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Um estudo da inadimplência dos geradores no setor elétrico brasileiro à luz da teoria da regulação

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Academic year: 2017

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(1)

FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS (FGV-RJ)

ESCOLA BRASILEIRA DE ECONOMIA E FINANÇAS (EPGE)

MESTRADO PROFISSIONAL EM

ECONOMIA EMPRESARIAL E FINANÇAS (MEEF)

UM ESTUDO DA INADIMPLÊNCIA DOS GERADORES NO

SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO À LUZ DA TEORIA DA

REGULAÇÃO

Professora Orientadora

Dra. Lavinia da Rocha Hollanda

Elisa Castilhos Silva

(2)

ELISA CASTILHOS SILVA

135204014

UM ESTUDO DA INADIMPLÊNCIA DOS GERADORES NO SETOR

ELÉTRICO BRASILEIRO À LUZ DA TEORIA DA REGULAÇÃO

Dissertação

apresentada

ao

Mestrado

Profissional em Economia Empresarial e

Finanças da Fundação Getúlio Vargas como

pré-requisito para obtenção do título de

Mestre em Economia Empresarial e Finanças.

Orientadora: Dra. Lavinia da Rocha Hollanda

Rio de Janeiro/RJ

(3)

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(4)
(5)

Ao meu filho, Murilo, que está a caminho, acompanhou grande parte da elaboração desse trabalho e se comportou muito bem durante essa fase.

Ao meu marido, que admiro e amo muito, meu eterno companheiro, pela paciência, pela compreensão, pelo incentivo e pelo amparo ao longo de mais essa caminhada.

Ao meu pai, eternamente presente na minha vida, que certamente, de onde estiver, está vibrando com mais essa etapa vencida.

À minha mãe, que me inspira em todos os momentos com sua garra, força e determinação, torce permanente e incondicionalmente pelas minhas conquistas e que, junto com meu pai, com muito amor, jamais mediu esforços para me proporcionar o melhor sempre.

Aos meus irmãos e a toda a minha família, pelo carinho, pela torcida e pela força de sempre. À minha professora orientadora Lavinia Hollanda, pela orientação, pelas excelentes ideias, pelo apoio e disponibilidade incansáveis que tornaram possível a elaboração dessa dissertação. Aos professores da banca, José Gustavo Féres e Pedro Hemsley, por terem aceitado participar desse trabalho e se dedicado na sua avaliação.

Ao doutorando da EPGE/FGV-RJ, Rodrigo Andrade Bomfim, pela colaboração e apoio no que originou os pilares desse trabalho.

Aos meus líderes da Petrobras, Angélica Garcia Cobas Laureano, Carlos Augusto Arentz Pereira, Tatiana de Moraes Leandro e Rodrigo de Miranda, pela aprovação da minha participação no curso e pelo constante incentivo em tornar esse projeto acadêmico possível, investimento que espero retribuir à empresa dada a capacidade analítica e metodológica adquirida ao longo desse curso.

À minha amiga e colega da Petrobras, Flavia de Souza Ramos Barbosa, pela motivação, carinho e dedicação e paciência na revisão desse texto.

A todos os professores e monitores do curso, que tiveram importante contribuição no meu crescimento acadêmico e na disponibilização de ferramentas e metodologia que possibilitaram o desenvolvimento desse trabalho, pelo convívio e pelo notório conhecimento compartilhado. Aos funcionários da EPGE/FGV-RJ, Gisele Carvalho de Souza Gammaro e Vitor Barros Souza, pela elogiável organização e pela ajuda permanente.

À coordenação do MFEE, pela excelente qualidade do curso oferecido e pela preocupação em aperfeiçoá-lo constantemente.

(6)

Essa dissertação objetiva analisar, à luz da Teoria da Regulação, os principais problemas enfrentados pelo Setor Elétrico Brasileiro (SEB) quando ocorrem atrasos ou não entrega de novos empreendimentos de geração. Para tal estudo, serão apresentados os conceitos-chave do SEB, sua estrutura institucional e o funcionamento da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), além de detalhadas as regras vigentes para lidar com a inadimplência de agentes. Em seguida, serão apresentados dois casos recentes e importantes do setor elétrico: Bertin e Santo Antônio. Finalmente, os casos apresentados e seus impactos no setor serão analisados a partir da literatura de regulação econômica.

Palavras-chave: Regulação, Inadimplência, Setor Elétrico Brasileiro.

ABSTRACT

This dissertation analyzes, in the light of the Regulation Theory, the main problems in the

Brazilian Electric Sector (SEB) related to the delays or non-delivery of new generation ventures.

For this study, the key concepts of the SEB will be presented as well as its institutional structure

and the functioning of the Electric Energy Trading Chamber (CCEE), in addition to detailing the

existing rules to deal with the default of agents. Then, two recent and important cases of the

electric sector will be presented: Bertin and Santo Antônio. Finally, the presented cases and

their impact on the sector will be analyzed, within the framework of the literature of economic

regulation.

(7)

LISTA DE SIGLAS ... 6

1. Introdução ... 7

2. Contexto e Motivação ... 9

2.1. Estrutura Geral do Setor Elétrico Brasileiro ... 9

2.1.1. Os Leilões de Energia Nova ... 12

2.2. A CCEE e os ambientes de comercialização no setor elétrico ... 14

2.2.1. Mecanismos vigentes de inadimplência e desligamento na CCEE ... 15

3. Os casos de estudo ... 20

3.1. Bertin ... 20

3.2. Santo Antônio ... 23

4. Análise dos casos ... 26

4.1. O modelo de Principal-Agente e os conceitos analisados ... 26

4.2. Análise dos casos Bertin e Santo Antônio ... 28

5. Conclusão ... 36

(8)

LISTA DE SIGLAS

ACL – Ambiente de Contratação Livre

ACR – Ambiente de Contratação Regulado

ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica

CCEAL – Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Livre

CCEAR – Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado

CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica

CMO – Custo Marginal de Operação

CMSE – Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico

CNPE – Conselho Nacional de Política Energética

CVU – Custo Variável Unitário

EPE – Empresa de Pesquisa Energética

FDIC – Federal Deposit Insurance Corporation

FIRJAN – Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro

MCP – Mercado de Curto Prazo

MME – Ministério de Minas e Energia

ONS – Operador Nacional do Sistema Elétrico

PLD – Preço de Liquidação das Diferenças

SEB – Setor Elétrico Brasileiro

SCL – Sistema de Contabilização e Liquidação da CCEE

SFG – Superintendência de Fiscalização dos Serviços de Geração da ANEEL

SIN – Sistema Integrado Nacional

TBTF – Too Big to Fail

UHE – Usina Hidrelétrica

(9)

1. Introdução

O presente trabalho objetiva analisar os principais problemas enfrentados pelo Setor Elétrico Brasileiro (SEB) quando ocorrem atrasos ou não entrega de empreendimentos de geração. Essa abordagem se dará à luz da Teoria da Regulação Econômica, onde os conceitos de seleção adversa, enforcement e moral hazard serão utilizados. Além disso, aspectos da regulação bancária e da teoria do Too Big to Fail servirão de base para a reflexão sobre as possíveis causas

e impactos do problema analisado, a partir da discussão sobre como tais questões são tratadas nessa literatura.

Como forma de contextualizar e motivar esse estudo, serão apresentados os conceitos-chave do SEB, sua estrutura institucional, o funcionamento da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), além de detalhadas as regras vigentes para lidar com a inadimplência de agentes. Em seguida, serão apresentados dois casos recentes e importantes do setor elétrico: Bertin e Santo Antônio. Finalmente, os casos apresentados e seus impactos no setor serão analisados a partir da literatura de regulação econômica.

A metodologia utilizada no desenvolvimento dessa dissertação foi qualitativa e de caráter exploratório. Buscou-se estudar a inadimplência dos geradores no setor elétrico brasileiro por meio de estudo de casos e de extensa revisão bibliográfica de conteúdo obtido em livros, artigos, reportagens e documentos institucionais. O interesse na utilização dessa metodologia foi captar as percepções e entendimento sobre o tema, focando nas causas e impactos financeiros dos atrasos e não entrega de energia pelos geradores, e tendo por base o arcabouço teórico de regulação econômica.

A ideia que se pretende apresentar nessa dissertação é a de que os mecanismos vigentes para lidar com a inadimplência no SEB não têm sido suficientes para prevenir e tratar empreendimentos de grande porte ou falhas por parte de agentes que possuem alta concentração de capacidade sob sua responsabilidade. Por essa razão, a análise dos casos práticos em paralelo com a teoria de regulação existente representa o início de uma abordagem mais profunda do problema, com o objetivo de buscar recomendações de possíveis políticas a serem implementadas no futuro.

De modo geral, as características de oferta e demanda definem a estrutura de um mercado. No entanto, mercados de energia elétrica são incompletos e de competição imperfeita, em função de algumas das características da oferta e da demanda1. Em particular, o fluxo da eletricidade produzida não pode ser monitorado e seu armazenamento é custoso. Além disso, a demanda é variável e deve ser atendida em tempo real. Consequentemente, para garantir que haja energia de reserva e capacidade suficientes para atender à demanda a qualquer tempo, o mercado de eletricidade requer o uso de mecanismos regulatórios para assegurar confiabilidade

(10)

do sistema e garantir investimento em geração2. Dessa forma, o mecanismo regulatório deve ser capaz de estimular a expansão da capacidade de geração do sistema. Será que a regulação implementada no Brasil tem atendido a esse propósito?

Para começar a responder a essa pergunta, explora-se a literatura básica de regulação econômica3 e de finanças, com ênfase nos campos de regulação bancária4 e Too Big to

Fail (TBTF)5 como forma de embasar a análise desenvolvida sobre os casos de Bertin e Santo

Antônio, foco desse trabalho. A literatura do Too Big to Fail se fortaleceu principalmente após a

crise financeira de 2008, uma vez que uma eventual falência de grandes bancos representava um possível risco sistêmico e implicaria em um efeito dominó em outros bancos, com prováveis efeitos nocivos sobre a economia do país e mundial. Em muitos casos, os governos acabaram intervindo e salvando essas instituições financeiras para não incorrerem em custos ainda maiores para a economia. No entanto, alguns artigos6 sobre o tema apontam que esse tipo de política acaba transmitindo sinais errados aos agentes, levando a moral hazard7 por parte dos bancos e

desincentivando os investidores a fiscalizarem essas instituições.

Dessa forma, TBTF é uma questão de regulação econômica vastamente estudada no setor bancário em função do risco sistêmico que grandes bancos representam para a economia. O paralelo para grandes empreendimentos de geração está no potencial impacto que o atraso de novos empreendimentos de geração desse tipo pode causar no setor elétrico como um todo. Por essa razão, parte da análise dos casos Bertin e, principalmente, Santo Antônio utiliza como base a literatura recente de TBTF. Assim, o que se pretende com essa bibliografia é avaliar como os bancos centrais e outros órgãos reguladores procuram desenvolver mecanismos que diminuam a probabilidade de crises, traçando paralelo com os casos estudados do setor elétrico. Logo, serão analisados quais desses mecanismos podem ser aplicados ao SEB e quais podem inspirar a regulação desse setor a aprimorar sua atuação de maneira a evitar que problemas como estes sejam recorrentes e a mitigar seus efeitos caso ocorram.

Além do problema de moral hazard, discute-se ainda a possibilidade de seleção

adversa nos leilões de novos projetos de geração e de possíveis problemas de monitoramento e

enforcement a partir da literatura de regulação econômica.

Essa dissertação está estruturada da seguinte maneira: na seção 2, são apresentados o contexto e motivação desse trabalho, na seção 3, os casos estudados, Bertin e Santo Antônio, são descritos, a seção 4 analisa os casos em estudo à luz da teoria da regulação e a seção 5 conclui.

2 Para uma explicação completa sobre os aspectos econômicos do mercado de eletricidade, ver Wilson,

2002, e Stoft, 2002.

3 Ver Laffont e Tirole, 1993 e Laffont, 2005. 4 Ver Freixas e Rochet, 2008.

5 Ver Moosa, 2010 e Mishkin, 2005.

6 Ver Stern e Feldman, 2004 e Guasch et al, 2008. 7

Moral hazard ou “risco moral” é um conceito lançado por Kenneth Arrow que busca definir o excesso de

(11)

2. Contexto e Motivação

Para contextualizar esse estudo, faz-se necessário abordar brevemente alguns conceitos-chave do setor elétrico brasileiro, em particular, aqueles relacionados à contratação de energia. Assim, essa seção apresentará brevemente a estrutura institucional do SEB, seguida de discussão sobre o funcionamento da CCEE e as regras vigentes de inadimplência e de desligamento na CCEE. Nesse contexto, serão abordados também o papel do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) e as implicações de suas decisões no que tange ao reconhecimento de atrasos ou não na entrega de obras.

2.1. Estrutura Geral do Setor Elétrico Brasileiro

O SEB está estruturado institucionalmente da seguinte forma: de um lado, há as entidades de planejamento e gestão, que definem as principais diretrizes do setor, e, de outro, as instituições operacionais, que regulam, centralizam as operações de geração do Sistema Integrado Nacional (SIN) e operacionalizam a contratação de energia. Conforme esquema apresentado no portal da CCEE, a atual estrutura institucional do sistema elétrico brasileiro é:

Figura 1: Estrutura institucional do SEB (Portal da CCEE-a, 2014).

Essa estrutura decorre do novo modelo do setor elétrico, aprovado em 2004. Nesse modelo, o Poder Concedente é atribuído ao Ministério de Minas e Energia (MME), e o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) – conselho interministerial consultivo da Presidência da República – define as diretrizes e aprova as políticas energéticas formuladas e propostas pelo MME. Do lado operacional, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS8) tem autonomia e é responsável por coordenar e controlar o despacho físico da energia, ou seja, a operação das

8 Entidade de direito privado sem fins lucrativos. –‹†ƒ†‡•†‡

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(12)

instalações de geração e de transmissão do SIN. Na operação, o ONS tem como objetivo otimizar a geração conjunta do sistema hidrotérmico, visando à segurança energética e à minimização dos custos da energia elétrica para os consumidores. Além do operador, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) é uma agência reguladora independente que atua na regulação, na fiscalização e no estabelecimento das tarifas.

Nesse modelo, três novas instituições foram criadas, com o objetivo de aumentar a segurança do sistema e minimizar a vulnerabilidade do setor elétrico brasileiro. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) foi criada como uma entidade de planejamento, para tratar do planejamento do setor no longo prazo. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE9) é um órgão operacional, com a finalidade de organizar as atividades de comercialização de energia no país. E, finalmente, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE10), órgão que auxilia no planejamento e gestão do setor, foi criado para acompanhar e avaliar permanentemente a continuidade e a segurança do suprimento eletroenergético no país11.

O CMSE se reúne de maneira ordinária mensalmente, para tratar de temas referentes ao acompanhamento das obras de novos empreendimentos, à operação do SIN, aos parâmetros dos modelos computacionais utilizados no planejamento e operação do SIN, à avaliação das condições de atendimento eletroenergéticas do SIN, entre outros. O CMSE é o órgão superior que determina quando será reconhecido o atraso em obras de projetos de geração e transmissão de forma discricionária, e a deliberação sobre o reconhecimento de atraso de obras é fruto das reuniões mensais. Assim, para incorporar tais atrasos em seus modelos de despacho, o ONS precisa da sinalização e autorização deste conselho. Desse modo, uma eventual demora do CMSE em reconhecer que determinado empreendimento de geração deve entrar em operação depois da data prevista inicialmente, pode afetar de forma significativa a operação e o planejamento do sistema, podendo levar a problemas operacionais e comerciais.

Operacionalmente, há uma divisão entre as atribuições do ONS e da CCEE entre o mundo físico de produção (despacho) e transmissão de energia – sob a responsabilidade do ONS – e o mundo contratual das relações comerciais entre os agentes – cuja gestão é atribuída à CCEE. Em função das peculiaridades da energia elétrica12 e de seu caráter essencial nas diversas atividades humanas, é fundamental que a interação entre esses planos – físico e contratual – aconteça de forma coordenada e dinâmica. Na prática, o mundo físico, coordenado pelo ONS, se desenrola em paralelo ao mundo contratual, orquestrado pela CCEE, mas ambos se interligam fortemente na liquidação mensal do mercado de curto prazo pelo Preço de Liquidação das Diferenças (PLD).

9 A CCEE foi criada em substituição ao Mercado Atacadista de Energia (MAE), do modelo anterior.

10 O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) foi criado pela lei 10.848. De acordo com o decreto

5.175, de 9 de agosto de 2004, o CMSE é presidido pelo Ministro de Estado de Minas e Energia e composto por quatro representantes do Ministério de Minas e Energia, titulares da ANEEL, ANP, CCEE, EPE e ONS.

(Portal do MME-a, 2014).

11 Portal da CCEE-a, 2014.

(13)

Essa separação entre o mundo físico e contratual está explicitada na Convenção de Comercialização de Energia Elétrica13:

“Os contratos registrados na CCEE não implicam, necessariamente, compromisso de

entrega física de energia elétrica por parte dos agentes vendedores, podendo a

energia ser entregue por outro agente da CCEE, ressalvando-se, para todos os

efeitos, que a responsabilidade contratual pela entrega da energia continua sendo do

agente vendedor referido no contrato.”

No entanto, o Agente continua tendo a responsabilidade por arcar com os custos referentes à compra e venda do montante de energia estabelecido no contrato. Adicionalmente, para garantir que não haja venda a descoberto, os vendedores devem comprovar lastro para o contrato de venda de energia elétrica e potência, conforme instituído na mesma Convenção.

O PLD é um marcador semanal de preço spot de energia elétrica no Brasil. Ele não

representa um preço spot propriamente dito, pois não é definido como resultado do balanço oferta e demanda do mercado. Na verdade, o PLD é proveniente do mundo físico supracitado, sendo calculado mensalmente a partir de um modelo matemático de programação dinâmica dual estocástica, o Newave, rodado pelo ONS. O modelo Newave é um programa de minimização de custo de operação das plantas de geração do SIN, sujeito às restrições de atendimento da demanda, transmissão entre outros. Como a matriz de geração no Brasil é hidrotérmica, o modelo considera o valor da água para geração hidrelétrica e o caráter estocástico dos regimes de chuva. Como resultado, o modelo “ordena” as unidades geradoras por ordem de seu custo de operação – Custo Variável Unitário (CVU), e o operador despacha as usinas por ordem, do menor para o maior custo – ou seja, pela chamada “ordem de mérito”. O PLD reflete, grosso modo, o custo de operação da usina mais cara despachada pelo operador – ou seja, ele reflete o Custo Marginal de Operação (CMO) do sistema, limitado a um piso e teto14 definidos anualmente pela ANEEL.

Apesar de não ser rigorosamente um preço spot, o PLD é um referencial importante

para o mercado, pois é o valor a que se liquidam as posições compradas ou vendidas de energia elétrica no mercado de curto prazo. Ou seja, para agentes que estejam em posição comprada em energia, o PLD representa o custo de oportunidade de venda dessa energia – caso esse excedente de energia não seja vendido para outro Agente, ele será liquidado a PLD. Da mesma forma, um Agente que esteja em posição vendida poderia comprar essa energia em um contrato bilateral no mercado livre ou liquidar essa posição a PLD. Um gráfico com o histórico do PLD de 2003 até dezembro de 2014 pode ser observado na Figura 2.

13 Ver, em http://www.aneel.gov.br/cedoc/ren2009348.pdf, Art. 7º, § 1o da RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº

348, de 6 de janeiro de 2009 que altera a Convenção de Comercialização de Energia Elétrica, instituída pela RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 109, DE 26 DE OUTUBRO DE 2004 da ANEEL.

14 Durante o ano de 2014, o piso do PLD foi de R$ 15,62/MWh e o teto, R$ 822,83/MWh. Para 2015, a Aneel

(14)

Figura 2: Histórico de PLD (R$/MWh) por submercado (região do Brasil) de maio de 2003 a dezembro de 2014 (Portal da CCEE-b, 2014).

O SIN é operado de forma centralizada pelo ONS, mas é dividido em quatro grandes submercados, interligados entre si pelas linhas de transmissão, sendo eles: Sudeste/Centro-Oeste (SE/CO), Sul (S), Nordeste (NE) e Norte (N). O PLD é calculado para cada submercado, conforme se observa na Figura 2.

2.1.1. Os Leilões de Energia Nova

Desde a implementação do novo modelo do SEB em 2004, a contratação de energia pelas distribuidoras no Ambiente de Contratação Regulado (ACR) é realizada por leilões centralizados. O objetivo desse mecanismo de contratação é obter o menor custo possível para a energia através da competição entre os agentes nos leilões. Além disso, a assinatura de contratos de concessão de longo prazo, entre 20 e 30 anos, serve como garantia para a obtenção de financiamento para a construção de novos empreendimentos de geração e transmissão. Ou seja, parte do objetivo desse modelo de contratação via leilões é viabilizar a expansão da capacidade.

(15)

seus Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR), válidos durante todo o período da concessão, como garantia.

Assim, a entrega da energia proveniente desse novo projeto é incluída no planejamento do setor, que conta com essa energia disponível na data prevista. Em geral, os leilões de energia nova trazem diversos projetos que, isoladamente, representam apenas um pequeno incremento na geração futura de energia. Conjuntamente, no entanto, tais empreendimentos representam parte importante da expansão da geração.

Uma categoria que merece destaque são os leilões de projetos estruturantes. Trata-se de leilões de compra de energia proveniente de novos projetos de geração de caráter estratégico e de interesse público. São projetos de grande porte e, de modo geral, hidrelétricos, que visam a assegurar a confiabilidade do Sistema Elétrico e a modicidade tarifária. Até hoje, foram leiloados três projetos estruturantes: Usina Hidrelétrica (UHE) Santo Antônio e UHE Jirau15, ambas no Rio Madeira, e a UHE Belo Monte16, no Rio Xingu17. No caso dos projetos estruturantes, por envolverem uma grande quantidade de energia, eventuais atrasos nas entregas das obras podem representar um grande desafio para o atendimento da demanda conforme o planejamento do setor18.

Desde a implementação do modelo de leilões, em 2004, alguns eventos importantes em obras de geração contratadas nos leilões de energia nova e nos leilões estruturantes, levaram a atrasos na entrega de energia que causaram impactos importantes ao setor – tanto em termos físicos, relacionados à operação e planejamento do sistema, quanto em termos financeiros, oriundos dos contratos comerciais. Além disso, problemas regulatórios, institucionais e jurídicos agravam esses impactos, pois quando as penalidades previstas não são devidamente aplicadas graças a liminares ou acordos judiciais, criam-se precedentes e ocorre perda de credibilidade por parte dos agentes em relação a leilões futuros.

Vale destacar que, quando uma empresa atrasa a entrada em operação de sua usina vendida em leilão, ela deixa em aberto uma posição vendida em energia, tornando-se inadimplente. Assim, ela não recebe o pagamento contratual e deve comprar energia para repor o volume contratado e não entregue – que pode ser reposto por liquidação no mercado de curto prazo a PLD ou por contratos bilaterais, que provavelmente também terão preços indexados ao PLD. Caso isso não ocorra, o mecanismo de inadimplência da CCEE, que será explicado no item 2.2.1, será acionado.

A liquidação da posição em aberto no mercado de curto prazo pode não ocorrer, ou mesmo representar uma punição pouco efetiva para o atraso de uma obra ou descumprimento de um contrato, em função da volatilidade do PLD (Figura 2). Quando o PLD está baixo, o gerador em atraso paga uma penalidade muito pequena – o que não coíbe atrasos e impacta o mercado físico. Por outro lado, a compra de energia a PLD para honrar a posição vendida pode ser inviável,

15 Resolução CNPE n°4 de 2007 e Resolução CNPE n°1 de 2008. 16 Resolução CNPE n°5 de 2009.

(16)

principalmente para grandes volumes em cenários como os vividos em início de 2008 e durante todo o ano de 2014, em que o PLD esteve muito alto19. Com isso, as penalidades acabam por não atingir seus objetivos ou são renegociadas em outros termos – o que faz com que a punição seja não eficaz ou, em alguns casos, não crível.

2.2. A CCEE e os ambientes de comercialização no setor elétrico

No mundo contratual, há dois ambientes de contratação no mercado de energia elétrica: o Ambiente de Contratação Livre (ACL) e o ACR. No ACR, as distribuidoras adquirem, para atender seus consumidores cativos, energia elétrica por meio de leilões públicos de compra e venda de energia definidos pelo MME e operacionalizados pela CCEE. Além da promoção dos leilões, a CCEE também gerencia os contratos neles firmados, os chamados CCEAR.

No ACL, os vendedores de energia (geradores, produtores independentes, autoprodutores, comercializadores e importadores) firmam contratos bilaterais com consumidores livres e especiais onde preço e condições contratuais são negociados diretamente entre as partes, podendo o cliente escolher livremente o seu supridor de energia como alternativa ao suprimento da distribuidora da sua região. Tais contratos são denominados Contratos de Comercialização de Energia no Ambiente Livre (CCEAL)20. Observe que o custo de oportunidade do preço de energia elétrica para os consumidores livres é a tarifa do mercado regulado, pois, se os preços no ambiente livre estiverem superiores ao do ambiente regulado, o consumidor migra para o ACR21.

Quem registra e gerencia os contratos, tanto no ACR, quanto no ACL, é a CCEE – que foi constituída como uma empresa privada, sem fins lucrativos, cujo orçamento é provido por todos os agentes do setor elétrico atuantes no mercado de compra e venda de energia elétrica22, que contribuem de maneira proporcional ao seu volume de energia transacionado. Ou seja, o custo de funcionamento da CCEE é coberto pelas contribuições associativas dos agentes e por emolumentos.

A CCEE é responsável pelo registro dos contratos firmados entre vendedores e compradores, pela medição da energia elétrica movimentada pelos agentes e pela contabilização das operações de compra e venda de energia elétrica, onde são apuradas mensalmente as diferenças entre os montantes contratados e os montantes efetivamente gerados ou consumidos pelos agentes de mercado. Além disso, a CCEE também calcula o PLD (a partir do CMO calculado pelo ONS) e os débitos e créditos dos agentes oriundos das diferenças apuradas, além de realizar a liquidação financeira das operações, onde as diferenças são valoradas ao PLD.

19 Barroso et al., 2011.

20 Portal da CCEE-c, 2014.

21 A Resolução Normativa (REN) 376/2009 da ANEEL disciplina as regras e condições de migração de um

consumidor do ACR para o ACL e vice-versa.

22 Tais agentes de mercado são as empresas geradoras (concessionárias de serviço público, produtores

(17)

É importante ressaltar, no entanto, que a CCEE funciona como uma instituição de registro de contratos e contabilização financeira de acordo com a situação contratual dos agentes, não funcionando como uma bolsa nem como uma câmara de compensação (clearing house). Para reger essas operações de comercialização de energia elétrica, a CCEE elabora regras e procedimentos que são constantemente melhorados e divulgados aos atores do mercado de energia elétrica.

Na governança da CCEE, o Conselho de Administração, formado por 5 (cinco) membros eleitos pela Assembleia Geral dos Associados, é responsável pela gestão da empresa. A Assembleia Geral é o órgão deliberativo da CCEE, composto pelos agentes no pleno exercício de seus direitos de voto. Para o cálculo do rateio de votos, a CCEE distribui 5.000 votos uniformemente entre todos os agentes e adota rateio proporcional de outros 95.000 votos mensalmente, de maneira proporcional à média móvel do volume de energia comercializado por cada Agente nos 12 meses anteriores. Nenhuma categoria de agentes (geradores, distribuidoras, comercializadoras, importadores e exportadores de energia elétrica e consumidores livres) pode ultrapassar 50% dos votos e, caso isso ocorra, os votos excedentes são redistribuídos entre os agentes das demais categorias23.

2.2.1. Mecanismos vigentes de inadimplência e desligamento na CCEE

Além de determinar os valores mensais das contribuições de cada Agente para o custeio da CCEE, o rateio dos direitos de votos tem ainda papel importante para o mecanismo de inadimplência e desligamento estabelecidos pela CCEE, conforme será descrito a seguir.

Todos os agentes participantes da CCEE que comercializam energia no SIN registram seus contratos no Sistema de Contabilização e Liquidação (SCL) da CCEE. O resultado do processamento da contabilização mensal desses contratos é divulgado aos agentes 45 dias antes da data efetiva de liquidação financeira. Nessa ocasião, os agentes devem aportar garantias financeiras em montante suficiente para cobrir as suas obrigações por ocasião da liquidação. Na data da liquidação financeira, cada Agente liquida os valores devidos na Liquidação Financeira do Mercado de Curto Prazo (MCP) – pagando, no caso de posição devedora, ou recebendo, se em posição credora. A liquidação financeira é realizada de forma multilateral, sem que haja identificação de parte e contraparte nas transações de créditos e débitos, e ocorre em duas datas, sendo uma para o depósito de recursos por parte dos agentes devedores e outra para a transferência desses recursos aos agentes credores24.

Quando há inadimplência no MCP, não coberta pelas garantias aportadas no período entre a contabilização e a liquidação financeira, o rateio dessa inadimplência é realizado de forma

23 Os votos aos quais os agentes têm direito também são utilizados como parâmetro para determinar os

valores mensais das contribuições associativas para custeio das atividades realizadas pela CCEE, calculadas com base no orçamento anual estabelecido e aprovado em Assembleia Geral (Portal da CCEE-d, 2014).

(18)

proporcional ao saldo de cada Agente credor25. Como exemplo, considere um sistema em que há 5 (cinco) agentes com 20% de votos cada um. Em determinado mês, os agentes A e B são credores e os agentes C, D e E são devedores conforme os montantes mostrados na Figura 3. Na mesma Figura 3, do lado direito, pode-se observar como ficam os valores efetivamente recebidos e pagos caso o Agente E não efetue o pagamento. Assim, nesse primeiro momento, a inadimplência fica a cargo dos agentes credores que arcam com o débito do inadimplente de forma proporcional aos seus créditos sem levar em conta o rateio dos votos.

Caracterizada a inadimplência – ou seja, se, de fato, o Agente inadimplente não efetuar o pagamento mesmo em data posterior ao vencimento – o Agente fica sujeito a encargos moratórios e ao desligamento da CCEE. No caso de desligamento, os débitos desse Agente desligado são rateados entre todos os agentes ativos da CCEE, na proporção de seus votos26 – ou seja, a CCEE funciona como um condomínio, onde a inadimplência é rateada entre todos os condôminos. Os agentes que apresentaram créditos líquidos na liquidação em que houve inadimplente e ratearam o montante da inadimplência proporcionalmente aos valores desses créditos (ou seja, os agentes A e B do exemplo acima), terão essas quantias abatidas do rateio do saldo devedor do Agente desligado.

Nesse caso, seguindo o exemplo do caso descrito anteriormente, o débito do Agente E seria rateado entre os agentes A a D que teriam seus votos recalculados sem a participação do Agente E. Para este exemplo hipotético, serão desconsideradas as correções monetárias, e o rateio de votos recalculado será de 25% para cada um, redistribuindo o montante devido do Agente E conforme a Figura 4.

25 Portal da CCEE-f, 2014.

26 Recalculados sem a participação do Agente desligado.

X

(19)

Figura 4: Redistribuição do montante devido pelo agente E entre os agentes A a D restantes no sistema.

Note que, como os agentes A e B haviam coberto o montante devido de E na liquidação financeira de curto prazo antes do seu desligamento, foram abatidos os valores pagos por eles das quantias a pagar por Agente após o desligamento de E, ou seja, os agentes A e B foram ressarcidos por parte do montante pago enquanto credores.

Esse mecanismo de curto prazo para lidar com a inadimplência faz com que os agentes potencialmente credores se antecipem ao mecanismo, na tentativa de reduzir sua contribuição no caso de inadimplência. Ou seja, atualmente quando há a expectativa do mercado de ocorrer uma alta inadimplência em determinado mês, os agentes credores passam a vender energia elétrica a preços inferiores ao PLD, para ficarem menos credores na ocasião da inadimplência. Com isso, eles buscam reduzir o potencial impacto desse mecanismo de inadimplência no fluxo de caixa de suas empresas – em outras palavras, o impacto de curto prazo é financeiro.

De acordo com as regras vigentes na CCEE, haverá desligamento compulsório em caso de (i) perda da condição de concessionário, autorizado ou permissionário ou (ii) no caso de consumidores livres e/ou especiais, aqueles que deixarem de atender aos requisitos legais/normativos inerentes à condição que permite sua atuação no âmbito do ACL. Poderá também haver desligamento por solicitação do Agente, por iniciativa do Conselho de Administração da CCEE (no caso de descumprimento de obrigações previstas na Convenção de Comercialização, nas Regras ou nos Procedimentos de Comercialização ou no Estatuto Social da CCEE) ou por iniciativa da ANEEL (no caso de descumprimento de condições previstas na norma/regulamentação que não tenham sido contempladas de forma compulsória)27.

(20)

Esses mecanismos vigentes vêm sendo seguidos e cumpridos de uma forma geral. No entanto, não há a efetividade na solução dos problemas quando os montantes envolvidos são muito elevados, como são os casos de Bertin e Santo Antônio, tratados na secção 3, pois os agentes tendem a judicializar os casos, argumentando, por diferentes razões, que as causas de inadimplência estão fora de sua responsabilidade ou que os valores devidos são menores do que os calculados pelos procedimentos os quais poderiam levá-los até à falência.

O rateio da inadimplência e do saldo devedor dos agentes é percebido pelo investidor nesse setor como um custo. Dada a natureza incerta desse custo, a precificação deste risco está refletida nos contratos de energia elétrica de forma indireta, pois os compradores não visualizam essa parcela discriminada. O fato de todos serem obrigados a compartilhar a inadimplência dos devedores faz aumentar o risco associado às operações descasadas realizadas pelos agentes, principalmente pelas comercializadoras. Em geral, essas empresas se preocupam em controlar o risco e consequentemente o tamanho do descasamento, e utilizam o Value at Risk (VaR) para

quantificar a exposição ao risco de mercado28. Assim, um dos impactos de tal mecanismo de inadimplência está nos preços de energia elétrica praticados no Brasil.

Além disso, apesar de haver penalidades devidas pelos inadimplentes, sendo até o desligamento em caso de real não cumprimento da dívida, não se observa que essas penalidades estejam sendo eficazes para evitar problemas de grande porte como o de Bertin e o de Santo Antônio. O compartilhamento da inadimplência tem por objetivo, assim como em outros mercados de energia ao redor do mundo, mitigar o risco de contraparte – pelo menos na parcela relacionada à liquidação no mercado de curto prazo29. No entanto, este compartilhamento se torna altamente oneroso nos casos estudados, e o mercado brasileiro acaba se tornando de alto risco.

Outro aspecto a ser mencionado é a insegurança jurídica percebida pelos agentes. Grande parte desses montantes de inadimplência rateados deveria retornar aos que pagaram, conforme as regras de rateio de inadimplência já apresentadas. No entanto, uma série de liminares é pleiteada pelos devedores, o que acabam postergando (ou nem procedendo) o cumprimento das regras estabelecidas. Logo, a judicialização do setor é outra variável considerada na quantificação de risco pelos agentes.

Por fim, todos os elementos estudados implicam o aumento da percepção de risco e o consequente aumento da precificação dos contratos de energia elétrica para buscar mitigar os riscos percebidos. Além disso, dependendo do perfil do investidor, percebe-se o não investimento ou desinvestimento nesta área por parte de alguns atores, dada a dificuldade de quantificar os riscos associados ao SEB.

Em função de sua importância, serão apresentados na seção 3 os casos das usinas termelétricas do grupo Bertin e da UHE de Santo Antônio e analisados na seção 4, onde o objetivo é ilustrar com dois casos concretos os impactos no setor de atrasos e não entrega de energia conforme o planejado. Vale ressaltar estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de

28 Gomes et al., 2010.

(21)

Janeiro (FIRJAN)30, publicado em fevereiro de 2015, sobre a estimativa de custo que os atrasos de usinas de geração causaram ao Brasil no período de 2006 a 2014. Tal estudo aponta R$ 65,1 bilhões para este custo referente à energia que deixou de ser gerada desde 2006 pelas usinas com obras consideradas atrasadas até 31/12/2014. Assim, espera-se motivar a importância e relevância do tema dessa dissertação, onde o foco é analisar as causas e impactos do problema financeiro, sob a ótica da teoria da regulação, considerando a interação com o mundo físico.

(22)

3. Os casos de estudo

Nessa seção, serão apresentados dois casos recentes vivenciados no setor elétrico: Bertin e Santo Antônio. Dada sua relevância para o funcionamento do setor, serão descritas as principais características, levantados os principais impactos e possíveis causas de cada caso.

3.1. Bertin

Mais de 20 projetos de usinas termelétricas a óleo combustível e a gás natural do grupo Bertin se sagraram vencedores nos Leilões de Energia Nova A-3 e A-531 de 2007 e 2008, para entrada em operação entre janeiro de 2011 e janeiro de 2013. No Leilão A-3 de 2008, seis projetos de usinas a óleo do grupo foram vencedores do leilão, totalizando 1.056 MW de potência. Nos leilões A-5, foram duas usinas a óleo vencedoras em 2007 (potência total de 420 MW) e em 2008, treze usinas a óleo (total de 2.868 MW) e quatro usinas a gás natural (total de 1124 MW). A partir desses resultados, foram firmados CCEAR entre Bertin e as distribuidoras totalizando em torno de 3,2 GWmed de energia elétrica dos 3,3 GWmed de garantia física32 e 5,5 GW de potência, representando cerca de 5% da potência instalada no Brasil. Não houve venda de Bertin no ACL, uma vez que o total da garantia física de seus empreendimentos foi vendido no mercado regulado (ACR)33.

A lista de empreendimentos para os quais Bertin se sagrou vencedora por leilão, suas respectivas potências, quantidade contratada e datas de previsão de entrada em operação podem ser observadas na Tabela 1.

31 O Leilão A-5 é um processo licitatório para a contratação de energia elétrica proveniente de novos

empreendimentos de geração realizado com 5 (cinco) anos de antecedência do início do suprimento. Esse foi criado para viabilizar empreendimentos de longa maturação, como, por exemplo, os empreendimentos hidrelétricos. O Leilão A-3 é um processo licitatório para a contratação de energia elétrica proveniente de empreendimentos de geração novos realizado com 3 (três) anos de antecedência do início do suprimento. Esse leilão foi criado para viabilizar empreendimentos de médio prazo de maturação, como, por exemplo, os empreendimentos termelétricos. (Portal do MME-b, 2014).

32 A quantidade máxima de energia que as usinas hidrelétricas, termelétricas e projetos de importação de

energia podem comercializar.

33 A menos das perdas da rede básica de transmissão, que são compartilhadas entre geradores e

(23)

Tabela 1: Empreendimentos vencidos em leilão pelo Grupo Bertin (Portal da CCEE-g, 2015).

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Na data prevista para a primeira entrega da energia, janeiro de 2011, nenhuma das obras dos projetos vencedores dos leilões havia sido iniciada – o que sinalizava que não havia perspectiva de entrada em operação desses projetos, nem mesmo com atraso34. Segundo noticiado na ocasião, o grupo Bertin afirmava em março de 2011, quando já havia seis usinas em atraso, que elas entrariam em operação no terceiro trimestre de 2011, pois eles contavam com um modo de construção modular que permitia a pré-fabricação em oficinas fora da área e que possibilitava grande velocidade de montagem no canteiro35. Na prática, era pouco provável que a entrada em operação de tais usinas fosse viabilizada nesse período de tempo.

Confirmada a não entrega por Bertin da energia contratada, o mecanismo de inadimplência da CCEE foi acionado. As garantias referentes às primeiras usinas em atraso que deveriam ter entrado em operação em janeiro de 2011, mas não entraram, totalizaram R$ 405 milhões, e Bertin não depositou tal montante junto à CCEE, alegando problemas financeiros e que buscaria vender projetos para equacionar tais problemas36.

A ANEEL, conforme a regulamentação, buscou revogar as autorizações das usinas e seus CCEAR, além de aplicar as multas adicionais previstas. O que ocorreu foi que Bertin recorreu à Justiça, polemizando a questão e agravando ainda mais a situação na prática, pois durante a

34 Energy Report 64, 2012.

35 Olivon, 2011.

(24)

judicialização do caso, os valores referentes à penalização são impedidos de serem cobrados, o Agente não é desligado da CCEE e a nova energia para substituição por meio de leilões não pode ser adquirida.

Apesar das reuniões mensais, apenas em setembro de 2011 – nove meses após o primeiro atraso – houve a primeira manifestação do CMSE sobre a avaliação de excluir tais projetos do sistema – tanto os que deveriam ter sido entregues em início de 2011, quanto os que estavam previstos para partida em início de 201337.

O fato de o Grupo Bertin não ter cumprido os prazos para essas usinas provocou um desequilíbrio no balanço energético das distribuidoras, além de ter representado um grande prejuízo do ponto de vista estrutural e de planejamento do sistema. Em termos comerciais, essas térmicas foram excluídas do volume de energia contratado pelas distribuidoras38, que tiveram que recorrer ao mercado de curto prazo quando o PLD estava alto. Isso levou a um grave desequilíbrio no fluxo de caixa das distribuidoras, que acabaram por receber grande volume de aportes do Tesouro Nacional e recorrer a empréstimos39.

Houve ainda grande discussão judicial entre o governo e o grupo Bertin, que perdura até hoje. A situação atual é que a CCEE e a ANEEL ainda não obtiveram êxito no desligamento desse grupo do mercado em função de liminares judiciais a favor de Bertin. Algumas usinas tiveram suas autorizações revogadas pela ANEEL, mas ainda restam em discussão seis usinas de Aratu na Bahia, que deveriam ter sido entregues em janeiro de 2013. Em seus processos, Bertin alega que os atrasos das obras não são de sua exclusiva responsabilidade e acusa a ANEEL por lentidão nos processos administrativos, o que impacta os cronogramas dos projetos.

Em abril de 2014, já havia 15 meses de atraso dessas usinas e ainda não havia previsão de entrega. As revogações das autorizações da ANEEL vêm sendo recorrentemente postergadas judicialmente por liminares a favor do grupo, porém a ANEEL vem acompanhando as obras e verificando que estão paradas sem viabilidade de conclusão. Assim, se mantém na Justiça a discussão sobre a revogação das autorizações dessas seis usinas, o pagamento das penalidades ainda não pagas por Bertin, que, segundo a ANEEL, já passam de R$ 450 milhões e, por fim, o desligamento desse grupo da CCEE40.

Além do impacto físico da não entrega dessas usinas e consequente repercussão financeira, leilões posteriores também foram impactados por este problema, principalmente pelo imbróglio judicial, que acarretou indefinições sobre como tratar a questão. Como exemplo, no final de 2012, quando houve um Leilão A-5, as distribuidoras declararam uma baixa necessidade de demanda para este Leilão, pois desconheciam o tratamento que seria dado aos contratos de Bertin e não podiam correr o risco de ficar excessivamente contratadas para o atendimento da demanda dos seus consumidores. Esse temor advinha do fato de que somente eram repassadas

37 Em junho de 2011, duas usinas a gás do grupo Bertin foram compradas pelo grupo MPX Energia. Da

mesma forma, em junho de 2012, o grupo Bertin vendeu oito de seus projetos de usinas a óleo para o grupo Bolognesi.

38 Portal da CCEE-h 2014.

(25)

às tarifas de distribuição os custos de sobrecontratação de energia quando o volume excedia 3% da demanda total do mercado (atualmente são 5%). Acima disso, os custos são da própria distribuidora.

A seleção adversa de um tipo de Agente que possivelmente é mais arriscado do que o aceitável para esse tipo de investimento, é uma possível causa para o que ocorreu neste caso específico. Como as distribuidoras não têm ingerência sobre a aquisição de sua energia – que é coordenada pelo governo através dos leilões centralizados –, elas não têm nenhum incentivo para que a seleção dos novos entrantes seja adequada. Da mesma forma, os consumidores livres veem o risco de contraparte mitigado pelo mecanismo de compartilhamento de inadimplência estabelecido pela CCEE – e também acabam não tendo incentivos a pressionar pela melhor seleção de novos entrantes no mercado de geração.

Além disso, o fato de ser permitida a concentração de muitos projetos em um só Agente gera um problema clássico de Too Big to Fail, onde o custo de desligar esse Agente se

torna muito alto, criando um problema de moral hazard. Também, pode-se elencar o

monitoramento falho como um possível motivo no caso de Bertin, supondo-se que não havia tecnologia disponível para o regulador identificar ex-ante que as obras estavam atrasadas. Por fim, pode se tratar de um problema de enforcement, dada a dificuldade percebida no SEB de se punir os agentes da forma como está prevista regulatoriamente, o que acaba criando um círculo vicioso de falta de credibilidade do regulador perante os agentes. Essas possibilidades serão discutidas na seção 4.

3.2. Santo Antônio

O caso de Santo Antônio, apesar de ser bastante distinto do caso de Bertin, vem gerando impactos no mercado similares aos observados no caso Bertin. São distintos primeiramente porque Santo Antônio é uma usina contratada em leilão de projeto estruturante41, ou seja, trata-se de um projeto de grande porte e indivisível. Mais importante, os motivos dos atrasos da não entrega de energia no prazo previsto são diferentes, já que a obra de Santo Antônio sofreu atrasos no seu cronograma, mas algumas turbinas já começam a entrar em operação comercial. Como principais fatores que geraram tais atrasos, podem ser citados: greve dos trabalhadores da obra, atraso no licenciamento ambiental, enchentes e atraso na entrega do Linhão do Madeira42. Dadas todas essas razões, a geração da usina tem sido inferior ao previsto no cronograma inicial. Segundo o contrato firmado no leilão, até 2016, a UHE Santo Antônio

41 A UHE Santo Antônio está localizada no rio Madeira (RO), o seu leilão ocorreu em dezembro de 2007 e foi

vencido pelo Consórcio formado por Furnas, Odebrecht, Andrade Gutierrez e Cemig. No leilão, foram negociados para o ACR um total de 1.552,60 MWmed, que representam 70% da garantia física da usina (2218 MWmed). Os outros 30% poderão ser negociados no ACL. O início de suprimento previsto foi 01/01/2012 e os CCEARs assinados, de 30 anos de duração. O escalonamento da entrega de energia segue a seguinte rampa (2012: 4,4; 2013: 999,2; 2014: 1.498,5; e a partir de 2015: 1.552,6 MWmed).

42 Linha de transmissão de extensão de 2.375 km que para ligar as hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio,

(26)

deverá operar com cinquenta turbinas, com potência total de 3.568 MW.

A UHE começou a ser construída em setembro de 2008, e suas duas primeiras turbinas entraram em operação em 30 de março de 2012. Atualmente, trinta e duas turbinas estão em operação comercial, com potência instalada de 2.286 MW. Santo Antônio vendeu energia através de contratos por quantidade43 a várias distribuidoras e consumidores livres. No entanto, em 2014, a usina não gerou energia suficiente para atender a esses contratos. Parte da não entrega de energia tem se dado pelo baixo nível atual dos reservatórios do sistema, mas os motivos mais representativos neste caso são os atrasos na entrada em operação comercial de unidades da usina e a produção abaixo dos valores de referência considerados na licitação do empreendimento.

Esses motivos são os que vêm sendo discutidos judicialmente pela empresa Santo Antônio Energia, pois ela alega que os atrasos não são de sua responsabilidade e que os fatores de indisponibilidade só deveriam ser medidos após instalação completa de todas as unidades geradoras. A empresa ganhou liminares na Justiça que a isentaram de pagar as penalidades relativas a eventos que não fossem de sua responsabilidade. Porém, essas liminares foram cassadas e, em agosto de 2014, a dívida de Santo Antônio era de mais de um bilhão de reais, que deveriam ser depositados em forma de garantias financeiras na CCEE. Inicialmente, Santo Antônio depositou pouco mais de cem milhões de reais em garantias, afirmando que era o montante que reconhecia, uma vez que dispunha de sentença na Justiça Federal e por não ter como depositar os mais de novecentos milhões de reais restantes44.

Posteriormente, os acionistas aportaram à empresa o valor necessário para sanar a dívida acumulada no MCP por não entrega de toda a energia vendida em seus contratos, em torno de R$ 1,3 bilhão. O pagamento foi efetuado porque o processo de desligamento da CCEE seria iniciado e, ao ser desligado, o Consórcio Santo Antônio perderia a licença de operação da usina, a qual seria devolvida à ANEEL sem indenização.

Mensalmente, Santo Antônio tem incorrido na necessidade de depositar elevados volumes de garantias financeiras, uma vez que se trata de grande quantidade de energia não entregue pelo consórcio e de um cenário de PLD alto. Portanto, os acionistas continuam questionando os montantes a serem pagos, e a situação deste grupo ainda está na ANEEL para ser aprovada pela sua Diretoria. O fato de ser um projeto de grande porte e indivisível torna Santo Antônio um caso bastante peculiar. Eventuais atrasos em projetos desse tipo provocam um maior impacto no sistema e isso leva o Agente a crer que haverá possibilidade de negociação para a sua inadimplência. Isso porque o desligamento do consórcio da CCEE certamente seria uma grande perda para seus acionistas, mas também para o setor elétrico como um todo, pois o tempo que se levaria para recontratar empresas para dar continuidade à obra e à operação das turbinas já em

43 Nos contratos por quantidade, os riscos hidrológicos da operação energética são assumidos integralmente

pelos geradores, cabendo a eles todos os custos referentes ao fornecimento da energia contratada, devendo existir mecanismos específicos para o rateio dos riscos financeiros decorrentes de diferenças de preços entre submercados e eventualmente impostos aos agentes de distribuição que celebrarem contratos nessa modalidade.

(27)

funcionamento afetaria fortemente a operação do sistema, principalmente em um contexto como o atual de balanço oferta e demanda justo, quando está se observando necessidade de geração plena de todo o parque gerador. Ou seja, punir este tipo de Agente não é benéfico nem para ele próprio nem para o regulador.

Por isso, é difícil de verificar e dissociar o quanto dos impactos das falhas desse Agente é oriundo de fatores exógenos de fato como as greves, enchentes e atrasos na entrega da linha de transmissão, e o quanto é endógeno, ou seja, resultante de um comportamento indesejado do Agente, que antecipa essa dificuldade de serem aplicadas as punições no seu caso em particular.

Na análise do item 4.2, os casos Santo Antônio e Bertin são mais detalhadamente analisados, incluindo a possibilidade de seleção adversa do Agente. No entanto, no caso de Santo Anônio, diferentemente de Bertin que poderia ter o seu tamanho limitado, é inerente ao projeto a característica TBTF, onde se cria uma proteção ao Agente em relação à punição em caso de falha. Justamente por seu tamanho, há possibilidade de moral hazard.

Levanta-se ainda a possibilidade de falha no monitoramento, também partindo da suposição de ausência de tecnologia de monitoramento. Entretanto, como ficará claro na seção 4, essa possibilidade parece pouco plausível, uma vez que existem mecanismos de verificação do andamento das obras pelo governo. A criação do CMSE inclusive indica o reconhecimento desse papel. Assim, existe realmente a tecnologia para realizar esse monitoramento, mas a questão que se destaca é também no caso de Santo Antônio o problema de enforcement, pois nem sempre

somente aspectos técnicos são observados por este comitê, uma vez que é presidido pelo governo, e interesses políticos também devem ser considerados. Por isso, por mais que, em muitos casos, os órgãos operacionais ONS, CCEE e a própria ANEEL apontem a identificação de atrasos, o CMSE nem sempre os reconhece prontamente.

O que pode ser destacado é que, nos dois casos analisados nesse trabalho, essa demora em reconhecer os atrasos prejudicou mais o sistema e os consumidores finais do que se tivessem sido assumidos no momento em que foram identificados. Assim, parece frágil o argumento de que assumir tais atrasos é mais impopular do que adiar o seu reconhecimento.

(28)

4. Análise dos casos

Nessa seção, serão apresentadas algumas possíveis razões econômicas que possam explicar os recentes atrasos ou não entregas de novos empreendimentos de geração. Para tal, serão analisados os casos de Bertin e Santo Antônio, ilustrados na seção 3, tendo como base os conceitos usuais da literatura moderna de regulação econômica. Em particular, para cada um dos casos, será considerada a possível existência de seleção adversa, moral hazard, além de

problemas de monitoramento e de enforcement.

Em um item inicial, serão apresentados esses conceitos conforme entendido pela literatura. Em seguida, será tratado cada um dos casos, Bertin e Santo Antônio, em função dos conceitos apresentados.

4.1. O modelo de Principal-Agente e os conceitos analisados

Os modelos de Principal-Agente, que são a base da nova teoria de regulação econômica, surgiram a partir do desenvolvimento da Teoria de Contratos (ou Economia da Informação) na década de 7045. A ideia básica da Teoria de Contratos era focar em modelos de equilíbrio parcial que levassem em conta as interações estratégicas entre agentes em um ambiente de informação assimétrica, utilizando principalmente ferramentas de teoria dos jogos.

Tais modelos são, em sua maioria, modelos de equilíbrio parcial (ou seja, isola-se o mercado de um bem do resto da economia) e descrevem as interações entre um pequeno número de agentes. Os modelos concatenam as restrições impostas pelo arranjo institucional existente através de um contrato46. De modo geral, os modelos são construídos a partir do encontro e da interação entre uma parte informada, o Agente, e uma parte desinformada, o Principal. Quando aplicado à regulação econômica, diz-se que o Principal é o regulador (ou Autoridade Regulatória) e o Agente é a empresa regulada.

Nesse contexto, um contrato é um compromisso entre as partes, onde se especificam as obrigações de cada parte para cada contingência. Observe que um contrato só pode ser feito sobre variáveis observáveis e verificáveis por uma terceira parte independente. Caso contrário, não há como garantir o cumprimento do contrato pelas partes (enforcement).

Um ingrediente fundamental do problema de Principal-Agente é a assimetria de informações entre as partes47. A assimetria de informação entre essas duas partes pode vir do desconhecimento do Principal sobre o (i) tipo do Agente (a que se chama de modelo de "hidden

45 Viscusi, Vernon e Harrington, 1995.

46 Os contratos podem ser explícitos ou implícitos. Um contrato explícito é garantido por um terceiro,

enquanto um implícito é garantido por um equilíbrio tácito observado na interação entre os agentes. Ver Shy, 1995.

47 Além da assimetria de informação, é necessário que haja um conflito entre os objetivos entre o Principal e

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information") ou sobre (ii) as ações do Agente (a que se chama de modelo de "hidden action"). Com base nesta classificação, na aplicação à Regulação Econômica, podem-se descrever dois tipos problemas básicos: seleção adversa e risco moral (moral hazard).

Seleção adversa

O termo "seleção adversa" é utilizado quando alguma característica ou tipo do Agente é observado de maneira imperfeita pelo Principal. No caso da regulação, por exemplo, o regulador não sabe dizer de antemão se a firma é de custo alto ou custo baixo, ou qual é o perfil de risco da firma. Então, o ponto principal da seleção adversa é fazer o Agente revelar o seu tipo.

A seleção adversa é uma característica da relação Principal-Agente que advém da assimetria de informações entre o Agente e o Principal. As firmas têm informação privada sobre seu tipo – sua produtividade ou seus custos – o qual não é observado pelo Principal. Dessa forma, os agentes podem manipular essa informação de modo a maximizar seu lucro, dados os contratos oferecidos pelo regulador. Vale reforçar que a seleção adversa ocorre ex-ante, ou seja, é um fenômeno anterior à celebração do contrato48.

Moral hazard

Um problema de moral hazard existe quando a ação do Agente após a assinatura do contrato não é verificável pelo Principal, ou seja, o Principal não consegue observar as ações do Agente. No caso da regulação, isso significa que o regulador não consegue observar de forma perfeita se a empresa regulada está se esforçando para obter o melhor resultado. Isso significa que, como há informação assimétrica, o Principal observa apenas o resultado (por exemplo, se houve ou não houve atraso na obra da geradora), que é correlacionado com o esforço, mas não observa o esforço diretamente. Como exercer esforço é custoso para o Agente, este tenderá a se esforçar menos do que o desejável sob o ponto de vista do Principal.

Então, o problema básico de moral hazard é fazer o Agente exercer esforço em um nível eficiente, apesar de o esforço não ser observável. O comportamento de moral hazard

também é uma característica da assimetria de informação na relação Principal-Agente e é posterior (ex-post) à celebração do contrato, onde o Agente responde ao mecanismo de incentivos

criado pelo contrato49.

Monitoring ou Auditing

Monitoring (ou monitoramento) é uma forma que o Principal tem de superar ou reduzir

o problema informacional. É uma tecnologia que permite que o Principal reduza esse problema de informação assimétrica. Com tecnologia de monitoramento, o Principal é capaz de verificar com alguma probabilidade o tipo do Agente e pode prever punição ao Agente caso seja detectado que

48 Salanié, 2005.

(30)

está mentindo. Sendo efetiva tal tecnologia, o Principal pode desenhar contratos com incentivos mais adequados a evitar os problemas de seleção adversa e moral hazard. Uma das práticas de monitoramento que tem se apresentado eficaz é a comparação de desempenho do Agente com o de outros agentes do mercado, quando tais informações são públicas, – ou benchmarking50.

Enforcement ou non verifiability

O problema no caso de enforcement não é de informação assimétrica entre as partes (Agente e Principal), mas reside no fato de que a terceira parte não consegue observar (verificar) o parâmetro de contratação – e, portanto não consegue impor o contrato. Veja que, no entanto, a verificação do parâmetro pode ser possível, e mesmo assim não haver enforcement.

Vale ressaltar que, se nenhuma das partes tiver incentivo a não cumprir o contrato, não importa se o enforcement é fraco ou não, pois não se fará necessário. Quando se observa,

por meio do monitoramento, um descumprimento do acordo contratual, há previsão no contrato ótimo a devida penalização do Agente. É importante, nesses casos, que o sistema judicial seja capaz de verificar tal descumprimento e fazer valer as penalidades previstas. Apesar de ser caro o uso do sistema judicial para que o contrato seja respeitado, observa-se que um sistema judicial limitado sinaliza menor necessidade de compromisso do Agente com suas responsabilidades51.

Laffont52 analisa a baixa qualidade de enforcement percebida nos países em

desenvolvimento de forma geral. Ele atribui essas falhas ao alto custo do enforcement ótimo,

devido aos custos de transação oriundos da assimetria de informação e ao baixo poder de barganha do regulador. Essas dificuldades estão relacionadas aos eventos de corrupção e às instituições fracas percebidos nesses países.

4.2. Análise dos casos Bertin e Santo Antônio

Nesse item, serão analisados os casos de Bertin e Santo Antônio com base na Teoria da Regulação53, brevemente abordada no item 4.1, onde foram explorados os principais conceitos da relação Principal-Agente. Vale destacar que a análise utiliza o jargão específico dos modelos de Principal-Agente aplicados à Regulação Econômica, conforme descrito em Laffont e Tirole, 1993. Assim, os termos utilizados nas próximas seções devem ser entendidos e interpretados no contexto dos referidos modelos.

Seleção adversa

A seleção adversa de agentes nos leilões de energia nova é uma hipótese possível tanto no caso de Bertin, como no caso de Santo Antônio. Ou seja, é possível que o mecanismo de

50 Laffont e Martimort, 2002. 51 Laffont e Martimort, 2002. 52 Laffont, 2005.

Imagem

Figura 1: Estrutura institucional do SEB (Portal da CCEE-a, 2014).
Figura 2: Histórico de PLD (R$/MWh) por submercado (região do Brasil) de maio de 2003 a  dezembro de 2014 (Portal da CCEE-b, 2014)
Figura 3: Posições dos agentes após a contabilização versus após a liquidação onde o Agente  E não aportou o valor referente ao seu saldo devedor até a data do pagamento
Figura 4: Redistribuição do montante devido pelo agente E entre os agentes A a D restantes  no sistema
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Referências

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