rev bras ortop.2014;49(4):405–408
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Relato
de
Caso
Estenose
lombar:
caso
clínico
夽
Pedro
Sá,
Pedro
Marques,
Bruno
Alpoim,
Elisa
Rodrigues,
António
Félix,
Luís
Silva
e
Miguel
Leal
∗UnidadeLocaldeSaúdeAltoMinho,VianadoCastelo,Portugal
informações
sobre
o
artigo
Históricodoartigo:
Recebidoem7demarçode2013
Aceitoem8deoutubrode2013
On-lineem11demarçode2014
Palavras-chave:
Colunavertebral
Estenoseespinal
Laminectomia
r
e
s
u
m
o
Aestenoselombaréumapatologiacadavezmaisfrequente,queacompanhaoaumentoda
esperanc¸amédiadevidaequecomportacustoselevadosparaanossasociedade.Apresenta
inúmerascausas,entreasquaisdestacam-seadegenerativa,aneoplásicaeatraumática.
Amaioriadospacientesrespondebemàterapêuticaconservadora.Otratamentocirúrgico
estáreservadoparaaquelesdoentesqueapresentemsintomatologiaapósaimplementac¸ão
demedidasconservadoras.Éapresentadoum casodeestenosegravedacolunalombar
emváriosníveis,numadoentedosexofemininocomantecedentespatológicos/cirúrgicos
dacolunalombar,naqualforamaplicadasduastécnicasdistintasdedescompressão,no
mesmoatocirúrgico.
©2014SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublicadoporElsevierEditora
Ltda.Todososdireitosreservados.
Lumbar
stenosis:
clinical
case
Keywords:
Spine
Spinalstenosis
Laminectomy
a
b
s
t
r
a
c
t
Lumbarstenosisisanincreasinglycommonpathologicalconditionthatisbecomingmore
frequent withincreasingmeanlife expectancy,withhighcostsforsociety.Ithasmany
causes,amongwhichdegenerative,neoplasticandtraumaticcausesstandout.Mostofthe
patientsrespondwelltoconservativetherapy.Surgicaltreatmentisreservedforpatients
whopresentsymptomsafterimplementationofconservativemeasures.Here,acaseof
severestenosisofthelumbarspineatseverallevels,inafemalepatientwithpathological
andsurgicalantecedentsinthelumbarspine,ispresented.Thepatientunderwenttwo
differentdecompressiontechniqueswithinthesameoperation.
©2014SociedadeBrasileiradeOrtopediaeTraumatologia.PublishedbyElsevierEditora
Ltda.Allrightsreserved.
夽
TrabalhorealizadonaUnidadeLocaldeSaúdeAltoMinho,VianadoCastelo,Portugal.
∗ Autorparacorrespondência.
E-mail:pmgs4@iol.pt(M.Leal).
406
rev bras ortop.2014;49(4):405–408Introduc¸ão
Aestenoselombarédefinidacomoadiminuic¸ãopatológica
docanalvertebrale/oudosforamesintervertebrais,oqueleva
àcompressãodosacotecale/oudasraízesnervosas,epode
estarconfinadaapenasaumsegmento(duasvértebras
adja-centeseodiscointervertebral,facetasarticulareseligamentos
correspondentes)ou,emsituac¸õesmaisgraves,abrangerdois
oumaissegmentos1eapresentarváriasetiologias.
Àmedidaqueaesperanc¸amédiadevidaaumenta,pessoas
maisidosas apresentam um estilo de vida ativo e,
conse-quentemente,alimitac¸ãofuncionaleadorporcausadeuma
patologiadegenerativadacolunasintomáticatornam-seum
fenômenomaisfrequenteeaestenoselombaréumapatologia
importante.
Asprincipaismanifestac¸õesclínicassãoalombalgia,
geral-menteassociadaairradiac¸ãoparaosmembrosinferiores,ea
claudicac¸ãoneurogênica.
Os exames radiológicos, notadamente o RX lombar,
a tomografia computorizada (TC) e a ressonância
mag-nética (RM), são ferramentas úteis e indispensáveis no
diagnóstico/caracterizac¸ãodaestenoselombar.
Aterapêuticacontinuaaserumdesafioclínico,comvárias
opc¸õesdisponíveis.
Relato
de
caso
Doentede53anos,sexofeminino,etniabranca,observadaem
consultaexternadeortopediaporlombalgiaemcontextode
cargaconstante,comirradiac¸ãoparaambososmembros
infe-riores,comcercadedoisanosdeevoluc¸ão,emterritóriodeL5
eS1,apesardaterapêuticaconservadora–analgesia,Aines,
miorrelaxantesefisioterapia–instituídapelomédicode
famí-lia.Refereclaudicac¸ão neurogênica.Semhistóriapréviade
traumatismo.
Refereantecedentespessoaisdehérniadiscalpresenteem
doissegmentos dacolunalombar(L3-L4eL4-L5)etersido
submetidaadiscectomialombarclássica.
Aoexamefísicoapresentavadoràpalpac¸ãodasapófises
espinhosaslombares,bemcomomassasparavertebrais.Sinal
deLaseguepositivobilateralmente.Exameneurológicorevela
pépendenteàdireita.
ARMlombardemonstrouabaulamentododisco
interver-tebral,hipertrofiadasfacetasarticulareseligamentoamarelo
nosníveisL2-L3,L3-L4,L4-L5eL5-S1,quecondicionam
estrei-tamento do canal raquidiano, com comprometimento das
Figura1–RMNdacolunalombar(cortesagital)emquese verificaestenoselombarL2-S1.
raízesdeL4,L5 eS1(figs. 1e2A,B).Fezainda
eletromio-grafiadosmembrosinferiorquerevelouradiculopatiasevera
L5eS1.
Foientãoestabelecidoodiagnósticodeestenoselombar
L2-L3,L3-L4,L4-L5,L5-S1,associadaadéficitsneurológicos,efoi
propostotratamentocirúrgico.Adoentefoisubmetidaa
reca-libragemlombarL2-L3eL3-L4pelatécnicadeSenegaseL4-L5
eL5-S1porlaminectomiaefixac¸ãocomparafusos
transpedi-culareseartrodeseposterolateralcomenxertoósseoautólogo
(fig.3).
Adoenteapresentouregressãodedéficitsneurológicosno
pós-operatório.Atualmenteéseguidaemconsultaexternae
encontra-seassintomática.
Discussão
Aestenoselombarapresentaumaincidênciade1,7%-8%na
populac¸ãogeraleaumentaapartirdaquintadécadadevida.2
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407
Figura3–RXdacolunalombarapósacirurgiacom
artrodeseL4-S1.
Podeserclassificadadeacordocomaetiologia,mas
tam-bémcomaanatomia.Aclassificac¸ãoetiológicadivide-seem
estenosecongênitaeestenoseadquirida/degenerativa.A
este-nosecongênitacaracteriza-seporumestreitamentodocanal
vertebralidiopáticoousecundárioaumadisplasiaósseacomo
acondroplasia.Aestenoseadquirida/degenerativapode
ocor-rercomoresultadodeumadoenc¸ametabólica(ex:doenc¸ade
Paget),tumor,infecc¸ão,alterac¸õesosteoartrósicasou
instabili-dadecomousemespondilolistese.Aclassificac¸ãoanatômica
éusadaparaidentificaráreasespecíficasdeestenoseesão
úteiscomo“guias”paraadescompressãocirúrgica.Divide-se
emestenose(1)central,(2)dorecessolateral,(3)foraminale
(4)extraforaminal.
A estenose lombar degenerativa dos adultos, presente
neste caso clínico, está quase sempre associada a um
aumento osteofítico/degenerativo das facetas articulares e
essasalterac¸õestêmcomocausaainstabilidadesegmentar.
Acredita-sequetodoesseprocessodegenerativotenhainício
nadegenerac¸ãododiscointervertebral,seguidadocolapsodo
espac¸odiscal,3 quecondicionaumacinéticademovimento
anormal,comconsequenteosteoartrose/hipertrofiadas
face-tas articulares, o que resulta numa diminuic¸ão da porc¸ão
centraleintervertebraldocanalvertebral.Porcausadaperda
de altura dodisco eda hipertrofia das facetas articulares,
verifica-se um encurtamento e um espessamento do
liga-mentoamarelo,quetambémcontribuiparaadiminuic¸ãodo
espac¸ocentraldocanalvertebral.Emdeterminadospacientes
aindasepodeverificarapresenc¸adecistosdegenerativosna
regiãosinovialdasfacetasarticulares,quecausamumefeito
“massa”econtribuemparaummaiorgraudeestenoselombar.
A apresentac¸ão clínica clássica da estenose lombar
consistenaclaudicac¸ãoneurogênicabilateral,bemcomo
lom-balgia crônica com irradiac¸ão para os membros inferiores,
queagravacomoortostatismoprolongado,aatividadefísica
eaextensãolombar.Algunspacientesdescrevemmelhoria
dos sintomas quando se sentam e/ou flexionam a coluna
lombar. É necessário distinguir a claudicac¸ão neurogênica
da claudicac¸ão vascular. Essa não apresenta agravamento
duranteoortostatismoprolongadoenãoaliviacomaflexão
dacolunalombar,aocontráriodoverificadonaclaudicac¸ão
neurogênica.Aoexameobjetivo,ospacientescomclaudicac¸ão
vasculargeralmenteapresentamalterac¸õesdopulsoarterial,
bemcomoalterac¸õestróficas(pelemaisfina,brilhante).Ouso
da provadeesforc¸opodeserútilna distinc¸ãodessasduas
entidadesclínicas.Umpequenonumerodepacientes
apre-senta,associado àclaudicac¸ãoneurogênica,priapismoe/ou
disfunc¸ão esfincteriana,o querevela um graude estenose
lombar maissevero.Alterac¸õesda sensibilidadedos
mem-brosinferioresedosreflexostendinosostambémpodemestar
presentes.
Existem diversas patologias que apresentam
sintoma-tologia semelhante e é necessário fazer o diagnóstico
diferencial.Éimportanteexcluirtumores(primários,
metás-tases), doenc¸a de Paget e infec¸ão, bursite trocantérica e
coxartrose/gonartrose.4
Odiagnósticodeestenoselombarpodeserconfirmadocom
ousodetomografiacomputorizada(TC)eressonância
magné-tica(RM).ATCéoexamequeapresentamaiorcusto-eficácia
eforneceumdetalheexcelentedasestruturasósseas,
sobre-tudonaregiãodorecessolateral.ARMproporcionaumavisão
superiordostecidosmoles,muitoútilnaavaliac¸ãode
patolo-giadodiscointervertebral,eapresentaumaeficáciasuperiorà
TCeàmielografia.5Aeletromiografia,quetestaavelocidade
deconduc¸ãonervosaeavaliaospotenciaisevocados
soma-tosensorais,nãofazpartedaavaliac¸ãoderotinadaestenose
lombar.Éútilparadistinguiraradiculopatiaporcausada
com-pressãolombaredaneuropatiadiabéticaqueafetaosnervos
periféricossensório-motores.
Otratamentodaestenoselombarapresentaduasvariantes
principais:oconservadoreocirúrgico.
Os pilares dotratamento conservador sãoo uso de
fár-macos, a fisioterapia, o usode um lombostato ea injec¸ão
epiduraldecorticosteroides.Ousodeanti-inflamatóriosnão
esteroidesproporcionaumamelhoriasintomática,ao
dimi-nuir a resposta inflamatória associada à compressão dos
elementosneurais.Afisioterapiabaseia-seemexercíciosde
alongamentoefortalecimentodecolunalombar,bemcomo
exercícios aeróbicos (bicicleta estática). O uso de
lombos-tato pode ser útil no alívio dos sintomas, ao diminuir a
lordoselombar,eapresentamelhoresresultadosempacientes
com espondilolistese.6 Ainjec¸ãodecorticosteroides no
tra-tamentodepatologialombar,notadamenteestenoselombar,
permanececontroversa.7 Váriosestudosfeitosatéhojenão
conseguiramdemonstrarumarespostaeficaznaresoluc¸ãoda
radiculopatia.7
O tratamento cirúrgico deve ser feito depois da
implementac¸ão de terapêuticas conservadoras, visto que
aestenoselombarnãoéumaentidade“ameac¸adora”devida,
emboraaprogressãodedéficitsneurológicoseasíndromede
caudaequinasejamindicac¸õesparadescompressãocirúrgica
urgente. A laminectomia descompressivapadrãoenvolve a
remoc¸ãodasapófisesespinhosas,dalâminaedoligamento
408
rev bras ortop.2014;49(4):405–408visualizac¸ãodiretadasraízesnervosasesuadescompressão
aolongodetodootrajeto.Recentementeassiste-seao
desen-volvimento de técnicas cirúrgicas descompressivas menos
invasivas, que preservam estruturas posteriores ósseas e
ligamentares, numa tentativa de diminuir a instabilidade
pós-operatória. Essas técnicas incluem laminectomia com
ressecc¸ão angular da porc¸ão anterior e lateral da lâmina,
laminotomiaunilateral/bilateralseletiva,laminectomia
par-cial e laminoplastia lombar.8–10 Em determinados casos é
possívelaplicar,nomesmodoente,váriastécnicascirúrgicas
emdiferentesníveisvertebraisereserva-sealaminectomia
padrãoparaosníveisqueapresentemestenosemaissevera.5
Osresultados clínicosda descompressão cirúrgica da
este-noselombarsão favoráveis,11 com remissão dossintomas,
emboraestudos recentesindiquem que a melhoria clínica
inicial tende a deteriorar-se com o passar do tempo.12 A
espondilolistesepós-descompressãosemartrodeselombaré
umadascomplicac¸õesmaiscomuns.Comotal,deve-sefazer
artodesedacolunalombar comenxerto autólogoefixac¸ão
comparafusos transpedicularesemtodos ospacientes que
apresenteminstabilidadepelaressecc¸ãodasfacetas
articula-resduranteadescompressão.13Éobrigatóriofazeraartrodese
lombarempacientescomestenoselombareespondilolistese
ouescoliosedegenerativa.13
Comaapresentac¸ãodessecasoclínicopretende-se
sali-entaro fatodesetratarde umadoentecomantecedentes
patológicos/cirúrgicos da coluna lombar, que apresentava
umaestenosegravecomenvolvimentodacolunalombarem
váriosníveis,naqualforamaplicadasduastécnicasdistintas
dedescompressãonomesmoatocirúrgicocombons
resulta-dos.
Conflitos
de
interesse
Osautoresdeclaramnãohaverconflitosdeinteresse.
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