Fundação Getulio Vargas
-
RJ
EPGE
-
Escola de Pós-Graduação em Economia
Dissertação de Mestrado
Efeitos de Educação e Filhos na Oferta de
Trabalho das Mulheres Cônjuges nas Re.giões
Metropolitanas
Orientador: Afonso Arinos de Mello Franco Neto
CcrOrientador: Lauro Roberto Albrecht Ramos
. /
Mestrando: Alexandre Zioli Fernandes
Índice
Capítulo 1) Introdução ... 1
Capítulo 2) Enfoques Teóricos ... 5
2.1) A Teoria Neoc1ássica e a Teoria de Alocação de Tempo ... 5
2.2) Modelos de Oferta de Trabalho ... 7
2.2.1) Oferta de Trabalho Individual ... 7
2.2.2) Oferta de Trabalho Conjunta ... 9
2.2.3) Teoria da Produção Doméstica ... 13
Capítulo 3) A Mulher e o Mercado de Trabalho Brasileiro ... 17
3. 1) Condição de Ocupação ... 18
3.2) Participação no Mercado de Trabalho e Renda Familiar ... 21
3.3) Nível de Escolaridade e Razão de Dependência ... 24
3.4) Grau de Escolaridade do Homem e da Mulher ... 25
3.5) Taxa de Participação e Faixa Etária ... 27
Capítulo 4) Modelos para a Oferta de Trabalho das Mulheres ...•... 29
4.1) Primeiro Modelo de Oferta de Trabalho da Mulher ... 30
4.2) Segundo Modelo de Oferta de Trabalho da Mulher.. ... 35
Capítulo 6) Resultados Obtidos ... 50
Capítulo 7) Conclusões ... 72
Apêndice ... 75
A.I) Regressões Auxiliares ... 75
A.2) Modelo Probit ... 79
Índice de Tabelas
1.1) Taxas de Participação no Mercado de Trabalho por Sexo - Brasil ... 1
l.2) Taxa de Participação Feminina - EUA ... 2
3.1) Distribuição Relativa das Mulheres Pertencentes às Famílias Nucleares
de Acordo com a Participação no Mercado de Trabalho ... 18
3.2) Condição de Ocupação das Mulheres Metropolitanas de Acordo
Com a Posição na Família - 1996 ... 19
3.3) Média de Horas Trabalhadas para as Mulheres de Acordo com
a Posição na Família - 1996 ... 20
6.1) Estimativa do Modelo Básico para as Mulheres Cônjuges
Metropolitanas com Idade entre 18 e 59 anos - 1996 ... 51
6.2) Efeito nas Probabilidades dos Cônjuges Femininos Participarem
do Mercado de Trabalho Metropolitano - 18 a 59 Anos ... 55
6.3) Taxa de Participação, Idade Média e Número de Observações para os
Cônjuges Femininos Metropolitanos de Acordo com a Presença
de Filhos e o Grau de Instrução da Mulher - 18 a 59 Anos ... 60
6.4) Proporções Relativas aos Cônjuges Femininos Metropolitanas que
6.5) Estimativas do Modelo Modificado Para os Cônjuges Femininos
Metropolitanas com Idade Entre 18 e 35 Anos ... 62
6.6) Efeito nas Probabilidades dos Cônjuges Femininos com Idade Entre
18 e 35 Anos Participarem do Mercado de Trabalho Metropolitano .... 63
6.7) Taxa de Participação, Idade Média e Número de Observações para
os Cônjuges Femininos Metropolitanos de Acordo com a Presença
de Filhos e o Grau de Instrução da Mulher - 18 a 35 Anos ... 69
AI) Estimativas do Xbeta para as Mulheres Cônjuges Metropolitanas
Com Idade entre 18 e 59 Anos ... 77
A2) Efeito nas Probabilidades dos Cônjuges Femininos Participarem do
Índice das Figuras
2.1) Maximização da Utilidade Segundo o Modelo de Produção Doméstica 15
3.1) Taxa de Participação dos Cônjuges Femininos Metropolitanos
Segundo a Renda Não Trabalho da Mulher ... 22
3.2) Taxa de Participação dos Cônjuges Femininos Metropolitanos
Segundo a Renda Familiar per Capita ... 23
3.3) Grau de Instrução dos Cônjuges Femininos Metropolitanos por Decil
Ordenado Segundo a Renda Familiar Per Capita ... 24
3.4) Razão de Dependência das Famílias Nucleares Metropolitanas por
decil Ordenado Segundo a Renda Familiar Per Capita ... 25
3.5) Escolaridade Média das Mulheres Metropolitanas de Acordo com
os Anos de Estudo do Marido - 1996 ... 26
3.6) Taxa de Participação dos Cônjuges Femininos Metropolitanos
de Acordo com o Grupo Etário - 1996 ... 27
4. 1) Curva de Oferta Individual do Cônjuge Feminino Segundo a
Renda do Marido - Primeiro Modelo ... 34
4.2) Curva de Oferta Individual do Cônjuge Feminino Segundo a
Renda do Marido - Segundo Modelo ... 40
4.3) Curva de Oferta Individual do Cônjuge Feminino Segundo a
1. Introdução
Entre os vários fatores que determinam o desenvolvimento econômico de um
país, um dos que se destacam e merecem maior atenção é a sua dotação de
mão-de-obra. Este fator torna-se particularmente importante para o desenvolvimento quando
levamos em conta seu nível médio de especialização e a eficiência como é alocado nos
diversos setores da economia.
Evidências empíricas apontam que, durante a década de 80, houve uma
utilização relativamente baixa da mão-de-obra feminína no Brasil, o que pode ser
avaliado tanto em termos domésticos, observando-se a taxa de participação no
mercado de trabalho das mulheres relativamente à dos homens (Tabela 1.1), como
também em termos internacionais, através da comparação das taxas de participação
das mulheres no Brasil com a das mulheres nos Estados Unidos (Tabela 1.2). Desta
forma, apesar da taxa de participação feminína ョセ@ Brasil apresentar um crescimento
gradual, pode-se dizer que ela ainda é relativamente baixa aos níveis internacionais.
Tabela 1.1
Taxa de Participação no Mercado de Trabalho por Sexo - Brasil - 1981/90 - %
Ano 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 Homens 79.9 80.6 80.0 79.6 81.1 81.1 82.5 81.9 81.4 80.9 Mulheres Total Cônjuges
37.2 27.7
39.4 30.3
39.4 30.7
40.2 31.8
41.3 33.1
42.3 34.3
43.7 36.1
44.0 36.4
43.7 37.0
44.4 38.2
Tabela 1.2
Taxa de Participação Feminina no Mercado de Trabalho - Estados Unidos -%
Ano Cônjuges Total
1900 5.6 20.6
1910 10.7 25.5
1920 9.0 24.0
1930 11.7 25.3
1940 13.8 26.7
1950 21.6 29.7
1960 31.9 37.7
1970 40.5 43.3
1980 49.8 51.5
1988 56.7 56.6
1992 59.4 57.9
Fonte: Ehrenberg e Smith (1996)
No caso brasileiro, estudos empíricos mostram que existe uma relação
positiva entre a taxa de participação da mulher no mercado de trabalho e o nível de
renda da famílial, de forma que em famílias cuja renda familiar per capita2 é maior,
observa-se uma maior taxa de participação da mulher, evidenciando a existência de
uma correlação positiva entre a taxa de participação das mulheres no mercado e o nível
de renda da família. Por outro lado, estratificando-se as famílias, não pela sua renda
per capita, mas sim pela renda do trabalho do ュ。イゥ、セL@ observa-se uma relação em
forma de "U', encontrando-se as maiores taxas de participação da mulher no mercado
de trabalho nas extremidades da curva3.
Diante desta indicação inicial de que uma maior participação no mercado de
trabalho das mulheres pertencentes às famílias mais pobres aumenta a probabilidade
1 Ramos e Soares (1995)
2 Renda familiar per capita é definida como sendo a soma da renda de todos os indivíduos dividida
pelo número de individuos que compõem a unidade familiar.
destas famílias atingirem um nível de renda aCima da linha de pobreza, fica uma
indagação do motivo pelo qual esta participação é tão baixa entre elas. Da mesma
forma, mesmo para as famílias que não são necessariamente pobres, resta saber por
que a taxa de participação feminina ainda é relativamente baixa.
Durante o processo de decisão da oferta de trabalho, podemos identificar uma
série de fatores relevantes que são levados em conta pelos indivíduos e/ou famílias,
alguns de ordem econômica como o salário de mercado esperado, taxa de desemprego,
renda não-trabalho e seu próprio nível de capital humano, outros pertinentes à
estrutura familiar, como o número de filhos e a idade deles, o ciclo de fertilidade das
mulheres, e até mesmo fatores de dificil mensuração, geralmente por serem variáveis
qualitativas e que envolvem fatores culturais.
o
objetivo desta dissertação é tentar captar como algumas variáveis, em particular a presença de filhos pequenos e o nível de escolaridade, influenciam atomada de decisão das famílias sobre a alocação do tempo da mulher no mercado de
trabalho, identificando quais delas têm o maior peso relativo na composição da decisão
familiar. Este mesmo exercício, além de ser feito para o conjunto total das famílias é
também feito para famílias de baixa renda. Esperamos ser possível, com base nestes
resultados, estabelecer áreas de atuação prioritárias para estudos futuros que visem a
elaboraçãO de programas sociais mais eficazes (em termos de relação custo-beneficio)
para aumentar a participação no mercado de trabalho das mulheres pertencentes às
famílias de baixa renda4. Tomando-se como base o fato de que a oferta de trabalho de
um indivíduo, pertencente a uma família, é o resultado de um processo de maximização
da utilidade familiar, serão desenvolvidos ao longo da dissertação alguns modelos
teóricos relativos a esta questão, os quais servirão para orientar a análise dos
resultados.
o
trabalho está dividido em seis seções. Na primeira seção temos uma breveexplanação teórica e a apresentação de alguns modelos teóricos a respeito da decisão
de oferta de trabalho, tanto individual como também do casal, para maximização da
utilidade familiar, sendo estes últimos separados entre os modelos seqüenciais e os
modelos simultâneos. A segunda seção descreve caracteristicas do mercado de
trabalho brasileiro e a importância relativa das mulheres cônjuges que participam dele,
apresentando dados estatísticos a respeito da taxa de participação das mulheres de
acordo com os conceitos de renda relevantes, além de algumas correlações da renda
com o capital humano e número de filhos do casal. A terceira seção apresenta os
modelos セ・イゥ」ッウ@ propostos para o estudo da oferta de trabalho das mulheres cônjuges.
A quarta seção apresenta a descrição da população alvo e a definição da base de
dados, assim como o modelo eco no métrico a serem utilizados. Na quinta seção são
descritos os resultados obtidos para os parâmetros das regressões feita e a análise dos
mesmos. Na última seção temos a conclusão final do trabalho.
A cesta de bens de consumo (ou bem composto de Hicks) é adquirida
exclusivamente no mercado, cujo vetor de preços é representado por P. Este indivíduo
deve decidir como distribuir o seu tempo disponível (T) entre duas atividades, trabalho
(H) e lazer (L). A remuneração por uma unídade de tempo no mercado de trabalho é
dada pelo salário de mercado (W), portanto, a renda do trabalho que indivíduo recebe
é igual a WH. Além disto, existe a possibilidade do indivíduo ter uma renda
não-trabalho (N). O valor total do consumo do indivíduo não pode ser superior à sua renda
efetiva (M), logo surgem duas restrições, uma de tempo e a outra orçamentária:
T=H+L
PX=WH+N=M
Combinando-se as restrições, o problema de maximização do indivíduo será:
MAXx'L U(X,L)
Sujeito a: PX
+
WL = WT+
NO termo à direita da restrição orçamentária representa a renda potencial do
indivíduo. Para efeito da análise vamos supor que as curvas de indiferença são
estritamente convexas à origem, garantindo que existe um ponto de ótimo, e que este é
único. A partir da solução deste problema pode-se construir a curva de oferta de
trabalho do indivíduo em função do salário e dos preços dos bens de consumo,
A inclinação da restrição orçamentária é igual ao salário enquanto que a
inclinação da curva de indiferença mede a taxa marginal de substituição de lazer por
renda. Logo, se as curvas de indiferença de um indivíduo são "mais verticais", significa
que para o indivíduo abrir mão de uma hora de lazer, ou seja, aumentar uma hora de
trabalho, é preciso que o salário seja muito alto. Se o salário no mercado for inferior ao
salário necessário para compensar a perda de uma hora de lazer para todas as horas
possíveis de lazer, então a escolha ótima do indivíduo será excluir-se do mercado de
trabalho.
Um aumento da renda não-trabalho gera um efeito renda puro, pois houve um
aumento na renda potencial, porém o salário de mercado manteve-se constante,
deslocando paralelamente a restrição orçamentária. Como o custo do lazer permaneceu
constante, o consumo de lazer aumenta. Um aumento do salário de mercado produz
um efeito renda, pois isto gera um aumento da sua renda potencial, e um efeito
substituição, devido ao aumento do preço do lazer. O indivíduo irá consumir mais
(menos) lazer se o efeito renda for, em valores absolutos, maior (menor) que o efeito
substituição.
2.2.2) Oferta de Trabalho Conjunta
A utilização do modelo de oferta individual, por construção, toma-se
inadequado quando o objetivo é explicar o comportamento de indivíduos que formam
uma família. É pouco plausível pensarmos que os indivíduo pertencentes à uma família
estejam interessados em maximizar unicamente as suas utilidades indivíduais, ao invés
supor que somente os cônjuges ofertam trabalho, ficando os filhos fora do mercado de
trabalho. O tempo dos cônjuges é dividido entre três atividades: a) o trabalho no
ュ・イ」。、ッセ@ b) a produção doméstica, que são todas as atividades ligadas ao domicílio
(como limpeza e preparo de refeições entre outros) e à família (educação dos filhos,
por ・ク・ューャッIセ@ e c) lazer. A maximização da utilidade familiar nos fornece a quantidade
de horas que cada um dos cônjuges dedicará ao trabalho, à produção doméstica e ao
lazer. O modelo será simplificado através de uma modificação quanto ao conceito de
lazer, sendo este redefinido como sendo a soma do tempo alocado a todas as
atividades domésticas e o lazer propriamente dito, para a partir daí, estudar como a
mulher divide seu tempo entre estas duas atividades: "lazer" (ou atividades
extra-mercado) e trabalho.
Vamos a seguir esboçar um primeiro modelo de decisão familiar conjunta,
chamado de modelo simultâneo, baseado na nossa simplificação das atividades do
casal. Consideramos que a família toma as suas decisões de modo a maximizar sua
função utilidade conjunta, que é função da cesta de consumo da família e do "lazer" do
casal, sujeita a uma restrição orçamentária e a uma restrição de tempo.
Existem três tipos distintos de renda no modelo: renda não-trabalho da família
(N), a renda trabalho do marido (WhHh) e renda trabalho da mulher (WmHm), onde Wi
e Hi são o salário recebido e as horas trabalhadas pelo indivíduo i, i = h, m. A renda
efetiva da família é composta pela soma destas três parcelas.
compõem a cesta (X), ou seja, px. A restrição orçamentária da família será dada então
por:
Admitimos que a família pode dividir a dotação de tempo disponível do casal
T, por simplicidade admitido como sendo igual para ambos, entre o tempo dedicado às
atividades de mercado e o tempo dedicado para o "lazer". A restrição de tempo da
família é:
onde: Li = tempo alocado com o "lazer" pelo indivíduo i, i = h,m. Juntando-se
as restrições chegamos a:
PX + WJ-h + WmLm = (Hh + HrrJT + N
Onde o termo à direita representa a renda potencial da família. Então o
A solução deste problema detennina as curvas de oferta de trabalho ótima do
casal, em função dos preços dos bens de mercado e do salário.
Um segundo modelo adiciona a hipótese de que o processo de maximização
da utilidade se dá em dois estágios de tempo e as conclusões obtidas a partir deste
modelo, no que tange à relação entre a renda do marido e a decisão da mulher, são
interpretadas como decorrentes de uma relação causal. A interpretação causal depende
da aplicabilidade da hipótese de que existe uma separação na decisão familiar do casal.
Num primeiro instante o marido decide a intensidade de sua participação no mercado
de trabalho e, dada a decisão do marido, a mulher decide se trabalha ou não. A
hipótese de que a decisão do marido independe da decisão da esposa, mas não o
contrário, caracteriza o chamado Modelo Seqüencial6. Dentro desta hipótese, o marido
decide no primeiro momento qual será a sua oferta ótima de trabalho, de forma a
maximizar o consumo total da família e o seu consumo de "lazer", sem levar em conta
o consumo de Bャセ・イB@ da mulher. Ou seja, neste estágio o homem estará resolvendo o
seguinte problema de maximização:
sujeito a: PX
+
セlィ@=
N+
セt@A solução desta maxmuzação é dada pelo conjunto (X *,
HZ,
lセI@ eindepende da decisão de trabalho da mulher. Esta, por sua vez, no estágio seguinte,
A solução deste problema detennina a oferta de trabalho ótima da mulher. A
segunda restrição indica que o consumo total da família não pode ser inferior ao
consumo detenninado pelo homem no estágio inicial, mas pode ser igual no caso onde
a oferta de trabalho ótima da mulher seja igual a zero.
Pode-se mostrar que os efeitos qualitativos advindos deste modelo são os
mesmos obtidos no contexto mais realista do modelo de decisão simultânea, desde que
admitamos a hipótese de que os tempos do homem e da mulher são substitutos no
"lazer", isto é, o aumento da oferta de trabalho de um dos cônjuges tende a diminuir a
oferta· de trabalho do outro. Com esta hipótese, a natureza dos resultados em termos
de efeito-renda e efeito-substituição seriam iguais em ambos os modelos7.
2.2.3) Teoria da Produção Doméstica
A Teoria da Produção Doméstica é uma abordagem mrus recente que as
anteriores na tentativa de explicar a oferta de trabalho da família. Esta teoria leva em
conta a existência de uma interdependência das decisões de trabalhar individuais dos
membros de uma família e que o tempo que não é alocado no mercado de trabalho não
é alocado exclusivamente para consumo de lazer e sim para produção doméstica
também, acrescentando a hipótese central referente à forma como a produção
doméstica será realizada e como isso contribui para a determinação da alocação do
tempo entre as atividades domésticas e de mercado. Muitos dos bens que são
consumidos por uma família são - ou podem vir a ser - produzidos domesticamente.
Por exemplo, combinando-se alimentos comprados no mercado com tempo - além é
claro de um certo grau de esforço fisico - uma família pode produzir refeições que
serão consumidas por todos. O tempo doméstico combinado com uma série de
insumos como vestuário, alimentação e serviços destinados à higiene podem produzir
cuidados com os filhos. Desta forma, o cônjuge que fica mais tempo em casa passa a
ter uma maior responsabilidade sobre a produção doméstica.
A decisão da família agora passa a ser não somente o que consumir mas
também como produzir o que irá ser consumido. Por simplificação, vamos imaginar
uma família que consome apenas um bem, refeições. Com esta simplificação, a família
passa a ter apenas uma decisão a tomar: como produzir refeições. Existem várias
formas de se produzir uma refeição, mas vamos citar três exemplos. O primeiro
consiste em comprar comida congelada, o que representa uma grande quantidade de
bens de mercado - em termos de valor de mercado - e uma pequena quantidade de
tempo - apenas o necessário para aquecê-la. O segundo consiste em comprar alimentos
que serão combinados domesticamente para preparar as refeições, levando a uma
quantidade intermediária de bens de mercado e tempo. O terceiro exemplo seria
produzir domesticamente os insumos necessários - através de plantio, por exemplo - e
combiná-los, preparando-se assim a refeição, o que necessita poucos bens de mercado
e muita quantidade de tempo. Em termos de utilidade, uma refeição traz um
determinado nível de bem estar, independente da forma como foi preparada,
permitindo desta forma que sejam agrupadas em curvas de indiferença. Estas curvas
são negativamente inclinadas e convexas, pois o tempo e os bens de mercado são
substitutos na produção de refeições e se um dos dois bens for relativamente muito
mais utilizado na produção de refeições, fica mais fácil manter a utilidade constante
substituindo uma grande parte dele por uma pequena parcela do outro. Através da
análise gráfica temos:
Figura 2.1
Maximiza ão da Utilidade Se ndo o Modelo de Produção Doméstica
Gastos com bens de mercado
A
c
to t1 Tempo na produção doméstica
Ao longo das retas A, B e C a razão entre os bens utilizados na preparação de
refeições e o tempo necessário para esta produção é constante, sendo a primeira a
menos intensiva e a última a mais intensiva em tempo. Na figura estão representados
duas situações de equilíbrio para o tempo ótimo de um dos cônjuges na produção
doméstica. No primeiro caso temos uma família que só tem a renda que recebe pela
venda de trabalho no mercado. As curvas de indiferença já trazem embutida a
tecnologia de produção doméstica que transforma bens de mercado e tempo em
consumo final. Em seu ponto de ótimo, determinou-se que a produção doméstica será
intensiva em tempo vis-à-vis os bens adquiridos no mercado. As estáticas comparativas
para aumentos exógenos da renda não-trabalho e do salário de mercado do cônjuge
responsável pela produção doméstica levam aos mesmos resultados encontrados no
modelo de decisão conjunta para os efeitos renda e substituição. A determinação de
qual cônjuge será o responsável pela produção doméstica não está explícita no gráfico
e depende de dois pontos básicos: a) quem é relativamente mais produtivo nos
trabalhos domésticos, que depende de quem consegue produzir セ。ゥウ@ bens domésticos,
dada uma quantidade de tempo e de bens de mercado; e b) quem é mais produtivo no
mercado, que depende de quem tem mais poder no mercado para adquirir uma maior
quantidade de bens. Se a família decide que um dos cônjuges deve permanecer em
casa, isto indica que, dentro da maxirnização de recursos, este cônjuge tem um
3) A Mulher e o Mercado de Trabalho Brasileiro
Antes de iniciarmos a modelagem do presente estudo, é importante descrever
as mulheres brasileiras de acordo com suas características sócio-econômicas, tais como
sua posição na família, nível educacional, condição na ocupação, grupos etários, etc.
Desta forma, podemos entender melhor a população que estamos estudando e
caracterizar a importância relativa destas na economia.
Dentro das pesquisas estatísticas realizadas no Brasil, as pessoas que
compõem uma unidade familiar residindo no mesmo domicílio são classificadas em
categorias de acordo com a sua posição na família, sendo o chefe a pessoa de
referência da família e que seria o principal responsável pelas tomadas de decisões
familiares ou a quem em muitos casos está atribuída a maior renda individual, podendo
• ser tanto um homem como uma mulher, seguindo-se pelo seu cônjuge, os filhos deste
casal, os demais parentes e as outras pessoas que セッイ。ュ@ no domicíli08 .
Como neste presente trabalho estamos interessados nos cônjuges femininos,
fizemos uma nova classificação para as mulheres, sendo Chefe a categoria referente
exclusivamente às mulheres que são a unidade de referência familiar e que não são
casadas, isto é, são solteiras, divorciadas, viúvas, etc. As Cônjuges serão aquelas que
vivem em união com o marido, podendo ser tanto chefe como cônjuge pela
classificação original. As demais classificações seguem o modelo original das
8 As outras pessoas que são compõem uma unidade familiar são classificadas nas categorias
pesqUlsas. A partir desta nossa classificação, calculamos a participação relativa das
mulheres residentes nas regiões metropolitanas pelas categorias de posição na família,
conforme a Tabela 3.1.
Tabela 3.1
Distribuição Relativa das Mulheres Metropolitanas De Acordo Com a Posição na Família - 1996
Poso Fam. Chefes Cônjuges Filhas Parentes Outros
Parto Rei. (%) 10,6 40,9 40,3 6,9 1,3
Fonte: PNAD/96 - Tabulações especiais do autor
De acordo com estes resultados, podemos observar que a maior parcela das
mulheres enquadram-se dentro da categoria Cônjuges, seguidas pelas Filhas e
representando ambas em conjunto por mais de 80% do total das mulheres
metropolitanas. Vemos assim que os cônjuges femininos têm uma representação
altamente significativa entre as mulheres dentro da população.
3.1) Condição de Ocupação
Pela Tabela 3.2 temos uma visão da distribuição das mulheres pela sua
condição de ocupação segundo a posição na família para o ano de 1996. A
estavam exercendo alguma atividade ou que estavam procurando emprego9.
Observamos desta fonna que a taxa de participação das mulheres Cônjuges é 8,5
pontos percentuais inferior à taxa de participação das mulheres Chefes, além de
continuar bem abaixo da taxas internacionais. A categoria Outros é a que observa a
maior taxa de participação no mercado de trabalho, o que faz sentido pois nela estão
incluídas as empregadas domésticas que residem no domicílio, sendo a categoria mais
representativa nesta agregação, e que logicamente estão participando do mercado de
trabalho.
Tabela 3.2
Condição de Ocupação das Mulheres Metropolitanas De Acordo Com a Posição na Familia - 1996
Posição na Fora da Participam da PEA
Família PEA Trabalham Proc. Emp.
Chefes 46.8 49.7 3.5
Cônjuges 55.4 40.0 4.7
Filhas 77.9 17.6 4.5
Parentes 73.9 22.2 3.9
Outros 20.3 77.3 2.4
Fonte: PNAD/96 -Tabulações especiais do autor
Os possíveis motivos para as mulheres Cônjuges pennanecerem fora do
mercado de trabalho podem ser separados em dois grupos. No primeiro encontram-se
aqueles que levam as mulheres a não participar do mercado de trabalho por vontade
própria ou da família, ou seja, em alguns casos a mulher trabalhar fora não
representaria o ponto de máximo de utilidade familiar, ou seja, em tennos de custo
beneficio, existiriam vantagens relativas para ela ficar responsável exclusivamente pela
9 O conceito de trabalho adotado pela PNAD a partir de 1992 foi alterado em relação ao adotado para
produção doméstica quando o valor da produção dela no mercado de trabalho for
inferior ao valor da sua produção doméstica, para qualquer quantidade de tempo
,
possível. No segundo grupo, os motivos estão ligados a uma restrição à participação
da mulher no mercado, podendo ser pelo próprio mercado quando as mulheres,
embora querendo, não conseguem entrar no ou retornar ao mercado de trabalho por
alguma razão, como por exemplo terem se mantido fora do mercado de trabalho
quando jovens e terem dificuldades de entrar após uma certa idade, devido a falta de
experiência, ou até mesmo por motivos ligados a fatores culturais dentro do núcleo
familiar, quando o marido não quer a mulher trabalhando fora de casa, mesmo que isso
não venha a gerar um aumento de utilidade familiar.
o
tempo disponível de uma pessoa pode ser dividido entre atividades nomercado de trabalho e atividades fora do mercado de trabalho, tais como atividades
domésticas e lazer. Considerando-se apenas as mulheres que trabalham, calculamos a
média de horas trabalhadas por semana de acordo com a sua posição na família e
reportamos os dados na Tabela 3.3.
Tabela 3.3
Média das Horas Trabalhadas para as Mulheres De Acordo Com a Posição na Família - 1996
Posição na Horas
Família Trabalhadas
Chefes 38,6
Cônjuges 37,0
Filhas 39,2
Parentes 40,0
Outros 44,6
F ente: PNAD/96 - T abulaçõos especiaiS do autor
A partir da análise destes dados, podemos perceber que entre as mulheres que
trabalham, as mulheres Cônjuges são aquelas que em média alocam a menor parcela do
seu tempo disponível no mercado. Isto pode sugerir que o processo de alocação do
tempo destas mulheres se dá de forma diferenciada às demais, onde as atividades fora
do mercado de trabalho parecem ter uma importância relativa maior para estas
mulheres.
3.2) Participação no Mercado de Trabalho e Renda Familiar
Partindo da amostra total, separamos todas as famílias nucleares 10, que
representam aproximadamente 52,3% do total de famílias residentes nas regiões
metropolitanas1\ formando assim um conjunto bastante representativo em relação ao
total de famílias, além da vantagem de compor uma amostra mais homogênea, e
estratificamos este subconjunto agrupando por famílias da seguinte forma: cnamos
uma variável denomínada RENDAHPC12, definida como sendo a razão entre o
somatório da renda famíliar excluindo-se porém a renda do trabalho da mulher cônjuge
e o número total de membros da família, calculada para todas as famílias. Estas famílias
foram divididas pela RENDAHPC e ordenadas por décimos de forma que no primeiro
décimo encontram-se as famílias cuja RENDAHPC está entre as 10% mais baixas, no
10 Define-se uma unidade familiar nuclear como sendo uma família composta apenas por um casal e
seus filhos, quando estes últimos estiverem presentes. A escolha deste subconjunto em particular é
justificada pelo fato de que será esta a amostra utilizada nos nossos exercícios econométricos.
11 Em valores expandidos pela amostra, são cerca de 6,7 milhões de famílias nucleares contra 12,8
milhões de fanúlias nas regiões metropolitanas.
segundo décimo estão as famílias cuja RENDAHPC está entre as 10% e 20% mais
baixas e assim sucessivamente, até o último décimo onde encontram-se as famílias cuja
RENDAHPC está entre as 10% mais altas, totalizando assim dez estratos classificados
por renda. Para cada décimo calculamos o valor médio da RENDAHPC - depois
transformado em valores logarítmicos - e a taxa de participação das mulheres cônjuges
e plotamos os resultados através de interpolação para unir os pontos conforme pode
ser visto na Figura 3 .1.
TxPatt. 0.58Or I 0.56Ol-I 0.5401-05J
oJ
I i 0.48Oj-! I I 0.46Ot I 0.440'2.50 3.00
Fi ura 3.1
Taxa de Participação dos cônjuges femininos metropolitanos segundo a renda não trabalho da mulher -/996
3.50 4.00 4.50 5.00 5.50. 6.00 6.50
fonte: PNAD/96 - elaboração própria do autor
7.00 7.50
Log daRendaHPC
podemos notar pela Figura 3. 1 uma curva em forma de "U" para o ano de
1996, conforme já observado empiricamente em Sedlacek (1991). Ou seja, em famílias
onde a renda "não-trabalho da mulher" per capita é baixa, verifica-se uma alta taxa de
participação dos cônjuges femininos, decrescendo conforme esta renda vai aumentando
até um certo nível, quando a taxa de participação dos cônjuges femininos passa a ser
Para este mesmo subconjunto populacional, calculamos a renda familiar per
capita ( RFPC ), ou seja, a renda total de todas as fontes da família (inclusive a renda
do trabalho da mulher cônjuge) dividida pelo número de membros da família e
estratificamos as famílias nos mesmos moldes da estratificação anterior13. Calculamos a
taxa de participação das mulheres e a RFPC média por decil e plotamos os resultados
-novamente através de uma interpolação dos pontos - na Figura 3.2.
TxPatt.
ZZZェセ@
0.600
::)
0.450
1
0400t
O·350t
I
Fi ura 3.2
Taxa de Par1icivação dos cômUfles femininos metrovolilanos seflllndo a renda familiar ver cavila -1996
O 300
r
PNRUPMゥMMMセMMMKMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセ@
2.40 2.90 3.40 3.90 4.40 4.90 5.40 5.90 6.40 6.90 7.40
LogdaRFl'C
fonte: PNAD/96 -elaboração própria do autor
Neste caso percebemos que a taxa de participação dos cônjuges femininos e a
renda famíliar per capita estão positivamente correlacionadas, ou seja, conforme a
RFPC aumenta, observa-se uma maior participação das mulheres cônjuges no mercado
de trabalho.
\3 Por este conceito de renda, é possível determinar-se, pelo método de mensuração pela linha de
3.3) Nível de Escolaridade e Razão de Dependência
Mantendo-se esta mesma estratificação de renda anterior, calculamos o nível
de escolaridade médio das mulheres cônjuges (que pode ser medido pelo número de
anos de estudo completos por mulher) e a razão de dependência média por décimo14,
plotados nas Figuras 3.3 e 3.4 respectivamente.
Anoo de estudo
Fi ura 3.3
Grau de instruçao dos cônjuges femininos metropolitanos por décimos ordenado segundo a renda familiar per capila -1996
QRLMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセセ@
I
QPセGMMMMセMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
XイMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMセセM
VイMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM\]]⦅セ@
2 エMャゥセiMMMmセi⦅M
2 3 4 5 6 . 7 8 9
fonte: PNAD/96 -elaboração própria do autor
10
Decil
14 A razão de dependência pode ser definida de várias fonnas. Neste caso específico está definida
como sendo a razão entre o número total de filhos entre O e 15 anos de idade residentes no domicílio e
Fi ura 3.4
RDcp Razão de Dependência das famílias nucleares metropolitanas por décimos ordenado segundo a renda familiar per capita -1996
0.60 ,
-0.50 KMエQセZャ⦅M⦅]Z⦅⦅MMMMMMMMMMMMMMMMMMM
0.40
0.30
0.20
0.10
0.00
fonte: PNADf96 -elaboração própria do autor
10 Doai
Podemos perceber claramente que, em relação à educação, existe uma
correlação positiva entre a média de anos de estudo e o nível da renda familiar per
capita, de forma que nas famílias cuja renda familiar per capita encontra-se entre as
mais elevadas observamos um maior grau de escolaridade médio para os cônjuges
femininos. Olhando-se pelo lado da razão de dependência, a correlação passa a ser
negativa, ou seja, conforme as famílias atingem os níveis de renda familiar per capita
mais elevados, a proporção média de filhos dentro da família cai, indicando que as
famílias mais pobres têm em média um maior número de filhos.
3.4) Grau de Escolaridade do Homem e da Mulher
Para verificar a existência de alguma correlação entre o capital humano dos
cônjuges masculino e feminino, utilizamos a variável nível de escolaridade, que é a
mais usualmente utilizada como proxy para esta medida. Para isto, dentro de cada
cônjuges masculinos, compondo assim 18 níveis de escolaridade15 e estratificamos a
amostra total seguindo esta classificação. Para cada um destes estratos educacionais
calculamos o número médio de anos de estudo dos cônjuges femininos e plotamos os
resultados obtidos na Figura 3.5.
_ 16
• 14
<
• 12
セ@
·
:;; 10
セ@
Fi ura 3.5
EscoÜJrüúuJe Média das Mulheres Metropolitanas De Acordo com os Anos de Estudo do Marido -1996
10 11 12 13 14 15 16 17
MOI de Estudo Do Hanma
fonte: PNAD/96 - elaboração própria do autor
Podemos perceber que a educação dos cônjuges masculinos e femininos são
linearmente e positivamente correlacionados, o que serve de indicador para os
pressupostos teóricos de que o nível de capital humano do casal é positivamente
correlacionado 16, além de fornecer também respaldo à hipótese de que existe uma
tendência natural das pessoas se relacionarem melhor com outras pessoas que tenham
caracteristicas semelhantes às suas.
15 O número de anos de estudo completos vai de zero, indicando uma pessoa sem nenhuma
escolaridade, seguindo até 17 anos, faixa que engloba também pessoas com mestrado e doutorado, independente do número de anos a mais de 17 que elas obtiveram.
3.5) Taxa de Participação e Faixa Etária
o
subconjunto dos cônjuges femininos foi dividido de acordo com a idade das mulheres em nove grupos etários e para cada grupo calculamos a taxa de participaçãofeminina no mercado de trabalho metropolitano, conforme pode ser visualizado na
Figura 3.6.
("lo)
Fi ura 3.6
Taxa de Participação dos Cônjuges Femininos Metropolitanos de Acordo com o Grupo Etário - 1996
00,---UPKMMMMMMMMMMMMMセセセセ@
40
+---II'?i.!1--18-20 21·23 24·26 27-29 30-)2 33-35 36-38 39-41 42-44 45-47 48·50 51·53 54·56 57·59
Grupos Etários
fonte: PNAD/96 - elaboração própria do autor
De acordo com os resultados obtidos, percebemos que a taxa de participação
dos cônjuges femininos aumenta a medida que estas mulheres passam de idades mais
jovens para idades mais maduras, atingindo os maiores valores quando estas mulheres
mais velhas, mais próximas da aposentadoria17
. Esta queda a partir a faixa de 39-41
anos também é reforçada pelo fato de que a taxa de participação das mulheres em
décadas passadas encontrava-se em um nível inferior ao atual18, devido ao aumento da
participação destas em anos mais recentes, o que pode ser notada pela magnitude das
quedas de participação após a faixa de 45-47 anos vis-à-vis a magnitude dos aumentos
da participação antes da faixa de 30-32 anos.
17 Este resultado apresenta um padrão próximo ao observado em Wajnman e Rios-Netto (1994),
embora a amostra de mulheres neste é composta pelo total de mulheres urbanas e aqui são apenas os cônjuges femininos metropolitanos
4) Modelos para a Oferta de Trabalho das Mulheres Cônjuges
Quanto à participação da mulher cônjuge no mercado de trabalho, Sedlacek e
Santos (1991) comprovam que a relação empiricamente observada entre esta taxa e a
renda do marido tem fonnato de "U" mas, quando controlada por outros fatores, como
educação feminina e número de filhos, esta relação passa a ser "negativa", isto é,
quanto maior a renda do marido menor a taxa de participação feminina, o que foi
confinnado por nós na seção anterior. A análise feita com base na taxa com fonnato
em "U' ignora que, quando comparamos a taxa de participação das esposas entre
famílias cujos maridos diferem na renda do trabalho, provavelmente diferem também
em outras características igualmente importantes, tais como idade e educação dos
cônjuges e número e distribuição etária dos filhos, tornando impossível identificar se a
diferença de comportamento é atribuída exclusivamente à diferença de renda do
marido ou também às diferenças naquelas outras variáveis.
Nenhum dos modelos teóricos apresentados anterionnente, porém, busca
explicar de que fonna o nível de capital humano da mulher e a restrição orçamentária
da família influenciam-na em seu processo de decisão de alocação de tempo ótimo no
mercado de trabalho, gerando assim uma curva de oferta de trabalho agregada das
mulheres em fonna de "U' quando avaliada em tennos da renda não trabalho da
mulher. Vamos inicialmente admitir um caso onde temos uma família cujo marido
trabalha em tempo integral e cabe à mulher decidir sobre a sua alocação ótima de
tempo no mercado de trabalho. Vamos supor também que a utilidade da família
depende do seu nível de consumo e também do nível de produção de serviços
refeições e cuidados gerais com os filhos. Vamos admitir também a hipótese mais forte
de que a tarefa de realizar tais serviços domésticos é de responsabilidade unicamente
da mulher. A partir destas hipóteses básicas vamos elaborar dois modelos de oferta de
trabalho da mulher e, utilizando estes modelos, poderemos explorar as implicações
teóricas de ambos quanto ao comportamento das mulheres, conforme variarmos alguns
parâmetros (a fim de auxiliar na análise do exercício econométrico a ser realizado
adiante). Como todos os modelos em geral, estes também são muito simplificados, não
levando em conta algumas variáveis que também podem ser importantes no processo
de decisão familiar, estando assim sujeitos a não responder integralmente para todos os
estudos referentes às decisões ótimas da família.
4.1) Primeiro modelo da oferta de trabalho das mulheres
As mulheres casadas preCIsam dividir o seu tempo disponível entre duas
atividades produtivas. Uma delas é referente ao trabalho no mercado, onde elas
recebem uma remuneração pela sua produção, cujo valor depende do seu nivel de
especialização, mais precisamente falando, da sua dotação de capital humano, que
pode ser medido pelo seu grau de escolaridade. A outra é referente à produção dos
serviços domésticos, que envolvem por exemplo trabalhos de limpeza da casa e
preparo de refeições, como também o cuidado com os filhos quando estes estão
presentes.
A curva de oferta de trabalho da mulher é resultante de um problema de
maximização da utilidade familiar. O bem estar da família depende do seu nível de
quantidade mínima necessária para garantir um grau de subsistência aceitável à família,
Co e So. A mulher enfrenta uma restrição orçamentária de mercado, pois o gasto total
com consumo pela família não pode ser superior à renda total da família, que é a soma
da renda do marido com a renda da mulher. A produção de serviços domésticos é em
função do tempo da mulher em casa, ou simplesmente do tempo dela fora do mercado
de trabalho, combinado com o seu nível de capital humano.
o
problema de maximização da utilidade da mulher pode ser descrito como:M8.Xc,s U(C,S) = In(C-Co) + In(S-So)
sujeito a: (2+f3n)C = K + tlf
(2+n)S = (l-t)W
onde: C = consumo famíliar per capita;
S = serviços domésticos per capita;
n = número de membros da família;
K = renda do marido;
H = nível de capital humano da mulher;
t = tempo relativo da mulher no mercado;
Co = quantia mínima necessária de consumo;
(1)
(2)
(3)
So = quantia mínima necessária de serviços domésticos.
o
consumo dos filhos é inferior ao consumo dos pais, logo o parâmetro f3 estáentre zero e um. Admitindo-se que a função de produção doméstica é mais intensiva
produção de mercado é mais intensiva em capital humano em relação à produção
doméstica, teremos que y > 8. A renda do marido, K, é função do seu nível de capital
humano Hh, K = f{Hh). De uma forma geral, as pessoas identificam-se com outras
pessoas que tenham hábitos, níveis culturais e intelectuais, além de preferências
próximos aos seus, de forma que existe uma correlação positiva entre o nível de capital
humano do homem e da mulherl9, Hh = aR. Supondo que não há discriminação por
sexo no mercado de trabalho, podemos tomar por hipótese que a renda do marido
pode ser descrita como:
K=(aRy (4)
Onde a. > O é o parâmetro que relaciona linearmente os capitais humanos do
homem e da mulher. Combinando-se (2), (3) e (4) em (1), o problema de maximização
passa a ser:
Maxt U(t) = ln[(a. Y +
t)H
Y-
Co]
+ In(CIt)H
9
-
So)
(5)2 +pn 2 +n
Resolvendo-se (5) chegamos ao tempo ótimo da mulher no mercado de
trabalho em função dos parâmetros do modelo, do número de filhos e da renda do
marido, representado por:
(6)
Características da curva de oferta de trabalho da mulher em relação à renda
do marido podem ser deduzidas através da análise do sinal da primeira derivada.
Diferenciando-se (6) em relação à K temos:
Olhando-se para a expressão dentro dos colchetes, quando o termo à direita
for maior que o termo à esquerda o sinal será negativo, indicando que a curva de oferta
de trabalho é localmente decrescente. Quando o termo à esquerda for maior que o
termo à direita o sinal será positivo, indicando que as curva de oferta será localmente
cresceqte. O ponto de mínimo global de t* será dado quando a derivada for igual a
zero, o que ocorre para um valor de
Ko
onde:Figura 4.1
Curva de oferta individual do cônjuge feminino Se ndo a renda do marido
kO k
fonte: elaboração própria do autor
Urna outra estática comparativa interessante que pode ser feita refere-se às
variações do tempo no mercado de trabalho ótimo da mulher em relação a um aumento
do número de filhos. Diferenciando-se (13) em relação ao n ternos:
Neste caso; para valores da renda do marido muito baixos, o sinal será
positivo indicando que a oferta de trabalho ótima da mulher aumenta com o aumento
do número de filhos localmente. A partir de um determinado valor da renda do marido,
o sinal será negativo, o que significa que, após um certo nível de renda do marido, as
mulheres ofertam menos tempo no mercado de trabalho quanto mais filhos tiverem.
Este resultado pode estar refletindo a necessidade de manter o consumo per capita
pelo menos o mais próximo possível do nível minimo necessário. Com o aumento do
número de filhos, mantendo-se a renda do casal constante, o consumo per capita cai,
ofertar mais tempo no mercado a fim de aumentar a renda doméstica e poder elevar o
consumo per capita.
Em relação aos mínimos de consumo e sefVlços necessários temos que
diferenciando-se (13) em relação ao So e ao Co obtém-se respectivamente:
dtO 1 (2
+
n)aa
d'S
=
-"2
ai < O ;o Klr
1 (2
+
セョI。@ r- >0
dCo 2 K
dtO
Ambos os sinais estão de acordo com o resultado intuitivo. A pnmelra
derivada é estritamente negativa, o que significa que, conforme a quantidade mínima
necessária de serviços domésticos cai, o tempo da mulher no mercado de trabalho
aumenta. Uma redução de tempo de serviço mínimo poderia ser decorrente das
aplicações de um programa assistencial às famílias que ofereçam substitutos diretos ou
indiretos ao tempo da mulher na produção de serviços domésticos, como por exemplo
a oferta de creches comunitárias que permitam às mulheres deixar seus filhos que
necessitam de cuidados mais intensos nestes locais, reduzindo assim uma das parcelas
que compõem o total de serviços domésticos. A segunda equação é estritamente
positiva, indicando que a oferta de trabalho da mulher cresce à medida que o nivel de
consumo mínimo necessário cresce, ceteris paribus, refletindo o aumento da pressão
orçamentária. Este efeito poderia decorrer de políticas de combate à pobreza, como
4.2) Segundo modelo da oferta de trabalho das mulheres
Nesta segunda modelagem para explicar o comportamento da mulheres,
frente à necessidade de trabalhar, vamos supor, a título ilustrativo, que o consumo e os
serviços domésticos são substitutos perfeitos entre si, de forma que o aumento de uma
unidade de consumo, mantendo-se os serviços domésticos constantes, geram um
ganho de utilidade igual ao ganho de utilidade quando aumenta-se uma unidade de
serviços domésticos, mantendo-se o consumo constante. Neste caso podemos escrever
o problema de maximização da utilidade da mulher como sendo:
MAXc.s
U(c,s) = c+
S sujeito a: nc セ@ k+
whtns セ@ (l-t)
(14)
(15)
(16)
Sendo que os vetores admissíveis de consumo e serviços são tais que:
(17)
(18)
Onde: c = consumo familiar per capita;
s = serviços domésticos per capita;
n = número de membros da família;
k
=
renda do marido;w = preço relativo do trabalho da mulher;
h = nível de capital humano da mulher;
Co = quantia mínima necessária de consumo;
50 = quantia mínima necessária de serviços domésticos.
A primeira restrição diz respeito à restrição orçamentária, de forma que a
renda do marido mais a renda do trabalho da mulher tem que ser igual ao consumo
total da família. A segunda diz que os serviços domésticos são produzidos através do
tempo da mulher fora do mercado de trabalho.
Dentro deste modelo, é importante notar que, como toda a renda monetária
obtida pelo homem e pela mulher é destinada unicamente ao consumo, a renda familiar
per capita será igual ao valor do consumo familiar per capita.
A renda do marido é uma função crescente de seu capital humano, ou seja, k
= f(Hh), onde f(Hh) > 0, enquanto que o capital humano da mulher e do marido são
positivamente correlacionados pelos mesmos ュセエゥカッウ@ apresentados no modelo
anterior20. Admitindo-se que f(Hh) é uma função invertível, podemos escrever o capital
humano da mulher em função da renda do marido como sendo h = h(k), onde h'(k»O.
Vamos admitir, assim como no modelo anterior, que o marido sempre trabalha - ou
seja, ele sempre participa do mercado de trabalho e nunca está desempregado - de
forma que k > O.
Antes de resolvennos o problema de maximização da utilidade da mulher, é
preciso que os limites dos parâmetros e da variável t estejam bem definidos. Por
construção temos que:
nc -k
a)
:h ::;
t;b) 1 -nSo セ@ t;
c)
o::;
t::; 1; logo::h
::;t::;l-nso,VkEO,nco(.l.
nco-k)]{
nc - k ( )
d) , onde nso E O,mll\. 1,1- .
O::;t::;l-nso,VkE[nco
,oo)
whTrabalhando-se algebricamente as equações (15) e (16), combinando-as com
a função objetivo (14), podemos tomar a escrever o problema de maximização da
utilidade da mulher da seguinte fonna:
k + 1+ (wh-1)t
Maxt U(t) = .
n
Sujeito a: c セ@ Co
Como a função objetivo é uma função linear em t, a solução será
obrigatoriamente de canto ou indefinida, dependendo do sinal de (wh - 1). O tenno wh
trabalh021, enquanto que o preço do seu tempo nos serviços domésticos é igual a 1.
Tomando-se por hipótese que wh(nco) < 1 (ou seja, o preço do seu tempo no mercado
de trabalho é menor do que o preço do seu tempo nos serviços domésticos quando
avaliado no ponto onde seu capital humano é igual a nCo, de forma a permitir que em
algum momento o tempo da mulher no mercado de trabalho possa ser igual a zero) e
wh(ko) = 1 (ou seja, o preço de seu tempo nas atividades de mercado e nos serviços
domésticos é o mesmo para este seu dado nível de capital humano) onde ko > nCo,
temos três alternativas possíveis:
{
nc - k ( )
t
=
o , Vk E O,ncoa) Se wh E (0,1) => wh
t=O,Vk E[nco,ko)
Note que foi retirada da análise a situação onde k = 0, pois isso só poderia vir
a ocorrer quando o marido estivesse desempregado ou quando ele não recebesse nada
pelo seu trabalho. Esta última possibilidade não faz sentido, pois caso ele não tivesse
renda pelo trabalho não. haveriam incentivos para ele sair de casa. Pelo outro lado, se
ele está desempregado, isto não só iria no sentido contrário da hipótese inicial do
modelo, onde o marido trabalha em tempo integral, como também não poderíamos
saber qual seria o seu nível de capital humano, trazendo como conseqüência uma
indeterminação do nível de capital humano da mulher.
21 Apesar do salário de referência da mulher ser w e o produto final que ela vende no mercado ser ht,
podemos entender que o produto que ela vende no mercado é o seu tempo e é remunerado por wh, que
Para o intervalo (O,nco) temos:
dI
]⦅セ{ィKHョcッ@
MォIィセ}\ッ@
dk w h2
Logo, quando wh E (0,1), t será decrescente para k E (O,neo) e constante
igual a zero para k E [neo,ko).
b) Se wh = 1 => k = ko e t é um valor indefinido entre
°
e l-nSQ.c) Sewh> 1 =>t= l-nSQ, 'v'k>ko.
Graficamente temos:
Figura 4.2
Curva de oferta individual do cônjuge feminino Se ndo a renda do marido
t
!
1-s0 i ,
cOlwh'
---=. ---'
cO kO k
fonte: elaboração própria do autor
A idéia que está por de trás deste modelo é que, enquanto a renda do marido
capital humano da mulher será também muito baixo - o rendimento que ela irá receber
no mercado será muito baixo, pois o preço do seu tempo no mercado também será
baixo, de forma que ela irá substituir todo o seu tempo de mercado por tempo
doméstico, onde seu tempo está com um preço sombra mais elevado em termos de
produtividade em atividades domésticas. Porém, existe uma quantidade mínima de
consumo necessária para a família, forçando-a assim a dedicar uma parte do seu tempo
no mercado de forma a ter renda suficiente para comprar Co e o restante do tempo em
casa. Para níveis de renda do marido mais elevados, o capital humano dele é mais
elevado, aumentando a probabilidade da mulher ser mais bem dotada de capital
humano e com isto maior seria a sua remuneração no mercado, pelo aumento do preço
do seu tempo no mercado, permitindo assim aumentar a renda potencial do casal por
duas frentes e conseqüentemente ela iria precisar de menos tempo nas atividades de
mercado para poder consumír a mesma quantia mínima necessária. Logo, enquanto seu
capital humano for suficientemente baixo para que ela prefira substituir consumo por
serviços domésticos, sua oferta de trabalho irá se reduzir conforme seu capital humano
aumente. A partir do ponto onde ela recebe uma remuneração que excede o valor da
sua produção doméstica, ou seja, o preço do seu tempo no mercado de trabalho é
maior que o preço do seu tempo nos serviços domésticos, ela irá alocar nos serviços
domésticos apenas o tempo necessário para garantir o mínimo de serviços necessários,
dedicando todo o restante às atividades de mercado.
Analisando-se a quantidade ótima de consumo per capita da família temos
•
c
=
co, Vk
E(
O,nCO)k
-,Vk E[nco,ko)
n
k
+
Wh(l-nSo),VkE(ko,oo)n n
Ou seja, o consumo per capita (ou a renda familiar per capita) será constante
para os valores de k pertencentes ao intervalo (O,neo) e crescentes para valores de k
superiores a este intervalo. Plotando-se o gráfico da taxa de participação da mulher e
da renda familiar per capita teremos:
Figura 4.3
Curva de oferta individual do cônjuge feminino Se undo a renda familiar er ca ita
v
._--..,....--_._----_._----_ ..
_---_.-c
fonte: elaboração própria do autor
Um outro resultado relevante que pode ser obtido do modelo refere-se à
questão do comportamento das mulheres diante de um aumento do número de filhos.
dn
セ@
> 0, VkE(O,nC
O )wh
0, Vk
E[nco,ko)
- So < 0, Vk
E(ko
,(0)
Logo, para as famílias onde a renda do marido é baixa, a renda da mulher
também é baixa pela correlação entre os seus capitais humanos, causando com isso
uma forte pressão orçamentária. Á medida que o número de filhos aumenta, esta
pressão orçamentária torna-se ainda mais intensa, forçando estas famílias a alocarem
uma parcela maior do tempo da mulher no mercado de trabalho. A partir de um certo
nível de renda do marido, mais precisamente quando ele - assim como a mulher - está
mais bem dotado de capital humano, um aumento do número de filhos faz com que as
mulheres diminuam o tempo da sua jornada de trabalho para ficar mais tempo em casa
cuidando dos filhos, resultados estes similares ao do primeiro modelo.
Pêlas Figuras 4.2 e 4.3, podemos visualizar a curva de oferta de trabalho da
mulher de uma única família, mas não a curva de oferta de trabalho agregada. Este
problema é decorrente do fato dos valores de consumo e serviços mínimos necessários
não serem obrigatoriamente iguais para todas as famílias. A quantidade de consumo
mínimo que uma família deseja para si pode ser inferior à quantidade desejada por
outra família e superior em relação a uma terceira, tudo isso em razão das famílias não
terem obrigatoriamente as mesmas preferências. Analisando-se a Figura 1, vemos que
o trecho decrescente depende do valor de Co, de forma que quanto maior (menor) for o
valor do consumo mínimo necessário, mais longo (curto) será o trecho decrescente. Da
de oferta de trabalho da mulher. Agregando-se todas as famílias, podemos estão
descrever, de uma maneira suavizada, a curva de oferta agregada com a forma de um
'lJ". Pela Figura 4.3 podemos observar que o trecho vertical depende do valor de Co,
de forma que quanto menor (maior) for o valor do consumo mínimo, mais próximo
(afastado) da origem estará o trecho vertical, assim como também ele será menor
(maior). De uma forma agregada, teremos então que a taxa de participação da mulher
5) Base de dados e metodologia aplicada
A base de dados utilizada será a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios
(pNAD) e o ano de referência será 1996, ano da última pesquisa disponível no
momento. A PNAD é uma pesquisa amostral realizada anualmente, desde 1972, pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Consiste em uma pesquisa de
âmbito nacional, baseada numa amostra probabilística de domicílios, estratificada, de
três estágios, com taxas amostrais que variam geograficamente de 1/400 a 1/50. A
cada ano a PNAD entrevista aproximadamente 0.5% dos domicílios brasileiros.
A partir de dados coletados junto à PNAD construiremos uma amostra que
será constituída por famílias nucleares, isto é, famílias compostas apenas por maridos,
esposa e filhos, quando for o caso, residentes em domicílios unifamíliares. Esta escolha
deve-se ao fato de que, havendo outras pessoas residindo neste mesmo domicílio,
sejam elas outros parentes da família (como os pais, seja do chefe ou do cônjuge) ou
mesmo outras pessoas não ligadas diretamente à família, estas pessoas poderiam ser
utilizadas como ''babás'' dos filhos do casal, o que poderia alterar a decisão de entrada
do cônjuge no mercado de trabalho, causando um viés na nossa análise, na medida em
que afetaria diretamente o processo de decisão de ingressar no mercado de trabalho.
A seguir eliminamos da amostra todo o conjunto de famílias cujo cônjuge não
fosse mulher, pois o nosso centro de atenção são justamente as decisões familiares
onde a mulher ocupa a condição de cônjuge na família. Uma nova filtragem elimina as
famílias cujos cônjuges femininos não têm educação definida, pois uma das variáveis
com cônjuges situadas na faixa etária abaixo dos 18 anos e acima dos 59 anos, pois
mais novas do que isto, o casamento, ainda que infonnal, é considerado precoce e
acima disto as mulheres já estão em idade de se aposentar. As famílias cuja renda não
está definida também foram eliminadas pela falta de infonnações suficientes.
Ficaremos restritos às 10 regiões metropolitanas tabuladas pela própria
PNAD e citadas abaixo. Estamos interessados em analisar o mercado de trabalho
metropolitano por se tratar de um importante segmento do mercado de trabalho
feminino brasileiro e também por constituir um subgrupo homogêneo do mercado de
trabalho brasileiro, vis-à-vis as outras áreas, principalmente as áreas rurais.
A partir desta amostra final, calculamos a renda familiar per capita, confonne
definida anterionnente, e estratificamos a amostra por decil a fim de ser possível isolar
o subconjunto das mulheres pertencentes às famílias mais pobres. O objetivo deste
estudo é não apenas o de investigar como a família decide sobre a alocação do tempo
da mulher em relação a algumas variáveis que julgamos relevantes, mas também
procurar entender melhor como estas decisões podem ser diferenciadas pelo nível de
renda da família.
Iremos, portanto, estudar o comportamento da participação das mulheres no
mercado de trabalho controlado pela renda familiar per capita excluindo a renda de
trabalho do cônjuge feminino. Acreditamos que a inclusão da renda da esposa tem um
maior impacto sobre as famílias cujos maridos recebem renda menor do que em
famílias onde os maridos têm maiores rendas, podendo causar uma mudança na
do marido é razoável pensannos que quando incluímos a renda da mulher há um
deslocamento de famílias de um grupo para o outro. Uma família pode ser considerada
"pobre" quando consideramos apenas a renda do marido e, esta mesma família pode,
quando imputarmos a renda da esposa, ser considerada "rica" (ou "não pobre") se a
mulher receber um salário elevado.
Modelaremos a taxa de participação da esposa trabalhar como função das
seguintes características: renda não-trabalho da mulher, idade da mulher, educação da
mulher, presença de filhos e região metropolitana onde reside. O modelo escolhido
para estimativa dos parâmetros associados às características é o modelo Probit, que é
um modelo de escolha binária usado em contextos onde a variável dependente é
qualitativa, no nosso caso um modelo de participação da força de trabalho, onde a
variável dependente é (Y=l) participa da força de trabalho ou (Y=O) não participa da
força de trabalho. Sua forma funcional na estimativa destes parâmetros é:
Prob(Y=l) = <l>(Wx)
onde: <1>(.) = função acumulada da normal padrão;
x = vetor das variáveis independentes; e
13
= vetor de parâmetros estimados que refletem o impacto de mudanças de x sobre a probabilidade de ocorrência doevento.