores estabelecerem os pontos deficitários como suas prioridades de investimento. Além disso, como o instrumento é autoavaliativo, não foi possível estabelecer com clareza a honestidade de cada profissional participante, mesmo não havendo premiações ou sanções oficiais para assegurar mais credibilidade às respostas dos questionários. Figueiredo (2013)aponta os altos escores encontrados no AMQ justamente como resultado deste aspecto autoavaliativo associado a respostas dicotômicas (sim ou não) (FIGUEIREDO, 2013). Uma vez que a avaliação negativa traria a percepção de ineficiência da equipe para implementar mudanças em seu território, o sujeito da avaliação tenderia a superestimar as respostas. Estudos indicam que profissionais de saúde, em autoavaliações, tendem a realizar uma avaliação mais positiva de suas ações, quando comparadas à opinião dos usuários (ELIAS et al., 2006; VAN STRALEN et al.,

2008).

Em 2011, o Governo Federal lançou o Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) com o intuito de ampliar e melhorar a proposta anterior (BRASIL, 2011d). Organizado em quatro fases,

(44)

“Desenvolvimento”, realizadas de forma muito semelhante ao que ocorreu

durante a AMQ: primeira etapa voluntária aberta a todos os municípios do país (50% das equipes mais uma de cada município) com a contratualização da equipe da atenção básica e do gestor municipal nas diretrizes e nos compromissos mínimos exigidos pelo PMAQ-AB seguida de realização de questionários de autoavaliação (BRASIL, 2012a).

Quarenta e sete indicadores de produção ambulatorial e cadastramento foram utilizados, relacionados a sete áreas estratégicas: Saúde da Mulher, Saúde da Criança, Controle de Diabetes Mellitus e Hipertensão Arterial Sistêmica, Saúde Bucal, Produção geral, Tuberculose e Hanseníase, e Saúde Mental (SAVASSI, 2012). Suas inovações em relação ao modelo anterior foram:

 O estímulo financeiro por meio de repasse de recursos imediato e automático durante seis meses aos municípios participantes, o que estimulou 71% dos municípios brasileiros a aderirem (SEIDL et al.,

2014);

 A inclusão de qualquer equipe de atenção básica, independente do modelo adotado (SAVASSI, 2012);

 A terceira fase “Avaliação Externa”, que incluiu um módulo de

avaliação de estrutura da unidade de saúde, um módulo de entrevista com um profissional de nível superior por equipe de atenção básica sobre o processo de trabalho da equipe, e um módulo de entrevista com usuários da unidade de saúde sobre satisfação, condições de acesso e utilização de serviços de saúde (BRASIL, 2012b);

 O estabelecimento de indicadores de desempenho de maneira a permitir a construção de parâmetros de comparação entre as equipes de atenção básica.

A quarta fase “Recontratualização” pressupõe novas pactuações futuras

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Segundo o Departamento de Atenção Básica do MS (DAB), 17.482 equipes em 3.972 municípios se inscreveram no PMAQ-AB, sendo que apenas 327 não cumpriram os compromissos mínimos assumidos e foram desclassificadas. Boa parte das informações coletadas ainda não está disponível (BRASIL, 2015a).

Estudo realizado por Fausto et al. (2014) utilizando o banco de dados de base nacional da avaliação externa do PMAQ-AB (seus três módulos, incluindo o terceiro de entrevistas a usuários na UBS) avaliou 16.566 equipes de Saúde da Família (96,6% das equipes de atenção básica participantes da avaliação –

aproximadamente, 50% do total de equipes existentes no país em 2012), variáveis de estrutura de 13.438 UBS nas quais atuam essas equipes e variáveis de 62.505 questionários de usuários vinculados a elas (FAUSTO et al., 2014).

Savassi (2012) questiona os indicadores de saúde adotados pelo PMAQ-AB. O coeficiente de exames colpocitológicos realizados em mulheres de 15 anos ou mais, por exemplo, está desatualizado e induziria coletas desnecessárias (SAVASSI, 2012). O Instituto Nacional do Câncer (INCA) recomenda o rastreamento apenas em mulheres entre os 25 e os 64 anos de idade (INCA, 2011). Alia-se a tudo isso as críticas já mencionadas aqui por Figueiredo (2013) relativas ao AMQ, que podem ser estendidas ao PMAQ-AB por consistir em parte de instrumentos de autoavaliação (FIGUEIREDO, 2013).

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1.12 O Primary Care Assessment Tool (PCATool)

O PCATool criado por Starfield et al. (2001) é uma ferramenta aplicável por meio de entrevistadores considerada por Haggerty et al. (2011) como um instrumento de boa performance (STARFIELD et al., 2001; HAGGERTY et al.,

2011). É baseado no modelo de avaliação da qualidade de serviços de saúde e foca na mensuração de aspectos de estrutura e processos, os atributos essenciais e derivados da APS: acesso de primeiro contato, longitudinalidade, integralidade, coordenação, orientação familiar e comunitária. Seu uso é difundido por todo o mundo, incluindo EUA, Canadá e Espanha, permitindo a comparação da performance entre equipes de APS em nível internacional (HARZHEIM et al., 2000).

Embora pesquisas voltadas para a avaliação organizacional ou de desempenho da APS sejam ainda escassas no Brasil, segundo Fracolli et al. (2014), o PCATool é o instrumento mais utilizado no país (FRACOLLI et al.,

2014). Novaes (2000) acrescenta ser o mais reconhecido pela comunidade científica (NOVAES, 2000).No Brasil, a primeira experiência aconteceu com o questionário ainda não validado por Ibañez et al. (2006) em municípios do interior de São Paulo, e por Macinko et al. (2007b) em Petrópolis (IBAÑEZ et al., 2006; MACINKO et al., 2007).

Traduzido, adaptado e validado para a realidade brasileira por Harzheim

et al. (2000), o questionário “Versão Adulto” brasileiro (PCATool Brasil) resultou

em 87 perguntas distribuídas entre 10 atributos:

 Afiliação: o quanto o usuário sente ser conhecido pelo serviço e o serviço ser responsável por ele.

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 Acesso de primeiro contato - acessibilidade: envolve a localização do serviço, os horários e dias em que está aberto, a tolerância a consultas não agendadas e o quanto a população percebe a conveniência destes aspectos.

 Longitudinalidade: pressupõe a existência de uma fonte contínua de atenção e seu uso regular ao longo do tempo.

 Coordenação - integração dos cuidados: a articulação entre diversos serviços e ações, de forma que, independentemente do local em que sejam prestados, esses serviços estejam sincronizados e voltados ao alcance de um objetivo em comum. Implica que a equipe que atende ao usuário ofereça continuidade em seu acompanhamento, incluindo

a comunicação entre os níveis de atenção, a

referência/contrarreferência (NUÑEZ, 2006).

 Coordenação - sistema de informações: envolve, também, a continuidade, mais focada no registro das informações no nível primário (prontuário médico).

 Integralidade - serviços disponíveis: implica na disposição de oferecer ao usuário alguns serviços considerados básicos no próprio estabelecimento, sem que haja a necessidade de encaminhamento. Está relacionado à resolutividade dos serviços.

 Integralidade - serviços prestados: aconselhamentos abrangentes que o serviço deve oferecer sem que a demanda parta do usuário. Foca mais a capacidade de prevenção e promoção de saúde do serviço.

 Orientação familiar: refere-se ao reconhecimento de fatores familiares relacionados à gênese e ao tratamento da doença.

 Orientação comunitária: o conhecimento dos prestadores das necessidades dos usuários e seu envolvimento na comunidade.

Esta divisão no questionário brasileiro é relativamente diferente do original em Inglês, que consiste em 92 perguntas distribuídas entre 7 atributos. Starfield

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Figura 1  –  Localização das Unidades na Cidade de São Paulo
Tabela  2  -  Características  gerais  da  amostra  estudada  de  acordo  com  a  afiliação aos serviços de saúde
Tabela 4  –  Características gerais da amostra estudada de acordo com equipe  a que pertence
Tabela  5  -  Comparação  entre  a  Equipe  Amarela  e  o  conjunto  das  outras  equipes em relação às variáveis que apresentaram diferença estatisticamente  significante
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Referências

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