,
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DEPARTAMENTO DE ENSINO
CURSO DE MESTRADO EM AD1.1INISTRAÇÃO PÚBLICA
DESCENTRALIZAÇÃO E FINANCIAMENTO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE NO BRASIL
DISSERTAÇÃO APRESENTADA A ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLI-CA PARA A OBTENÇÃO 00 GRAU DE MESTRE EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
FEDERICO TOBAR
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE AD~IINISTRAÇÃO PÚBLICA
DEPARTA~IENTO DE ENSINO
CURSO DE ~IESTRADO E11 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
E
~SCENTRALIZAÇÃO
E
FINANCIA~lENTO
DOSSERVIÇOS DE SAÚDE NO BRASIL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR FEDERICO TOBAR
APROVADA EM: 09.08.1995
PELA COMISSÃO EXAMINADORA
SILVIA MARTA PORTO
Ao povo e à sociedade brasileiros que sabem receber aos seus irmãos.
À minha mulher Marcela, que além de tudo é companheira.
Agradecimentos
Agradecer nomeando um a um todos aqueles que me incentivaram não só a realizar o mestrado, mas sobretudo este trabalho, é tarefa humanamente impossível.
Fica assim registrada mina gratidão a todos.
Quero ressaltar, no entanto, o incentivo, apoio e ajuda de:
• Minha orientadora, professora Sônia Fleury Teixeira, pela sua dedicação, e
valiosos conselhos
• Professora Silvia Marta Porto da ENSP/FIOCRUZ, pelo seu grande afeto,
porque me acolheu no Brasil como a um irmão, porque acreditou em min e porque nunca poupou esforços para me ensinar a sua profissão de economista da saúde.
• Colegas e professores do mestrado da EBAP
• Carlos Otávio Ocke Reis: que incansavelmente me ajudou e estimulou para
tentar pensar em brasileiro e escrever em português.
• Affonso Mendônça, e demais funcionários do mestrado da EBAP que sempre
íNDICE
Apresentação 7
PARTE 1. DESCENT~L1ZAÇÃO EM SAÚDE 10
Capítulo I. INTRODUÇAO 11
Objetivo do Estudo 11
Análise Financeira da Descentralização dos Serviços de Saúde 14
Descentralização Como Alternativa Para Superar o Déficit 17
A Problemática Específica do Financiamento à Saúde 18
Capítulo 11. AS ESTRATÉGIAS DE DESCENTRALIZAÇÃO 22
Inclusão Da Descentralização na Agenda das Políticas
Governamentais. 24
Desconcentração ou Descentralização Administrativa. 28
Descentralização Isolacionista. 31
Descentralização Cooperativa. 32
A Delegação de Funções Sem Autonomia. 34
Descentralização Como Estratégia Democratizadora. 35
Descentralização Como Deslocamento do Conflito. 37
Descentralização Como Estratégia de Redução do Gasto Público. 43
Descentralização Como Desregulação. 47
Descentralização Como Estadualização e Como Municipalização. 48
Contribuição de, Cada Estratégia à Superação da Crise de
Racionalidade e Legitimidade. 51
Capítulo li). AS ESTRA TEGIAS DE DESCENTRALIZAÇÃO SETORSAUDE
Tipologia dos Processos Descentralizadores
Considerações Metodológicas Para a Análise dos Modelos Necessidade de um Recorte Histórico do Problema.
Dâesafios Financeiros Comuns a Todas as Modalidades. Condicionantes da Desconcentração.
Condicionantes da Devolução.
O Deslocamento do Conflito como Distorção da Devolução
NO
54
54
58
58
60 61 62A Evassão de Responsabilidades como Distorção da Devolução Relações Entre Devolução e Desconcentração e suas Distorções Condicionantes da Delegação
63 67
68
68
Condicionantes da Privatização.
Racionalidade e Legitimidade em Cada Estratégia. Interrogantes Para a Identificação de Cada Estratégia.
Capítulo IV. INSTRUMENTOS FINANCEIROS PARA A DESCENTRALIZAÇÃO EM SAÚDE.
Instrumentos Financeiros da Descentralização Orçamento Global.
Transferências Automticas Transferências Negociadas Pagamento por Prestação
PARTE 2.ESTUDO DO CASO BRASILEIRO 92 Capítulo V. FORMlJLAÇÃO DA DESCENTRALIZAÇÃO DOS
SERViÇOS DE SAUDE NO BRASIL 93
Os Instrumentos de Repasse Financeiro Para Descentralização
dos Serviços de Saúde no Brasil. 93
O Plano do Conselho Consultivo de Administração de Saúde
Previdenciária (CONASP). 94
Os Convênios das Ações Integradas de Saúde (AIS). 100
Os Convênios dos Sistemas Unificados e Descentralizados de
Saúde ( S U D S ) . , 103
O Marco jurídico do Sistema Unico de Saúde (~US). 107
Os Novos Instrumentos no Marco do Sistema Unico de Saúde
(SUS). 110
Autorizações de Internação Hospitalar (AIH). 110
Unidade de Cobertura Ambulatorial (UCA). 114
Outros Instrumentos de Repasse. 116
As Redefinições da Estratégia Descentralizadora Introduzidas na
NOB 01/93. 117
Instrumentos Financieros Utilizados em Cada Estratégia. 120
Capítulo V.IMPLEMENTAÇÃO DAS ESTRATÉGIAS DESCENTRALlZADORAS NO BRASIL
Análise dos Condicionantes Gerais da Eficácia das Políticas 123
Descentralizadoras no Brasil 124
Coordenação das Fontes de Financiamento 125
Condicionantes da Eficácia da Desconcentração 130
A Passagem da desconcentração para a Devolução 135
a) Fortalecimento das Finanças Locais. 139
b) Participação dos Gestores Locais no Processo Orçamentario 143
c) Gradualidade na Descentralização dos Recursos 151
d) Estabilidade das Finanças Locais. 152
e) Vontade política de assumir os encargos com saúde por parte
dos governos locais. 163
f) Expanssão da Capacidade Instalada. 172
g) Eqüidade na Distribuição dos Recursos. 177
A Delegação Como Compra-Venda de Serviços. 180
a) Adequação do Fluxo de Recursos 180
b) Assistencia Técnica 190
c) Normatização e Controle de Gestão 190
Capítulo VI. CONCLUSÕES
Capítulo VII. BIBLIOGRAFIA
192
LISTA DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1. Descentralização Das Funções Nos Diferentes Tipos De Sistemas 58 Quadro 2. Principais Diferenças Entre a Delegação e a Devolução 72 Quadro 3. Contribuição de Cada Estratégia Para a Superação dos Deticits 76 Quadro 4. Condicionantes da Eficacia em Cada Modelo Descentralizador 77 Quadro 5. Adequação de Cada Instrumento Financeiro aos Modelos Descentralizadores 91 Quadro 7. Cumprimiento dos Condicionantes de Cada Tipo de Descentralização no caso 201 Brasileiro
Quadro 6. Caraterísticas das Políticas de Descentralização Sanitaria Formuladas No Brasil 122 Tabela 1.EVOLUÇÃO REAL DAS TRANSFERÊNCIAS DA UNIÃO A OUTROS NIVEIS DE 133 GOVERNO
Tabela 2.DISTRIBUIÇÃO DA ARRECADAÇÃO PROPRIA E DA DISPOSiÇÃO FINAL DA 142 RECEITA TRIBUTARIA POR NIVEL DE GOVERNO
Tabela 3.COMPARAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DA DOTAÇÃO INICIAL E FINAL DESTINADA 145
À FUNÇÃO SAÚDE NO ESTADO DE RIO DE JANEIRO
Tabela 4.COMPARAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DA DOTAÇÃO INICIAL COM 146 A DOTAÇÃO FINAL DA SES-RJ
Tabela 5.BRASIL.DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DAS DESPESAS DE ASSISTÊNCIA 151 MÊDICA DO INAMPS POR TIPO DE PRESTADOR
Tabela 6.COMPOSIÇÃO PERCENTUAL DA RECEITA ARRECADADA DO ESTADO DE RIO 154 DE JANEIRO SEGUNDO FONTES
Tabela 7.TOTAL DA RECEITA ARRECADADA DO ESTADO DE RIO DE JANEIRO 156 Tabela 8. EVOLUÇÃO DA RECEITA ARRECADADA DO ESTADO DE RIO DE JANEIRO 157 Tabela 9. EVOLUÇÃO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS NO ESTADO DE RIO DE JANEIRO 158 Tabela 10.TAXA GEOMETRICA DE CRESCIMENTO DA ARRECADAÇÃO DO ICMIICMS, 161 SEGUNDO ESTADOS SELECCIONADOS E BRASIL.
Tabela 11.BRASIL. RECEITAS PROPIAS E ARRECADAÇÃO DISPONíVEL DOS 163 MUNICIPIOS
Tabela 12.BRASIL. ESTIMATIVA DA COMPOSiÇÃO PERCENTAUL DO GASTO ESTADUAL 164 E MUNICIPAL COM PROGRAMAS SOCIAIS
Tabela 13.BRASIL. GASTO PÚBLICO EM SAÚDE CONSOLIDADO NAS TRÉS ESFERAS DE 166 GOVERNO
Tabela 14.BRASIL. DISTRIBUiÇÃO PERCENTUAL DO GASTO TOTAL EM SAÚDE POR 166 ESFERA DE COMPETENCIA
Tabela 15. EVOLUÇÃO DA DOTAÇÃO ORÇAMENTARIA DOS ESTADOS E DOS 167 MUNICPIOS NA FUNÇÃO SAÚDE
Tabela 16. EVOLUÇÃO DA DESPESA REALIZADA PELA SECRETARIA ESTADUAL DE 169 SAÚDE DO RIO DE JANEIRO
Tabela 17. EVOLUÇÃO DOS RECURSOS PROPIOS DO ESTADO DE RIO DE JANEIRO E 170 DA SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE
Tabela 18. EVOLUÇÃO DOS RECURSOS PROPIOS DO ESTADO DE RIO DE JANEIRO E 170 DA SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE
Tabela 19.BRASIL.EVOLUÇÃO DO NUMERO DE ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE 173 Tabela 20. BRASIL.EVOLUÇÃO DO NUMERO DE ESTABELECIMENTOS DE 173 SAÚDE(íNDICE)
Tabela 21. BRASIL.COMPOSIÇÃO PERCENTUAL DA DISTRIBUiÇÃO DOS 174 ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE
Tabela 22. BRASIL.EVOLUÇÃO DO NUMERO DE LEITOS PARA INTERNAÇÃO POR 176 CLASSIFICAÇÃO DA ENTIDADE MANETENEDORA
'rabela 23. BRASIL.COMPOSIÇÃO PERCENTUAL DOS LEITOS PARA INTERNAÇÃO 176 SEGUNDO MODALIDADE DA ENTIDADE MANETENEDORA
Tabela 24 .. BRASIL.EVOLUÇÃO DO NUMERO DE LEITOS PARA INTERNAÇÃO POR 177 CLASSIFICAÇÃO DA ENTIDADE MANTENEDORA(íNDICE)
Tabela 25.AVALlAÇÃO DA CAPACIDADE RDISTRIBUTIVA NA DISTRIBUiÇÃO DOS 178 RECURSOS PARA SAÚDE
RESUMO
A eficácia dos processos de descentralização sanitária está
fortemente condicionada por fatores econômico-financeiros. Na
primeira parte deste trabalho se analisa uma classificação dos
processos de descentralização de serviços de saúde que distingue 4
tipos ideais. Para cada um deles são identificados os intrumentos de
repasse de recursos mais adequados, assím como os
condicionantes financeiros da sua eficácia.
Na segunda parte o estudo é focalizado na experiência
brasileira da década de 80. São analisadas as políticas de
descentralização sanitária identificándo-se o tipo ideal ao que se
aproximam os instrumentos financeiros que foram adotados na sua
formulação. Posteriormente, é examinada a implementação das
políticas desentralizadoras avaliándo-se a medida em que cada uma
cumpríu com os condicionantes correspondentes.
RESUMEN
La eficácia de los procesos de descentralización sanitária
está fuertemente condicionada por factores económico-financieros.
En la primer parte de este trabajo se analiza una c1asificación de los
procesos de descentralización de servicios de salud que distingue 4
para transferência de recursos mas adecuados, así como los
condicionantes financieros de su eficácia.
La segunda parte dei estudio está focalizada en la
experiencia brasilena de la década dei 80. Son analizadas las
políticas de descentralización sanitária identificándose el tipo ideal ai
que se aproximan los instrumentos financieros que fueron adoptados
en su formulación. Posteriormente , se examina la implementación
de las políticas desentralizadoras evaluándose la medida en que
cada una cumplio com los condicionantes correspondentes.
ABSTRACT
This paper analyses the financiai restraints on the
decentralization of health services. In part One we go through
different types of decentralization and their economic features. And
in Part Two the special case of the brazilian experience is
Apresentação
O trabalho divide-se em duas partes, procurando avançar
desde o marco mais geral da análise das políticas
descentralizadoras (parte 1) até os aspectos mais específicos do
financiamento dessas políticas nos serviços de saúde
implementadas no caso brasileiro (parte 2). A primeira parte
desenvolve-se do capítulo 11 ao IV e a segunda do capítulo VIII.
No capítulo 11 é examinado o debate sobre a
descentralização, aplicando a técnica de oposição para a construção
dos argumentos, utilizando-se o seguinte critério de análise: a
identificação dos pontos de proximidade ou convergência entre os
autores que escreveram sobre o tema, e também daqueles onde se
intensifica o debate ou surgem divergências. Através desse método
foram identificados diferentes desenhos de políticas
descentralizadoras.
No capítulo 111 é abordada a especificidade do setor saúde.
Partindo de uma difundida tipologia de modelos de descentralização
dos serviços de saúde são formulados modelos alternativos, que se
apresentam como distorções dos modelos ideais puros. Para cada
caso são identificadas as características financeiras específicas e
formulados os condicionantes financeiros para a eficácia do modelo
No capítulo IV são apresentados os diferentes instrumentos
financeiros que permitem o repasse de recursos do nível central às
unidades descentralizadas. Ainda neste capítulo examina-se a
adequação de cada instrumento aos diferentes modelos de
descentralização.
A partir do capítulo V começa a segunda parte, onde o estudo
é orientado à realidade brasileira. Nele são descritas as políticas, ou estratégias, formuladas para atingir a descentralização financeira
dos serviços de saúde no Brasil durante a década de 80.
O capítulo VI examina a implementação das políticas para a
descentralização financeira dos serviços de saúde no Brasil,
procurando analizar a coerência entre esta implementação e a
formulação de cada uma das estratégias (expostas no capítulo
anterior). Para a análise dos dados procurou-se utilizar informação
referente a todos os níveis de esfera de governo (União, Estados e
municípios). Na maioría dos casos, no entanto, foi impossível obter
dados de fontes secundárias. Por esse motivo, em alguns casos, a
análise foi feita de forma indireta, sendo estudado um Estado em
particular para compreender a dinâmica dos sistemas de saúde, ou
abordando um tema através de outros relacionados com ele.
Outra limitação do estudo reside no fato de que foi utilizada
uma série histórica muito reduzida para análise dos dados que
descentralização um processo ainda em desenvolvimento, as
conclusões deste estudo não podem ser consideradas como
definitivas. Na análise das últimas etapas do processo
descentralizador, que se iniciam no começo da presente década, só
foram utilizados dados de 1991. Vale ressaltar que ha restrições que
são decorrentes da necessidade de recortar o caso estudado e
ajustar aos recursos disponíveis. Isto não invalida o aporte deste
estudo em relação à caracterização e comparação dos modelos
descentralizadores e suas limitações.
As tabelas foram uniformizadas, quando os. dados são
apresentados em valores absolutos a unidade monetária que se
escolheu é o dólar americano médio de 1988.
PARTE 1
Capítulo I.
INTRODUÇÃO
Dois movimentos têm sido observados manifestado de forma
acentuada nos últimos anos na esfera das políticas públicas: o
deslocamento do poder desde os níveis centrais à periferia dos
sistemas e o deslocamento da organização e produção de serviços
desde o setor público ao setor privado. O âmbito sanitário não é uma
exceção e vários países experimentaram no transcurso da década
de 80 processos descentralizadores e privatizadores.
Porém, os avanços nesse sentido não se deram de maneira
uniforme. Diversas políticas foram formuladas e implementadas e o
ritmo dos processos foi variável: en alguns casos, acelerado, em
outros avançou devagar ou fugiu dos caminhos traçados
inicialmente e, por fim, casos em que simplesmente estancou. Esses
avanços e retrocessos, essas marchas e contramarchas, foram uma
das características da reformulação do sistema de saúde no Brasil,
que vem ocorrendo desde os começos da década de 80.
Objetivo do Estudo
O presente trabalho constitui um estudo de caso de uma política
pública particular: a descentralização dos serviços de saúde no
Brasil, a qual pode ser catalogada como uma política de reforma do
Determinados recortes foram necessários por causa da
especificidade do caso brasileiro e para definir a metodologia deste
estudo. No nível heurístico, o trabalho propõe fundamentalmente
duas questões. Por um lado, a identificação dos condicionantes da
política pública em questão. Por outro, a análise das estratégias
associadas à mesma.
Os analistas das políticas públicas têm desenvolvido diversos e
vastos modelos para a avaliação das mesmas. O presente trabalho
não pretende aumentar esta lista de modelos mas sim conciliar, na
medida do possível, diversas categorias analíticas, utilizadas e
desenvolvidas por outros autores, no estudo de um caso concreto.
O estudo dos condicionantes, tal como é apresentado aqui,
procura enquadrar-se dentro do que tradicionalmente é denominado
fase de formulação, enquanto que o exame das estratégias
descentralizadoras está mais relacionado com as fses de
implementação e avaliação das políticas públicas. O exame destes
condicionantes privilegia a análise da coerência que se estabelece
entre as diferentes instâncias decisórias do processo. No estudo das
estratégias procura-se identificar basicamente qual foi o impacto
deste processo sobre a realidade setorial.
Testa (1989:85) argumenta que a relação de coerência é
expressada nas Ciências Sociais de duas maneiras: determinação e
limites dentro dos quais deve ocorrer um fenômeno. Pode ser
definida como a fixação, por um fenômeno, das condições para a
eficácia de outro fenômeno. Sua lógica não é estritamente causal, quer dizer, não se afirma que
• se A, então
a,
senão que:• se A, então fica determinado que para que
a
seja eficazdevem cumprir-se as condições C, O, E que são então as outras
determinantes que posibilitam a realização de
a.
O condicionamento, por sua vez, é uma força negativa que fixa os
limites fora dos quais não pode ocorrer um fenômeno. Dito de outra
forma:
• se
a,
A não pode realizar X, Y, Z.Ao analisar os determinantes nos referimos a um conjunto de
fatores anteriores ao próprio processo descentralizador, ou seja
fatores ligados ora à estrutura econômica, ora à superestrutura jurídico-político-ideológica, que viabilizam a existência desta política,
isto é, sua inclusão na agenda governamental. O presente trabalho
não examina as causas da descentralização e se limita a analisar as
formas em que a mesma se dá no âmbito sanitário brasileiro.
Ao analisar os condicionantes questionamos sobre os fatores que
fazem com que o processo descentralizador seja de uma
determinada forma e não de outra. É aqui que cabe tentar enquadrar
descentralizadores e avaliar suas possíveis desviações dos
casos-padrão.
A análise das estratégias descentralizadoras é feita através das
formas de implementação desta política. Considerando que política
é uma proposta acerca da distribuição do poder e que, como será
demonstrado mais adiante, descentralização significa um efetivo
deslocamento do poder; é fundamental tentar identificar quais foram
os propósitos perseguidos, que atores participaram no processo e
quais foram e são os instrumentos utilizados para facilitar essa
redistribuição do poder e, por fim, quais foram os obstáculos e
distorções que apareceram no caminho.
Em síntese, o presente trabalho se propõe a identificar os
condicionantes do processo descentralizador e analisar a eficácia
das estratégias descentralizadoras adotadas até o momento atual.
Análise Financeira da Descentralização dos Serviços de Saúde
O estudo da política pública em questão focaliza-se nos seus
aspectos financeiros. Sem dúvida estes não são suficientes para dar
conta da totalidade do processo descentralizador, o qual configura
um fenômeno muito complexo. Porém, a dimensão financeira
expressa a materialização do deslocamento do poder, se constitui
no ponto nevrálgico do processo descentralizador. Como afirma um
documento preparado para o treinamento dos gestores locais de
"Como grande parte dos recursos para atender às necessidades de saúde dos municípios advém das transferências, o padrão de financiamento e a forma de operar essa política por parte do governo federal serão sempre um ponto crucial na . saúde' do SUS (Sistema Ún5c6s de Saúde), tal como concebido na Constituição. Na verdade, o esquema de financiamento constitui-se num bom indicador para medir a distância entre intenção e gesto de descentralizar a saúde do País." (IBAM/UNICEF/COSEMS-RJ, 1993, anexo 20)
O aspecto mais saliente do contexto geral onde surge o processo
descentralizador na área de saúde é a situação de escassez de
recursos., e a importância das dimensões financeiras nesse
processo aumenta de maneira proporcional à crise fiscal.
Parte-se aqui do pressuposto de que o contexto de crise fiscal
têm-se configurado como o principal determinante das políticas de
reforma no setor público e a capacidade das mesmas para esquivar
as restrições que o déficit público impõe constitui o principal fator
condicionante do seu sucesso.
Porém, a referência à crise e ao déficit fiscal não significa a
redução das políticas de reforma do setor público aos seus aspectos
estritamente econômicos. Segundo J.Habermas (1975), a crise
financeira do Estado deixou de ser simplesmente uma fase do ciclo
econômico para consolidar-se como um pano de fundo estrutural.
Aquele longo ciclo de crises, de conseqüências sociais cada vez
mais convulsivas, foi substituído por uma inflação desenfreada e
uma crise permanente nas finanças públicas. Este déficit resulta do
fato de que o fisco deve sustentar os custos comuns de uma
"Como grande parte dos recursos para atender às necessidades de saúde dos municípios advém das transferências, o padrão de financiamento e a forma de operar essa política por parte do governo federal serão sempre um ponto crucial na 'saúde' do SUS (Sistema Ún5c6s de Saúde), tal como concebido na Constituição. Na verdade, o esquema de financiamento constitui-se num bom indicador para medir a distância entre intenção e
gesto de descentralizar a saúde do País."
(IBAM/UNICEF/COSEMS-RJ, 1993, anexo 20)
O aspecto mais saliente do contexto geral onde surge o processo
descentralizador na área de saúde é a situação de escassez de
recursos., e a importância das dimensões financeiras nesse
processo aumenta de maneira proporcional à crise fiscal.
Parte-se aqui do pressuposto de que o contexto de crise fiscal
têm-se configurado como o principal determinante das políticas de
reforma no setor público e a capacidade das mesmas para esquivar
as restrições que o déficit público impõe constitui o principal fator
condicionante do seu sucesso.
Porém, a referência à crise e ao déficit fiscal não significa a
redução das políticas de reforma do setor público aos seus aspectos
estritamente econômicos. Segundo J.Habermas (1975), a crise
financeira do Estado deixou de ser simplesmente uma fase do ciclo
econômico para consolidar-se como um pano de fundo estrutural.
Aquele longo ciclo de crises, de conseqüências sociais cada vez
mais convulsivas, foi substituído por uma inflação desenfreada e
uma crise permanente nas finanças públicas. Este déficit resulta do
fato de que o fisco deve sustentar os custos comuns de uma
estratégias de mercado imperialistas, e os que surgem da demanda
de bens de uso improdutivos (armamento e carreira espacial); 2) os
custos das obras de infraestrutura diretamente vinculadas à
produção (sistemas de comunicações, progresso técnico-científico,
formação profissional, etc); 3) os custos do consumo social, que
afetam indiretamente à produção (habitações, estradas, saúde
pública, seguridade social, educação, etc); 4) os custos da
assistência social (em particular aquela prestada aos
desempregados); 5) a todos estes, finalmente, acrescentaram-se os
custos externos da deteriorização ambiental gerada pela atividade
produtiva.
Para financiar todos estes custos, o Estado precisa recorrer aos
impostos, defrontando-se com um duplo desafio: : o primeiro desafio
e que deve arrecadar a massa tributária necessária, em prejuízo dos
ganhos e rendas privadas correndo o risco de estar estimulando
efeitos inflacionários. Simultaneamente, deve alocar estes recursos
com racionalidade suficiente para evitar as perturbações de um
crescimento atrelado à crise (particularmente no que tange à
concentração da renda e à oligopolização dos mercados). O
segundo desafio refere-se ao caráter seletivo da arrecadação dos
impostos, o modelo de prioridades adotado para sua aplicação e os
próprios rendimentos administrativos devem ser definidos de modo a
satisfazer a crescente necessidade de legitimidade. Neste aspecto,
tributação, quanto do caráter regressivo ou progressivo dos tributos
e, especialmente, os modelos para alocação de recursos públicos.
Ainda segundo Habermas, quando o Estado fracassa na primeira
destas tarefas, surge um déficit de racionalidade administrativa e,
quando fracassa na segunda, origina-se um déficit de legitimidade.
Aqueles países que introduziram tardiamente o capitalismo e
ainda não fazem parte do denominado mundo desenvolvido,
compartilhariam as crises dos países desenvolvidos, sem ter
atingido os seus parâmetros de qualidade de vida.
Num intento desesperado por combater ambos déficits, os países
que ingressaram tardiamente no capitalismo começaram a promover
reformas nos setores onde existia uma tradição e um padrão de
intervenção estatal. Em alguns casos, as reformas causaram
autênticas mutações institucionais, como por exemplo, a Reforma da
Seguridade Social no Chile (1978). Em outros, os governos
procuraram, de manera oportunista, propro políticas públicas
capazes de produzir efeitos legitimadores imediatos, mas que não
produziam mudanças profundas, seja por causa de distorções na
sua implementação seja pela descontinuidade das mesmas.
Descentralização Como Alternativa Para Superar o Déficit
A descentralização representa uma alternativa oportuna para a
modo a satisfazer a necessidade de se obter maiores níveis de
eficiência na administração dos serviços públicos como por
exemplo, evitar a duplicação de esforços através da unificação do
comando na esfera local. Também pode ser desenvolvida como uma
forma de aproximar as esferas decisórias aos cidadãos, fomentando
uma maior identidade de interesses entre usuários e
administradores. No caso brasileiro, esta alternativa é apresentada
como uma tendência contrária a toda esta dinâmica institucional que
levou o país a uma situação crítica.
O estudo da descentralização desde seus aspectos financeiros
implica no reconhecimento de como cada instrumento específico
das políticas descentralizadoras têm contribuído na superação da
crise de racionalidade e de legitimidade. O presente trabalho parte
do pressuposto que, desde a ótica do financiamento, tanto a
coerência de uma política pública quanto o seu impacto podem ser
avaliados identificando-se como estes têm contribuído à superação
de ambos déficits.
A Problemática Específica do Financiamento à Saúde
A análise financeira dos processos descentralizadores implica em
considerar as diferentes dimensões da problemática específica do
financiamento da saúde e a forma em que elas são articuladas
A problemática específica do financiamento à saúde pode ser
sintetizada através de três questões fundamentais:
1. Problemática das fontes: como obter recursos para financiar
as ações de saúde?
2. Problemática da alocação de recursos: quais critérios devem
ser utilizados para calcular os valores a serem repassados a
estados e municípios?
3. Problemática das modalidades de pagamento: quais
instrumentos são mais apropriados para estabelecer os fluxos de
pagamento dos serviços prestados pelos estabelecimentos públicos
e privados contratados?
O desenvolvimento do processo descentralizador exige uma
adequada articulação destas três dimensões.
A primeira das problemáticas está diretamente condicionada
pelos déficits de racionalidade e legitimidade. No que diz respeito à
racionalidade, uma das questões basicas é a estabilidade das fontes
e sua capacidade de garantir o fluxo de recursos necessários. Em
quanto à legitimidade, a preocupação basica é quanto à eqüidade
praticada na captação dos recursos (níveis de progressividade ou
regressividade das fontes).
A segunda é a problemática específica da descentralização.
Alguns autores, como por exemplo Vieira (1971), concordam que o
o peso do gasto local sobre o gasto total no país. Nesse sentido,
pode-se concluir que os fluxos de recursos refletem o nível de
desenvolvimento do processo descentralizador.
No caso brasileiro, a terceira problemática (definição dos meios
de pagamento) tem sido confundida com a segunda a partir da
implementação, desde 1991, de uma sistemática unificada de
pagamento para prestadores públicos e privados (AIH e UCA), que
por sua vez funciona como mecanismo de repasse às esferas locais.
Porém, além do volume de dinheiro mobilizado, a problemática
da descentralização financeira da saúde inclui o estudo das
modalidades de repasse e de como elas são equacionadas no
contexto institucional. Aqui se pode observar como são tratadas por
cada política específica as questões do déficit de racionalidade e
legitimidade. No caso brasileiro os instrumentos propostos para a
descentralização dos recursos podem ser classificados em três
categorias: transferências negociadas (com base em acordos
políticos), transferências automáticas (com base em critérios
objetivos para calcular a partilha dos recursos) ou repasse através
dos meios de pagamento por serviços produzidos (repasses guiados
pela lógica da produção de serviços).
A operacionalização do processo descentralizador através de
cada uma destas modalidades de instrumentos financeiros para
descentralizar a gestão configura cenários diferentes, privilegiando
exemplo, permitem uma maior eficácia na descentralização quando
esta es concebida como um instrumento para garantir a eqüidade
(déficit de legitimidade), facilitando a transparência e o processo de
avaliação. Por sua vez, o repasse através dos meios de pagamento
por serviços prestados apresenta vantagens quando o objetivo é
Capítulo 11
AS ESTRATÉGIAS DESCENTRALlZADORAS
Os processos descentralizadores establecem a transferência de
autoridade no planejamento e na tomada de decisões. No setor
público em particular, freqüentemente tomaram a forma de repasse
desse poder decisório do nível nacional aos níveis subnacionais.
Mas a existência de diversas experiências descentralizadoras
demonstra que estes processos permitem avançar na construção
de realidades completamente diferentes.
Como conceito, o termo descentralização vemse posicionando
desde há algum tempo, nos primeiros lugares na - "parada" das
palavras mais freqüentemente usadas pelos políticos,
administradores e cientistas. O discurso descentralizador tem se
expandido com maior rapidez que os próprios processos de
deslocamento do poder. Repentinamente, a palavra parece ter
virado moda. Distintos atores, grupos e setores aplicaram-na em
conjunturas diferentes e na perseguição de fins diversos. Assim, a
palavra transformou-se num autêntico "camaleão político",
adquirindo uma funcionalidade particular em cada caso, de acordo
com as caraterísticas de seus usuários, dos momentos e dos
lugares de sua enunciação.
A partir de uma leitura paretiana da história, poderia concluir-se
leões, reclamaram a necessidade de um ou de outro polo da tensão
centalização-descentralização. Isto sugere ainda que também seria
possível vislumbrar um uso "gatopardista" da palavra
descentralização.
Desta maneira, pode produzir-se um hiato entre o contexto de
enunciação do processo descentralizador e a forma em que o
mesmo é concebido na instância de formulação da política. Ou seja,
a particular popularidade do termo permitiria que o conceito seja
utilizado com fins de legitimidade, mas sendo incluído na formulação
das políticas públicas com objetivos menos populares. Por sua vez,
seria também possível registrar discrepâncias entre a forma em que
a descentralização é formulada e aquela em que é implementada.
Este capítulo examina o conceito de descentralização,
enfatizando os usos diferenciais que vêm sendo dados ao mesmo
na formulação de políticas governamentais. Num primeiro momento
são analisados particularmente os determinantes da inclusão das
políticas descentralizadoras nas agendas das políticas públicas.
Posteriormente se tenta distinguir algumas formulações de
processos descentralizadores, de acordo com os objetivos ou fins
que os mesmos perseguem. Por último, é examinada maneira como
cada estratégia contribui para a resolução dos déficits de
Inclusão da Descentralização na Agenda das Políticas Governamentais
A tensão centralização-descentralização esta presente no debate
sobre os modelos de desenvolvimento, de modo que diferentes
estratégias econômicas tem recorrido às diversas formas da divisão
espacial das atribuições e encargos governamentais.
Mas, nem sempre a descentralização foi carregada de
conotações positivas. A grosso modo, os governos oscilaram entre
os que privilegiaram a "eficiência" e os que privilegiaram a "eficácia"
na alocação de recursos. Coraggio (1969) chama a estes bandos de
"eficientistas"e "descentralistas".
Para os primeiros, a estrutura espacial deve ser aquela que
permita um maior crescimento do país. Toda a consideração da
descentralização per se, ou de políticas destinadas a desenvolver
regiões atrasadas, implicaría numa perda para a nação. Essa
postura sustenta-se a partir de, no mínimo, duas suposições:
1. O fato de que a atividade tende a concentrar-se nas
metrópoles demostra que tais aglomerações estão em rendimentos
crescentes. Portanto, não corresponde a eles provar sua tese, mas
aos descentralistas provar que os centros estão em rendimentos
decrescentes.
2. Que esse produto social (maximizado por causa da
centralização) favorece a todas as regiões ou, ao menos, não
Em síntese, os eficientistas recorrem à centralização por encontrar-lhe uma funcionalidade econômica que, na hora da
alocação dos recursos, deveria ser privilegiada.
Em contrapartida, os descentralistas valoram outras funções na
distribuição espacial e governamental do poder, tais como a de
favorecer a administração e facilitar o processo político. O principal
critério que guiaria a alocação de recursos passa a ser a eqüidade.
As teses descentralistas começam a ser defendidas mais
enfáticamente por organismos internacionais como a ONU, o World
Bank e a OPAS no inicio da década de 80. Talvez nenhuma
publicação tenha sido mais paradigmática nesse sentido que a de
G.Shabbir Cheema e Oennis A. Rondinelli, titulada Decenfralizafion
and Developmenf (1983). Nesse trabalho, os autores enunciam as
diversas funções da descentralização do poder, tais como: diminuir
os efeitos negativos da burocracia; respeitar prioridades e
necessidades locais, facilitar uma maior representatividade na
formulação de decisões e uma maior eqüidade na alocação dos
recursos; aumentar a legitimidade e estabilidade institucional; etc ...
Contudo, o mais relevante dos argumentos enunciados é a
reconsideração da funcionalidade econômica da descentralização,
por ..
As teses descentralistas só começam a tomar importância
quando é enfatizada essa função econômica. Se, como coloca
Habermas (1980), a crise fiscal e de governabilidade dos Estados
que ingressaram tardiamente no capitalismo pode ser atribuída aos
déficits de legitimidade e racionalidade, a mudança de rumo no
policy making não responde só à necessidade de ser considerada a
crise de legitimidade mas, também, à reconsideração do valor
econômico da descentralização.
A discussão de uma nova ordem econômica internacional coloca
a qualidade dos bens produzidos como um fator determinante na
estratificação do mercado. A partir de então começam a ser
analizadas com maior ênfase as deseconomias da produção em
escala. Navarro (1992: 79) observa que dita tendência centrípeta faz
parte de uma estratégia de "racionalizações administrativas e
gerenciais", em resposta às rebeliões dos trabalhadores. O seja,
quando a análise das condições da produção é ampliada, o
argumento empírico de que as aglomerações estão em rendimentos
crescentes começa a debilitar-se.
Tanto na análise quanto na praxis política têm-se aplicado
diferentes usos ao conceito de descentralização. O termo ganha
uma funcionalidade particular em cada caso, de acordo com as
caraterísticas de seus usuários. Os diferentes atores utilizam o
conceito adaptando-lhe a seus interesses. No entanto, encontram-se
diferentes autores. Algumas destas caraterísticas comuns são as
seguintes:
a) sua aplicação sugere pensar no fortalecimento da esfera
local;
b) o problema da descentralização é de caráter político, a
implementação eficaz e eficiente do mesmo é de caráter
administrativo;
c) o processo em si não é possível de se realizar de forma
isolada e só é viável dentro do marco de um processo geral de
reforma;
d) a conceitualização dicotômica centralização versus
descentralização não tem poder explicativo sobre os dados
empíricos.
Uma revisão crítica da literatura sobre descentralização requer,
necessariamente, uma classificação dos conceitos segundo alguma
taxonomia pré-estabelecida. Formula-se, então, como princípio de
análise, que a descentralização tem status de meio (tático e
estratégico) para atingir determinados fins, que são anteriores e
superiores a ela mesma. Portanto, a definição em uso será uma
função resultante da combinação dos fins e valores com os quais
seja concebida. De fato, têm-se articulado definições acordes com o
surgimento da universalidade na cobertura dos serviços públicos e
também outras, baseadas na capacidade individual de cada cidadão
ferramenta para a expansão e intensificação da democracia e
também como mecanismo de controle e dominação. Da mesma
forma, há definições que são compatíveis com a estatização dos
serviços e outras centradas na transferência dos mesmos ao setor
privado. Na sua aplicação podese perseguir tanto a eqüidade como
manter as diferenças no acesso aos serviços que existem até o
presente.
Nos pontos a seguir são examinados os diversos usos do
conceito na formulação das diferentes estratégias
descentralizadoras.
Desconcentração ou Descentralização Administrativa
A primeira questão basica no estudo do conceito é a distinção
entre descentralização e desconcentração. Embora muitos autores
concordem com a distinção "formal" destes termos, alguns os
aplicam "operacionalmente" como sinônimos.
Descentralização implica redistribuição do poder, uma
transferência na tomada das decisões. É, portanto, interferir nos
interesses dos grupos de poder, enquanto desconcentração é a
delegação de competência sem o deslocamento do poder decisório.
No contraste de ambos termos é preciso ter claro que, embora
funcionem na pratica como ferramentas legítimas para transformar a
da implementação de uma ou de outra. É por isso que deve ser dada ênfase às seguintes idéias:
• O uso indistinto de ambos conceitos, longe de representar
uma "confusão", é a articulação consciente de um determinado uso
da palavra como meio para atingir fins precisos e manifestos.
• O debate teórico podería ser esquematizado a partir da
seguinte questão: o que separa a desconcentração da
descentralização são diferenças de grau ou de qualidade? Ou, em
outros termos: qual é a relação que se estabelece entre ambas
categorias?
Há uma concepção restrita da descentralização, aquela que a
equipara com a desconcentração, considerando a existência de uma
diferença de grau entre as duas. A sua aplicação opera na praxis
política uma restrição do conflito ao seus componentes
administrativos. Nesse caso, embora seja admitido o caráter político
da descentralização, seu processo de implementação é visto como
um conjunto de procedimentos funcionais para a racionalização,
modernização e reprodução ampliada do sistema a modificar.
Esta acepção não é contrária ao sistema democrático e até
postula uma relação positiva entre democracia e descentralização,
baseada no argumento de que, uma vez instaurado o processo de
descentralização, estaria garantida a gestão democrática do
operar com uma visão tecnocrática, que ignora a necessária
mudança na correlação de forças que o movimento descentralizador
deve gerar isto. Quer dizer que esta concepção omite a existência
de projetos hegemônicos no poder e a necessidade de gestar
alternativas de mudança. Uma leitura deste tipo corre o risco de não
chegar a distinguir a natureza dos processos políticos que dão
origem à mudança.
Um estudo comparativo dos níveis de descentralização em
quarenta e cinco países, chega a conclusões que ilustram os pontos
relevantes na definição do problema segundo esta concepção. A
análise mostra que o grau de descentralização em um país depende
principalmente do desenvolvimento de seus recursos econômicos e
tecnológicos e não dos elementos e das caraterísticas da
organização constitucional (Vieira, 1971).
Uma segunda estratégia de descentralização é a de
desconcentração como projeto pedagógico, aquela que vê na
desconcentração as condições de facilitar o processo de
descentralização. Isto significa o reconhecimento da existência de
diferenças qualitativas entre as duas categorias, mas sem que
sejam postos como termos antagônicos. A desconcentração seria
então uma condição necessária, embora não suficiente, para atingir
os níveis desejados de descentralização na tomada de decisões.
Assim, é possível pensar que uma medida tanto pode ser
velho sistema, como substituí-Ia, dando-lhe uma aparência
renovadora, mas que encobre o continuísmo do sistema social
dominante.
Descentral ização Isolacion ista.
A condição basica da existência da autoridade local é a
autonomia assim como a soberania é o componente essencial da
autoridade nacional. É no surgimento de novas autonomias que reside a redistribuição do poder. No entanto, na distinção da
autonomia também aparece a tensão entre as variações qualitativas
ou quantitativas. Assim, o enfoque que tenta medir as melhoras na
descentralização a partir de um acréscimo na capacidade decisória
local, pode não discriminar a origem do mesmo. Em outros termos,
corre-se o risco de avaliar do mesmo modo uma pratica
transformadora, como a da ação social racional, de acordo a fins
que têm como atores principais a confluência entre setores
populares e os grupos progressistas, e as conseqüências de um
movimento reacionário que equipara descentralização com
feudalismo e promove ações com acordo a valores tradicionais que
conduzem ao coronelismo.
Portanto, um dos principais pontos que marcam a diferença na
questão da autonomia é a distinção da origem da mesma. Ora
unidades locais (Estados ou municípios). Quer dizer, seja originada
numa pratica cooperativa ou isolacionista.
Descentralização Cooperativa
Por outro lado, havendo sido registrado o consenso com que
conta a tese da descentralização como um processo circunscrito
num projeto maior, o nexo entre descentralização e autonomia não
pode ser estabelecido de forma rígida. Antes é preciso levar em
conta que todos os termos da discussão precisam ser redefinidos
em cada instância do processo político. Assim, como coloca Sorja:
" ( ... ) o velho e importante debate sobre autonomia política ou administrativa e sobre descentralização ou desconcentração não pode colocar-se hoje em termos antagônicos."(Sorja. 1984 :13)
O reconhecimento do caráter político do processo
descentralizador significa a representação da concretização do
mesmo como um resultado de uma luta de vários rounds. Um jogo
onde cada time pratica avanços e retrocessos segundo o momento.
É por isso que se trata de ações racionais, de acordo com fins, e
que necessitam de uma permanente revisão e redefinição.
Por exemplo, se em um primeiro momento era importante antepor
barreiras ao poder do Estado, para garantir a invulnerabilidade de
determinadas instâncias da sociedade civil (particularmente a
propriedade privada), este é um problema que logo passa a um
Welfare State, antes que colocar freios ao Estado é necessário que
este possa dar conta dos seus novos deveres sociais.
Em relação aos sistemas locais, quanto mais estiverem abertos à
participação da cidadania mais estarão aptos a estabelecer um
duplo vínculo com o nível central: por um lado reclamam autonomia
e, por outro, estão comprometidos com seus objetivos comuns:
"As novas reivindicações descentralizadoras não se baseiam
tanto numa concepção "garantista" senão que numa
cooperadora. O "garantis mo" coloca ênfase na existência de um campo irredutível de competências em mãos do poder local ou ente descentralizado, onde não podia entrar a administração superior. Hoje a interdependência dos distintos setores e as funções da administração pública conduz a generalizar os princípios do "federalismo cooperativo" a todo tipo de relações entre entes territoriais. O ente descentralizado espera não somente ter competências e funções próprias e decisórias, mas
também participar no processo de elaboração, decisão e
execução de programas, normas mais gerais que, mais tarde, condicionarão a sua atuação, podendo reduzir sua autonomia real a quase nada." (Sorja. 1984. :13-14)
Esta questão do duplo vínculo, colocada por Sorja, é
corroborada também por Selmartino, chegando mesmo a citar o
autor catalão:
"É necessário superar a condição da administração local como
organismo dedicado exclusivamente a dispensar serviços à
população. Os organismos locais, além de uma maior autonomia, devem ter a possibilidade de participar na tomada de decisões globais ( ... )"(Selmartino. 1990 :36)
Quando a descentralização é um caminho traçado dentro de uma
revisão do pacto federativo, que pretende proporciona uma maior
viabilidade a determinadas funções de governo, as instâncias
envolvidas podem acordar a descentralização num aspecto e, ao
um desenvolvimento mais efetivo dos serviços públicos podese
descentralizar a gestão e, conseqüentemente o seu custeio, sendo
mantida centralizada a iniciativa de corrigir e melhorar a distribuição
da capacidade instalada (investimentos).
A Delegação de Funções Sem Autonomia
o
exame do princípio da autonomia local permite identificar umaquarta proposta descentralizadora. Sonia Fleury Teixeira observa
um outro tópico ao pontualizar que a questão da autonomia também
está estabelecida em termos da descentralização funcional e
territorial:
"Segundo Guait, na descentralização funcional ou por serviços, a transferência de competência é feita a favor de uma pessoa jurídica, mas as funções e serviços transferidos são funções que não saem de sua esfera de ação. Na descentralização territorial, a transferência de funções ou competências do governo central para os órgãos e divisões territoriais só podem concretizar-se mediante disposições legais, na medida em que a própria constituição do país autorize." (Teixeira. 1990. :84)
No primeiro caso trata-se de uma delegação que não tem a
ver com a autonomia local. Esta alternativa poderia até configurar
uma estratégia de atomização, na qual os estabelecimentos públicos
ganhassem plena autonomia de gestão, sem necessidade de
remeter-se à coordenação da autoridade local.
Mas, sem chegar a um grau extremo vem sendo muito
difundida esta estratégia como uma alternativa para melhorar os
destacados e/ou de referência por seu nível tecnológico (empresas
públicas do setor tecnológico, fundações de pesquisa e
desenvolvimento, universidades e hospitais universitários, etc). Um
dos instrumentos mais utilizados nesse sentido são os denominados
contratos de gestão. Por meio deles, a esfera central delega alguma
autonomia e permite certa flexibilidade de gestão a esses órgãos.
Em contrapartida, os mesmos se comprometem a cumprir
determinados patamares de produção.
Descentralização como Estratégia Democratizadora
Pode-se considerar a descentralização como um processo
definitivamente associado à democratização?
A resposta a esta interrogação não é direta nem conclusiva; depende outrossim das definições adotadas para cada um dos
termos. No entanto, na definição da relação é preciso considerar a intermediação de outras duas categorias de análise: participação
popular e controle social.
A relação entre descentralização e democracia deve ser
examinada considerando que existe um elemento comum, que
media a descentralização com o governo. A descentralização é,
antes de mais nada, uma medida política ligada à tomada de
decisões, e a sua implementação implica, necessariamente, numa
Por outro lado, democracia é um sistema político que se
caracteriza por sustentar uma lógica expansiva da esfera pública.
Ou seja, a tomada de decisões tende progressivamente a ser feita
pelo espaço público. Como coloca Claude Leffort, a democracia
estabelece a legitimidade de um debate sobre o legítimo e o
ilegítimo, onde ninguém pode ocupar o lugar do grande júri (Lefort,
1987:41). O fato de que o lugar do poder chega a ser um "lugar
vazio" impede aos governantes se apropriarem do poder. Seu
exercício é submetido ao procedimento de reposição periódica. Esta
é feita em termos de uma concorrência regulamentada, cujas
condições são preservadas de maneira permanente. Este fenômeno
implica uma "institucionalização do conflito"(Lefort, 1985:82), o qual
identifica ao sistema não por ter um governo escolhido pelo sufrágio
popular e sim pela legitimidade do exercício do controle social,como
também do permanente debate sobre os limites da dita legitimidade.
Considerando o consenso com que conta, na literatura
especializada, a tese que argumenta que "não se acredita numa
descentralização feita por decreto", concorda-se em aceitar que no
debate político a descentralização é um fator de controvérsia, que
deve ser visto como uma lógica administrativa que se discute
politicamente.
A descentralização é organizada segundo uma lógica
administrativa em que não há uma demanda direta por parte dos
solução organizativa capaz de colaborar no encaminhamento de
outros fins, os quais estão ligados ao conflito social e são
manifestados nas demandas concretas dos atores sociais. Por
exemplo, no contexto da reforma sanitária brasileira, a
descentralização é um princípio organizativo formulado para atingir princípios anteriores e superiores a ela, como a universalidade e
integralidade da cobertura, a eqüidade no acesso e a participação
nas decisões.
Contudo, o estatuto de intermediação que carateriza o processo
descentralizador não é outra coisa do que a intermediação dos conflitos sociais. Portanto, supõe-se a existência de diferentes
maneiras de instrumentalizar o conceito, que por sua vez estão
relacionados aos distintos atores que fazem parte do conflito.
Para simplificar, seria possível dizer que, por um lado, a intençã
o será a de ampliar a dominação e, por outro, o controle social.
Tem outros termos: a descentralização pode surgir como uma forma
de reforçar o aparelho de dominação ou como um mecanismo de
participação que permite o retorno do poder à sociedade civil.
Descentralização como Deslocamento do Conflito
Uma das relações entre descentralização e democracia concebe
a primeira como um instrumento de expansão da lógica democrática,
no âmbito democrático. No entanto, como são ampliadas?
Permitindo que o nível central se ocupe das tomadas de decisões
correspondentes ao conflito central (buscando uma hierarquização
dos conflitos de forma clara e precisa) e gerando mecanismos de
amortização dos conflitos (na praxis política isso é denominado o
"princípio do fusível"). A descentralização seria, então, a
multiplicação das instâncias de negociação e, portanto, de
conciliação.
Habermas (1980: 359) reconhece a C. Offe haver descrito com
precisão a física desta estratégia de dominação. Sua aplicação nas
áreas sociais seria mais viável que em temas como política
econômica ou trabalhista:
"No artigo citado, Claus Offe mostra que os conflitos abertos por interesses sociais espalham-se com maior probabilidade quanto menos consequncias perigosas para o sistema têm a sua frustração. As necessidades com maior potencial de conflito são as da periferia do âmbito da intervenção estatal. Estão longe do conflito fundamental mantido em estado de latencia e, portanto, não se considera que tenham prioridade entre os perigos dos que é preciso precaver-se"
Assim, a descentralização é uma estratégia que permite aliviar as
cargas do nível central, dando estabilidade ao processo
democrático. Neste sentido, a descentralização constitui-se como
um pré-requisito funcional do processo democrático, ligada à
premissa basica de modernizar o aparelho do Estado, procurando
atingir maiores níveis de eficácia e eficiência.
Preteceille (1988) assinala que a tendência a uma concentração
acompanhada da descentralização das políticas sociais para as
esferas locais (apud Soares, 1991:56). O autor observa a existência
de uma estratégia descentralizadora, determinada pela crise do
Welfare State, que teria como função a de proteger politicamente o
Estado Central, já que o mesmo deixaria de aparecer como
responsável imediato por uma política de austeridade que afeta as
condições de vida; delegando às autoridades locais essa
responsabilidade.
Cabe então questionar se a descentralização está associada a
uma nova e mais ampla cidadania ou a uma reestruturação da
hegemonia abalada pela política de ajuste, a qual aumenta a dívida
social, impedindo ou reduzindo a redistribuição de benefícios
sociais. Os custos políticos desse agravamento do déficit de
legitimidade originado pelas políticas denominadas recessivas,
neoliberais, de ajuste ou de contenção do gasto social seriam, deste
modo, espalhados territorialmente e não se acumulariam no centro
administrativo do Estado. Preteceille adverte também que esta
estratégia de deslocamento do conflito pode conduzir à
fragmentação das demandas sociais, perdendo-se de vista o caráter
global, nacional e internacional do processo que produz essas
desig ualdades.
Preocupados com as condições de governabilidade, alguns
"( ... ) descentralizar os conflitos, impedindo que se acumulem na cúpula do sistema nacional de planejamento. Sua tarefa principal é prover uma base de opções para as negociações das organizações sindicais e patronais. Para manter o conflito dentro de limites razoáveis é indispensável que existam diversas instâncias de conciliação e que, inclusive, outras clivagens, como as provenientes das desigualdades regionais, possam ser processadas com maior ou menor independência do conflito principal" apud.: (Teixeira, 1990:80)
Em síntese, nesta ótica estruturalista, a manutenção de um
sistema possui certos pré-requistos que devem ser cumpridos;
quando as dimensões do conflito superam a capacidade de
negociação do sistema ou regime, o processo democrático entra em
crise. Neste contexto, descentralização seria uma estratégia
circunscrita no marco de um processo democrático, que permitiria
dissolver essa sobrecarga administrativa e manter o constante fluir
dos discursos e dos conflitos.
Como se viu no ponto anterior, até a racionalidade tecnocrática
procura explorar o caráter democrático da descentralização. O termo
está carregado de conotações positivas como "democracia",
"solidariedade", "participação" etc. Isto transforma o termo numa
faca de dois gumes. Em mãos dos reformistas, pode motivar
relações capazes de reconstruir um tecido social mais organizado e
solidário, constituindo novos papéis e status (Sorja 1984 : 10),
podendo aportar condições favoráveis à transformação. O outro
gume desta ferramenta é capaz de operar um "lifting" na face
Este perigo é observado por Susana Belmartino, quando
considera que a participação e descentralização não mantêm uma
relação de condicionantes ou pré-requisitos um do outro, e sim que
se realimentam mutuamente.
"Do mesmo modo, a descentralização se inscreve como condição necessária mas não suficiente para desenvolver a participação. Em órgãos descentralizados a participação pode ser obstaculizada pela permanência de praticas autoritárias ou clientelísticas, ou pela distância que dispõe o domínio de um saber baseado em pressupostos técnico-científicos. Pese estas
reservas, a descentralização aparece como requisito
indispensável para estimular uma dinâmica participativa, baseada na possibilidade da difusão de informação, o estabelecimento de canais de comunicação entre eleitores e eleitos, técnicos e usuários, e a procura de mecanismos de articulação entre instituições representativas e organizações sociais." (Belmartino. 1990 :36)
A autora concorda com Borja (1981) na conveniência de
consolidar um verdadeiro controle social, contrastando a tendência
que leva à concentração do poder, mediante o reforço das
Instituições representativas.
Paralelamente, Theresa Lobo (1990) dá ênfase à manutenção de cinco princípios, diretrizes do aspecto político-institucional da
descentralização territorial. Estes são: flexibilidade, gradualismo,
progressividade, transparência e mecanismos de controle social.
Enquanto os três primeiros servem para assumir a heterogeneidade
das realidade estaduais e municipais, os dois últimos procuram
atingir a meta da democratização do Estado.
Porém, segundo esta definição, os cinco princípios se
democrática, que formula a necessidade de preservar a identidade
dos conflitos particulares. Isto poderia ser traduzido no entendimento
do conflito strictu-senso e não lato senso. Ou seja, este isolamento
dos conflitos locais que permite a descentralização, garante que as
reivindicações dos atores locais não sejam distorcidas nem diluídas
detrás de consignas mais globalizadoras (embora legítimas) como a
"liberação da classe operária", "o fim do imperialismo" etc.
A única garantia de que a descentralização não está sendo
formulada como uma forma de restrição do espaço público passa
pela participação popular. Contudo, é possível identificar certos
condicionantes para a efetividade da participação:
1- A consolidação de uma pratica participativa requer uma
mudança de consciência. Castigados pela descontinuidade dos
projetos institucionais, incorporou-se nos povos latinoamericanos
uma atitude passiva que conjugou o medo à repressão, com o temor
de serem esquecidos ou traídos pelos representantes eleitos.
O sucesso do projeto baseado na participação cidadã. requer dos
atores sociais que eles tomem consciência da forma em que suas
próprias biografias participam na construção da história das
instituições.
11- Paralelamente, a participação política está condicionada pela
igualdade de condições de acesso às políticas sociais. Não é
possível que todos os atores levantem as mesmas bandeiras
sucesso de qualquer projeto baseado na participação popular será
relativo às condições de redistribuição da riqueza geradas por este
projeto.
Concluindo, quando a crise fiscal e de governabilidade do Estado
chegam a afetar as estabilidade do regime (seja este democrático ou
não), cobra relevância a estratégia que procura acentuar a
distribuição espacial e intergovernamental do trabalho. Assim,
caberia à esfera central dar conta das condições de acumulação, e
às locais concentrar-se na função de reproduzir a força de trabalho.
Contudo este tipo de estratégias pode adquirir um sentido
democratizador, quando sã
o abertos novos canais de participação. Portanto, para identificar
se a estratégia descentralizadora procura dissolver ou resolver o
conflito, é preciso registrar de onde surge a iniciativa. Ou seja, é
importante identificar quando se trata de políticas "concedidas"ou
"demandadas"(Hirschman: 1987). Um artifício tecnocrático para dar
continuidade ao sistema ou o resultado articulado de uma demanda
organizada através dos movimentos sociais.
Descentralização Como Estratégia de Redução do Gasto Público
Em nome da "modernização" do Estado tem-se formulado