A LINGUA ESTRANGEIRA TI SUA INCLUSÃO 'NO CURRfcULO DA EDUCAÇÃO DO', POVO:
NECESSÁRIA OU SUP~RFLUA?
Nerilda Salazar Bergo e Gomes
A LINGUA ESTRANGEIRA E SUA INCLUsAo NO CURR!CULO DA EDUCAÇÃO DO POVO: NECESS~RIA OU SUPSRFLUA?
Nerilda Salazar Bergo e Gomes
Dissertação submetida como requisito
parcial para a obtenção do grau de
Mestre em Educação 0,
Circe Navarro Vital Brazil
Ori en tadora
RIO DE JANEIRO
, '
FUNDAÇÃO GETOLIO VARGAS
INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA 'DA EDUCAÇAO
1985
11
Dedico este trabalho
A meu marido Pedro Walter,
A meus pais, Vittorio Bergo e Tarcília
Salazar Bergo,
E aos meus filhos, Pedro Wal ter e Vittorio
Eugenio,
pelo apoio constante, estímulo,
incentivo·
e amor.
111
,,~ ..•• ,'I.
A"Erofessora Circe Navarro Vital Brazil, de convivio intelectual estimulante e enriquecedor, com quem tivemos o privil6gio de trabalhar no Col~gio Estadual Andr6 M~urois e no Laborat6rio de CurrIculos da Secretaii~de Educação do Estado do Rio de Janeiro, pela confiança qUe sempre deposi-tou em n6s, permitindo-nos produz~r e crescer como pessoa;
ao Professor Durmeval Trigu~iro Mendes, intelig~ncia
brilhante, convivio af~vel e recepiivo, cujas aulas de Fiio sofia da Educação Brasil~ira muito contribuiram para a nos-sa compreennos-sao e esclareci~ento dos problemas educacionais brasileiros;
à"Prqfessora Zilah Xavier de Almeida Borges, sempre amiga, solicita e competente;
à p'rofessora Marcella Mortara, exemplo de Mestra,qt.:e aprendemos a admirar e respeitar ao longo destes anos de
conviv~ncia;
às Professoras Fátima Cunha Ferreira Pinto e C~lia
Machado de Carvalho, an~iga e atual Diretoras do Laborat6-rio de Currículos, pelo apoio e estimulo que sempre nos dis pensaram;
aos colegas do Laborat6rio de Curriculos~ espc~ial -' mente Albenides Ramos de Souza, Amélia Noronha Pessoa de Queiroz, Maria Apparecida de VascQncellos Rodrigues, ,Maria Helena de Mello Vieir~ e Silvia de Lima Bedran, pela amiza-de, apoio e colaboração na revisão deste trabalho;
à colega Regina Vit6ria de Mendonça Kayat, tio solí-cita, bem humorada e prestativa, que datilografou esta dis-serta<;ão,
os nossos mais sinceros agradecimentos.
1·,"
INTRODUÇÃO
CAPITULO 1 - O Brasil Colonial. Caracterização po-1itica e s6cio-econBmica. O.apare1ho educacional de Estado. Supressão
e.a-doção do ensino da l~ngua estrangeira.
1. Colonialismo
Q sistema educacional no Brasil Co
lBnia.
1.1. Período de 1500 a 1759
1,2. Periodo de 1759 a 1808: o impe
-1
9
9
11 12
rialismo inglês' 32
1.3. Periodo de 1808 a 1822: o forta-lecimel1to do domínio econBmico e.
politico inglês 47
CAPITULO 2 - O Brasil Imperial. Ca~a~ter{zação
po-l{tica e s6cio-econBmica. O aparelho educacional de Estado. A adoção do en
sino da liniua estra~geira.
2. Imperialismo: o expansio:iüsmo Império Britânico
do
2.1. De 1822 a 1889: o periodo da
in-dependência do Brasil e~ relação
a Portugal. A ed~cação no
siste-ma imperial brasileiro.
v
81
81
polrtica c s6cio-ccon6mica. O aparcilho educaciorial de Estado nos dife
-rentes perrodos. Adoção e tend~ncia
à
supressão do ensino da Lín~ua Es-trangcira.
CONCLUSÃO.
ANEXOS
BIBLI-OGRAFIA
3.1. Período de l889·a 1930: a repú-blica oligárquica positivista,
com forte influ~ncia liber~l
a Primeira República.
3.2. Perrodo de 1930 a 1985: do
"go-verno provisório" a ditadura
fascista de Getúlio Vargas. A
.transição· da fase da "democra
-cia provisória" a uma nova dit~
dura
"desenvolvimentista-tecno-crata", inventora do "milagre
brasileiro" - a Segunda Repúbli ca.
VI
193
195
250
290
292
Este trabalho propõe-se a pesquisa~ os critérios que impelem os legi~
ladores a determinar a adoção ou a supressão da língua estrangeira nos
currículos escolare~; identificar as ideologias que servem de suporte a
estes critérios; analisar os objetivos da educação formal e determinar o
grau de importância do aprendizado da língua estrangeira na consecuçao
destes objetivos.
Considerando-se os valores que definiram ,os tipos de educação privil~
giados pela sociedade brasileira nas diferentes fases da sua evolução, le
vantou-se a seguinte hipótese: o ensino da língua estrangeira tem sido
vinculado ao modelo político-econõmico em vigor. Sua adoção ou supressão
articula-se com as ideologias que legitimam
e
sustentam a hegemonia dasclasses dominantes.
Para comprovar esta hipótese, fez-se um levantamento histórico da edu cação no Brasil Çolonial, Imperial e Republicano e sua divisão em perío
-dos. Procedeu~se' a uma caracterização político~econômica e sócio-cultural
de cada período, identificando-se as ideologias dominantes e suas articu-lações com a educação. Definiram-se os saberes dominantes superiores e i!!,
feri ores , os critérios estabelecidos pelas classes hegemônicas para a
transmissão dos mesmos e suas vinculações com o aprendizado da língua
es-trangeira. Tratou-se da omissão de educação, a partir da impostura do
discurso dos detentores do poder decisório, proclamando valores que nao
correspondiam ao seu pensamento e sua ação reais; e do caminho percorrido
do "humanismo"
à
"tecnologia", no ensino das línguas estrangeiras, do seupapel de divulgadoras de idéias
à
transmissão de ideologias. Procurou-seestabelecer de que modo a herança histórica plasmou nosso presente, no d~
IDÍnio da educação, desde o colonialismo até
à
construção da identidade n~cional. Identificaram-se razões que recomendam a diversidade de oferta e
aprendizado de varias línguas estrangeiras, como componentes, entre
ou-tras disciplinas consideradas "supérfluas", da formação do patrimônio
in-telectual e cultural de cada indivíduo e da corrn.midade como um todo. Conclui-se denunciando os mecanismos adotados pelas classes
hegeIDÔni-cas para impedir o crescimento educacional do povo, a fim de que este
não se torne uma ameaça a esta hegemonia. Como propostas de solução,serão
publicadas duas pesquisas j á realizadas: problema quantidade
de efetivos 2Lqualidade de ensino da língua estrangeira e o
domínio da língua materna x a organização do pensamento x as
Ce travail a plusieurs objectifs: la recherche des críteres qui condui
sent les législateurs à décider l'adoption ou la suppression des langues
étrangeres figurant dans les programmes scolaíres; l'identification des
idéologies serv~lt de support à ces criteres; l'analyse des objectifs de
I' éducation dOImee par l' école et 1 I établissement du degre d' importance de
l'apprentissage de la langue étrangere pour la réalisation de ces objec
-tifs.
Considérant les valeurs qui ont défini les fOrmes d'éducation privilé-giées par la société brésilienne à chaque phase de son évolution, nous a-vons pensé à l'hypothese suivante: l'enseignement de la langue étrangere
a-t-il été lié jusqu'à présent au modele poli tique et économique en
vi-gueur? Son adoption ou sa supression dépend-elle des idéologies qui légiti
ment et soutiennent l'hégémonie des classes dominantes?
-Dans le but de pouvoir répondre
à
ces interrogations, nous avons faitune recherche sur l'histoire de l'éducation aux différentes époques du Bré sil Colonial, Impérial et Républicain, chacune d'elles étant divisée en pe riodes. Nous avons mis au point une caractérisation politique, économique et socio-culturelle de chaque période, en y identifiant les idéologies
do-minantes et leurs articulations avec l'éducation. Nous avons défini les
savoirs dominants supérieurs' et inférieurs, ainsi que les criteres établis par les classes hégémoniques dans le but de les transmettre à la société •
Nous avons aussi étudié les rapports existant entre ces cri teres et 1 I ap
-prentissage de la langue étrangere. Nous avons traité de l'omission d'é-'ducation, à partir de l'imposture du discours des détenteurs du pouvoir de
décision, qui proclamaient des valeurs et ne s'y tenaient pas. Nous nous
sammes également intéréssée au chemin parcouru par l'enseignement des
lan-gues étrangeres depuis "l'humanisme" jusqu'à la "technologie" et le rôle
qu'elles ont joué d'abord dans la propagation des idées et ensuite dans la
transmission des idéologies. Nous avons cherché à évaluer le degré d'in
-fluence de notre passé historique dans le domaine de l'éducation, et ceci depuis le colonialisme jusqu'à la construction de notre identité nationale.
Nous avons relevé les raisons qui démontrent. que I' apprentissage de di ver
ses langues étrangeres connne composantes de la fonnation du patrimoine in=-tellectuel et culturel de chaque individu et de .la connnunauté dans son en-semble n'est pas du tout superflu.
Nous avons conclu le travail en dénonçant les mécanismes adoptés par
les classes hégémoniques dans le but d' empêcher un' "menaçant"
développe-ment inteDectuel du peuple. Naus publierons prochainement del~ recherches
déjà réalisées et aUl tentent d'apnorter une solution à chacun des
proble-mes soulevés. L'une traitera du rapport effectifs phéthoriques xqualité de l'enseignement. L'autre aura pour sujet: maitrise de la langue maternelle,
organisation de la pensée et nossibilité d'expression dans la langue étran
gere étudiée. -
. '. ~ ".
Este trabalho tem por objetivos:
a) pesquisar os critérios que impelem os legislad~
res a determinar a adoção ou a supressãd da lfn .
gua estrangeira no~ currfculos escolares;
b) identificar as ideologias que servem de suport~
a estes critérios;
c) analisar os objetivos da educação formal e
de-te-rminar o grau de importância do aprendizado
da lfngua estrangeira na consecuçao destes obj~
tivos.
Considerando que a seleção dos componentes. curric~
lares tem por finalidade contribuir para a formação de um
.,.
tipo definido'~~ ~idadão, que toda educação
lem
em viita umproduto final ~adaptado para viver num determinado tipo de .
sociedade, cultuando valores especificos da mesma, levanta-mos a seguinte hip6tese: o ensino da lfrigua estrangeira no
Brasil tem sido vinculado ao modelo polftico-econ6mico em
vigor. Sua adoção é aprovãda pelas classes dominantes, e
estudo da língua estrangeira e .0 m~tod6 adotado
transmi-tem ou inculcam valores que,' sendo acei tos e incorporados ~
los dominados, ajudam a manter esta. dominação; e est-e
ensi-no tem sido adotado ou suprimido quando ~~ novas id~ias vei
culadas atrav~s do aprendizado da" língua estrange.ira contri
buem para substituir os elementos 'hegem6nicos e a língua se
transforma numa ameaça para a manut~nção deste domínio,pri~
cipalmente em se tratando da educição do povo.
Para comprovar esta hipótese, fizemos uma análise
hist6rica do aparelho educacional brasileiro, desde o desco brimento atf a fpoca atual, .e procuramos estabelecer, em ca da p'eríodo c"aracterizado .. suas vinculações e
com o sistema pOlítico-econ6mico vigente.
articulações.
Identificamos os mecanismos utilizados por determi
nadas caciadas ;ociais para exercer sua autoridade e poder
sobre outras, e legitimar esta dom.inaç.ão: ela se manifesta
pela subservi~ncia exigida das camadas dominadas, atrav6s~
reconhecimento dos valores das classes dominantes e sua re
-pro~ução servil. Determinamos os valores proclamados,
arbi-tr~dos e cultuados pela sociedade brasileira em cada um dos
períodos estudados, Identificamos .as ideologias q~e
5ervi-ram de suporte a esta dominação, procurando estabelecer sms conexoes com a educação do povo x educação das classes domi
nantes. Concluímos que, para manter seus. privilégios, as
classes dominantes sempre recorreram i educação, necess~ria
para que seus quadros fossem reproduzidos emanti~os, e, p~
lo mes~o motivo, não se empenharam na ihstrução do povo,pr~
ins~rção no mercado de trabalho. ,
A
adoção da iíngua ~strangeira, como parte docur-rículo transmissor dos "saberes dominantes superiores" teve
dois aspectos: o de língua de comunicação .entre a potência
estrangeira que detinha o poderio' econômico e os nacionais
do país, que intermediavam esta dominação no Brasil, benef~
ciando-se com ela, em termos de sal~rios e outras vantagens,
e transmitindo às classes, dominadas a tecnologia estritame~
te necessária à viabilização da produção, com o máximo de
renda e o mínimo de custos; e
6
de língua de cultura e la-zer, que proporcionava a uma minoria privilegiada o conheci
.
-ment'o de outros povos e c.i viIi zações, com todo o seu acervo. de arte, filosofia, ciências, etc.
A supressão da língua estrangeira do currículo dà
.
.
ed~cação do povo, optando-se pelo ~nsino de conteúdos
míni-mos, cujo aprendizado lhe, possibiU.ta em geral apenas o aces so à língua materna escrita elementar, ao nível da sua
"fa-la", ,e à realização de operações ma temáticas básicas, faz
parte de uma "desalfabetização" que não permite às crianças
do povo o acesso à informação e à cultura~ conservando-se
urna falsa linha de demarcação, que .dividiu os saberes das
clas'ses dominantes e das dominadas:; o "popular" e o
"erudi-to", 'o "empírico" e o "científico". Ensina-se apenas o es sencial para integrar' o homem do povo numa das atividades
produtivas consideradas vitais à manutenção da
Nesta anilise em que fizemos um percurso através
•
da história da educação no Brasil, com um levantamento dos
principiis fatos históricos, pOlítico-econ6micos e sociais, tentamos captar os diferentes arglunentos (-aparentes ou reais)
usados para suprimir ou adotar o ~nsino da língua estrange!
ra, principalmente no que se refare i educação' das massas ,
apoiados em conceitos como educação da "elite" e educação
do povo. Na tentativa de analisar a educação em geral,
si-tuamo-la no contexto das mudanças das relaç5es econ6micas ,
políticas e sociais, procurando localizar, determinar as
ideologias desencadeadoras dos atos do poder decisório. Exa minamos os principais fatos históricos que plasmaram o nos-so presente; tentamos também precisar em que nível e em que situações ,específicas existlu umarelaçã'? entre desenvolvi-mento e educação, e q'ual seria o papel representado
língua estrangeira neste contexto.
pela
A partir da definição da ~alavra ensino (tendo em
vista a pergunta: o que ensinar, ~ quem, com que objetivo?),
utilizamos um esquema que nos permitiu demonstrar ser
~que-1e o ponto d~' convergência de um t,ripé, formado por alunos,
'professores e aparelho educacional da sociedade; esta, atr! vês de mecaniscios resultantes das conveniências do. sistema,
determina o tipo de con~ecimento que o ensino vai ~rivile
-giar e difundir.
Hi aqui uma aparente contradição: a sociedade P9d~
ria ser o ponto de convergência do tripé. Mas para se res -guardar como sistema, criou uma entida,de todo-poderosa,.
5
a vida humflna, e em nome do qual todas as escolhas, a nível
de conhecimento, são feitas e justificadas. Por esta razão ~ ,
o ensino ocupa o ponto de converg~ncia dQ,trip~, como resu!
tante dos valores que motivaram a.escolha desse saber.
Para melhor situar este trip~ em r~lação ao nosso
objetivo, procuramos definir ensino,atrav~s de diferentes ri
soes, que privilegiam ora a "instrução", ora a, "educaçãoi , ':
um professor habituado i labuta diária com seus alunos, se
indagado sobre o que
é
"ensino ',', responderia provavelmenteque ~ a transmissão/aprendizagem de certo número de conheci
mentQs, cóm a aqui~ição de informaç6es básicas para um
con-texto definido, a ativação de determinadas potencialidades,
'mecanismos intelectuais , a formação de hábitOs e ati tudes
ig
dispensáveis ao. desenvolvimento do ser humano, visando a
prepará-lo para vi ver em dado tipo de spciedade. fl in +
strue-re, "construir dentro da pessoa"'.
Os lexic6grafos, diriam que
é
a açao, a arte ou amaneira de ensinar, de transmitir conhecimentos a um aluno; e
que esta transmissão de conhecimentos, de illformaç6es ou
de esclarecimentos fiteis ou considerados indispensáveis,t~m
em vista fins determinados. Acrescentariam certamente que
estes fins podem orient'ar-se seja p'araa formação ou a modi
ficação da conduta humana, seja para um adestramento ou
treinamento especifico.
Explicariam a educação como um processo de desen
-volvime~to das capacidades fisica, iritel~ctual e moral da
criança e do ser humano em geral, objetivando uma integração individual e social; considerariam também
me lho r corno
processo. Educar seria despertarin~eresses, desenvolver as
,boas tend~ncias, as virtudes latentes da pes~oa: do latim
ex + ducere , "trazer para fora".
Carlos Brandão fala em "educações'~ - "para saber ,
para fazer, para ser ou para convfver", considerando que
não há uma forma nem um modelo único de educação. (1) Ela
ocorre através da ação exercida pelas gerações adultas
so-bre as gerações jovens, com a finalidade de adaptá-las à vi
da soci'al. Segundo Vanilda Pai va, a educação "como prática
social, se realiza através das "instituições, formais ou
não"; e
"ê
uma prát.ica que se orienta por valores visandoa finalidades que são colocadas tanto ao nivel do individuo
quanto ao nível da sociedade". (2) E est.as finalidades
so-ciais tanto podem transforma"r, quanto igualar e àeformar os
aprendizes; (3)" Carlos Brandão acrescenta ainda"qu6, como
prát.ica social, por meio da inculcação 'de tipos de saber, r~.
produz tipos àe sujeitos sociais. (4 )
Em todas as definições do que e ... ensino, um
instru-mento posto a serviço da educação,pcrcebe-se nitidamente
o tripé ~cim~"me~cionado: a) aluno, ou criança, ou jovem,ou
. ser humano "imodelado"; b) professor, ou mestre, ou
educa-dor, ou adulto '''modelador'' - o "porta-voz" do sistema; c) a sociedade, o "sistema", 'a que se vinculam os anteriores, com
seus valores, suás instituições e a~ leis que deles decor
-rem. As três pontas do tripé são únidas pelo conhecimento,
transmitido através de uma ~ao, que corresponde
à
metodologia e às técnicas empregadas.
"Procuramos si tuar es te tripê educacional .dent 1'0 de
que sofreu através dos tempos e' estabelecer quais as rela
-ções havidas entre ele e a adoção ou '~upi'essão do ensino
da(s) lfngua(s) estrangeira(s).
A conclusão de nossa anilise
é
que, da Col6niaRepfiblica, os governos nao se empenharam em educar o povo
como é sobejamente reconhecido, do discurso nunca se passou
...
a
à ,ação. O binômio' educação das classes dominantes, com um
currfculo variado, enriquecido pelo ensino da(s) língua(s)
estrangeira(s) e instrução bisica das classe~ dominidas
com um treinamento direcionado para atividades produtivas ~
pecíficas de nível elementar ou médio, permanece em ,vigor.
Ô~ "desvalidos econômicos" continuam sendo "desvalidos
cu!:-turais". As classes dominantes, desejosas de manter a sua
hegemonia econô~ica e c~ltural, simplificam o currfculo des
.
..
.
tinado às classes dominadas; concluimos que a pluralidade
da ofer~a de virias lfnguas estrangeir~~ é fundamental para
estas Últimas na sua busca de identidade cul tural e igualdade
social, como mostraremos no trabalho.
REFERENCIAS BIB~IOGRÃFICAS
(1) Carlos Rodrigues Brandão. O que·é educação, pp. 7 e 9
(2) Vanilda Paiva. Educação populat e educação de adultoi,
pp. 11 e 46.
(3) Carlos Rodrigues Brandão, ide~, p. 25.
(4) Idem, ibidem, p.71 .
/
CAPfTULO 1
o
BRASIL COLONIAL. CARACTERIZAÇÃO POL!TICA E SOCIO-ECON6MICA. O APARELHO EDUCACIONAL DE ESTADO. SUPRESSÃO E ADOÇÃO DO ENSINO DA L!NGUA ESTRANGEIRA.1. COLONIALISMO
"Pertende, Doroteu, 6 nosso chefe mostrar um grande zelo nas cobranças
do imenso cabedal que todo o poyo
>aos cófres do monarca está devendo.
Envia bons soldados às comarcas,
e manda-lhes qu~ cobrem~ ou que metam
a quantos não pagarem nas .cacleias. Não quero, Dorpteu, lembrar-me agora 'das Jeis do nosso augusto; estou cansado
de:confrontar os factos deste chefe com as disposições do são direito; por isso pintaFei, prezado amigo,
som~ntea confusão e a gradesordem
em. que a todos nos pos tão nova idéia.
Entraram nas comarcas os ~oldados,
Uns tiram os ~rinquinhos das orelhas das filhas e mulheres; outros vendem as escravas, já veI has, que os criaram,
por menos duas partes do seu preç~.
Aquele que não tem cativo, ou jóia,
satisfaz com pap~is, e o "soldadinho
estas dIvidas cobra, mais violento do quecbbra a justiça uma parcela, que tem executivo aparelhado,
por sabia Ordenação do nosso reino. Por mais que o devedor exclama e grita que os creditas são falsos, ou que foram ha muitos anos pagos, o ministro
" "
da severa cobrança a nada atendc~
".
despreza este·s embargos, bem que o triste
proteste de os provar incontin~nti."
Critilo~Cartas Chilenas
• • •. ~ ,.1
Edição crítica de M. Rodrigues Lapa(l)
Observação: Nesta edição das obras completas de Tomas Antonio Gonzaga, Rodrigues La
-pa conclui que Critilo e o poeta
Gonzaga e que Doroteu
ê
o poeta clá~o
SISTEMA EDUCACIONAL NO BRASIL-COLÔNIAO sistema educacional no Brasil-colSnia pode ser
dividido em três períodos distintos:
.
a) o período de 1500 a 1759, quando se verifica o estabelecimento e a fixação da estrutura polí -tico-econSmica e social da colSniaportuguesa
paralelamente, ocorre tamb~m a organização e o
desenvolvimento do aparelho educacional reprodu
.
-tor das condições ideológicas necessárias
ã
se-dimentação do. poder met ropoli tano, liderado pe-. la Companhia de Jesus .
b) o período de 1759 a 1898, que corresponde ao
desmantelamento do aparelho educacional j e.suíti
co e da estrutura de poder político-cconSmico por
ele representado: ocorre neste período(1759) a
ascensão do Marquês de Pombal e a expulsão dos
membros da Sociedade de Jesus' de Portugal e
co-, .
lSnias; o aparelho eduçacional do Estado ~ rees
truturado em função do: pensamento ideológico e
da ação do Marquês de Pombal.
independência.
1.1 Período de 1500 a 1759
Ao aportarem na Am~rica·do Sul, os navegadores eu-ropeus nela encontraram J?ovos "americanos" em diferentes graus de evolução: havia tribos nômades (geralmente uma centena de pessoas), que viviam da caça, pesca e coleta de frutas naturais; povos agricultores, que conheciam o mi-lho, a mandioca, a batata-do~e, o tabaco, o algodão e o a-mendoim, entre outras plantas; e socieda4es com desenvolvi mento ao nível de altas civilizações, que floresciam com
estrutu~a~ s6çio-~conômicas origi~ais e ·complexas. Todos
possuiam uma língua e uma cultura. pr6prias: com a conquis-ta ~a terra e o avassalamento dç seus habitantes, estes fo ram sendo progressivamente aculturados.
Os portugueses, comandados por Pedro Álvares'
Ca-br~l, foram precedidos n~ sua des~oberta, segundo relata
Gilberto Fr~ire; por um certo Jean Cousin, francês natural de Dieppe, .cuja viagem ao Brasil teria ocorrido em 1488; consta tamb6m que normandos percorreram a costa btasilei -.ra, durante os primeiros anos do s6culo XVI. Mesmo depois 'de j i iniciada a colonização portuguesa, o litoral brasi
-leiro continuou a ser visitado, nos seus trechos mais de's-guarnecidos (entre o Cabo de são Roque e a Paraíba do Nor-te, ao longo da costa de Alagoas e S~~gip~ e em certo~ re-cantos do Rio de Janeiro), por ruivos piratas franceses,h~
pau-de-tin-13
ta e don~juans de índias", segundo o mesmo· autor. (2)
Este soci610gd, citando Ferdinand Denis, nos fala de uma grande festa brasileira, havida em Rouen no ano de 1550: a ela assistiram Henrique lIe Catarina de M~dicis.Os
franceses se encantaram 'não s6 com as madeiras, animais, !:!:.
ves. e plantas e~6ticas brasileir~s, mas tamb~m com alguns ameríndios "pela beleza do corpo e dos olhos da gente sel-vagem - principalmente das mulheres - pela graça de seus gestos, pelo seu vigor".
Sabedores dos encantos franceses pela "nova" ter-o ra, bem como da cobiça' de outtas nações europ~ias is riqu~
zas do terreno rec6m-conquistado, trataram Os portugueses de organizar a ~strutura político~militar e econ6mica da colônia,- a fim de· assegurar os seus diréi tos sobre ela. E sua primeira tarefa foi a de atrair e "domesticar" os seus habitantes indígenas, que a isto se opunham,' evidentemen -te.
Neste período, os interesses da metrópole p'ortu-guesa eram meramente explorat6rios~ a sociedade foi organi zada em fun~ão ~a necessidade de ~bastecer a Corte com as riquezas naturais da terra brasileira, destacandose ini -cialmente a exploração ,de madeiras e pedras preciosa.s. Pa~
latina.mente, com a introdução das culturas de cana de açU-car, tabaco e algodão, os cofres portugueses foram abaste-/ cidos com a renda proveniente da exportação destes prod~
-tos, ao lado daquela resultante da extração do ouro.
obti-das sobre os parceiros, propiciando a acumulação de metais transform'áveis em moeda, como ouro e prata, foi utilizada
pelos portugueses na sua exploração colonial. Procuraram,
entã'o, manter' a exclusividade no comércio 'com suas colô
nias, proibindo que navios de outros países a elas aporta~
sem.
Paulatinamente, Portugal foi tomando medidas que
fortalecessem a sua posição: além do monopólio do comércio com as colônias, estabeleceu uma administração
centraliza-da na metrópole, a qual exercia forte controle fiscal
50-bre as operações comerciais internas e externas. Recorreu
à
Companhia de Jesus, também de fundação recente, para or-'ganizar e desenvol ver o aparelho educacional na colônia :'os
jesuítas exerceram um papel preponderanie, seja no início
.
.
'
da colonização, através do "seu sistema de educação popu
-lar'com base no objetiv~ primordial de catequese e,recruta
mento de vocações religiosas necessárias ã difusão qa fé e
consolidação do domínio portuguêsi" sej a posteriormente
quando, uma vez 10grad~s estas metas, enfatizaram o ensino
das elites. (3)
Em vista da importincia da atuação dos padres je
-suítas neste período, trataremos mais minuciosamente da
criação, estrutura e funcionamento da Sociedade de Jesus bem corno de suas atribuições principais.
A idéia da criação da ordem nasceu a lS de agosto
de 1534, na Capela de Montmartre, quando Inicio de Loiola
e seis companheiros egressos da Universidade de Paris,
setembro' de 1540', o papa Pa~lo 111, através da bula "Regi-men militantis ecclesiae" confirmou a nova Ordem. O objet!. vo ,inicial de seus membros era combater a heresia e os "re
beldes" reformistas protestantes,' bem como converter os p~
gãos. Tinha corno caracteristica principal o voto especial
de fidelidade ao Sumo Pontifice, a,quem prestava obedi~n
cia incondicion~l, e disciplina id~ntica i do exército, em
cuja estrutura Inicio de Loiola se inspirou para organizar a Companhia, por ter sido militar. A atividade intelectual e moral. dos jesuítas, bem corno a prontidão e a habilidade
com que
.
des~mpen:havam suas incumb~ncias, granj earam à Or-.
dem a inteira confiança ~ontifícia; começaram seus membroi
a lecionar na Universidade Romana. Receberam do Papa encar
gos secl~etos 4e aI ta pOlítica: seu prestígio e valor
subi-ram tanto que, fosubi-ram os teólogos po'ntifícios no ConcíliQ
Tridentino. Cresceu sua reputação de saber: em seis anos
o ensino superior estava dominado pela Ordem.
No ano de 1549, com o Governador-Geral Tomé de Sou sa, çhegaram ao Brasil os primeiros jesuítas: entre eles,
João de Azpilcueta Navarro, o primeiro educador
bras~lei-. , C". . . "
ro que, instruldo desde logo na llngua dos aborlgenes, tr~
duziu nela orações e sermões para 'a catequese, em 1550.
"Aqui acharam alguns pequenos núcleos de povoaçao na costa, de Pernambuco a são Vi cente. Os indígenas comiam uns aos outros os reinóis os matavam e escravizavam; uns e outros viviam em poligamia e na promiscuid! de. Os próprios clérigos aqui se corrompiam .
sol-ta!''', disse um destes jesurta,s ..
ft.
moral dotempo era que, passada a Linha, tudo era
permitido:"ultra Equinoxialem non peccavi".
Com os jesuítas veio a virtude, também a
justiça ou a eqUidade, entre as duas raças,
Brancos e N~gro~ (como eram thamados os
!n-dios, por oposição), que uma escravizava a outra, "ferrando" as"peças" como ,se foram a nimais, deles usando e abusando. Em ambas as raças, ,dominadores e dominados, dominou por
fim a moral privada e pública dos Jesuítas": (4)
A educação foi entregue aos jesuítas porque a
re-figião deveri a funcionar como um freio para reprimi r os.
abusos da época inicial da colonização: além de converter
indios e hereges, deveriam dar apo~o rel~gioso aos colmas .
. Para isso recebiam subsidias da coroa portuguesa e foram
-. lhes -.destinadas sesmarias para a manut~nção dos estabeleci
mentosque viessem a criar. Em 1553, com o segundo govern~
dor, Duarte da Costa, chegaram os jesuítas J6sé de Anchieta e Antonio Blasquez, primeiros mestres de índios, mame
-lucos e rein6is; em 1554, de Piratininga, São Paulo, Anchi
eta ji fala dos meninos que freqUentavam a escola' com
aulas de gram~t.ic·a em três classes diferentes' e também
aulas de cant~. Ministra ainda o latici, em são Vicente.
Em 1556 é fundado em Piratininga o primeiro colé
gio dos Padres Jesuítas no Brasil, seguido de outro na
Bahia, ambos pelo padre Manuel da N6brega, primeiro Provin
cial da Companhia de Jesu~ no Brasil. Segundo seu depoime~
"Em menos de vinte anos, os índios já
nao se comem, já t~m sua família, ~ma
mu-1her' uma cas~, uma roça; os filhos apren
-dem e por eles já querem escrever.à Rainha
por mulheres piedosas que lhes façam, pelas
filhas, o que pelos filhos fazem os Padres,
que ensinam com proveito portugu~s, solfa
canto, ofícios. Nos colégios de são Paulo
Rio, Baía, Pernambuco, há lentes que l~em
gramática, l6gica, latim e até uma hora de poesia, do 29 livro da "Eneida". (5)
Em 1567, N6brega funda ainda o terceiro colégio
da Companhia, no Rio de Janei~o. Na Bahia, iniciaram-se em
1572 cursos de artes e teologia, conside~ados como os
pri-meiros cursos d~ nível supe~ior no Brasil. (6) Estes cur
sos foram depois estendidos aos demais ~olégios.
Ãmedida que a sociedade colo~ial se foi sedimen
-tando e as instituições qu~ a compunham aper~eiçoartdo-se,o
aparelho educacional se diversificou, bem como o tipo de ~
luno que dele se beneficiava: não podendo ministrar a
mes-ma educação a todos os índios, davam-na os jesuítas, em c~
riter prefer~nc;al, aos filhos dos caciques, para que atra
vés deles tivessem acesso e influ~ncia sobre os pais. O~
outros índios, de acordQ co~ suas inclinações· e aspossibi
lidades ou necessidades locais, eram catequizados e inicia
dos em práticas agricolas e/ou artesanais.
Esta infl uência dos "curumins" nos adul tos, que
"se fazia diretamente sobre os detentores do poder tribal",
permitia também que ficassem "protegidos os núcleos de
~he-festinham seus. filhos aí aldeado·s". Verifica-se assim que
"esta incipiente Ifeducação dos adultos" foi, no entanto, ao lado e at ravês da'·. educação das crianças, decisiva no·"progressivo abran
damento das resist~ncias ~borígenes· e de
suave mas persistente penetração das barrei ras étnicas e culturais, tiansformando fero
zes antropófagos em cristãos submissos e
obedientes", facilitando o êxito da
coloni-zação, bem corno a sedimentação dos padrões
culturais europeus e da religião cristi no Brasil". (7)
Aos escravos negros davam os padres jesuítas assis
t~ncia e orientação religiosa na igreja: paia aqueles nao
se julga~ane~essirio nenhum sistema de "educação formal
posto que executavam os serviços mais ,rudes e cansativos ,. nio só no campo, corno nas vilas' e futuras cidades. Consti-tuiam a mão-de-obra nec'essiria para a indústria extrativa, o cultivo extensivo da cana de açúcar, a criaçio de gado , a mineração etc., para os quais, na época, não se
conside-rava essencial nenhum preparo profissional específico,nem
sequer o domínio das técnicas de leitura e escrita. (8)
Quando as corporações de ofícios começaram a ser
criadas no Brasil, nos moldes das portuguesas, foi utiliza do também \) trabalho escravo:
"Sempre que podiam, os rnest:res faziam es cravos aprenderem ofIcios para p6-los a tr!
balhar em suas tendas, disbensando-os de p~
ofícios passavam a ser "coisa de escravos" ou "repartição de negros" e, por uma inver sao ideo16gica, os ofícios mecinicos passa vam a ser desprezados, corno se houvesse aI go de essencialmente aviJtante no trabalho
manual~ qu~ndo 'a exploração-do escravo ~
que o era. Para o objeto da exploração,es-cravista, não poderia havir, po~ ceito, m~ tivo algum para valori~ar o trabalho naqu~
las relaç6es. A quebra das relaç6es pela fuga do domínio do senhor, inaugurando urna' vida "livre", era uma'solução freqi1enteme~
te procurada. Mas, o trabalho continuava -sendo definido corno um castigo e o 6cio,um ';; alvo altamente desejável. Quando libertos"
.', ~',
de fato ou de direito, os ex-escravos pro-curavam sobreviver nas condiç6es materiais ,de escravo,
.
.
trabalhan~o o.menos.possível .O resultado foi um generalizado preconcei-to coptra o trabalho manual. Mostrar-se li vre era distanciar-se o mais possível do lugar social do escravo". (9)
Quanto aos meninos livres, brancos ou mestiços 19
julgamos poder diferenciá-los em tr~s categorias: aqueles que não tinham acesso à escola, pórque suas famílias, po-bres, não podiam prescindir da colaboração, embora mode&a, fornecida pelo seu trabalho (ou por não terem meios de man
t~-los na escola); aqueles que se toinavam aprendizes, nas
corporaç6es de ofícios; e aqueles que eram filhos da clas-se mais priv~legiada da 6poca; a elite que freqUentava os
"A freqUência dos Colégios era constituí
..
da por filhos de Funcionarias pGblicos, de . Senhores de Engenho, de Criadores de Gado,de Oficiais Mecânicos, e, no século XVIII
tamb~m de Mineiros, e que represehtava no
Biasil a nobreza e a burguesia europ~ia, em bora estas duas denominações sejam um.tanto fictíciás transportadas ·ao Brasil dos pri -meiros séculos". (10)
As meninas, em geral, nao aprendiam a ler nem es -crever; as mais privilegiadas recebiam em casa lições par-ticulares, e completavam sua educação com "prendas domésti cas", enquanto aguardavam "um bom casamento".
A seguir, veremos como funcionava o aparelho educa cional je~uíta:
.
.
a escola elementai era ~pGblica, geral e' . .
gratuita"nos colégios, sendo particular, com internato e
reml.lIler~da, nos seminár~os (onde se formavam· os futuros p~
dres, e também se ilustravam os filhos das famílias "pref~
renciais" da época, que poderiam vir a ocupar posteriorme!!. te ·postos importantes no· aparelho ~dministrativo do Esta-do). Além dó curso elementar, os· cOlégios ofe~eciam tam -bém o de humanidades, que poderia corresponder ao nosso a-tual ensino secundário, e os cursos de artes e teologia.E~
tes quatro graus de ensino eram integrados e perfeitamente ·articulados. No primeiro, possivelmente com a duração de
mais elitizados. (11)
A' estrutura dos colégios, as disciplinas ensinadas
e os métodos utilizados foram definidos num s6 c6digo, a
fim de uniformizar a açao e o pensamento dos
padres-profes-sores, segundo seu "intenso e enorme desejo". Ap6s muitas
consultas e o estudo de inúmeras,sugestões recébídas,
che-gou-se a um consenso: em 1598, o Geral cláudio Acquaviva
mandou ,imprimir em Nápoles e publicar no ano seguinte, em
Roma, o "Ratio Atque Instituto Studiorum Societas Jesu", um
c6digo de ensino que contêm normas de açao padronizadas e
"é, ao mesmo ,tempo, programa e método - c6-digo não, s6 do que se deve enslnar, mas tam bém do modo pelo qual o ensino deve ser mi-nistrado. '
A educação nao se limita i instrução in
telectual. Abrange o ensino religioso e
mo-ral em toda a su~ extensão, te6rica e
práti-ca. Isto é, ~ educação moral cat61ica segu~
do os principios do Evangelho, com o fim de
formar o cidadão genuinamente cristão, e
tom ~ instrução pretende-se formar o perfei
to h~manista." (12)
Os jesúitas foram buscar a inspiração para a sua
pe-dagogia,além dos EvangeJ:hos,na "Institutio Oratoria",de Qui!!,
ti1iano,que os educadores do Renascimento redescobriram pa-ra o ensino das humanidades.Nos principios do século XVI, a Universidade de Paris foi o centro de uma vigorosa restaura ção tomista: nela também se inspiraram os pedagogos da, So
a seguinte assertiva:
"Santo Inácio tinha pela universidade pa
risiense um verdadeiro culto: pOr quê pref~
riu Inácio o costume de Paris?
Porque reconhecia a superioridade do m~
todo, tanto que o introdu'ziu no Colégio
Ro-mano, chamando, para professores, o~ anti
-gos alunos da célebre universidade e mandan do a Paris os jovens que entravam na Compa-nhia, antes do fim dos estudos.
Escrevendo o Santo-a seu sobrinho Ber
trand, ac~nselha que freqUente a Universid~
de ~e Paris, porqui, além de outros motivos,
há entre os estudantes dessa cidade mais ho nestidade e religião do que em outras". (14)
~lêm dos padres jesuítas, também os franciscanos,
beneditinos e carmelitas foram-se instalando progressiva ... mente no Brasil; mantinham também em seus conventos cursos
de <l:rtes e teologia, de 'nível superior; entretanto, não
e-xerceram influência marcante na sociedade colonial, como
os j e"suí tas. Es t avam os prime iras mai s vo 1 tado s para. a. re
-produção interna de seus quadros, enquanto que os jesuítas estavam voltados para fora, o que. constituiu a sua caracte
rística distintiva. (15)
o
sistema educativo nao mantinha nenhuma relação-cessários ao funcionamento da sociedade.
Com a progressiva ocupação do lito~al, onde novas
vilas eram fundadas e as antigas se transformavam em cida-des, o avanço da colonização para o interior, a descoberta ,de ouro, novas carências ocupaciónais passaram a ser senti
das num maior g~au: o progresso reclamava oleiros,
pedrei-ros, ladrilheipedrei-ros, carpinteipedrei-ros, marceneipedrei-ros, ferreiros,a~
tesãbs de especialidades 'as mais variadas. Tanto na agroi~
dfistria açucareira, quanto no cultivo do tabaco e na mine-ração, o trabalho dos oficiais e seus auxiliares, escravos
ou livres, era acessório à atividade principal de produção
de mercadorias para a exportação. (16)
No que di z respei to aos ofícios manufaturei ros, 'va riavam oS,padrões de' aprendizado,:que nio eram sistemiii -cos: havia ajudantes/aprendizes que desempenhavam as tare-fas, integrantes do processo t6cnico dé trabalho. Entretan-to, mesmo que fossem menores de idade, não precisavam ser necessariamente aprendizes (a predisposição em aprender o ofício não era necessária).
'Nas ,corp'orações de ofício, o aprendizado era siste matico, emb6ra não tivesse tomado, na col6nia, a forma
es-colar. Tod~s os ofícios embandeirados, isto ~. aqueles que
estavam sujeitos à orga'nização corporativa e participavam
,de cerim6nias religiosas levando a bandeira de seu santo
protetor, progrmnavam o aprendizado da sua profissão. Esti -.
-pulavam que todos os menores ajudantes deveriam ser
apren-dizes (exceio os escravos). Um nfimero, miximo de apren~izes
era fixado por mestre, bem como a d~ração do aprendizado e
ções impediam que os aprendizes se tornassem oficiais, a-trasando ao miximo seus exames. Determinavam tamb6m a obri
gatotiedade d~ registrarem-se os contratos'do aprendizado
e a remuneração correspo~dente ao trabalho dO$ aprendi~es.
Toda a organização corpo~ativa do Brasil-colônia ,
com suas normas de controle do trabalho artesanal, pautou-se
pela da·metr6pol~. O monop61io das atividades artesanais e
ra mantido proibindo-se seu exercício aos trabalhadores não
ligados às corporaçoes; impedia-se tamb6m que os artesãos
trabalhassem em obras convencionadas corno pr6prias de
ou-tros. (17) Todas estas medidas limitavam o desenvolvimento
da produção e impediam o progresso da colônia.
Al'6m dos privi16gios mencionados', acima, dos quais
eram ciosos os oficiais artesãos, em algumas corporaçoes a
,"
ind~ era maior a discriminação racial:
.
"Havia ofícios cujo exercício nao convinha aos artesãos fossem confiados a escra
-vos. Quando isso acontecia, as corporaçoes
faziàm normas rigorosas inipedindo ou, pelo
menos, desincentivando o emprego de escra
-vos como oficiais e, em decorr~ncia,
procu-rava-se "branquear" o ofício,dificultando-o a negros e mulatos. Mouros e judeus, dota -dos, tamb6m, de características 6tnicas "in feriores", eram arrolados nas mesmas normas,
embora fosse improvável que seu número no
artesanato do Brasil-colônia merecesse refe
r~ncias especiais.
Com esse prop6sito, o compromisso de
Janeiro, al~m de proibir sua entrada, dizia: "Todo irmão em que se notar raçá de mula "to, mouro ou judeu, será expulso da lrmanda de sem remissão alguma. O mesmo se
entende-rá de" suas mulheres tendo qualquer das
so-breditas faltas". (18)
O desprezo com que a sociedade colonial tratava os negros estendeú-se ao tipo de trabalho que os mesmos execu tavam," ocorrendo com o tempo uma discriminação entre
qual-quer ofício físico ou ocupação manual, "por ser tarefa de
escravos" e as demais atividades sociais, sobretudo as de
cunho intelectual. Esta disciiminaçio era reforçada pela ~
ducação que os jesuítas ministravam aos f'ilhos dos colonos: enfatizavam uma cultura essencialmente especulativa e li
-vresca. Procuiava~ tamb~m polir as maneiras de seus
discí-pul~s, a~eiçoando-os i vida em meios mais cultos do que o
da maioria dos seus alunos.
Entretanto, nos col~gios e residências da Companhia
de Jesus no Brasil havia também núcleos de artesanato urba
no, que foram possivelmente os pri~eiros da colBnia. A
ca-r~ncia de a~tesãos na ~poca fez com que os jes~ítas manda~
sem vir da "Eur0pa irmãos oficiais: estes tinham corno incum
b~ncia nao s6 praticar aqui as suas especiali~ades, mas
também ensinálas, preferencialmente a crianças e adoles -centes, formando outros artesãos.
nos mesmps moldes do realizado nas oficinas eur9péias,onde os irmãos/oficiais haviam aprendido: os aprendizes iam
re
-cebendo tarefas acess6rias de produção em grau crescente ~ dificuldade.
Os principais oficios desempenhado~ pelos irmãos e ensinados aos seus escravos e indios eram os seguintes: a carpintaria (que era a principal atividade dos irmãos/ofi-ciais), a pintura de tetos, quadros, altares e bandeiras; os oficios executados nas olarias e ferrarias e também os de pedr,eiro, ladrilheiro, marcene.iro, etc. A fiação e a te celagem foram os oficios que mais se difundiram entre os indios das aldeias. E também o de boticirio, com a fabric~
ção de medicamentos: as virtudes medicinais.das plantas n~
tivas, descobertas e catalogadas pelos irmãos boticirios : levaram inclusive. i produção de novos medicamentos. Em
"
1706, a botica do colégio do Rio de Janeiro aba.stecia· as boticas da cidade, que vendiam ao p~blico. Também eram ex-portadas para a Europa ervas nativas, com as quais faziam os jesuitas um grande comércio, isento do pagamento de tri butos fiscais i Coroa.
Para concluir, estando caracterizado a.gora politi-ca, econ&mica e socialmente este primeiro período da
tolonização do territ6rio brasileiro e identificada a ideolo -gia que o dominou, faremos uma sintese, 4ue ~nvolveri as três partes do tripé formado pelo aparelho educacional de EstaQo:
desti-.'~ ._
....
. :.'
.....
nada aos meninos per.tencentes
à
classedominan-te da época, que recebiam ,uma. instrução de
ní-Vel "superior" ou "universitário"; de outro, o
adestramento ou treinamento destinado aos das
classes dominadas, visando ao preparo de
mão-de-obra esp~cializada, para servir aos interess~s
dos primeiros;
b) quanto aos professores, segue-se o comp~emento
da dualidade acima mencionada: a educação da ~
lite, ministrada por padres jesuítas especial -mente formados; a da classe dominada, por
mãos/óficiais e mestres/artesãos;
ir-t)
a s'o.ciedade colonial, s'egundo' o exposto, eraconstituida por escrav~s,'r~sponsáveis pela pr~
dução dos bens e prestação dos serviços ,os quais nao estudavam; índios não-livres .(pois recebiam
urna educação correspondente à sua importância
dentro da tribo e aos interesses político-econ~
micos e sociais dos detentores do aparelho edu-o
cacional) que eram "ferrados" pelos colonos
brancos sempre que a oportunidade se lhes apre-sentava, a despeito da proteção e protesto dos
padres; mestiços e brancos dominados pelo sist~
ma, que~ embora livres, também viviam em função
d~ produção de bens que não lhes pertenceriam
-assim, nãó possuiam condiç6es econ5micas para
e desmandos do monarca e seus prepostos, "eno -,brccidos" ou não; a classe dominante branca, que
controlava as relações de produção, sendo, por-tanto, senhora do produto final, do qual usufru ia, em benefício próprio'ou em nome da
Portuguesa.
A educação, controlada pelo aparelho educacional de Estado, destinava-se a reproduzir os valores desta clas
se dominante, alimentando e mantendo os preconceitos que
constituiam o suporte do seu poder: .uma sociedade composta
.'-:,,"-<de escravos e hO,mens livres, hierarquizados em classes so'-ciais, segundo seu poder econômico ou posição de mando den
tro do a2arel~0 de Estado.
Por conseguinte, o grande, e ,complexo aparelho
re-'.-, .",
pressor do Reino
"era secundado por um aparelho ideológico
tamb~m irande e complexo, 'coincidente com a
Igreja Católica, cuja burocracia, na ~poca,
estava integrada ao funcionalismo estatal . E'ste .. ;aparelho tinha por função difundir as ide,oi'ogi"as legi timadoras da exploração col2,. nial: voltada para o reforço dos integran tes do aparelho repressivo, para a aceita
-ção da domina-ção metropolita~a atrav~s do
reconhecimento da figura do rei de Portugal
e; finalmente, para aressocialização dos
índios, de modo a integri-los i economia da
Vimos tamb~m que o conhecimento transmitido era de
virias níveis: tanto podia ser o ertsino das primeiras
le-tras, quanto o estudo das humanidades, abrangendo o ensino
da gramitica e da ret6rica, e todo minist~ado em latim;das
artes, tamb~m chamado curso de ci~ntias naturais ou de
fi-losofi,a, onde durante tr~s anos se aprendia .16gica, física,
m·atemática, ~tica e metafís ica, sendo Arist6teles o princi:.
paI autor estudado (dava o título de bacharel); e da teolo
gia (que dava o título de doutor). Vemos, p~rtanto, que:
.... .-.
. ;.:
,', ....
"Numa formação so,:-ial, concebida histori:.· camente, nio se encontra apenas um
mas vários: fundamentalmente, os dominantes (das classes dominantes)
saber " saberes e os sa beres dominados (das classes dominadas). To
.
.
do ensino, operando neces~ar~amente por me i:.
o de um aparelho escolar, propõe-se a mini~
trar um saber dominante, mas não todos os
saberes dominantes. Eles estio hierarquiza-dos, de modo que hi saberes dominantes infe riores (por exemplo, o domínio da leitura e da escrita na língua dominante) e saberes dominantes superiores (por exemplo, o domí.;..
nio d~s priticas letradas mais complexas e
da f · l~OSO -1 f' la com e sem aspas ) " . (2 O)
Nessa estrutura de ensino, as crianças das classes dominadas, a menos que manifestassem vocação religiosa(quan
do, então;sua educaç50 estava assegurada), nao possuiam
condições para se instruirem, al~m. de"ler, escrever e
con-tal". Assim, a educação pouco podia contribuir para a
fi-lh6s dos proprietirios de terras e minas, mercadores metro
politano~ ou fWlcionirios burocr~ticos graduados podiam se
ilustrar. Estes dispunham ainda de mais um privi16gio: nao
podiam ser "presos para soldados", isto 6, recrutados
-
aforça para o s~rviço militar.
Como os voluntários que se alistavam nas milícias
do rei eram em nGmero insuficiente, os recrutadores comple
tavam seus efetivos com adolescentes presos à força,nas e~
colas; por esta razão, muitos pais preferiam que seus
fi-lhos não as freqUentassem. Os professores lamentavam a peE
da dos seus bons alunos, mas_quando algum deles se ~ostra
-;J"a
muito. rebelde_ e não obedecia, mandavam prendê-lo noquartel; e se, apesar da prisão, nao se recuperasse, era o brigado a "sentar praça", para que aprendesse a subordina-. -çaosubordina-.
o', • . • •
"Entretanto, em momentos de perigo, sua
organização e espírito de obediência,mais a localização estrat6gica dos co16gios, perm! tiram que eles participassem, de modo deci-sivo, na defesa do colônia contra os ataques de invasores holandeses (em Olinda, 1630, e
na Bahia; 1638) e franceses (no Rio de J anei
.-.
ro, lJio/l7ll). Sua participação na defesa
da colônia, iniciada espontaneamenie, na de
fesa deOlinda contra os holandeses, foi
institucionalizada, posteriorm~nte, com a
fOTmação de ~ompanhias de estudantes, em to
dos QS col,6gios jesuítas. Estas eram
compa-nhias normais de ~rdenanças, comandadas por
Durante dois s6culos e meio de dominação
portugue-sa, foi-se desenvolvendo e aprimorando à atividade educati
va dos jesuítas na colônia. Quando, em 1759, abandonaram o Brasil, aqui deixaram um número incalculável de "escolas de
ler e escrever~1 e seminários menóres, al6m .de 25 residên
-cias; 36 missões e l7co16gios e seminários maiores.
Quanto à's línguas estrangeiras modernas, vimos que nao eram ensinadas: neste perído, certamente se evitava o
seu aprendizado, por representarem, de certa for~a'- uma
a-meaça ao domínio português e ~ supremacia da religião cat6
lica. A cobiça das terras americanas, por parte
daspotên-. .
tias europ6ias, era grande: a Espanha já possuia 0 seu qu~
nhão, em decorrência do Tratado de Tordesilhas. Mas a Fran
ça, .alem da ameaça conéreta manif~stada pelas várias
inva-sões à colônia; ao longQ de todo este período, tinha o po-der ma·ior de suas idéias que, se di vuI'gada.s através. do en-sino da língua francesa, entrariam em choque com a
ideolo-gia do aparelho de Estado colonial portuguê~ e educativo
-religioso dos je~uítas. Quanto i lingua inglesa, embora ~o
fosse ensinada através do aparelho educacional de Estado ,
a ameaça de d9minação veio a se concretizar por meio do p~
derio naval. é.~econômico da Inglaterra, como veremos
1.2 Perrodo d~ 1759 a 1808: o imperialismo ingl~s
Durante os s6culos XVI e XVII, enquanto no Brasil
'Portugal procurava expandir e assegurar os seus direitos
como pot~ncia colonizadora, cada vez os via mais limitados
na Europa: a hegemonia conseguida no período das grandes
descobertas dos 'anos l50Ó desfazia-se paulatinamente,
che-gando 'i perda da soberania, quando os reinós da Espanha e
Portugal se juntaram, de l580'a 1640; e, posteriormente, a
pós a restauração do trono portugu~s, permaneceu durante
vinte e cinco anos sob a constante ameaça de invasões de
espanhóis, que nao queriam reconhecer a {ndepend~ncia lusi
tana.
Assim, para garantir a sua soberania, Portugal
a-proximou-se da Inglaterra, grande rivál da Espanha na
6po-ca. Desde o s6culo anterior, a coroa inglesa financiava e
protegia piratas em seus assaI tos aos galeões espanhóis que vinham da Am6rica carregados de ouro e outros produtos preciosos. Com o produto do saque,' os ingleses pagavam as
suas drvidris com os banqueiros e viabilizavam a primeira
fase da sua R~volução Industrial. Em troca de proteção
po-lrtico-militar, os poriugueses fizeram concessões
econBloi-,cas, numa s6rie'de acordos celebrados com a Inglaterra, c~
mo a obtenção pelos comerciantes 'ingleses de jurisdição ex -,
-traterritorial, tarifas aduaneiras especiais e, ainda, ta~
to na metrópole quanto nas colBnias" a renfincia ao desen
-volvimento das mapufaturas, para que o povo,compr.asse as
No inicio do s~culo XV;lI, as relações comerciais entre o imp~rio portugu~s e o britin~co_eram profundamente desvantajosas para o primeiro. Quando ocorreu a descoberta do óuro e o surto de mineraçio no, Brasil, o ouro extraIdo e remetido a Portugal passava rapidamente is mios dos ban-queiros ingleses; estes o empregavam no financiamento . da
indust~ializaçiq de seU pais.
Esta situação se agravou durante o reinado de D. Joio V, quando houve um grande déficit na balança ~e paga-mentos, gerado principalmente pelas desvantajosas relações de troca de vinhos portugueses por manufaturas inglesas.E~
1.e déficit foi coberto de forma perdi.tlária, com o o~ro
ex-._
....
;.'
traido das mina5 brasileiras. Quando, em 1750,subiu ao trono. de Portugal D.José I, a situação econ6mica do pais era'de extrema gravidade, "consequência-da governação des-cuidosa, exercida na embriaguez de um~ prosperidade surpr~
,', ....
endente, eterna a juízo dos que dela aprovei tavam". (22J
o
rei nomeou para a Secretaria de Neg6ciosEstran-gei ros - o que s.e supõe pelo empenho da rainha-mie e a pr~_
teçio do jesuita Luis da Cunha, confessor da soberana - Se bastião José de Carvalho e Melo, primeiro conde de Oeiras e primeiro m~rqu~s do Pombal. Homem firme e decidido,
Pom-..•.
bal procurou ,enfrentar a crise econômica existente e recu-perar a soberania portuguesa, praticamente perdida para a Inglaterra. Havia dois partidos na corte, resultantes de relações conflituosas entre nobres, misturadas com as rela
~ ,
em pouco tempo, tornou-se a figura principal do governo
com a facção do monarca obtendo a.hegemQnia interna~
Durante 65 s~culos XVII e XVIII,o qual fo~ thama
-do 'pelos contemporâneos de "século das luzes", em
oposi-çao
à
"era das trevas" representada pela Idade M~dia, imp~rou ~a Europa o Iluminismo, movimento cultural e intelectu
aI científico-na.turalista, que pretendia. dominar pela
ra-zão a problemitica total do homem. Dentre suas causas, des
tacamos 05 êxi'tos alcançados pelas ciências naturai.s na
~-poca, desvelando ao Homem a consciência de si-mesmo. A ra-zão humana julgou-se capaz de compreender de modo
exausti-:.Yj> a realidade, e propôs-se a transformar, de acordo com
. :
...
suas opiniões, tbdas as esferas da vida, pondo de lado a
história. Tambem no campo religioso o Iluminismo esperava
.
-e:ô.contra-y na razão, comum a todos 05 homens, um princípio
de unidade e de conciliação, para'suprimir as divisões em
.', .'.
materia de crença. Extraindo dos diversos credos religio
-50S o que possuíam de comum, obtinha uma religião natural
puramente racional; excluía esta qualquer tipo de revela -çao e vInculo sobrenatural, e tambem toda autoridade natu-ral recebida de Deus. Apresentava-se genatu-ralmente sob a for-o
ma de "deí
smq:",
como religião pura e primi ti va.o
Iluminismo iniciou-se na França e na Inglaterra;nesta, uniu-se ao empirismo de Locke e Hume, na França a
Descartes e na Holanda a Spinoza. Traço fundamental do Ilu
minismo, tanto francês quanto alemão l foi o racionalismo
(Leibniz, Ka~t, etc.); deu tamb~m origem ao radicalismo de
do movimento ideo16gico, criou espaço para o surgimento de várias outras doutrinas: na França, 'além da linha liberal
pr~-rev61u~ionária, destacaramse também a ideologia rea
-cionâria, adotada por Joseph de Maistre, ~ visconde de
Bo-nald e o conde Gobineau, e a soclal~sta,de Saint-Simon e
Fourier. (23)
As ideologias que os intelectuais franceses esta -vam criando serviram ao marquês de Pombal para "europeizar" seu país: julgava ele que na França havia boas idéias poli· ticas, que poderiam ser empregadas com proveito em Portu -galo Estas novas ideologias foram utilizadas sobretudo na ':j!-eforma da estrutura escolar, que Pombal procu,rou, realizar.
Os "estrangeirados". conforme foram então cognominados o·
~inistro e seu~ seguidbres, constituíam uma elite
intelec-. '. .
.
tual ativa. Mas o . Iluminismo em Portugal não manteve as
mesIl)..~~' características do adotado. na França e na
Inglater-ra: encontrou-se uma fórmula de composição com parte da I-greja Católica.
Para superar a dominação inglesa, Pombal tomou
me-didas destinadas a criar em Portugal o mesmo estím~lo ~ i~
dustrialização que se processava na Inglaterra. Pretendia,
assim, recupira~ o poderio econ6mico e tornar-se igual ao
do~inador. V~jamos quais foram as principa~s medidas, que·
pretendiam atingir tr~s objetivos principais, por ele toma
das para reconquistar a hegemonia de Pórtugal:
a) o incentivo
as
manufaturas na metr6pole,com suab) a acumulação de capital pGblico e privado pela
.
concessão de privilégio de monopólio do comér -cio dé certos bens a compahhias formadas na
me-tr~pole e n~ col&nia, como, po~ exemplo, a
Com-panhia do Grão-Pari e do Maranhão (que procurou apropriar-sedas atividades econ&micas desenvol vidas pelos jesuitas);
. c) a substituição das ideologias orientadas para ~ ma sociedade feudal por outras, orientadas para uma sociedade capitalista.
Para por em ~ritica estes objetivós, Pombal aumen-tou o poder do Estado, apoiando-se no
.
"regal~~o",doutri-.
na que riivindica ~ submissão ao rei de todas as' in5tinci-as de poder. Restringiu, in5tinci-assim, a influ~ncia que exercia parte da nobreza, principalmente' a,que tinha interesses nas col&nias, e as instituições que a apoiavam e legitimavam, entre elas a Companhia ~e Jesus. Este foi o m6vel politico da orientação, contra os jesuitas; além disso, estes eram .também contririos ao intento de reforço da acumulação de , capital, segundo relações capitalistas de produção, nas mãos de particulares e do Estado. Preferiam a'antiga ideo-logia, orientada para uma sociedade feudal, com a manutcn-çao dos privilégios conquistados:
"Durante os dois primeiros séculos da co
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