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O desenvolvimento constitucional da pena de morte nos Estados Unidos

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

LUIZ FRANCISCO MOTA SANTIAGO FILHO

Trabalho de Conclusão de Curso:

O desenvolvimento constitucional da pena de morte nos Estados Unidos

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

LUIZ FRANCISCO MOTA SANTIAGO FILHO

O desenvolvimento constitucional da pena de morte nos Estados Unidos

Trabalho de Conclusão de Curso, sob orientação do professor Thiago Bottino do Amaral apresentado à FGV DIREITO RIO como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

O desenvolvimento constitucional da pena de morte nos Estados Unidos

Elaborado por LUIZ FRANCISCO MOTA SANTIAGO FILHO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à FGV DIREITO RIO como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito.

Comissão Examinadora:

Nome do orientador: Thiago Bottino do Amaral

Nome do Examinador 1: André Pacheco Teixeira Mendes Nome do Examinador 2: Gustavo da Rocha Schmidt Assinaturas:

__________________________________________________ Thiago Bottino do Amaral

__________________________________________________ André Pacheco Teixeira Mendes

__________________________________________________ Gustavo da Rocha Schmidt

Nota Final: ________________________

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AGRADECIMENTOS

A todas as oportunidades concedidas pela FGV Direito Rio para o meu crescimento.

A todos os professores cuja sabedoria e zelo me incentivaram e instruíram ao longo desses 5 anos de graduação.

Ao escritório Nelio Machado Advogados, pelo progresso profissional que me foi propiciado e pelo ótimo convívio.

Aos meus amigos e à minha namorada, com participação de grande valor na minha formação, cada um da sua forma, e em especial Antônio Augusto Bastos, Fernanda Marques, Louise Dias, Ricardo Figueira e Thiago Filippo, sempre muito solícitos e sensíveis a todos os contratempos surgidos no desenvolvimento deste trabalho.

À minha mãe pelo amor incondicional e pelo apoio nos momentos de dificuldade e sorriso nas horas de alegria.

(6)

“Deserves it! I daresay he does. Many that live deserve death. And

some that die deserve life. Can you give it to them? Then do not be too

eager to deal out death in judgement. For even the very wise cannot see

all ends.”

(7)

RESUMO: Regulamentada desde as legislações mais arcaicas, como o Código de Hamurabi na Babilônia de 4.000 a.C., a pena de morte é um dos institutos mais antigos da humanidade. É também um dos temas mais controvertidos do Direito, cerne de debates que se intensificam na medida na medida em que os direitos humanos são universalizados, principalmente em meados do século XX. Diante disso, a audaciosa manutenção da pena de morte no sistema jurídico norte-americano, o último reduto do instituto no mundo ocidental, é o resultado de longo e árduo processo de desenvolvimento constitucional, orientado principalmente pelos constantes avanços da jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos sobre a pena capital. O presente trabalho tem como escopo apresentar o histórico de tais decisões, bem como fundamentos de cunho criminológico, moral, filosófico e econômico aplicáveis à sistemática da pena de morte, expondo ainda dados sobre a aplicação da pena capital e perspectivas para o futuro da sanção nos Estados Unidos.

(8)

ABSTRACT: Regulated since the prime of positive law, in the 4.000 B.C. Babylonian Code of Hammurabi, the death penalty is one of the most ancient institutes of human history. It is also one of the most controversial legal topics, core of debates that intensify with the ongoing development of human rights, especially during the 20th century. That being said, the audacious maintenance of the capital punishment by the North-American legal system, the last stronghold of the institute in the western world, is the result of a long and hard process of constitutional development, guided by the constant advances of the Supreme Court of the United States regarding the death penalty. This article presents a retrospective of these decisions, as well as criminological, moral, philosophic and economic arguments related to the death penalty system, exposing data on the application of capital punishment and prospects for the future of death penalty in the United States.

(9)

1

Sumário

Introdução ... 2

Capítulo 1: Como Justificar a Pena de Morte? ... 5

1.1. Justiça retributiva ... 6

1.2. Arbitrariedade na imposição da pena capital ... 9

1.3. Efeito dissuasório das execuções. ... 11

1.4. Condenação de inocentes ... 14

Capítulo 2: Panorama da Pena de Morte nos Estados Unidos ... 18

2.1. Mapa da pena capital por estado ... 19

2.2. Métodos de execução ... 21

Capítulo 3: Década De 70: A Reviravolta do Sentenciamento Capital ... 25

3.1. A pena de morte em tese: primeiros questionamentos ... 25

3.2. O sobrestamento judicial da pena de morte ... 27

3.3. A legislação pós-Furman e o ressurgimento da pena capital... 30

Capítulo 4: Advocacia de Pena de Morte: O Pilar da Mitigação ... 34

4.1. Imposição automática da pena capital ... 37

4.2. A introdução de circunstâncias mitigantes ... 38

Capítulo 5: Quando a Pena de Morte é Cabível ... 42

5.1. O teste de proporcionalidade e o fim da pena capital para crimes sem óbito ... 42

5.2. Grau de participação no crime ... 45

5.3. Imputabilidade capital: idade, insanidade e deficiência mental ... 47

Capítulo 6: Considerações finais: Perspectivas para o futuro ... 55

Referências ... 61

(10)

2

Introdução

Poucos assuntos despertam o interesse e a preocupação da sociedade quanto aqueles atinentes à preservação da vida humana. Nesse sentido, discussões sobre a pena de morte, um dos institutos jurídicos mais antigos da humanidade, sendo os primeiros registros de normas permissivas da execução derivados do Código de Hamurabi do século XVIII a.C.1, têm relação direta com os limites da intervenção estatal nas liberdades individuais.

A prática sempre esteve presente no dia a dia das sociedades antigas e até meados do século XIX não era considerada tão polêmica. Os avanços dos direitos humanos, no entanto, viam na pena de morte um retrocesso sem precedentes, iniciando-se, assim, ampla campanha pela sua abolição a nível mundial.

No plano internacional, as resoluções n.º 62/149, 63/168 e 65/206 da ONU instituíram a moratória da pena de morte2. As diretrizes, no entanto, não são vinculantes, e, portanto, apesar de recomendadas pelo organismo, não impedem a manutenção do instituto nos países que não a ratificarem.

Antes do movimento internacional, todavia, muitos países já haviam abolido a pena capital para crimes comuns ou até mesmo na sua totalidade, e outros, apesar de manter a previsão legislativa para a execução de criminosos, não buscam sua aplicação.

As controvérsias sobre a adoção da pena capital são inúmeras. O debate é costumeiramente reacendido em períodos eleitorais, juntamente com temas como a legalização do aborto, descriminalização das drogas e redução da maioridade penal, são infindáveis.

Diante de tal contexto, apesar do desenvolvimento das teorias de direitos humanos e da forte pressão internacional, um país se destaca na manutenção da pena de morte para criminosos comuns. Os Estados Unidos, em pleno século XXI, a despeito do fato de todos os outros países do Ocidente terem abolido a pena de morte, limitado sua aplicação a hipóteses extremas ou simplesmente deixado de executar criminosos, conseguem manter a pena capital como sanção constitucionalmente permitida.

1 "Introduction do the Death Penalty: Early Death Penalty Laws", disponível em:

http://www.deathpenaltyinfo.org/part-i-history-death-penalty#early, acessado em 22/11/2014.

2 "International Comission Against Death Penalty: Moratorium", disponível em:

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3 O objeto do presente trabalho é demonstrar o árduo caminho percorrido pela Suprema Corte na constante adequação do instituto à Constituição dos Estados Unidos, restringindo a sua aplicação e mitigando potenciais críticas à pena de morte ao longo dos anos.

Note-se que a Constituição de 1776, ainda vigente naquele país, não permite expressamente a pena de morte como sanção criminal. Alguns dispositivos, no entanto, dão ensejo à interpretação de que a pena capital é cabível na sistemática constitucional norte-americana.

A 5ª Emenda à Constituição, de 1791, determina, entre outras previsões, que nenhuma pessoa responderá por crimes capitais sem a anuência de um Grand Jury, nem estará sujeita à

perda da vida ou de membros mais de uma vez pela mesma ofensa, e não poderá ser privada da vida, liberdade ou propriedade sem o devido processo legal:

"Ninguém será detido para responder por crime capital, ou outro crime infamante, salvo por denúncia ou acusação perante um Grande Júri, exceto em tratando de casos que, em tempo de guerra ou de perigo público, ocorram nas forças de terra ou mar. ou na milícia, durante serviço ativo; ninguém poderá pelo mesmo crime ser duas vezes ameaçado em sua vida ou saúde; nem ser obrigado em qualquer processo criminal a servir de testemunha contra si mesmo; nem ser privado da vida, liberdade, ou bens, sem processo legal; nem a propriedade privada poderá ser expropriada para uso público, sem justa indenização." 3

Do mesmo modo, a 14ª Emenda, que estendeu a Bill of Rights às legislações estaduais,

reproduz a possibilidade de perda da vida, desde que observado o due process of law:

“Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e sujeitas a sua jurisdição, são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde tiver residência. Nenhum Estado poderá fazer ou executar leis restringindo os privilégios ou as imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem poderá privar qualquer pessoa de sua vida, liberdade, ou bens sem processo legal, ou

negar a qualquer pessoa sob sua jurisdição a igual proteção das leis.” 4

3“No person shall be held to answer for a capital, or otherwise infamous crime, unless on a presentment or

indictment of a Grand Jury, except in cases arising in the land or naval forces, or in the Militia, when in actual service in time of War or public danger; nor shall any person be subject for the same offence to be twice put in jeopardy of life or limb; nor shall be compelled in any criminal case to be a witness against himself, nor be deprived of life, liberty, or property, without due process of law; nor shall private property be taken for public

use, without just compensation.” Constituição dos Estados Unidos de 1976.

4“All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the

United States and of the State wherein they reside. No State shall make or enforce any law which shall abridge the privileges or immunities of citizens of the United States; nor shall any State deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to any person within its jurisdiction the equal protection of the

(12)

4 Se a Constituição estabelece condições específicas para que se possa privar um indivíduo da vida, há de se concluir que o Estado pode instituir a pena de morte.

Ao longo do tempo, no entanto, outro dispositivo constitucional tornou-se parâmetro de observância obrigatória para a constitucionalidade da pena de morte. A proibição contida na 8ª Emenda, ao determinar que “não poderão ser exigidas fianças exageradas, nem impostas multas excessivas ou penas cruéis ou incomuns”5, como se verá adiante, teve papel crucial ao longo do século XX, quando a Suprema Corte dos Estados Unidos se encarregou da adequação da pena capital aos ditames constitucionais.

Este estudo tem como escopo o desenvolvimento constitucional da pena de morte nos Estados Unidos, principalmente no âmbito da sua Suprema Corte, almejando apresentar os principais caminhos tomados pelo Tribunal para legitimar a manutenção do instituto até os dias de hoje. A partir de extensa pesquisa jurisprudencial e doutrinária, as principais decisões da instância máxima Judiciária daquele país serão abordadas a partir de perspectivas morais, filosóficas e econômicas, buscando nas manifestações judiciais elementos que possam ter influenciado as decisões finais, bem como detalhar, a partir de um mapeamento da pena capital nos Estados Unidos nos dias de hoje, diferentes experiências na sua regulamentação e, diante de tais informações, apresentar possíveis novos rumos da pena de morte no futuro norte-americano.

(13)

5

Capítulo 1: Como Justificar a Pena de Morte?

Para a compreensão dos argumentos elencados ao longo do árduo processo de constitucionalização da pena capital nos Estados Unidos da América (EUA), é imprescindível que se atenha também a questões morais, políticas e econômicas, além daquelas estritamente jurídicas. Em primeiro lugar, conforme apresentado na introdução do presente trabalho, há de se destacar que a Constituição dos Estados Unidos, mesmo após a introdução das emendas n.º 5 e 8, principalmente, aplicáveis ao tema, é extremamente vaga no que diz respeito à execução de indivíduos pelo Estado.

Muito embora o problema da indeterminação constitucional não seja específico às discussões sobre a operacionalização da pena de morte, poucas searas possuem relação tão intrínseca com elementos cotidianos e a própria existência humana como aquela em que se delibera sobre a possibilidade de perda da vida como sanção estatal. Limitar o debate a questionamentos puramente jurídicos implica não só em certo descaso para com a própria existência humana, mas esbarra também na efetiva capacidade de argumentos de ordem moral, filosófica e econômica de contribuir para o deslinde do sempre conturbado desenvolvimento da sentença capital.

Tanto é que em muitas – se não em todas – das vezes em que a Supreme Court of the

United States (SCOTUS) teve que se manifestar sobre a permissão ou proibição constitucional

acerca de temas atinentes à execução de indivíduos, os argumentos vencedores se pautavam no entendimento pessoal dos Justices e premissas teoricamente desvinculadas do direito e do

respeito aos precedentes.

(14)

6

1.1.

Justiça retributiva

A primeira grande justificativa utilizada para legitimar a imposição da pena capital tem origem na lex talionis, originária do Código de Hamurabi do século XVIII a.C.6, dando início

à chamada doutrina da retribuição. A pena de morte também havia sido reproduzida no Código Hitita (século XIV a.C.), nas Leis Draconianas de Atenas (século VII a.C.) e na Lei das Doze Tábuas de Roma (século V a.C.), tendo chegado aos Estados Unidos por influência da colonização britânica, que em meados do século XVIII chegou a prever a pena de morte para 222 crimes, entre eles roubo e furto e ofensas como o corte ilegal de árvores. A primeira execução nos Estados Unidos foi registrada em 1608, quando o Capitão George Kendall foi condenado a morte, acusado de espionagem. Em 1612, o Governador da Virgínia decretou as chamadas Divine, Moral and Martial Laws, que previam a pena de morte para ofensas como

realizar comércio com indígenas e matar galinhas, sempre tendo em vista os primórdios da sanção capital da Babilônia antiga7.

A teoria da justiça retributiva parte da premissa de que o fundamento precípuo da lei de talião impunha ao criminoso condenado punição semelhante ao crime cometido como forma de retaliação, limitando a vingança do ofendido à proporção e espécie do dano outrora suportado. Seria, na verdade, uma espécie de direito da vítima da prática delituosa de infligir em quem lhe causou suplício o mesmo flagelo sofrido8.

Jeffrey Reiman, professor e diretor do programa de mestrado em filosofia e políticas sociais da American University, resgatou a teoria oriunda da Babilônia de quase 4 mil anos atrás

sob uma nova roupagem, incluindo na justiça retributiva preconizada pela lex talionis o

elemento da proporcionalidade:

"Mas a lex talionis não é a única versão de retribuição. Outra, que eu chamarei

de retribuição proporcional', afirma que o que a retribuição requer não é a igualdade do dano entre os crimes e as punições, mas 'adequação' e proporcionalidade, de modo que o pior crime será punido com a pior pena da

6 REIMAN, Jeffrey. Why the Death Penalty Should be Abolished in America, em The Death Penalty: For and

Against, ed. Rowman & Littlefield, 1998, p. 71. Ver também BENN, Stanley I. Punishment, The Encyclopedia of Philosophy 7, ed. Paul Edwards, 1967, p. 32.

7 Idem.

8“The standard problem confronting those who would justify retributivism is that of overcoming the suspicion

that it does no more than sanctify the victim's desire to hurt the offender back”. REIMAN, Jeffrey. Justice, Civilization, and the Death Penalty, answering van den Haag, em Philosophy & Public Affairs, Vol. 14, n. 2,

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7

sociedade, e assim por diante, sendo que a pior punição social não precisa reproduzir exatamente o sofrimento do pior crime."9

A premissa cunhada pelo autor é de que não necessariamente a transposição da dor causada pelo acusado depende da aplicação de pena exatamente na mesma medida do crime causado. Bastaria, para esse fim, que aos crimes mais graves fossem destinadas as sanções mais graves existentes em cada sociedade.

Nesse sentido, seria legítimo que a previsão do cabimento da pena de morte em determinado local fosse a resposta estatal a prática de crime de maior gravidade abstrata. E nesse caso, portanto, seria perfeitamente admissível a aplicação da sanção capital aos violadores do maior bem jurídico tutelado pelo Estado: a vida.

O excerto destacado acima é o embrião da resposta de Jeffrey Reiman à pergunta que sucede à necessidade de proporcionalidade da pena: se a sociedade impõe a morte a quem matou, por que não impor a pena de tortura a quem torturou ou a pena de estupro a quem estupro?

A solução encontrada pelo autor foi descrever a justiça retributiva a partir de dois elementos. O primeiro consiste na observância à lex talionis na perspectiva destacada acima,

de que os piores crimes exigem uma reprimenda à altura dentre aquelas previstas em determinada sociedade. O segundo traço para que se puna justamente os criminosos busca justificar o limite a que, por escrúpulos morais, deve esta mesma sociedade observar ao

sancionar os criminosos, fugindo um pouco à máxima do “olho por olho, dente por dente”:

"Essa forma de entender a punição justa permite que formulemos a retribuição proporcional de modo que ela se tornaria compatível com a justiça da lex talionis: se entendermos a lex talionis como a expressão do que o criminoso

merece, e se outras considerações morais exigirem que se abstenha de igualar o sofrimento causado pelo criminoso mas ainda permitindo a punição justa, então certamente a sanção será justa se impusermos a pena moralmente aceitável mais próxima da lex talionis. A retribuição proporcional, então, ao

requerer que o pior crime seja punido com a pior punição da sociedade e assim por diante, pode ser entendida como a transposição do que o criminoso merece para o seu equivalente mais próximo dentro do rol de punições moralmente aceitável pela sociedade. (...) A retribuição proporcional assim formulada preserva o objetivo da retribuição e permanece fiel ao direito da vítima de

9 “But the lex talionis is not the only version of retributivism. Another, which I shall call 'proportional

retributivism,' holds that what retribution requires is not equality of injury between crimes and punishments, but 'fit' or proportionality, such that the worst crime is punished with the society's worst penalty, and so on, though

(16)

8

onde extrai seu fundamento. Uma vez que pune da forma socialmente aceitável mais próxima à lex talionis, a pena efetivamente diz ao criminoso

que ele merece o equivalente ao que ele causou à sua vítima, mas só está recebendo menos na medida que nossos escrúpulos morais nos impedem de reproduzir o que ele fez."10

O ponto de partida do autor é bastante simples. Na imensa maioria das vezes, seria impossível reproduzir na exata proporção a prática delituosa efetivamente realizada. Em primeiro lugar, porque costumeiramente a ação criminosa possui o elemento da surpresa, de difícil traslado para a aplicação da sanção. Do mesmo modo, como se reprimiria, por exemplo, o cometimento de homicídios em série? Reiman sugere que a punição justa seria levar o serial

killeraté um ponto muito próximo da morte e “revivê-lo” a mesma quantidade de vezes que ele

teria matado menos uma, quando ele deveria ser efetivamente executado11, sem deixar de destacar o grau de crueldade monstruoso de tal castigo, demonstrando desse modo a importância da existência de limites de ordem moral à busca da justiça retributiva.

Reiman, apesar de apresentar fundamentos que justificariam a aplicação da pena de morte para aqueles crimes mais graves, argumenta também que a extinção da punição capital não significaria um retrocesso, mas sim um avanço dos tais limites morais da justiça retributiva como resultado da evolução da civilização:

"Se a civilização é caracterizada pela pouca tolerância à nossa própria dor, bem como à dos outros, então recusar publicamente a infligir sofrimentos horríveis aos nossos companheiros sinaliza o nível de nossa civilização e, pelo nosso exemplo, dá continuidade ao próprio progresso civilizador. E o gesto fica ainda mais forte se nos recursarmos a punir dessas formas horríveis quem realmente merece ser punido. Assim, nós ganhamos ao incluir a tortura nessa categoria, e se a execução for especialmente horrível, ganharemos ainda mais ao incluí-la."12

10“This way of understanding just punishment enables us to formulate proportional retributivism so that it is

compatible with acknowledging the justice of the lex talionis: If we take the lex talionis as spelling out the offender's just deserts, and if other moral considerations require us to refrain from matching the injury caused by the offender while still allowing us to punish justly, then surely we impose just punishment if we impose the closest morally acceptable approximation to the lex talionis. Proportional retributivism, then, in requiring that the worst crime be punished by the society's worst punishment and so on, could be understood as translating the offender's just desert into its nearest equivalent in the society's table of morally acceptable punishments. (…) Proportional retributivism so formulated preserves the point of retributivism and remains faithful to the victim's right which is its source. Since it punishes with the closest morally acceptable approximation to the lex talionis, it effectively says to the offender, you deserve the equivalent of what you did to your victim and you are getting less only to the

degree that our moral scruples limit us from duplicating what you have done.” Idem, p 128-129 (tradução livre). 11 Idem, p. 126-127.

12“If civilization is characterized by lower tolerance for our own pain and that of others, then publicly refusing

(17)

9 Dessa forma, argumenta o autor que, teoricamente, se o avanço da civilização moderna em determinada ensejar a compreensão de que a pena de morte passou dos limites, o surgimento de uma eventual tendência abolicionista da sanção capital apenas reproduziria a nova consciência da sociedade, e assim por diante até que restem apenas as sanções moralmente aceitáveis pelos responsáveis por sua implementação.

1.2.

Arbitrariedade na imposição da pena capital

Outro ponto nodal do debate sobre a aceitação da pena de morte é falta de guias e parâmetros claros fixados na Constituição dos EUA para a implementação da pena de morte. Dessa forma, sem uma diretiva teórica de um procedimento ideal para que se possa executar criminosos, os respectivos Poderes Legislativo e Judiciário de cada ente federado encontram dificuldades na prolação de normas e decisões criteriosas.

E é justamente a falta de critérios que faz surgir o questionamento: se não há quaisquer diretivas quanto à atuação do Poder Judiciário nos procedimentos de pena de morte, no que se lastreiam as decisões?

A sugestão de resposta de Stephen Nathanson, professor de filosofia da Northeastern

University, é bastante polêmica:

"É certo que apenas saber que alguém é de fato culpado pela morte de outra pessoa está longe de ser suficiente para determinar que ele merece morrer, e se promotores, juízes e júris não tem critérios que permitem classificar aqueles que são condenados de forma justa e racional, então os seus respectivos juízos sobre quem merece morrer será necessariamente arbitrário e sem princípios. Quando analisamos a dificuldade e a complexidade de julgamentos em que se discute culpa e merecimento, fica mais fácil ver como eles podem ser influenciados por características raciais e outros fatores irrelevantes."13

Em apertada síntese da obra em referência, argumenta-se que a ausência de critérios abre espaço para a arbitrariedade das decisões. O grande problema de tal abertura é que

them. Thus we gain from including torture in this category, and if execution is especially horrible, we gain still

more by including it.” Idem, p. 135-136 (tradução livre).

13“It is clear that simply knowing someone is factually guilty of killing another person is far from sufficient for

determining that he deserves to die, and if prosecutors, judges, and juries do not have criteria which enable them to classify those who are guilty in a just and rational way, then their judgments about who deserves to die will necessarily be arbitrary and unprincipled. Once we appreciate the difficulty and complexity of the judgments which must be made about guilt and desert, it is easier to see how they might be influenced by racial characteristics

(18)

10 elementos que não deveriam ser levados em conta na análise da pena aplicável passa a assumir papel de protagonismo nas decisões do júri, como a raça ou a condição social do defendente.

O autor faz questão de ressaltar que reconhece a possibilidade de interferência de tais fatores alheios à culpabilidade do agente em todo e qualquer procedimento criminal, mas aduz que no que diz respeito à pena de morte, o argumento sobre a arbitrariedade da sua aplicação tem dimensões muito maiores em comparação com outras sanções devido à sua severidade e discutível utilidade.14

Ainda assim, é no mínimo precipitado concluir cabalmente que o fato de que alguns indivíduos não são condenados à morte quando poderiam sê-lo – uma vez que teriam, ao menos em tese, praticado crimes passíveis de punição com a perda da vida – resultaria na imprestabilidade da pena de morte.

Em outras palavras: se todos que estão sujeitos à aplicação da pena de morte preenchem os requisitos para serem executados, o fato de, pela razão que for, algum desses indivíduos não tenha a perda da vida decretada não significa que a execução de todos os outros teria sido injusta.

Nesse sentido, Ernest van den Haag, sociólogo da Fordham University, dialoga com a

teoria de Nathanson. Van den Haag recorre à doutrina de Reiman sobre a retribuição proporcional do crime para defender a manutenção da pena de morte, ainda que por critérios arbitrários alguns indivíduos fujam da aplicação da lei.15

O sociólogo explica seu argumento com um exemplo. Suponhamos que por algum motivo, apenas motoristas com determinadas características – o autor sugere motoristas com barba – sejam multados por infrações de trânsito que por ventura venham a cometer. Aqueles

que não possuírem os traços do “condutor infrator ideal” estariam isentos de qualquer punição.

Diante de tal cenário, ainda que apenas uma parcela aleatoriamente determinada da população

14 Idem, p. 162.

15“Punishment must, whenever possible, impose pain believed to exceed the pain suffered by the individual victim

of crime. No less is deserved. Punishment must be determined by the total gravity of the crime, the social as well as the individual harm, and by the need to deter from the harmful crime. There are ordinal limits to deserved punishments, but cardinal upper limits are set only by harm, habit and sentiment—not by victim suffering.” DEN

(19)

11 esteja sujeita à legislação de trânsito, seriam as multas efetivamente aplicadas consideradas injustas? Para o autor, seria evidente que não16.

Seu argumento caminha para a conclusão de que eventual problema na aplicação da pena de morte, tal qual na fiscalização do trânsito nos moldes do exemplo acima, podem até ajudar a identificar algum tipo de problema, mas não nos casos em que há a aplicação da lei, e sim quando não há:

"Nathanson cita o falecido Justice Douglas sugerindo que uma lei que

deliberadamente prevê a execução apenas para os condenados pobres, ou que tenha esse efeito, seria inconstitucional. Talvez. Mas o vício estará na isenção dos condenados ricos; os condenados pobres ainda seriam culpados e merecedores da punição prevista mesmo se os condenados ricos escapem da punição por meios legais ou não."17

Em suma, as lacunas operacionais da pena de morte no que tange à adoção de procedimentos judiciais aptos a coibir eventuais arbitrariedades na sua implementação dão margem à conclusão de que a imprevisibilidade da sanção capital tornaria ao menos discutível a justiça da sua aplicação.

1.3.

Efeito dissuasório das execuções.

O debate sobre a existência de algum efeito dissuasório das condenações à morte e execuções é bastante controvertido. Por um lado, argumenta-se que o referido efeito é nítido, enquanto outros afirmam não haver como comprovar o caráter preventivo da imposição da pena de morte na sociedade.

Estudos econométricos mais recentes (2003) concluíram através da análise de determinadas variáveis em um período de 20 anos em 3054 distritos norte-americanos que cada execução tem a capacidade de prevenir até 18 homicídios graças ao seu efeito dissuasório.18

Cass Sunstein e Adrian Vermule, professores de Direito Administrativo e Análise Econômica do Direito da faculdade de Direito de Harvard, publicaram em 2006 o artigo "Is

16Nathanson insists that some arbitrary selections among those equally guilty are not "just." He thinks that

selecting only bearded speeders for ticketing, allowing the cleanshaven to escape, is unjust. Yet the punishment of

the bearded speeders is not unjust. The escape of the clean shaven ones is.” Idem, p. 174.

17Nathanson quotes the late Justice Douglas suggesting that a law which deliberately prescribes execution only

for the guilty poor, or which has that effect, would be unconstitutional. Perhaps. But the vice would be in exempting the guilty rich; the guilty poor would remain guilty, and deserving of prescribed punishment even if the guilty rich escape legally or otherwise.” Idem, p. 175 (tradução livre).

18 DEZHBAKHSH, Hashem. Does Capital Punishment Have a Deterrent Effect? New Evidence from

(20)

12

Capital Punishment Morally Required?"19, no qual argumentam que se tais dados puderem ser

confirmados, o trade-off entre uma vida e diversas outras determinaria mais do que uma

possibilidade, mas um dever do Estado de manter e implementar a pena de morte. Mais do que isso, Sustein e Vermule classificam o Estado como uma diferente espécie de agente moral, de modo a justificar a tese de que a sua omissão diante de tal cenário dissuasório seria inadmissível20.

Para os autores, os supostos problemas intrínsecos das execuções (erro potencial, irreversibilidade, arbitrariedade e vieses raciais) não seriam um entrave a esse raciocínio, uma vez que também estariam presentes na prática do crime. Em outras palavras, sustentam os professores que se um crime de homicídio é cometido com base em questões raciais ou de forma puramente arbitrária, não haveria motivo para que se questione a pena de morte com tais argumentos.

O raciocínio, embora pautado nas melhores lições utilitaristas, a partir de uma análise consequencialista do cenário criminal norte-americano, encontra certa resistência especialmente quanto à transposição de uma lógica administrativista ao direito penal.

A também professora da faculdade de direito de Harvard, Carol Steiker, explica que o

“homicídio” eventualmente imposto pelo Estado não pode se equiparar ao crime que ensejou a

punição, justamente porque devem entrar no cálculo elementos de ordem moral ignorados pelos administrativistas no artigo supracitado:

"Sunstein e Vermule retratam as principais objeções deontológicas à pena capital como integralmente confinadas ao seu aspecto "capital", e assim conseguem cunhar um argumento por equivalência moral: se fosse errado o governo matar por execuções, também seria errado se o governo 'matasse' pela dissuasão insuficiente. Mas as execuções pelo governo não são erradas porque são homicídios, mas também porque são 'punições' injustas, e não há qualquer

19 SUNSTEIN, Cass R. e VERMEULE, Adrian. Is Capital Punishment Morally Required? The Relevance of

Life-Life Tradeoffs. Chicago Law & Economics n. 239, 2005.

20“Any objection to capital punishment, we believe, must rely on something other than abstract injunctions against

(21)

13

equivalência entre o que o governo faz mediante execuções e o que estaria fazendo por disuassão insuficiente."21

Cabe dizer que por mais que muitas decisões das cortes norte-americanas tenham se pautado na suposta comprovação de um efeito dissuasório das execuções, tais estudos não estão privados de críticas22. A resposta para a crítica costuma ser bastante direta. Ainda que não se possa evidenciar de forma definitiva a dissuasão da prática criminosa a partir da existência e aplicação da pena de morte, a mera possibilidade de que tais efeitos sejam reais seria suficiente para que muitos estados mantivessem o instituto diante do risco, por menor que seja, de provocar um aumento na criminalidade após a abolição da pena capital.

21“Sunstein and Vermeule portray the central deontological objections to capital punishment as entirely confined

to the “capital” aspect of it, and thus they are able to make their argument from moral equivalence: if government

killing by execution is wrong, so is government “killing” through inadequate deterrence. But if government

executions are wrong not only because they are killings but also because they constitute unjust “punishment,”

then there is no equivalence between what the government is doing through executions and what it is doing through

inadequate deterrence.” STEIKER, Carol S. No, Capital Punishment is Not Morally Required: Deterrence, Deontology, and the Death Penalty. Stanford Law Review, Vol. 58, 2006, p. 764.

22“As summarized by Jeffrey Fagan (2004), two major criticisms stand out. First, all these studies suffer too much

from the statistical risk that their overall findings are driven by a few outlier jurisdictions—most notably Texas. Thus, more fine-tuned comparisons between certain states (say, Texas and California) will be needed to retest the results. Next, the studies do not take account of the most important new legal innovation that has arisen in the post-Gregg era—namely, the availability of life without the possibility of parole (LWOP) sentences in all death penalty states except two (New Mexico and, ironically, Texas, where a new LWOP law has just been enacted). LWOP sentences are far more numerous than death sentences these days, and beyond their obvious incapacitating

effect they may well have a powerful deterrent effect as well. (…) Other potential lines of criticism that Fagan

suggests include the following: 1. These new studies tend to aggregate several forms of murder, and, as above, the one study that breaks them down purports to find all forms deterrable. This conclusion may be implausible if we believe that heat-of-passion killings are necessarily somewhat harder to deter than other murders. If so, more fine-tuned research will be needed, especially of such specific contextual factors as the availability of guns in certain domestic situations. 2. The new studies do not control for the phenomenon of autoregression, that is, the influence that trends in certain years may exert over longitudinal or time series data covering succeeding years. This problem is especially serious in the context of very rare events like executions. 3. The new studies are only sporadically successful, at best, in accounting for controls supplied by the various operations of the criminal justice system, including such essential factors as the success of police in even identifying offenders. It is a virtual cliché of criminal deterrence that the certainty of punishment, of any type, is a more effective deterrent than the possibility of severe punishment, contingent on apprehension and conviction. If the cliché is true, then initial police success in catching offenders should be a more effective deterrent than the rarer death sentences or still rarer executions. If high-executing states also have higher-than-average homicide clearance or arrest rates, this fact could explain the apparent deterrent effects. Some of the newer studies try to control for murder or homicide arrest rates (Dezhbaksh et al. 2002, Mocan & Gittings 2005). But because arrest rates are likely to be particularly high for homicides that are not death-eligible or for which the death penalty is seldom given (e.g., fights between friends, crimes of passion), the adequacy of the control is questionable unless arrest rates as well as homicide rates are broken down by the death-eligibility of the crime. Unfortunately, none of the new studies attempts that breakdown. 4. The studies ignore large amounts of missing data in important states such as Florida, thus potentially biasing their conclusions. Fagan suggests that different techniques for restoring missing data should

be used to determine whether the lack of available data can explain findings of deterrence.” WEISBERG, Robert.

(22)

14

1.4.

Condenação de inocentes

Por fim, há também a preocupação com a condenação de inocentes. A bancada

pró-death penalty insiste em dizer estar presente em todo tipo de procedimento penal, ao passo que

os abolicionistas respondem chamando a atenção para o caráter definitivo da execução.

Ao contrário dos questionamentos anteriores, o Poder Judiciário dos Estados Unidos já abordou a constitucionalidade da pena de morte com base exclusivamente no prisma do risco de condenação de inocentes, tomando por base a irreversibilidade da aplicação da sanção.

Em 2002, o juiz federal do distrito de Nova Iorque, Jed Rakoff, julgando o caso United

States v. Quinones23, decretou a inconstitucionalidade da pena capital. Alan Quinones e Diego

Rodriguez, foram indiciados pela prática de homicídio em concurso com o crime de extorsão. O governo logo informou que buscaria a pena de morte. Em resposta, Quinones e Rodriguez peticionaram perante o juízo para que fosse declarada a inconstitucionalidade do Federal Death

Penalty Act.

O fundamento dos peticionários era que os avanços tecnológicos do fim do século XX, notadamente o exame de DNA, revelavam que muitos condenados à morte eram inocentes. Frise-se que, muito embora Quinones não alegasse ser inocente, a defesa alegava que tal risco seria suficiente para que ninguém pudesse ser condenado à morte. O magistrado foi convencido, aduzindo para tanto que:

"A melhor evidência disponível indica que, por um lado, pessoas inocentes são condenadas à morte com maior frequência do que se acreditava antigamente e, por outro, provas convincentes da sua inocência normalmente não aparecem até muito tempo depois da sentença. Dessa forma, é plenamente previsível que a aplicação da pena de morte pode significar que muitas pessoas inocentes serão executadas, indivíduos que poderiam eventualmente comprovar sua inocência. Consequentemente, a implementação do Federal Death Penalty Act não só priva pessoas inocentes de oportunidades

significativas de comprovar sua inocência, e portanto o procedimento viola o devido processo legal, mas também cria um risco inaceitável da execução de inocentes, atentando contra a perspectiva material do devido processo."24

23 United States v. Quinones, 205 F. Supp. 256 (2002).

24“The best available evidence indicates that, on the one hand, innocent people are sentenced to death with

materially greater frequency than was previously supposed and that, on the other hand, convincing proof of their innocence often does not emerge until long after their convictions. It is therefore fully foreseeable that in enforcing the death penalty a meaningful number of innocent people will be executed who otherwise would eventually be able to prove their innocence. It follows that implementation of the Federal Death Penalty Act not only deprives innocent people of a significant opportunity to prove their innocence, and thereby violates procedural due process,

(23)

15 A decisão, no entanto, foi revertida pela Corte de Apelação do 2º Circuito dos Estados Unidos, não por expressa discordância das razões apresentadas por Rakoff, mas porque já vigia, no âmbito da Suprema Corte dos Estados Unidos – com caráter vinculante às instâncias inferiores –, entendimento consolidado acerca de pleitos de inocência na condução da pena de morte.

Em 1982, Leonel Torres Herrera foi condenado pela prática de homicídio e sentenciado à morte. Em 1992, 10 anos após a condenação, a defesa de Herrera impetrou habeas corpus sob

o argumento de que era na verdade inocente, e que o verdadeiro culpado pelo crime teria sido seu recém-falecido irmão. O pedido do habeas corpus não era exatamente pela inconstitucionalidade da pena de morte, mas pela revogação da sua pena.

O caso chegou à Suprema Corte25, que denegou a ordem. A opinião dos Justices foi no sentido de que o que a Constituição garante a todo e qualquer cidadão sob a proteção do devido processo legal é que ele seja submetido a um julgamento justo, o que já havia sido oportunizado ao Paciente. A reiteração de habeas corpus desvinculada de qualquer pleito constitucional independente era tratada como, no mínimo, abusiva, uma vez que todas as chances de comprovação de inocência já teriam sido concedidas durante a instrução criminal ordinária, de modo a inexistir qualquer inconstitucionalidade da pena de morte com base exclusivamente em possíveis pleitos de inocência26.

Especificamente no que diz respeito à situação de Herrera, William Rehnquist, então

Chief Justice da Suprema Corte e responsável pelo voto condutor, em exercício especulatório,

analisou o pleito do Paciente:

"Vamos assumir, para fins de argumentação, que, em um caso capital, uma demonstração extremamente persuasiva de 'verdadeira inocência' feito após um julgamento tornaria a execução do defendente inconstitucional, e desse modo, ensejaria a concessão de habeas corpus se não houvesse um caminho na esfera estadual para processar tais pleitos. Mas devido ao nefasto efeito que admitir tais teses de verdadeira inocência surtiria na necessidade de finalidade dos casos capitais, e o altíssimo ônus que rejulgar casos baseados em

25 Herrera v. Collins, 506 U.S. 390 (1993).

26“As the foregoing discussion illustrates, in state criminal proceedings, the trial is the paramount event for

determining the guilt or innocence of the defendant. Federal habeas review of state convictions has traditionally been limited to claims of constitutional violations occurring in the course of the underlying state criminal proceedings. Our federal habeas cases have treated claims of "actual innocence," not as an independent constitutional claim, but as a basis upon which a habeas petitioner may have an independent constitutional claim

considered on the merits, even though his habeas petition would otherwise be regarded as successive or abusive.”

(24)

16

evidências sólidas teria sobre os estados, o limiar necessário para demonstrar esse direito teria que ser extraordinariamente alto. A demonstração do peticionário no presente caso está longe de atingir tal limiar."27

O que se depreende do excerto acima é que as Cortes não fechariam as portas para demandas fundamentadas na inocência do Peticionário, mas que seria necessária uma demonstração irrefutável da sua ausência de culpa na prática delituosa, requisito que Herrera não alcançou.

É imperioso destacar, ainda, como fez o então Chief Justice, que, historicamente, o

remédio “adequado” para tais pedidos não era a revisão judicial, mas sim a concessão de

clemência pelo Poder Executivo. Dessa forma, o risco de execução de inocentes não seria ignorado pelo Direito norte-americano, sendo combatido na instrução processual sob a guarda do due process of law e, ao final, ainda sujeito ao crivo do Governador de cada estado ou

Presidente dos Estados Unidos, no caso da pena de morte prolatada por cortes federais.

De fato, os números comprovam o argumento da Suprema Corte. Entre 1973 e 2013, mais de 140 condenados foram exonerados do corredor da morte e postos em liberdade devido à comprovação de sua inocência, graças à concessão de clemência pelo Poder Executivo28.

O argumento contrário à pena capital com base no elevado risco de execução de pessoas inocentes existe, tanto que foi submetido às Cortes mesmo após o posicionamento da Suprema Corte, que, como se viu, não restringiu expressamente o alcance do Poder Judiciário aos litígios que versem sobre possível inocência dos condenados. Por outro lado, parece seguro afirmar que o Estado já proporciona aos seus jurisdicionados mecanismos suficientes para combater o risco de condenação de inocentes. A conclusão que se extrai de Quinones é que muito embora a

Suprema Corte já tenha decidido pela constitucionalidade da pena de morte diante de tais argumentos, ainda há juízes que insistem em declará-la inconstitucional, revelando certa resistência interna no próprio Poder Judiciário ao instituto.

27“We may assume, for the sake of argument in deciding this case, that, in a capital case, a truly persuasive

demonstration of "actual innocence" made after trial would render the execution of a defendant unconstitutional, and warrant federal habeas relief if there were no state avenue open to process such a claim. But because of the very disruptive effect that entertaining claims of actual innocence would have on the need for finality in capital cases, and the enormous burden that having to retry cases based on often stale evidence would place on the States, the threshold showing for such an assumed right would necessarily be extraordinarily high. The showing made by

petitioner in this case falls far short of any such threshold.” Idem.

28 “House Judiciary Subcommittee on Civil & Constitucional Rights Staff Report”, disponível em:

(25)

17 Ainda assim, o tema é recorrente nos debates sobre o cabimento da pena de morte no século XXI. Não se olvida, no entanto, que a constante modernização de técnicas investigativas e comprobatórias, como a realização de perícias, exames de DNA29 e outras medidas não parece ter sido levada em conta pela Suprema Corte no início da década de 90, mas terão um papel cada vez maior nos próximos casos dado sua capacidade de solucionar injustiças em razão da falibilidade dos métodos anteriores30.

29 Entre 1979 e 2013, houve 321, exonerações nos Estados Unidos com base em exames de DNA. “The Innocence

Project: DNA Exoneree Case Profiles”, disponível em: http://www.innocenceproject.org/know/, acessado em 22/11/2014.

(26)

18

Capítulo 2: Panorama da Pena de Morte nos Estados Unidos

Sem uma proibição constitucional do sentenciamento capital, a regulamentação da pena de morte fica a cargo e critério de cada jurisdição norte-americana. A autonomia política concedida a cada estado pelo modelo de federação dos Estados Unidos permite que cada ente federado legisle e aplique a pena capital da forma mais adequada para seus jurisdicionados.

Elementos como a religião dominante, índices de homicídios e criminalidade em geral, localização geográfica e ideologia política do governo são rotineiramente utilizados para lastrear alterações, não só legislativas, mas também executivas e judiciárias, do instituto, mas nem sempre são indicativos aptos a demonstrar qualquer relação de causalidade com a pena de morte.

Dados de 2014 do Death Penalty Information Center31apontam que dos 5 estados com

maior taxa de homicídios por habitante, dois não têm a pena de morte. Em Louisiana, onde há pena de morte, são 11,2 homicídios para cada 100.000 habitantes, enquanto o segundo lugar fica com o estado de Maryland, que aboliu a pena capital em 2013. Não se ignora o fato de que a abolição muito recente possa não ter surtido efeito imediato nos índices, mas Maryland já quase não aplicava a pena de morte, com apenas 5 execuções desde 197632.

No extremo oposto da tabela também figura um estado com a pena de morte. Em New Hampshire, onde apesar da previsão legislativa, não houve nenhuma execução – mas há condenações, com um único detento no corredor da morte em 2014 – desde 1976, há apenas 1 homicídio para cada 100.000 habitantes. Os estados seguintes, Vermont e Iowa, ambos sem a pena de morte desde a década de 60, apresentam índices de 1,1 e 1,3 homicídios, respectivamente.

Outros estados que aboliram a pena capital recentemente apresentam indicativos bastante intermediários. Connecticut, que pôs fim à pena de morte em 2012, é o 23º dos 50 estados, além do Governo Federal e do Distrito de Columbia, com menor índice de homicídios, com 3,6 assassinatos a cada 100.000 habitantes. Nova Jersey e Nova Iorque, ambos sem a pena

31 Anexo I. Tabela I.

(27)

19 capital desde 2007, são o 25º e 28º, respectivamente, ambos abaixo da média nacional de 4,8 homicídios para cada 100.000 habitantes.

A conclusão que se extrai da análise dos dados é que a regulamentação da pena capital por estado acaba sendo definida a partir de indicativos pessoais e da aceitabilidade social da pena de morte em cada jurisdição. Os índices de criminalidade são tão variáveis que não se pode vincular tais elementos à possibilidade de execução de criminosos. Não é possível estabelecer qualquer relação de causa ou consequência entre as taxas de homicídios e a aplicação (ou mera existência) da pena de morte.

Diante de tal prognóstico, o presente capítulo se destina a apresentar dados objetivos sobre a pena capital em todo o território norte-americano, tais como que estados ainda permitem a execução de criminosos, histórico recente de condenações e execuções e métodos de execução utilizados e o Estados Unidos afora.

2.1. Mapa da pena capital por estado

33

O primeiro estado a abolir a pena capital nos Estados Unidos foi Michigan, no longínquo ano de 1846. Desde então, outras 18 jurisdições seguiram o exemplo e extinguiram a pena de morte de seus respectivos ordenamentos jurídicos. No total, dentre os 50 estados federados, além do Distrito da Columbia, Governo Federal e as Forças Armadas, são 19 os que extirparam a sanção capital de sua legislação, com 34 jurisdições em que as execuções ainda são possíveis.

A maior concentração de movimentos abolicionistas ocorreu na última década. Entre 2007 e 2014, Nova Iorque, Nova Jersey, Illinois, Novo México, Connecticut e Maryland, já em 2013, puseram fim às execuções em seu território. Os três últimos, no entanto, mantiveram as condenações existentes à época, e, em conjunto, mantém até hoje 17 detentos no corredor da morte aguardando suas respectivas execuções.

Dentre as 19 jurisdições acima (18 estados e o Distrito da Columbia), dez deles já haviam abolido o instituto até o início da década de 70. Os outros 9 ainda previam a pena de morte mesmo após a sua reforma nacional em 1976. Desde então, desses 9, apenas 4, Maryland, Connecticut, Novo México e Illinois, efetivamente executaram criminosos após 1976, os dois últimos com uma execução cada. A proibição formal da pena de morte, portanto, reflete a

(28)

20 realidade histórica dos estados abolicionistas. As execuções e condenações eram muito infrequentes. Em Maryland, por exemplo, no ano de 2013, quando pôs fim à pena capital, havia apenas 4 detentos no corredor da morte.

Também merece destaque a abolição da pena de morte em Nova Iorque. Desde que as execuções começaram a ser registradas nos Estados Unidos, aquele estado figura como o 3º que mais fez uso do instituto no país, com 1.130 execuções, atrás apenas de Virgínia, com 1.387 e Texas, com 1.274. O diferencial de Nova Iorque é que todas as execuções ocorreram antes de 1976. Desde então, as condenações persistiam, mas o estado não aplicava a pena capital. A situação é parecida na Pennsylvania, que ainda prevê a pena de morte para alguns crimes. Antes de 1976, foram 1.040 as execuções neste estado, mas após a reforma do instituto apenas 3 vezes a sanção foi de fato aplicada.

O estado do Texas, por outro lado, é emblemático. Das 1.274 execuções registradas, 519 – mais de 40% – ocorreram após 1976. A proporção só não é maior do que em Oklahoma, com 45%. São estados que efetivamente fazem uso da pena capital.

Há outros, ainda, que mantiveram a pena de morte ao longo dos anos e ainda condenam criminosos, mas não os executam. Em Nevada, Califórnia e Flórida, o número de detentos atualmente no corredor da morte já supera todas as execuções registradas. No primeiro, são 79 pessoas aguardando a aplicação da pena contra 73 execuções, com 12 delas após 1976. A Califórnia é um dos estados com maior número de condenações, com 745 presos no corredor da morte, contra 722 execuções na história do estado (apenas 13 após 1976). Na Flórida, são 403 detentos contra 403 execuções. Nos três estados somados, são 1.228 pessoas atualmente no corredor da morte contra 1.198 execuções e apenas 114 desde a reforma da pena de morte.

A bem da verdade, a aplicação da pena de morte em tais situações em nada difere da prisão perpétua. Na Califórnia, desde 1976, enquanto 13 indivíduos foram efetivamente executados, outros 90 morreram por causas naturais no corredor da morte34. A manutenção da pena capital foi posta em jogo quando a Proposition 34 foi levada a voto popular. Apesar da

34"California's Death Penalty: A Year in Review", disponível em:

(29)

21 utilização quase nula da pena de morte naquele estado, a proposta foi derrotada por 52% dos votos válidos35.

A pena de morte federal, por sua vez, apresenta dados relativamente próximos à média nacional. Não foram muitas as execuções antes de 1976 (340), mas houve apenas 3 aplicações da pena de morte desde o marco da reforma da pena capital. As condenações, no entanto, persistem, com 60 detentos no corredor da morte no ano de 2014. A possibilidade de novas condenações é real, uma vez que os órgãos persecutórios federais continuam buscando a pena de morte nos tribunais36.

Diante dos indicativos apresentados, o que se vê é o peso político da pena capital, aliado às diferenças culturais entre as diversas jurisdições norte-americanas, como efetivo baluarte da pena de morte. Muitos estados apresentam condenações e execuções tão infrequentes que a manutenção do instituto é, no mínimo, questionável. Conforme dito acima, também não se pode traçar uma relação direta entre a pena de morte e os índices de criminalidade, ainda mais quando se vê que as experiências de cada estado quanto à sua aplicação são tão distintas. Parece, no entanto, que, apesar do crescimento do movimento abolicionista no plano nacional, a confiança na pena de morte e o risco da efetiva existência de um efeito dissuasório, conforme trazido no capítulo anterior, mantém a sanção capital como pena aplicável na grande maioria das jurisdições estadunidenses.

2.2. Métodos de execução

37

A evolução nos métodos de execução tem estreita ligação com os avanços tecnológicos. Há muito tempo se busca formas moralmente aceitáveis de se pôr fim à vida dos condenados. Até a câmara de gás, quando foi implementada pela primeira vez em 1924 pelo estado de Nevada, foi apresentada como uma alternativa mais humana à cadeira elétrica e ao enforcamento38.

35 A aprovação do projeto teria substituído a pena de morte pela prisão perpétua sem condicional como a sanção penal mais grave da Califórnia.

36"U.S. Is seeking Death Penalty in Boston Case", disponível em:

http://www.nytimes.com/2014/01/31/us/boston-marathon-bombing-case.html?_r=1, acessado em 22/11/2014. 37 Anexo I. Tabela I.

38"The lethal history of the gas chamber", disponível em:

(30)

22 Atualmente, todas as jurisdições norte-americanas que ainda possuem a pena de morte adotam como método primário a injeção letal. A aplicação convencional do método consiste na introdução direta na veia de um coquetel de três drogas: a primeira, sedativa ou anestésica, seguido de alta dose de brometo de pancurônio (paralisante muscular), e, por fim, o cloreto de potássio força uma parada cardíaca quase imediata39.

Em 18 das 34 jurisdições norte-americanas com pena capital, apenas a injeção letal é legalmente permitida. Em outros 9 o executando pode optar entre a injeção e outros métodos, como a cadeira elétrica (Alabama, Flórida, Carolina do Sul e Virgínia), a câmara de gás (Califórnia e Montana) ou enforcamento (Nova Hampshire e Washington). Em alguns estados em que métodos alternativos já foram extintos, no entanto, aqueles que já habitavam o corredor morte antes da abolição ainda podem por eles optar. É o caso de Utah, por exemplo, onde os condenados antes de 2004 ainda podem escolher a morte por fuzilamento40. Na pena de morte federal será aplicado o método previsto pelo estado onde a pena for imposta.

Ao contrário do que logo se imagina, a discussão sobre os métodos utilizados para as execuções não é dos pontos mais controversos relativos à pena de morte. A Suprema Corte, por exemplo, nunca declarou nenhum método inconstitucional. Pelo contrário: nas duas vezes em que teve que se manifestar sobre as formas pelas quais a pena de morte seria conduzida, chancelou a pena capital sem vislumbrar qualquer inconstitucionalidade.

A primeira vez que a discussão chegou na Suprema Corte dos Estados Unidos foi em 194741. Willie Francis havia sido condenado à morte, tendo sido submetido à cadeira elétrica em 3 de maio de 1946. O aparelho, no entanto, apresentou falhas e o choque não foi suficiente para matá-lo. Testemunhas teriam escutado Francis aos berros durante o mal funcionamento da cadeira elétrica, pedindo aos agentes carcerários que retirassem o aparelho para que ele pudesse

respirar. O questionamento sobre a constitucionalidade de “executá-lo novamente” foi levado

à maior instância do Poder Judiciário dos Estados Unidos, instado a se manifestar sobre potenciais violações à 5ª e a 8ª Emendas à Constituição.

39 Alguns estados, como Ohio, têm estudado a utilização de protocolos com apenas 2 ou até 1 única droga. "Death

Penalty Information Center: Lethal Injection", disponível em:

http://www.deathpenaltyinfo.org/lethal-injection-moratorium-executions-ends-after-supreme-court-decision, acessado em 22/11/2014.

40 Desde 1976, apenas 3 réus optaram pelo fuzilamento em Utah, sendo o último em 2010. "Ronnie Lee Gardner

Executed by Firing Squad in Utah", disponível em:

(31)

23 A Corte, no entanto, não encontrou nenhum problema. Para os 5 Justices que

compuseram a maioria, não havia nenhuma diferença entre uma nova execução após a falha do equipamento e a submissão de um indivíduo a um novo julgamento após algum erro procedimental no trâmite anterior. Afastada a alegada violação à double jeopardy clause, Willie

Francis foi finalmente executado em 9 de maio daquele ano.

Já em 2008, tendo em vista o avanço na utilização da injeção letal, conforme visto acima, o three-drug protocol veio a ser questionado perante a SCOTUS42. Argumentava-se que

a alta precisão necessária para que as drogas surtissem o efeito esperado traria consigo riscos suficientes de erro na sua aplicação, podendo causar dor e sofrimento ao executando.

A maioria Corte ratificou a constitucionalidade da pena de morte e também do método de aplicação da injeção letal. Segundo o Justice Roberts, a simples alegação de que o protocolo

das três drogas seria de difícil aplicação, ainda que ilustrada por casos esporádicos em que se erros fossem cometidos, não seria suficiente para que se concluísse pela sua inconstitucionalidade sob a 8ª Emenda.

Apesar da chancela da Suprema Corte e da aparente aceitabilidade do progresso da injeção letal como um método de execução mais humano, a administração das drogas ainda é confusa e objeto de muitas críticas43. Os estados que tentaram introduzir novos protocolos, como Ohio44 e Oklahoma45, tiveram problemas nos primeiros testes. A grande dúvida quanto à injeção letal é se o que torna o método “indolor” seria a primeira droga, responsável pela

paralisação do corpo. O indivíduo que fica paralisado não pode demonstrar nenhum sofrimento, como fez William Francis ao perceber que a cadeira elétrica não estava funcionando direito. Não se pode saber se o relaxante muscular, por exemplo, foi injetado incorretamente, como já aconteceu na Flórida46, o que poderia submeter o executando ao sofrimento de estar acordado enquanto a terceira droga força uma parada cardíaca.

42Baze v. Rees, 553 U.S. 35 (2008).

43 ZIMMERS, Teresa A. et al. Lethal Injection for Execution: Chemical Asphyxiation? disponível em:

http://www.plosmedicine.org/article/info:doi/10.1371/journal.pmed.0040156, acessado em 22/11/2014.

44 "Controversial execution in Ohio uses new drug combination", disponível em:

http://edition.cnn.com/2014/01/16/justice/ohio-dennis-mcguire-execution/, acessado em 22/11/2014.

45 "Oklahoma execution: Clayton Lockett writhes on gurney in botched procedure", disponível em:

http://www.theguardian.com/world/2014/apr/30/oklahoma-execution-botched-clayton-lockett, acessado em 22/11/2014.

46 RADELET, Michal L. Examples of Post-Furman Botched Executions, disponível em:

(32)
(33)

25

Capítulo 3: Década De 70: A Reviravolta do Sentenciamento

Capital

Durante grande parte da história dos Estados Unidos a constitucionalidade da pena de morte e questões procedimentais atinentes à sua aplicação restou inconteste. Dessa forma, a Suprema Corte se posicionou pela primeira vez sobre o tema em 1932, em Powell v. Alabama47,

em que homens acusados de estupro foram condenados à morte sem que tivessem se consultado com advogados, exceto por alguns minutos antes do julgamento. A Corte decidiu, então, que a ausência de defesa técnica em procedimento capital violava o devido processo legal, tornando obrigatório que se possibilite ao defendente a assistência de advogado.

Desde então até o início da década de 70, foram poucos os avanços da constitucionalização da pena capital pela Suprema Corte. O episódio mais significativo durante tal interregno foi em 1968, quando a Suprema Corte declarou inconstitucional norma do

death-penalty statute de Illinois que permitia a exclusão de jurados que tivesse objeções à pena de

morte48.

Justamente no período entre 1966-1972, o apoio à pena de morte chegou ao seu menor nível. Observando principalmente o movimento internacional pela abolição da pena capital, apenas cerca de 42% da população americana apoiava a prática49. Os questionamentos chegavam à Suprema Corte, que não respondia aos anseios da população com a velocidade necessária. Entre 1967 e 1972, os estados norte-americanos impuseram o que ficou conhecido como a "moratória voluntária", período em que não ocorreu nenhuma execução50.

Um posicionamento oficial era necessário. Cientes de que teriam que se manifestar sobre a pena de morte, a Suprema Corte concedeu certiorari para analisar dois casos: McGautha

v. California e Crampton v. Ohio51, que viriam a ser julgados conjuntamente em 1971.

3.1. A pena de morte em tese: primeiros questionamentos

47Powell v. Alabama. 287 U.S. 45 (1932).

48 A Suprema Corte decidiu que apenas poderiam ser excluídos aqueles que não fossem capazes de seguir as instruções do juiz. Witherspoon v. Illinois, 391 U.S. 510 (1968).

49"Recent Legal History of the Death Penalty in America: American capital punishment goes to court", disponível em: http://usgovinfo.about.com/library/weekly/bldeathpenalty.htm, acessado em 22/11/2014.

Imagem

TABELA 1: QUADRO COMPARATIVO DA PENA DE MORTE NOS ESTADOS UNIDOS POR JURISDIÇÃO
Tabela por Luiz Francisco Mota Santiago Filho com base nos dados fornecidos pelo Death Penalty Information Center .

Referências

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