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Uma reflexão sobre a formação da identidade feminina em mulheres vítimas de violência doméstica

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Academic year: 2017

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ANA PAULA MALLET LIMA

UMA REFLEXÃO SOBRE A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE

FEMININA EM MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA

Tese Apresentada à Universidade Federal de São Paulo para

Obtenção do Título de Mestre em Ciências

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ANA PAULA MALLET LIMA

UMA REFLEXÃO SOBRE A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE

FEMININA EM MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA

Tese Apresentada à Universidade Federal de São Paulo para

Obtenção do Título de Mestre em Ciências

Orientador: Marcelo F. de Mello Co-orientador: José Paulo Fiks

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE PSIQUIATRIA

Chefe do Departamento: Prof.: Dr. Cássio do Nascimento Pitta

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DEDICATÓRIA

Dedico ao meu grande amor, meu marido, Mauro Alencar, a quem devo a realização deste trabalho pelo seu estímulo e credibilidade a mim, pessoal e profissionalmente.

E a José Venâncio por toda a sua luta em me fazer ser melhor a cada dia e por não me deixar desistir.

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AGRADECIMENTO

Agradeço as mulheres que se predispuseram a realização deste trabalho, pois sem elas não seria possível.

Aos meus pacientes por terem me ensinado muito do ser humano que também há em mim.

Em especial, a ajuda de Viviane Rocha, que me ensinou como passar o caminho das pedras...

Aos colaboradores para que este trabalho acontecesse, bem como a oportunidade de terem me dado o direito a palavra e de transcrevê-la nas linhas que se formaram ao longo deste trabalho.

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SUMÁRIO

Dedicatória ... IV Agradecimentos ... V

Resumo ... 3

Introdução ... 5

I.1. Identidade ... 5

I.2. Construção do Feminino... 9

I.3. Vitimização Doméstica: Revisão da Literatura ... 22

I.4. Caracterização da Violência Doméstica ... 30

I.5. As Conseqüências da Violência na Saúde da Mulher ... 32

I.6. Padrões Histórico-Social na Questão da Violência Doméstica ... 34

I.7. Tipos de Violência contra a Mulher ... 38

Objetivos Gerais ... 40

Objetivos Específicos ... 40

Metodologia... 41

II.1. Seleção das Entrevistadas ... 41

II.2. Critérios de Seleção da Amostra ... 42

II.3. Considerações Éticas ... 42

II.4. Operacionalidade ... 43

II.5. Coleta de dados ... 43

II.6. Registros dos Dados ... 45

II.7. Análise dos Dados ... 46

Resultados ... 48

III.1. Caracterização das Mulheres Entrevistadas ... 48

III.2. As Entrevistas ... 55

III.3. Categoria / Violência Precoce ... 56

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III.6. Categoria / Relação Paterna ... 61

III.7. Categoria / “Pré” TEPT ... 62

III.8. Dados das Escalas ... 62

Anotações de Campo ... 64

Discussão ... 67

IV.1. Uma Leitura Junguiana ... 67

IV.2. Uma Leitura Histórico-Social ... 83

Conclusão ... 90

Referências ... 96

Anexos ... 106

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RESUMO

A violência doméstica contra a mulher no Brasil e no mundo é tema de apreensão para a época presente. Trata-se de um fenômeno surpreendentemente contemporâneo, embora recorrente na história da humanidade.

A violência nas relações entre parceiros mostra uma dinâmica de poder e um tipo de afeto onde estão presentes a dominação e a submissão caracterizada pela diferença de gênero que pode ser propiciada na medida em que a divisão interna de papéis se configura em direitos e deveres com privilégios para uma das partes dentro do ambiente intrafamiliar.

Trabalhos na área de ciências humanas têm apresentado uma compreensão deste contexto por meio dos danos psicológicos implicados nas mulheres em situação de violência doméstica, assim como também no âmbito histórico-social que parecem apontar para uma mulher com necessidade de tutores pela condição de dependência e co-dependência existentes.

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que é referência para o tratamento de violência. E também foram encaminhadas pacientes da Delegacia da Mulher, provenientes da coleta de dados da pesquisa de outra autora.

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INTRODUÇÃO

IDENTIDADE

DEFINIÇÃO: definir identidade implica falar em aspectos presentes e importantes na “constituição da identidade” das pessoas dentro do círculo de pertencimento à auto-identificação, como por exemplo, grupos étnicos, credos religiosos, línguas e costumes advindos da família, estado e igreja (Bauman, 2005).

Para o sociólogo Zygmunt Bauman, em seu livro Modernidade Líquida (2001, p.19), ele cita:

“As identidades flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta constante para defender as primeiras em relação às últimas”.

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Bauman fala também em seu texto de uma subclasse (mendigo, viciado, abandonou a escola, etc..) que para estes, o significado de identidade é ausência de identidade. E vai adiante quando diz do “homem sem qualidades” e após esse homem surgiu o homem sem vínculos, que é o homem líquido-moderno, aquele que vive sem vínculos de relacionamentos, de compromissos, aquele que não está seguro quanto ao tipo de relacionamento que deseja ter (Claudia de Mendonça Cascapera, artigo, São Paulo, ano 2, no.3, 2007).

Complementando a idéia de Bauman, Hall (2006) menciona que o próprio conceito de identidade é demasiadamente complexo, muito pouco desenvolvido e muito pouco compreendido na ciência social contemporânea para ser definitivamente posto à prova. Isso porque a modernidade lida com mudanças nos conceitos de identidade e de sujeito por conta das identidades culturais que surgem do “pertencimento” as mesmas.

A esta noção, o autor denominou “descentração” pelos aspectos contraditórios e certas complexidades existentes em sua forma. Hall (2006), traz ainda importante contribuição em relação as identidades modernas que segundo ele, alguns teóricos acreditam que estejam entrando em colapso.

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Esta perda do “sentido em si” estável é que Hall (2006, p.9), denominou descentração = “crise de identidade”. Importante explicitar que identidade nessa concepção implica em espaço entre o interior e o exterior – entre o mundo pessoal e o mundo público. E, de que projetamos a “nós próprios” nessas identidades culturais, ao mesmo tempo que internalizamos seus significados e valores, tornando-os “parte de nós”, contribuindo para a formação de nossos sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e cultural (Hall, p.12).

Outro aspecto que Hall (2006) fala é de uma identidade que se tornou uma “celebração móvel” formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987). É definida historicamente e não biologicamente.

Como parte deste trabalho é importante mencionar as identidades de gênero e identidade feminina. Identidade de gênero homem ou mulher é a primeira a ser considerada diante das outras identidades, como produto da construção da sociedade e da história onde se mantém a relação de poder como base para a sua formação. E o medo da indiferenciação sexual que é o centro das crises identitárias masculinas, está sempre tentando dar respostas ao combate feminino de tentar sair da situação de dominação, pois marcar a diferença é uma forma de poder. A definição clássica de gênero separado de sexo é moldada pela cultura e reafirma a força da hierarquia do masculino e do feminino como fundamento irredutível do pensamento e da organização do mundo (Perrot, 1998).

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como um constructo, historicamente elaborado que dissolvem as heterogeneidades, as diferenças através do uso de um discurso acabam por definir uma instância mais geral, como é o caso da feminilidade ou a masculinidade. Assim, características esperadas, ou próprias de algumas mulheres, tais como “fragilidade”, “intuição,” “abnegação”, “altruísmo”, “docilidade”, “sensibilidade”, entre outras, acabam por definir a chamada

identidade feminina, isto é, acabam por serem vistas como parte de uma

“natureza feminina.”

Esta identidade social unificada, nos parece, é, e sempre foi, uma abstração embora desempenhe importante papel na construção das identidades individuais”. ( Maria Lúcia Rocha Coutinho, 2004, vol.12 no. 1, Temas em Psicologia, INSS 1413-389X).

A busca da Identidade e o encontro com ela pode nos levar à legitimidade e à originalidade. Devemos procurar a Identidade Feminina para nos encontrarmos como mulher, para podermos falar em nome de uma coletividade e, assim, associarmos a Identidade à Igualdade e à Diferença que devem ser pensadas em função uma da outra, e não separadamente, esse laço é a construção social e cultural da diferença dos sexos (Perrot,1998).

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CONSTRUÇÃO DO FEMININO

Após a definição básica dos conceitos Identidade, Identidade de Gênero e Identidade Feminina, proponho percorrer a história das mulheres ao longo dos tempos na tentativa de ‘quebrar’ o confinamento do saber a respeito de sua trajetória de sofrimento e dor no aspecto geral, ao qual, a própria humanidade lhe confere como razão para sua descrição de ser, o ser feminino.

Além disso, estabelecer uma compreensão da formação da identidade feminina através dos fatos da história e como a violência contra a mulher está implicada neste contexto.

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O parágrafo anterior descreve a interioridade do silêncio que foi fomentado pelo mundo patriarcal onde a mulher acostumada a se sentir sem um lugar e sem importância, deixa pouco vestígio de sua produtividade, até mesmo nas produções domésticas que são rapidamente consumidas ou mais facilmente dispersas. Sendo elas mesmas a apagar suas marcas porque acreditam ser sem interesse. Há uma desvalorização por si mesma como um pudor feminino que se estende à memória. (Perrot, 2007)

Memória do relato da história constituída pelos primeiros historiadores gregos ou romanos que retratam os feitos dos homens “ilustres” ou dos homens “públicos”. Mirella Faur (2003), fala em seu trabalho, Sagrado

Feminino, sobre a restrição à mulher no acesso à cultura e à expressão

literária ou científica que fora vetada e, somente nos últimos cinqüenta anos, novos enfoques e reinterpretações dos postulados anteriores tornaram-se possíveis pelos trabalhos corajosos e pioneiros de mulheres do meio científico.

Em O Legado da Deusa (2003), a autora narra a trajetória do feminino

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como mantenedora, regeneradora e criadora de todas as formas de vida, por isso seu poder ser associado aos mistérios da vida e da morte.

Foi um período relativamente pacífico e harmonioso sem vestígios de armas, marcado pela colaboração e não pela competição. Era uma sociedade igualitária e centrada na proteção das crianças. As distribuições das tarefas ocorriam de maneira natural entre homens e mulheres. O único problema que havia eram os climáticos.

Durante o período neolítico, marcado pela saída das cavernas, homens e mulheres vivenciaram novas experiências (agricultura). A mulher ainda é cultuada como Deusa, mas sua representação já aparece nas estatuetas junto com a figura do marido ou do filho.

Era uma sociedade matrifocal e matrilinear, ou seja, tudo estava centrado na figura materna e da mulher (Faur, 2003).

O culto à Grande Mãe se transforma em um complexo sistema de rituais, mitos, símbolos, recomendações e proibições divinas. Nasce aqui a dualidade da Deusa, senhora da luz e da sombra, sem ter sinais de violência, crueldade e armas. Mas, sim de celebração à vida.

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Em 5.000 a.C. surgem as tribos bárbaras e com elas a estagnação cultural. A Europa Antiga é marcada pela ruptura ao culto às Deusas pela invasão dos povos Kurgos, advindos do continente asiático, trazendo consigo seus deuses violentos, vingativos, coléricos que faziam o uso do poder da espada. (símbolo do triunfo masculino) e com atitudes devastadoras como a pilhagem, estupros de mulheres, massacre de crianças e destruição das propriedades.

A sociedade de matrilinear passou a patrilinear, ou seja, distribuição da riqueza pela força e superioridade do masculino. As mulheres eram usadas como troféus de guerra, sacrificadas em trabalhos pesados e com suas Deusas transformadas em arquétipos da violência dos deuses masculinos, funcionando como base para suas finalidades. Nasce a posição de submissão ao modelo do guerreiro.

Em 400 a.C., na Palestina, a mitologia bíblica serviu de fundamento na estruturação do Judaísmo, Cristianismo e Islamismo, modificando e adaptando para um estado teocrático e patriarcal que difamava o papel social da mulher.

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A imagem da mãe que embala seu filho divino é mortal e virgem. Exalta-se a dor e o sofrimento como forma de purificação da mulher que é vista como sendo o mal. Portanto, a virgindade como valor feminino e a sexualidade como personificação de Maria Madalena, a pecadora.

Existiam também aqueles que se indignavam com a forma de como as mulheres eram tratadas e foram colaboradores que defendiam a sua autonomia. Em 411a.C., Aristófanes cria uma peça chamada Lisístrata que retrata a opressão da mulher e sua revolta. O ponto crítico é o conflito na área sexual. E Henrik Ibsen defende a autonomia e a necessidade de autoafirmação da mulher com duas peças importantes para a época e também para os dias de hoje: (“Casa de Bonecas”, 1879) e (“Os

Espectros”, 1881), caracterizando as formas que restavam para se viver

numa sociedade de homens, a mulher que abandona o lar em busca de sua independência e a mulher que sustenta um casamento falido cujo saldo acaba sendo a loucura de um filho.

Para retratar essa situação vivida pelo feminino da época, há um texto do escritor Tertuliano (A Exortação da Castidade, 207), em que ele não poupa

as mulheres dessa condição entre o bem e o mal: “Mulher, deverias ir vestida de luto e andrajos, apresentando-se como uma penitente, afogada em lágrimas, redimindo assim a falta de ter posto a perder o gênero humano. Tu és a porta do inferno, foste quem rompeu os selos da árvore proibida, a primeira a violar a Lei divina...”

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autoridades eclesiásticas desse período. Um contexto originário pela falta de conhecimento da natureza feminina ao relacionar o Pecado Original de Eva ao feminino. Os religiosos davam à corporeidade a capacidade de inferiorização da mulher, cabendo a ela uma única chance de ser aceita se mantivesse a castidade até o casamento e este como salvação para a sua perdição sexual se estivesse apenas à serviço da procriação. (Silva, 2006)

Cabe aqui a necessidade de se abordar o tema casamento porque neste sentido há diversas situações que explicitam a respeito da formação da identidade do feminino ao longo da história.

O surgimento do casamento ocorre por dois importantes fatos, primeiro pelo cristianismo em 392 ter sido proclamado como a religião oficial e segundo, entre 965-1008, os reis, do norte europeu, terem sido os primeiros a serem batizados dando origem ao formato da cerimônia do casamento em princípios do ano 1000.

A Igreja tinha interesse em controlar as mulheres e esta era uma solução bastante cabível para as idéias da época. Lembrando que antes os relacionamentos se davam de forma livre. Homens e mulheres tinham vários parceiros sexuais. Desta forma, a mulher era contida por medidas drásticas direcionando-a para a castidade. Foi um período marcado pela perseguição da “caça às bruxas” tratado no livro O Martelo das Feiticeiras,

do autor Heinrich Kramer.

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Segundo ainda Mary Del Priore (2004), por muito tempo a mulher seguiu estigmatizada e enfraquecida em seu poder feminino. Além de estar sob controle masculino para pertencer à sociedade, sendo atribuídas as tarefas domésticas e os cuidados dos filhos como uma única forma para a sua valorização.

O filósofo beato catalão, Ramon Llull (1232-1316) criou suas obras baseadas na fundamentação da intenção do matrimônio cujo objetivo era a procriação. Embora tenha feito críticas sociais ferrenhas pela falta de valores da sociedade patriarcal porque condenava a mulher à posição de submissão em relação aos homens, compartilhava da idéia de que o sexo tinha que ser feito apenas para procriar e sem prazer.

Conta em suas obras os feitos sociais para que a prática do casamento acontecesse por intermédio da figura paterna que escolhia com quem sua filha se casaria. Assim garantia a manutenção dos bens familiares a quem lhe fosse de interesse. Ou seja, confirmava a superioridade do universo masculino.

Esse poder era depois transferido ao marido que passava a ser seu tutor e caso fosse necessário era de direito castigá-la fisicamente podendo levá-la à morte ou até mesmo vendê-la.

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aquelas que aceitavam o casamento e acreditavam que com ele estavam garantidas por toda a vida.

Outro dado importante dentro da instituição casamento estava no fato de que muitas se casavam cedo demais, aos sete anos de idade, então a Igreja estabeleceu por volta do século XII, a idade mínima de doze anos para as meninas e catorze para os meninos. Mas mesmo assim as famílias envolvidas decidiam qual o momento propício para os seus interesses materiais. O casamento era um negócio (Duby e Perrot, 1990).

O papel da Igreja por volta dos séculos XIII e XIV, foi muito forte no sentido do não amor e do não prazer, através destes pregavam a superioridade masculina, chegando até a dizer que “o esperma era o extrato mais puro do sangue”, portanto, cabia à mulher a aceitação da sua inferioridade “natural”. (Llull, 1316)

Associado a isso também estava a questão da vestimenta. Acreditava-se que a vestimenta era atributo da sensualidade e sexualidade feminina e dava à mulher uma valorização pela diferenciação do corpo feminino e do corpo masculino. Logo surgiu a proibição de tudo que desse a mulher uma representação de valor ao seu corpo. (Macedo, 2002)

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Essa idéia está nos textos do bispo Azevedo Coutinho (1798) que diz: “...elas nascem com uma propensão violenta de agradar, ao que logo se segue o desejo de serem vistas, os homens procuram pelas armas ou letras conduzir-se ao auge da autoridade e da glória, as mulheres procuram o mesmo pelos agrados do espírito e do corpo”.

No período da escravatura, no Brasil colonial, suas curiosidades e experiências, inclusive as sexuais, eram descobertas com os escravos e escravas como forma de vivenciar e manifestar a sexualidade feminina reprimida (Priore, 2004).

Segundo Jaime Pinsky (2000) é importante considerar que a escravidão traça o seu caráter cruel e sua influência perversa na formação de nossa sociedade.

Em 1789, há uma crescente valorização da maternidade e do papel de donas de casa na França, até o início do período imperial (1822) no Brasil (Manoel, 2005). Não havia preocupação com a educação formal feminina na colônia, a grande maioria seguia a tradição patriarcal de uma educação voltada para as prendas domésticas onde o objetivo era saber cuidar da casa e dos escravos e ao que cabia como valorização do feminino, a maternidade como educadora dos filhos da pátria. Na França, marcada pela Revolução Francesa, é naturalizada a função de mãe e de dona de casa, vista como necessidade e possibilidade de ter um espaço privado dentro do mundo da disseminação de idéias e valores do contexto de gênero. (Ribeiro, 2000)

Em 1791, na França, Olympe de Gouges foi guilhotinada por editar “Os

Direitos da Mulher e da Cidadã”, sendo recriminada por esquecer-se das

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edição foi defendida publicamente na Inglaterra por Mary Wollestonecraft, que contestou as diferenças naturais de inteligência entre meninos e meninas em seu livro “A Reivindicação dos Direitos da Mulher”, um

clássico da literatura feminista que defendia a educação para meninas no sentido do aproveitamento do potencial humano. (Perrot, 2005)

No Brasil, em 1827- surge a primeira lei sobre a educação para as mulheres com a permissão de que elas pudessem freqüentar escolas elementares.

Nos EUA, a grande primeira vitória foi em 1848, uma convenção sobre os direitos da mulher que abriu as portas para a fundação da Associação Nacional dos Direitos da Mulher. Apesar disso, suas líderes foram ridicularizadas, perseguidas, e chamadas de solteironas despeitadas. E foi só em 1920 que as mulheres obtiveram o direito do voto. Na verdade, o direito de voto sempre existiu, mas na condição de cada época de que isso era apenas para o mundo masculino fazendo com que as mulheres creditassem esse valor ao homem, negando a si mesmas este direito. Com a industrialização (1930) é que a mulher foi se conscientizando da importância de sua participação porque ganhou espaço no campo profissional.

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Federação Brasileira para Programas Femininos, até hoje um trabalho social ativo.

O Governador do Estado do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine, em 1927, consegue uma alteração da lei eleitoral que dava direito de voto às mulheres, mas os votos foram todos anulados. Somente em 1932 este direito passa a ser garantido no governo de Getúlio Vargas. (Diniz, 2005)

Nos anos 60, surge o Movimento Feminista que dá destaque à mulher em vários campos de atividade, clareando suas posições e propostas, propiciando transformações em diversos setores da vida humana.

A partir deste momento, o Brasil toma fortemente, o caminho rumo às transformações político-sociais do direito de igualdade entre homens e mulheres através do movimento do feminismo/ feminista.

Em 1980, a Criação de Centros de Autodefesa para coibir a violência contra a mulher. Surge nesta ocasião o lema “Quem ama não mata”. SOS- mulher foi a primeira instituição a trabalhar contra a violência conjugal no Brasil, prestando serviços de orientação jurídica e estabeleceu um contato contínuo com as mulheres. Seu objetivo foi dar uma nova forma de organizar a luta feminista em São Paulo. Em sua inauguração foram expostas imagens de sofrimento feminino e da crueldade do masculino com o intuito de trazer à tona o que era camuflado por toda a sociedade. (Diniz,2005)

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da Mulher, em resposta à forte mobilização dos movimentos feministas, baseando sua assistência nos princípios da integralidade do corpo, da mente e a sexualidade de cada mulher.

O ano de 1984 testemunhou a ratificação pelo Brasil da convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a mulher (CEDAW), da ONU. No ano de 1985 surgiu a primeira Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher – DEAM (SP) formada por policiais do sexo feminino e depois, foram implantadas em outros estados brasileiros (Américas Watch, 1991/2).

Ainda neste ano, com a Nova República, a Câmara dos Deputados aprova o Projeto de Lei que criou o Conselho Nacional dos Direitos da mulher.

No ano de 1987 criou-se o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do RJ- CEDIM/RJ pela reivindicação dos movimentos de mulheres para assessorar, formular e estimular políticas públicas para a valorização e a promoção feminina.

Através do “lobby do batom”, em 1988, feministas e 26 deputadas federais

constituintes, obtêm importantes avanços na Constituição Federal garantindo igualdade nos direitos e obrigações entre homens e mulheres perante a lei.

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Alguns dos representantes de serviços ao combate da violência doméstica e sexual, que vêem sendo realizadas no Brasil, têm colaborado efetivamente com o trabalho de acolher estas mulheres e prestar assistência necessária para cada situação. Como exemplo em Porto Alegre – Casa de Apoio Viva Maria criada em 1992 atende mulheres que sofreram violência doméstica e sexual funcionando como abrigo caso corram risco de vida. (Meneghel et al., 2000). Em Belo Horizonte - MG, Benvinda (1986) e o Sempre Viva (1987). E em São Paulo, Casa Eliane de Grammont (2001) principal local de auxílio às mulheres nesta situação que é mantida pela prefeitura (O Estado de S.P., 2001).

Nesta trajetória de décadas de trabalho voltada a assistência e prevenção, temos hoje uma cartilha de violência doméstica descrita como Rede de Serviços, realizado pelo SEESP (Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo) que indicam por região, todos os tipos de serviços existentes para melhor atender as mulheres que se encontram nesta situação (centros jurídicos, psicossocial, setor de saúde e outras orientações).

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E no campo jurídico, em janeiro do ano de 2009 foi criado o primeiro Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Estado de São Paulo, possibilitando a articulação da aplicação da Lei 11.340/06- Lei Maria da Penha e favorecendo um caminho à conscientização da sociedade quanto à importância de uma Lei à educação na questão de gênero.

No decorrer desta trajetória, podemos observar que a construção da identidade feminina é indefinida porque se caracteriza por uma enorme gama de variações psicossocioculturais que determinam por exercer influência no seu comportamento.

VITIMIZAÇÃO DOMÉSTICA: REVISÃO DA LITERATURA

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“Qualquer ato de violência baseado no gênero que resulte, ou que provavelmente resultará, em dano físico, sexual, emocional ou sofrimento para as mulheres, incluindo ameaça, coerção ou privação arbitrária da liberdade, seja na vida pública ou privada”. (ONU, 1993)

Em 2006, Sr. Kofi Annan, Secretário- Geral da Organização das Nações Unidas, em mensagem sobre o Dia Internacional para Eliminação da Violência contra as Mulheres, traduz em palavras o que seja a preocupação mundial de que “causa enorme sofrimento, deixa marcas nas famílias, afeta várias gerações e empobrece as comunidades. Impede que as mulheres realizem as suas potencialidades, limita o crescimento econômico e compromete todo um desenvolvimento. No que se refere à violência contra as mulheres não há sociedades civilizadas.” (UNIFEM, 2005)

Estudos realizados pela UNIFEM (2005) demonstram que metade da humanidade vive sob esta ameaça em qualquer continente, qualquer cultura, independentemente da condição socioeconômica, de raça ou de grupo étnico.

A luta contra este flagelo exige uma quebra de padrão na maneira apreendida de viver, muito ainda enraizada, e que necessita construir uma nova postura de atitude diante do que seja a prática dos direitos humanos reconhecidos e garantidos por lei nos cômpitos nacional e internacional. (ONU, 2006)

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pública uma questão que permanecia no âmbito do privado. Com isso, trouxe responsabilidades ao Estado que criou uma Lei específica (Lei Maria Da Penha) para a luta pela erradicação da violência contra a mulher devido às cobranças mundiais para que tal medida fosse adotada.

Vale aqui mencionar o batismo desta lei no caso verídico em que Maria da Penha, vítima de duas tentativas de homicídio por parte de seu companheiro o qual a deixou paraplégica caracterizou esta luta que ela como mulher travou em busca do direito de ser mulher em todo o país. É a quebra de um silêncio nocivo ao desenvolvimento do feminino.

A Lei Maria da Penha de no. 11.340/06, sancionada em 07 de agosto de 2006, entrou em vigor no dia 22 de setembro do mesmo ano. Estabeleceu para o regime da legislação brasileira no art.5º. que a violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I- no âmbito da unidade doméstica, compreendida como espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II- no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidades ou por vontade expressa;

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Com a efetivação da Lei Maria da Penha consagra um novo microssistema jurídico de enfrentamento da violência no contexto intrafamiliar. E com isso, inova um processo conjugado à conscientização social que colabora para a erradicação da violência contra a mulher dentro de um engajamento dos agentes públicos e suas respectivas competências no intuito de que os fins colimados pela Lei sejam alcançados de forma plena.

Na década de noventa, o setor de saúde começou a assumir que acidentes e violência eram tema de grande importância à saúde Pública (Minayo, 2004) devido a repercussão gerada à saúde que envolvia a condição de eixos sociais implicadas neste contexto. Ou seja, o “re-conhecimento” de que ao longo da história, na maioria das sociedades e culturas, as mulheres são inseridas na condição de subordinadas e de desigualdades estabelecidas nas relações de poder, principalmente perpetuada na relação conjugal, demandou uma prática de romper com este sistema implantado por toda a sociedade que tornou a figura da mulher, uma invisibilidade quase existencial, nesta formação cultural ainda predominante. (Meyer, 2007) Nesta mesma questão da invisibilidade, Silva (2003) diz que este fato é um problema no setor de saúde devido às consequências ao adoecimento do corpo e ao maior sofrimento mental existentes no quadro dessas mulheres.

Mas foi na década de sessenta que se deu início ao reconhecimento da violação dos direitos humanos na questão da violência contra a mulher, começou a ser discutida e questionada com fortes críticas quanto a opressão ocorrida no ambiente doméstico. (Azevedo, 2000)

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histórico-cultural para que a violência permaneça velada dentro do lar, o patriarcado*.

Segundo Heise (1994), a violência doméstica e o estupro são considerados a sexta causa de anos de vida perdidos por morte ou incapacidade física em mulheres com idade de 15 a 44 anos, dados que superam as estatísticas de todos os tipos de câncer, acidentes de trânsito e guerras.

A violência doméstica não apenas acarreta prejuízos na saúde e na vida privada dela e dos filhos, como também, traz graves danos para a sua vida produtiva e para o desenvolvimento de um país. (Heise, 1994)

O Banco Mundial estima que um em cada cinco dias de faltas no trabalho seja devido à ocorrência de violência doméstica. No Canadá a violência doméstica custa 1,6 bilhões de dólares/ano. Nos EUA esse número varia entre 10 a 67 bilhões de dólares/ano. No Chile engloba 2% do PIB (Banco Mundial, 2003).

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A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) mostram que a violência perpetrada contra a mulher no espaço doméstico tem crescido a cada ano 7%, o que demonstra cada vez mais um agravo deste problema no mundo (Camargo, 2000; Cabral, 2000).

Além disso, o agravamento da condição de saúde destas mulheres que sofrem por constantes ameaças e/ou agressões por parte do marido ou parceiro, uma vez que a violência está inserida em suas vidas, representa grande risco à saúde em vários graus, alterando a saúde, produzindo doenças e até pode provocar a morte, como realidade ou como possibilidade. (Agudelo, 1990)

As doenças e a morte geradas pelas denominadas “causas violentas” chamam a atenção por serem eventos inesperados e incidirem em maior número em pessoas jovens. (Jorge & Laurenti, 1997)

O Brasil foi um dos últimos países do mundo a se afiliar ao assunto violência em sua agenda política de saúde, apesar de, desde a década de oitenta, a violência ter mudado o perfil da taxa de mortalidade do país, devido à frequência de homicídios que de quarto passou para segundo em causa de morte, perdendo apenas para as doenças cardiovasculares. (Njaine et.al, 1997)

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quando a violência de gênero revelou ser uma problemática efetiva na esfera nacional e internacional, e a partir deste momento criaram-se serviços à violência sexual para a prevenção e profilaxia de doenças sexualmente transmissíveis, de gravidez indesejada e para a realização de aborto legal quando necessário.

Para Saffioti e Almeida (1995), o conceito de violência de gênero designa um tipo específico de violência que visa à preservação da organização de gênero, fundada na hierarquia e desigualdade de lugares sociais e sexuais. Segundo essas duas autoras, a violência de gênero tem duas faces: é produzida no interior das relações de poder, sob o controle de quem detém menor poder e revela a importância de quem a perpetra para exercer o domínio, pelo não consentimento de quem sofre a violência.

O “World Report on Violence and Health”, em 2002, comprovou que é alta a incidência estatística de violência de homens contra mulheres, sendo a forma mais endêmica é a violência sexual e física de companheiros contra suas mulheres, como tipo de violência praticada pelos agressores às vítimas. (Krug et.al, 2002)

O comportamento inserido na violência inclui agressões físicas, violência psicológica, relações sexuais forçadas e outras formas de coação sexual, além da dominação e outras formas de restrição de liberdade de ir e vir. Na Lei Maria da Penha, o art. 7o., as formas de violência são descritas da seguinte forma:

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II- a violência psicológica, como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III- a violência sexual, como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer método, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação, ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV- a violência patrimonial, como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades,

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CARACTERIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Violência doméstica é o termo ampliado de violência contra a mulher porque podem ocorrer em diversas formas de violência no espaço familiar. (ONU, 1993)

Nos últimos anos tem se agravado em quantidade e em qualidade as agressões. Atingindo maior índice em relação à violência urbana e institucional. Dentre os fatores implicados nesta situação se deva ao fato de que ainda existe dificuldade em reconhecer a situação como violência, tanto pelas próprias mulheres como pelas vias sociais. Assim como, a violência psicológica não é identificada pela vítima e tampouco pelos serviços de saúde por ser difícil mensurá-las. (Azevedo e Guerra, 2001)

Sendo que a violência psicológica destrói e desconstrói a auto–estima e a auto-imagem dessas mulheres fixando-as ainda mais na condição de submissão e de co-dependência. (Zampieri, 2003)

É a primeira forma de ocorrência de violência seguida pela sua concretização verbal, à violência física que é depositária de conteúdos psicológicos do agressor, mas também da vitimada.

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de tortura mental e de uma convivência com o medo e o terror: subjugada e atemorizada.

Autores a denominam como violência silenciosa, os conflitos vivenciados são silenciados como um segredo onde muitas vezes a mulher resiste em denunciar e acaba se submetendo as exigências do companheiro. (Day, P.V. et.al, 2003)

Os termos: violência intrafamiliar e violência doméstica, para alguns autores, existem diferenças. O primeiro é toda ação ou omissão que prejudique o bem estar, integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de um membro da família. Enquanto que o segundo termo, inclui pessoas que convivem no ambiente familiar. (Day, P.V. et al, 2003)

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AS CONSEQUÊNCIAS DA VIOLÊNCIA NA SAÚDE DA MULHER

Na sua grande maioria estas mulheres passaram por alguma forma de violência já na infância, testemunhando a violência praticada dentro de casa ou mesmo sendo alvo de maus tratos generalizados. (Day, P.V. et al, 2003)

É neste ambiente familiar que se pressupõe proporcionar proteção e afeto, onde os traumas são gerados, e na sua maioria, irreversíveis. Além de tornar estas mulheres, “reprodutoras” da violência do mesmo padrão familiar de origem, quando na sua vida adulta na formação de um novo núcleo familiar. A violência doméstica é um fator de risco para o desenvolvimento de problemas psiquiátricos como transtornos: depressivo maior, de personalidade limítrofe (“borderline”), de abuso ou dependência de substâncias psicoativas, comportamento anti-social, do pânico, do estresse pós-traumático. Pode acarretar também problemas médicos somáticos como: gastrointestinais, dores generalizadas, somatizações, hipertensão arterial, doenças cardíacas, problemas ginecológicos e graves conseqüências no campo psicológico como por exemplo, forte sentimento de culpa, auto responsabilização dos ocorridos, sentimento de fracasso, baixa auto-estima, sentimento de desvalorização, e outros.(Heise, 1994: 36)

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Permanecem anos nesse sofrimento e desconhecem serviços especializados o que acarreta em uma cronificação da saúde. (Silva, V.I., 2003)

Estudos nos EUA têm abordado essas questões dos tipos e gravidade do abuso e os sintomas de TEPT nessas mulheres que acabam matando seus companheiros por extremo quadro de estresse por terem vivido sob constante ameaça de morte e terem vivido vários tipos de violência. (Hattendorf, J.et al, 2003)

Em cada ano nos EUA, 1,400 mil mulheres foram mortas pelos parceiros (Ingrassia e Beck, 1994). Contra 750 de mulheres que mataram seus parceiros por terem sofrido violência. (Browne,1987) e (Torrey, 1994).

O termo síndrome de mulheres vítimas de violência (Walker, 1984) é usado

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PADRÕES HISTÓRICO-SOCIAIS NA QUESTÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Azevedo (1986) identifica dois grupos de fatores que podem “explicar” a violência contra a mulher: formação social na história da condição sócio-econômico e político implicada no masculino e no feminino. E a ideologia dos papéis de dominação e subordinação construída pela educação.

A subordinação ganha espaço na vida da mulher quando o medo de se expor e de tornar público o que ocorre com ela dentro de casa a faz temer represálias por parte do agressor (Silva, V.I., 2003).

Estudos na Espanha falam da violência em etapas: obediência – submissão – maus tratos físicos que não são um processo pontual, mas que se cronifica com o tempo e traz raízes profundas do social e histórico (Blanco, P. et al, 2004).

A falta de reconhecimento social diante desta questão leva muitas mulheres a uma maior permanência no convívio com os maus tratos. A carência de informações a respeito da violência não ser “natural” no processo das relações e de não ser a forma para a resolução dos problemas é uma necessidade para o social. (Rodríguez, 1993)

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segundo lugar a família dele e em terceiro lugar a família dela. (Larraín e Rodríguez, 1993)

As condições sociais estão diretamente associadas a saúde da mulher no sentido em que há discriminação, repressão sexual nas diferenças entre os gêneros levando a situação de violência e consequentemente sequelas psicológicas, físicas e outras que levam a mulher à situação de total desamparo e abandono. (Vianna et al, 1995)

Segundo os autores, Njaine (1994), Ribeiro e Souza (1995) tratam a questão social da desinformação como um dos maiores problemas, o que deveria ser um facilitador do conhecimento e informatização dos dados para qualquer pessoa poder acessar é na verdade um mito que exige reflexão crítica a respeito da qualidade da informação da violência no Brasil. Complementando esta idéia, associada a esta exposição encontra-se a exclusão sócio-política, econômica e cultural reforçada na figura da mulher como alvo (Cruz Neto e Minayo, 1994) e exclusão moral. (Pinheiro, 1995)

Prado e Oliveira (1982) falam da família como “um terreno privilegiado para o aprendizado de normas, valores e técnicas de violência”. Assim, a criação de gênero é traduzida pela diferença da sexualidade masculina como explicação de seus atos, inclusos o abuso sexual, como sendo uma reação biológica e, portanto, não ser totalmente responsável por suas ações. (Birke, 1986)

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imbutidas também nos conceitos de cultura/ natureza, razão/emoção, sujeito/ objeto, mente/ corpo. (Giffin, 1994)

Goddard (1987) explicita que “as percepções ambivalentes das mulheres como vítimas passivas e como ninfomaníacas predatórias” sejam raízes históricas e culturais inseridas na “falta de uma clara identidade sexual feminina” (Holland et. al, 1990) e que a mulher sempre pode ser culpada por ataques sexuais que ela mesma “atrai”. (Seidler, 1987)

Chodorow (1978) “argumenta que as meninas desenvolvem sua identidade de gênero no contexto da identificação com a mãe, uma relação continuada com ela”. A mãe é a única responsável pela criação dos filhos, sendo a mesma desvalorizada socialmente nesta função. (Benjamim, 1990)

Confirma um patriarcado com características sociodemográficas e reduzido a variáveis individuais que se fundamenta na base familiar deslocando as razões de conduta individual e fenômenos de caráter estrutural. (Castro e Riquer, 2003)

Identificando alguns fatores de risco de violência como moderado, episódico, severo ou crônico, autores fizeram estudos que trazem dados importantes a esta temática de violência doméstica contra a mulher:

x “nível socioeconômico, a escolaridade, quanto menor a idade, maior

o risco”;

x “estado civil (mulheres não casadas), maior o risco”;

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x “número de filhos, tempo de união e consumo de álcool quanto

maior, maior será o risco da violência”;

x “quanto mais arraigada a idéia de papéis de gênero, maior o risco”.

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TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Dentre todas as citadas anteriormente, a violência psicológica, violência física, violência sexual, violência econômica (negligência), violência moral, recentemente poucos estudos se dedicaram a trabalhar com a questão da violência durante a gravidez, e esta hoje é a apontada como a mais feroz pela gravidade de sua atuação contra a mulher.

Heise (1994) e Moore (1999) trazem a gravidez como um fator de proteção contra a violência à mulher neste período. Outros estudos revelam que não há nenhuma diferença em antes ou durante a gravidez destas mulheres sofrerem por abuso (Castro e Ruiz, 2002). Mas, outros autores apontam que a gravidez é um fator de alto risco para a violência ser mais grave. (Goodwin et.al,2000)

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OBJETIVOS GERAIS:

Este trabalho visa estudar a relação de alguns aspectos da construção da identidade feminina como possíveis fatores predisponentes e facilitadores da violência intrafamiliar a partir da relação mãe-filha.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1. Compreender de que forma se desenvolve a identidade feminina nessas mulheres em situação de violência doméstica.

2. Analisar o processo de vitimização mãe-filha na contextualização psicossociocultural.

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METODOLOGIA:

Para alcançar os objetivos propostos neste estudo foi realizado o método de pesquisa qualitativa, com base observacional e entrevistas semi-estruturadas com roteiro prévio para que pudesse averiguar quais as características presentes nas condições existentes com relação à violência intrafamiliar (Minayo et al, 1998).

Seleção das entrevistadas

A seleção das participantes ocorreu através de pacientes em atendimento no ambulatório do PROVE/UNIFESP-EPM (Universidade Federal de São Paulo- Escola Paulista de Medicina) Rua Botucatu, 416 Vila Clementino, que é referência para o tratamento de violência e do TEPT do Departamento de Psiquiatria. Também foram encaminhadas pacientes com autorização prévia da Delegacia de Polícia de Defesa da Mulher- Centro, Rua Bittencourt Rodrigues, 200 Centro / S.P., provenientes da coleta de dados da pesquisa intitulada Vítimas de Violência Doméstica nos Aspectos

Psicofisiológicos, Percepção e Memória Emocional destas Mulheres, de

autoria da psicóloga Adriana Cristine Fonseca Mozzambani.

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Critérios de inclusão:

-Mulheres vítimas de violência doméstica com idade entre 25 e 50 anos

Critérios de exclusão:

-Mulheres usuárias de álcool e outras drogas

-Mulheres portadoras de esquizofrenia ou de deficiências intelectual e visual.

Considerações Éticas

Os sujeitos de pesquisa receberam informações sobre o objetivo do contato e sobre a pesquisa. Antes de iniciar a entrevista, cada participante assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), na data de 27 de julho de 2007 com o no.1088/07 do CEP.

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necessidade de se desenvolver um atendimento preventivo/profilático no sentido de evitar as repetições do quadro de violência inclusive aos filhos existentes nestes ambientes familiares.

O procedimento ao anonimato e a confidencialidade das informações obtidas no processo da pesquisa foi garantido a cada participante pelo uso de codinome (nome fictício) para a transcrição da entrevista.

Operacionalidade

Período:

O período para a realização das entrevistas/coleta de dados foi de Agosto de 2007 a Janeiro de 2009. Foi um período de duração maior devido à dificuldade de aderência dessas mulheres.

Coleta de Dados:

Antes de iniciar efetivamente a coleta de dados, cada entrevistada passou por encontros iniciais para a apresentação e familiarização da pesquisadora/entrevistadora com o intuito de possibilitar a elas um conforto para expor suas histórias de sofrimento e de violência vivenciada.

Anteriormente às entrevistas, foram utilizados instrumentos (escalas) que avaliaram o grau do quadro da violência doméstica:

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que mede a presença de sintomas desse transtorno e de outras variáveis associadas ao seu desenvolvimento. São utilizadas em estudos de seguimento de vítimas de traumas como desastres (incêndios, terremotos, etc.); violência (estupros, assaltos) e acidentes graves e em estudos realizados em centros especializados no atendimento de veteranos de guerras ou de pessoas expostas a atividades violentas (polícia, bombeiros, etc.). É comum também a utilização dessa escala como medida de mudanças na sintomatologia em estudos de tratamento de TEPT. (Blake, et.al,1995)

Entrevista de Trauma Precoce (Early Trauma Inventory – versão brasileira (autorizada por Aline Ferri Schoedl e Marcelo Feijó de Mello): entrevista feita para avaliar algumas experiências infantis que atualmente causam impactos na vida do sujeito. As perguntas são direcionadas a questões gerais da infância, bem como perguntas específicas sobre acontecimentos vividos ao longo da vida que apontem a presença de violência. (Bremer, et.al, 2000)

SCID I (Entrevista Clínica Estruturada para o DSM-IV): trata-se de entrevista clínica psiquiátrica semi-estruturada, aplicada por profissional de saúde mental treinado na mesma, permite o diagnóstico psiquiátrico das patologias do eixo I, segundo os critérios da DSM-VI (SPITZER, et.al,1992). A aplicação deste foi em parceria com a psiquiatria do PROVE.

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universo da violência intrafamiliar, sem entretanto, ser dirigida tal qual o roteiro. As perguntas utilizadas são as seguintes:

- Conte sobre como foi sua infância.

- Como foi a transição da infância para a adolescência para você? - Como era a sua relação com o seu pai?

- Como era a sua relação com a sua mãe? - Como é para você ser mulher?

- Como é sua relação com o masculino?

Registros dos Dados

O registro dos dados efetuou-se com a gravação digital das entrevistas e a transcrição fora realizada por uma profissional de jornalismo, capacitada e renomada, Eliana Pace, que no final de todas as transcrições fez a devolução de todo o material que está arquivado em CD. Foi feita também uma revisão de cada entrevista transcrita como um critério de fidedignidade aos relatos das mesmas.

Somou-se um total de 11 (onze) participantes as quais duas desistiram de continuar o processo da pesquisa por decidirem não querer falar do assunto devido ao grau do trauma da violência sofrida.

Paralelamente foi elaborado um diário de campo que procurou-se observar

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utilizados pela importância desses conteúdos para a análise de dados de cada caso.

Análise dos Dados

A primeira etapa da análise dos dados foi feita uma pré-análise, também, chamada de “leituras flutuantes” (Turato, 2003), momento em que foram feitas leituras e releituras para um contato inicial com todo o material com o objetivo de assimilação e proximidade maior com os conteúdos presentes, pelas observações e pelos relatos das participantes nas entrevistas e com o auxílio do diário de campo.

Como uma segunda etapa consistiu da análise individual dos casos e análise comparativa que estabeleceu semelhanças, padrões, diferenças para a criação das categorias e subcategorias de acordo com critérios de relevância e de repetição baseados na literatura já existente.

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Na fundamentação teórica desta análise utilizou-se da psicologia analítica como um caminho para a compreensão dos significados simbólicos e de referências contextuais histórico-sociais. Para o entendimento psicológico, utilizei-me de alguns autores importantes que tratam de alguma forma este contexto apresentado na violência doméstica. São eles:

Erich Neumann (2000): trabalha com a formação do feminino a partir da relação com a mãe na estrutura e dinâmica da personalidade em desenvolvimento desde o nascimento.

Portmann (2003): denomina o período uterino como social, onde a criança vai sendo moldada pela cultura humana que é transmitida pela mãe em valores e linguagem, influenciando inconscientemente e de modo efetivo, o desenvolvimento da criança. Entra aqui formação de gênero que traduz a mensagem de aceitação ou rejeição dependendo se é menino ou menina.

Edward C. Whitmont (1982): trata do feminino negado pelo desenvolvimento cultural através da destrutividade tecnológica e do empobrecimento espiritual advindos da dominação masculina durante milhares de anos pelo patriarcado que trouxe o desconforto e a violência ao seio de nossas sociedades (o enaltecimento da agressão como forma de resolução dos problemas).

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RESULTADOS

Caracterização das Mulheres Entrevistadas

Descrição Sumária:

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desempregados, acarretando para J. a divisão de seu pagamento por todos da casa.

O parceiro está preso por ter sido pego em flagrante pela situação de violência doméstica e por porte de drogas. J. não quer mais saber dele, porém, as sequelas do trauma vivido por ela não a deixam em paz, seu TEPT crônico levou a muitas complicações com grande prejuízo em seu funcionamento, impossibilitando uma volta à normalidade.

CASO 2: L. tem 47 anos, separada judicialmente, 24 anos de casada, sendo 12 anos vividos em situação de violência. Estudo incompleto e nunca trabalhou. Mãe de um casal de filhos e uma que fora adotada. O marido era usuário de álcool e drogas, mas segundo ela não era só nessas horas em que ele a agredia verbalmente e fisicamente. O desespero de L. chegou a um limite máximo quando descobre mais uma das traições do marido, neste momento, ela joga em seu corpo acetona e atea fogo contra si. Teve queimaduras de terceiro grau necessitando de cirurgia reparadora. Fez a denúncia na Delegacia da Mulher. Ele saiu de casa e disse que não daria nada a ela. Ela não teve apoio de ninguém de sua família e conta ter vivido agressões na infância. Segundo ela, abriu mão de uma vida financeiramente estável e decidiu refazer sua vida. Mas, como viveu em função dele, hoje se encontra desnorteada e sem rumo para seguir a sua própria vida. Apresenta quadro de depressão significativo.

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segundo ela são nessas horas que ele a agride mais. As agressões psicológicas são constantes e as físicas só quando ele usa drogas. Diz ter sentimento por ele e por isso não se decidir pela separação que os pais esperam. Revela que entre ele e seus pais prefere ficar com os pais, esse foi um dos motivos que levou o casal às brigas freqüentes culminando em violência doméstica.

CASO 4: C. 25 anos, mora junto com o parceiro há quase quatro anos e não tem filhos. Não chegou a terminar a faculdade devido ao acidente que os pais tiveram onde os mesmos faleceram. C, tem um irmão mais novo e diz que hoje não se dão bem devido o seu parceiro que o irmão não gosta. C. conta também que viveu situações de violência do pai com a mãe e que anos nesta situação, assistindo a mãe ser espancada pelo pai, decide fazer a denúncia. O pai bebia, mas segundo ela não foi só por isso que era agressivo. Na ocasião do acidente diz ter ficado aliviada com a morte dele, mas descobre que o pai deixou uma dívida alta tendo ela que vender o único imóvel existente. Ela decidiu morar com o namorado e o irmão foi para a casa de um parente. C. revela que no início do namoro ele era maravilhoso e agora que estão juntos, ele vem mostrando um lado ruim, a proibiu de trabalhar o que foi aceito totalmente por ela, uma vez que é um empresário bem sucedido. Mas teme falar com alguma pessoa seja homem ou mulher pelos ciúmes que o parceiro demonstra. Quando contrariado, se torna excessivamente agressivo verbal e fisicamente. Ela diz sentir medo dele. Ele não bebe e não é usuário de drogas. Ela tem quadro de ansiedade e TEPT.

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normalidade, quando ele chega do trabalho tira a calcinha dela para verificar se há algum cheiro diferente e olha no cesto de roupa suja para ver se acha algum vestígio. Não quer vê-la conversando com ninguém. Segundo P., ele não tolera que ela conte alguma coisa da vida deles para outra pessoa mesmo se for da família. Se ela o enfrenta, ele tem por hábito deixá-la sem telefone por dias. Não a deixa trabalhar pelo fato dela ter que cuidar dos filhos. Nunca fez denúncia e demonstra ter esperanças de que ele vai mudar. Na infância foi abandonada pelo pai e a mãe sempre se colocou como quem deu a chance de vida para ela, referindo-se ao fato que se não fosse ela, P. poderia estar na “lata do lixo”. P. é muito ansiosa e apresenta quadro de depressão acrescido de muita baixa auto-estima.

CASO 6: R. tem 50 anos. Casada há 33 anos que foram de violência física, verbal, econômica e sexual. Tem um casal de filhos. Não tem estudos e trabalhou como empregada doméstica até se casar, depois de casada, o marido a proibiu de trabalhar. R. conta que ele a tratava como puta, fosse na cama ou fora dela. Tinha uma atitude escrava para com ele e diz que sabia de todas as traições dele, inclusive, certa época ele trouxe uma criança, fruto de um caso extra conjugal, para ela cuidar e criar como filho. E ela diz não ter tido outra forma de lidar com isso senão aceitando.

Agora que os filhos estão maiores, se apóia neles para que a ajudem na separação. Tem sofrido muito com tudo isso, e tem recebido ameaças do marido quanto a receber alguma ajuda dele financeira. Tem passado por dificuldades econômicas chegando até a não ter o que comer.

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CASO 7: B. tem 27 anos, é solteira, não tem filhos, mora com a família. Está fazendo faculdade de Terapia Ocupacional, dá aulas de inglês. B. sofreu por anos violência sexual dentro de casa de um irmão. Diz que quando revelou para a mãe o que havia acontecido, a mesma a responsabilizou, dizendo o filho ser uma pessoa muito boa. A partir daí, tem sofrido muito e sente forte desejo de morrer. B. conta que sua família sempre foi muito violenta em todos os sentidos e fala da história de um irmão que se suicidou na casa da família, enforcado na luminária da cozinha. Essa imagem não lhe sai da cabeça e teme fazer algo parecido porque tem vivido uma pressão muito grande depois de ter contado o que lhe aconteceu. A situação de ser tratada como “mentirosa” depois de tudo que passou a deixa muito deprimida. Apresenta TEPT grave.

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por um tio junto com seus irmãos porque a mãe preferiu ficar com o marido.

Hoje, T. tem quadro crônico de TEPT que se configura em crises noturnas com pesadelos e com forte falta de ar, tremores pelo corpo, nervosismo crônico, ansiedade crônica, raiva exagerada por não ter tido a chance de ter matado o pai (pai faleceu há 8 anos).

CASO 9: A. tem 27 anos, casada há 5 anos e tem dois filhos, sendo o mais velho, fruto de uma violência sexual sofrida na rua de sua cidade quando tinha 14 anos. Conta que o homem era casado e bem mais velho do que ela. Pegou carona com um amigo que estava junto com este homem porque o ônibus não estava passando e já era tarde da noite. O amigo foi deixado em casa e ela quis descer com ele, mas o homem insistiu em levá-la até sua casa. Mas, no caminho ele mudou de direção e a levou para um terreno baldio, fez ameaças e a violentou. A. não contou a ninguém o ocorrido e depois de um mês achou que podia estar grávida pelos enjôos que sentia. A mãe só ficou sabendo quando ela estava de sete meses de gestação. Seu pai já era falecido e sua relação com sua mãe era difícil. Diz ter sofrido muito. Quando a criança nasceu sua mãe se apegou muito ao neto, tanto que sente que seu filho é mais filho de sua mãe do que dela.

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CASO 10: S. tem 43 anos, tem um casal de filhos e está separada há 6 anos, mas não oficialmente. Foi casada por 21 anos sendo 16 anos sofridos por todas as formas de violência. O ex-marido a agredia de várias formas e depois a arrastava pelos cabelos pela casa. Controlava o dinheiro, impossibilitando-a de sair de casa. Proibia contato social até mesmo no prédio em que moravam. Agredia verbalmente na frente de qualquer pessoa e gritava para que os vizinhos escutassem. Traía com mulheres no próprio prédio em que moravam ao ponto de algumas pessoas alertarem a ela do que estava acontecendo.

S. quando ficou grávida de sua filha diz que naquele momento decidiu que iria sair daquela situação, quando a filha nasceu, ela pegou os dois filhos e com a roupa do corpo foi embora de casa.

Foi morar com a mãe e um irmão, mas a convivência familiar nunca tinha sido boa e declara que sua mãe a convidou para sair da casa porque o irmão não estava gostando dela lá. S. arrumou um emprego e em alguns meses saiu da casa da mãe. Alugou um canto para ela e os filhos morarem.

S. conta que sofre muito em lembrar tudo o que passou e que a humilhação a faz sofrer. Sente muita vergonha diante dos filhos de ter feito com que eles passassem por tudo aquilo. Chora muito e diz não saber porque começa a chorar. Sente-se sem valor e uma descrença em viver. A raiva é um forte traço em sua vida hoje, fala que gostaria de fazer com ele o mesmo que ele fez a ela, pois acredita que lhe traria um alívio.

Tem TEPT e é significativa sua depressão.

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várias vezes. As brigas são freqüentes e que ele tem muito ciúmes dela. Investiga o celular para saber com quem ela falou e a segue para ver aonde ela vai. Já deu “shows” na porta de seu trabalho e na rua.

Mas mesmo assim, V. acredita que ele é assim por causa dela ser muito nervosa e não levar desaforo pra casa. Atribuindo toda a responsabilidade para si mesma. Espera melhorar porque tem certeza de que ele ficará bem. V. sofreu muito com o seu primeiro casamento porque ele era alcóolico e a agredia, mas conseguiu sair da situação. Revela também que na infância passou pelas mesmas coisas com seu pai que bebia e agredia a mãe. Várias vezes ela tentou separar a mãe e o pai a empurrava e a agredia também. O pai trancava os filhos para o lado de fora da casa para que eles não interferissem. Saiu de sua cidade por não querer mais passar por aquilo e não se conforma de encontrar situações iguais aqui. Tem TEPT leve, mas um quadro de depressão considerável.

As entrevistas

A partir das entrevistas foram feitas análises do conteúdo presente que delinearam categorias principais segundo a percepção das entrevistadas:

violência precoce, violência doméstica, relação familiar, sexualidade,

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Não quiseram participar da entrevista os casos: C., B.. devido à condição pessoal que cada uma apresentou ao recordar das situações vivenciadas. Alegaram não querer participar mais da pesquisa devido ao sofrimento já passado e tampouco quiseram dar sequência ao tratamento psicoterapêutico.

Violência Precoce

A maior parte das entrevistadas cresceu em contexto variado de violência, instabilidade e uma precocidade no seu desenvolvimento de vida. A variação do quadro de violência está também representada por uma violência social (trabalho infantil).

Foi delineado pelos relatos de praticamente todas as participantes, quando caracterizaram o período da infância, como não tendo sido vivenciado ou mesmo não reconhecendo esta fase em suas vidas. E outras, retratam como um período difícil por terem passado por desavenças familiares (violência física e psicológica), mas não consideradas, por algumas, como sendo violência.

Exemplos: Caso S.: “...minha infância foi uma....uma infância assim meio sem importância...trabalhava junto com minha mãe.... novinha...uns cinco a sete anos....com 13 anos arrumei pra trabalhar em casa de família....”

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Caso A.: “... não tenho do que reclamar até os 11 anos até que meu pai faleceu e, ficou eu e minha mãe.... “teve uma festa , eu queria muito ir ...agi errado...e ela me deu uma surra pra valer de fio de tocar pipa...”

Caso J.: “... não foi fácil pra mim não...eu via muito mau trato na gente...a gente ficava trancado dentro de casa ...quando os dois chegava em casa , a gente temia eles...nunca tive brinquedo...”

Caso L.: “ ...eu não sei se posso dizer se é bem ou se é mal....minha mãe era muito brava e batia muito na gente....”

Caso T.: “... ah! foi terrível...não podia brincar...não tive infância....meu pai quebrava todos os brinquedos da gente....me recordo que aos 6 anos até os 9 eu era molestada pelo meu pai....”

Caso M.: “ ....minha infância foi muito boa, feliz....não era muito de amigos....eu era muito pequena....eu não gostava daquela sensação de ficar ali sozinha....não me encaixava em grupos...quando meu irmão nasceu eu comecei a fazer xixi na cama...fiz até quando grande uns 12 anos....”

Caso R.: “... hoje eu vejo que eu era muito feliz.... a gente não conversava com os pais....”

Caso P.; “ ....desde muito pequena minha mãe falou toda a verdade pra mim...ela ficou grávida e meu pai me abandonou... brincava pouco, tinha que ajudar minha mãe em casa pra...fazer uma comida....”

Violência Doméstica / Relação Familiar

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violência doméstica e outras por uma violência de gênero, mas camuflada por um social.

Como violência doméstica, os casos V., J., L., T., conviveram com uma figura paterna que excedia na bebida e portanto, acabava em violência psicológica e física, primeiramente com a mãe e se estendendo até aos filhos.

“ meu pai bebia muito, batia na minha mãe, a gente via toda essa briga...era horrível...ele não deixava a gente defender ela.... ele traiu muito minha mãe...” – “ eles brigavam muito, se xingavam também ...” – “ meu pai era maquinista, viajava muito e tinha muitas mulheres...ela discutia muito com ele, era muito nervosa...ele deu uma facada na minha mãe, sabe...ele rasgo com o intestino da minha mãe...” – “ ela apanhava, ele batia nela, era aquelas Amélias antigas....ficou com a pessoa acho que por causa de ameaças ...ele ameaçava a gente...”. Relatos respectivos dos casos citados acima.

Os casos S., A., M., P., e R., relatam sofrer impactos por parte da figura materna que segundo elas, é uma mulher que manda na casa, nervosa, humilha a todos e que não pode ser contrariada.

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