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ARTIGO
DE
REVISÃO
Signs
and
symptoms
associated
with
digestive
tract
development
夽
Mauro
Batista
de
Morais
a,baDisciplinadeGastroenterologiaPediátrica,EscolaPaulistadeMedicina,UniversidadeFederaldeSãoPaulo(Unifesp),SãoPaulo,
SP,Brasil
bPós-Graduac¸ãoemNutric¸ão,EscolaPaulistadeMedicina,UniversidadeFederaldeSãoPaulo(Unifesp),SãoPaulo,SP,Brasil
Recebidoem1defevereirode2016;aceitoem20defevereirode2016
KEYWORDS Gastroesophageal reflux;
Constipation; Crying;
Milkhypersensitivity; Infant;
Infantformula
Abstract
Objective: Toanalyzethedevelopmentandprevalenceofgastrointestinalsignsandsymptoms
associatedwiththedevelopmentofthedigestivetract,andtoassessthemeasuresaimedto
reducetheirnegativeimpacts.
Sourceofdata: Considering thescope andcomprehensiveness of thesubject, asystematic
reviewoftheliteraturewasnotcarriedout.TheMedlinedatabasewasusedtoidentify
refe-rencesthatwouldallowtheanalysisofthestudytopics.
Synthesisofresults: Infants frequently show several gastrointestinal signs and symptoms.
Theseclinicalmanifestationscanbepartofgastrointestinalfunctionaldisorderssuchas
infan-tilecolic,infantregurgitation,andfunctionalconstipation.Allergytocow’smilkproteinand
gastroesophagealrefluxdiseasearealsocausesoftheseclinicalmanifestationsandrepresent
animportantanddifficultdifferentialdiagnosis.Thediseasesthatcoursewithgastrointestinal
signsandsymptomscanhaveanimpact onfamilydynamicsandmaternalemotionalstatus,
andmaybeassociatedwithfutureproblemsinthechild’slife.Comprehensivepediatriccare
isessentialfordiagnosisandtreatment.Maternalbreastfeedingshouldalwaysbemaintained.
Somespecialformulascancontributetothecontrolofclinicalmanifestationsdependingonthe
establisheddiagnosis.
Conclusion: Duringthenormaldevelopmentofthedigestivetract,severalgastrointestinalsigns
andsymptomsmayoccur,usuallyresultingfromfunctionalgastrointestinaldisorders,
gastro-esophagealrefluxdisease,andallergytocow’smilkprotein.Breastfeedingshouldalwaysbe
maintained.
© 2016 Sociedade Brasileira de Pediatria. Published by Elsevier Editora Ltda. This is an
open access article under the CC BY-NC-ND license (http://creativecommons.org/licenses/
by-nc-nd/4.0/).
DOIserefereaoartigo:
http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2016.02.008
夽 Como citar este artigo: Morais MB. Signs and symptoms associated with digestive tract development. J Pediatr (Rio J). 2016; 92(3Suppl1):S46---56.
E-mail:maurobmorais@gmail.com
PALAVRAS-CHAVE Refluxo
gastroesofágico; Constipac¸ão intestinal; Choro;
Hipersensibilidade aleite;
Lactente; Fórmulasinfantis
Sinaisesintomasassociadoscomodesenvolvimentodotratodigestivo
Resumo
Objetivo: Analisar o desenvolvimento e a prevalência de sinais e sintomas gastrintestinais
associadoscomodesenvolvimentodotubodigestivoeasmedidasquevisamadiminuirsuas
repercussõesnegativas.
Fontesdosdados: Considerandoaabrangênciaeamplitudedotema,nãofoifeitarevisão
sist-emáticadaliteratura.Usou-seabasededadosdoMedlineparaaidentificac¸ãodereferências
bibliográficasquepermitissemcontemplarostemasdeestudo.
Síntesedosresultados: O lactente apresenta com elevada frequência sinais e sintomas
gastrintestinais.Essasmanifestac¸õesclínicaspodemfazerpartededistúrbiosfuncionais
gas-trintestinais,comocólica,regurgitac¸ãoeconstipac¸ãointestinalfuncional.Aalergiaàproteína
doleitedevacaeadoenc¸adorefluxogastroesofágicotambémsãocausasdessasmanifestac¸ões
clínicaserepresentamumimportanteedifícildiagnósticodiferencial.Asdoenc¸asquecursam
comsintomasesinaisgastrintestinaispodemterconsequênciasnadinâmicafamiliarenoestado
emocionaldasmães.Podemseassociarcomproblemasnavidafuturadacrianc¸a.Aatenc¸ão
pediátricacompletaéfundamentalparaodiagnósticoeotratamento.Oaleitamentonatural
devesempresermantido.Algumasfórmulasespeciaispodem contribuirparaocontroledas
manifestac¸õesclínicasnadependênciadodiagnósticoestabelecido.
Conclusão: Duranteodesenvolvimentonormaldotubodigestivopodemocorrersinaise
sinto-masgastrintestinaisemgeraldecorrentesdosdistúrbiosgastrintestinaisfuncionais,dadoenc¸a
dorefluxogastroesofágicoedaalergiaàproteínadoleitedevaca.Aleitamentonaturaldeve
sempresermantido.
© 2016 Sociedade Brasileira de Pediatria. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Este é um
artigo Open Access sob a licença de CC BY-NC-ND (http://creativecommons.org/licenses/
by-nc-nd/4.0/).
Introduc
¸ão
A partir da fecundac¸ão, caracterizada pela entrada do espermatozoide no óvulo, o potencial biológico para a formac¸ãodeumnovoserhumanosecristalizaemum fas-cinanteprocessodemultiplicac¸ãoe diferenciac¸ãocelular. Amaturac¸ãodoserhumanoocorrenocursodasvárias eta-pasdavida.Atualmente,osprimeirosmildias,iniciadosna concepc¸ão, são valorizadoscomo um períodocrítico para definiroestadodesaúdedoserhumano epodeter reper-cussõesaolongodetodaavida.1,2
Os doisprimeiros anos devida constituemuma impor-tante parceladesse período,queé marcadopela elevada velocidade de crescimento e desenvolvimentodos órgãos e sistemas. Dessa forma,podem surgir nolactente sinto-mase sinais gastrintestinais3,4 que podemestar atrelados
às inúmeras alterac¸ões anatômicas e funcionais que são observadasnessafasedavida.Alémdessasmanifestac¸ões clínicas, podem ter repercussões na vida futura do indivíduo,5 além de produzir consequências que
interfe-rem na dinâmica familiar e no estado emocional dos pais.
Pode-se dizer que o desenvolvimento do aparelho digestivo envolve não somente os aspectos anatômicos e funcionais de seusórgãos, mastambém a interac¸ão local e sistêmica com o sistema imunológico intestinal e a instalac¸ãodamicrobiotaintestinal.Ainterac¸ãoentreesses trêsprocessos émotivodepesquisasdeciênciasbásicase clínicasnabuscadeopc¸õesquepossamproporcionar resul-tadosfavoráveisduranteosprimeirosmildiasenosvários ciclosdavidafutura.
Oobjetivodesteartigoéanalisaroaparecimentoea pre-valênciadesinaisesintomasgastrintestinaisassociadoscom o desenvolvimentodo trato gastrintestinale das medidas quevisamadiminuirsuasrepercussõesnegativas.
Metodologia
Considerando a abrangência e amplitude do tema, não foifeitarevisão sistemática daliteratura.Usou-se a base de dados do Medline para a identificac¸ão de referên-ciasbibliográficasque permitissemcontemplaro temade estudo.Entre outras,foramusadososseguintestermosna buscadeinformac¸ões:‘‘digestive’’,‘‘tract’’,‘‘ontogeny’’, ‘‘microbiota’’, ‘‘development’’, ‘‘premature’’, ‘‘oral’’ e ‘‘tolerance’’. Quando necessário, a pesquisa foi restrita parahumanos.Foramusadostambémconhecimentos pesso-aisetendênciasdiscutidasemeventoscientíficosnacionais einternacionais.
Desenvolvimentoanatômicoefuncionaldotrato gastrintestinal
Ointestinoéumdos órgãosmaiscomplexosdoorganismo humano,tantodopontodevistaanatômicocomofuncional. As células e os tecidos intestinais são formados a partir detodos os três folhetos embrionários. As células tronco (‘‘stemcells’’)intestinais sãoderivadasdomesoderma, o tecidomusculardoendodermaeosistemanervosoentérico do ectoderma.6 Além da func¸ão digestiva e absortiva
Tabela1 Principaismarcosdodesenvolvimentointestinal7
Épocadagestac¸ão
Diferenciac¸ãocelular
Desenvolvimentodossegmentosintestinais 10asemanadegestac¸ão
Fixac¸ãodoangulodeTreitzereto 12asemanadegestac¸ão
Desenvolvimentodascriptasevilosidades Da9aà20asemanadegestac¸ão
Apoptosedecélulasdoepitéliodavilosidade 18asemanadegestac¸ão
Digestão
Desenvolvimentodereceptoresparaabsorc¸ão
devitaminaB-12aolongodetodointestino
comatividadeexclusivanoíleoterminalnofim
dagestac¸ão
Da6aà30asemanadegestac¸ão
Detecc¸ãodeatividadedepeptidase,sacarase,
lactase,insulina,glucagon,IGF-1,
colecistoquinina,secretina
Apartirda9aatéa12asemanadegestac¸ão
70%daatividadedasacarase 34asemana
Atividademáximadelactase Somentena40asemanadegestac¸ão
Cólonperdeaestruturadecripta/vilosidade
edaatividadedesacaraseeaminopeptidase.
Apartirda36asemana
Aumentodaatividadedelipasegástrica Apartirda24asemana
Absorc¸ão
Transportadordeglicosenamucosaluminal
(SGLT-1)
Apartirda17asemana.Menorcapacidadeaonascimentoemrelac¸ãoao
lactenteeadulto
Transportedeglicosenamembranabasolateral Presenc¸adeGLUT-2entre17ae30asemanas
Motilidade
Deglutic¸ão Delíquidoaminióticoapartirda20asemana
Motilidadeenterocolônica Desorganizadaapartirda24asemanadegestac¸ão
Propagac¸ãodocomplexomotormigratórioentre33ae36asemanas
Maturac¸ãodamotilidadeinterdigestivaapartirda36asemana
na regulac¸ão dos níveis sistêmicos de nutrientes e com-portamento alimentar) e a chamada barreira intestinal, que impedea passagemdo conteúdo intestinal, inclusive demicrorganismos,paraointeriordoorganismo.Afunc¸ão epitelialéfeitaporquatrotiposdecélulas:enterócitos, res-ponsáveispelaabsorc¸ão,etrêstiposdecélulassecretoras (célulascaliciformesprodutorasdemuco,célulasdePaneth produtorasdesubstânciasantimicrobianaseváriascélulas enteroendócrinas que regulam a saciedade, a absorc¸ão intestinal, a proliferac¸ão de células  do pâncreas e a secrec¸ão dehormônios,entreoutros).6 Destaca-se,ainda,
a intensaproliferac¸ão epitelial a partir de célulastronco querenovaempoucosdiasasuperfícieluminaldointestino e a complexa interac¸ão entre o epitélio, a musculatura lisa e o sistema nervoso entérico para assegurar o fluxo unidirecionalproporcionadopeloperistaltismointestinal.6
Odesenvolvimentodointestinoduranteagestac¸ãopode serdivididoem quatroprocessosbásicos:1)diferenciac¸ão celular; 2) digestão; 3) absorc¸ão e 4) motilidade.7
A tabela 1 apresenta os principais marcos do
desenvolvi-mentointestinal.7
Essas características fisiológicas são muito importan-tes para a compreensão do processo de alimentac¸ão do recém-nascido,principalmenteoprematuro.Aonascimento ocorre a transic¸ão daalimentac¸ão parenteral, via cordão umbilical,edepequenasquantidadesdelíquidoamniótico deglutido,paraacompletaobtenc¸ãodenutrientesapartir
docolostro e leitematerno.7Nesse momento,o intestino
passaporprocesso derápido crescimentomorfológico em termosdecomprimentoesuperfícieabsortiva.Valelembrar queseestimaqueo comprimentodointestinoé de50cm nametadedagestac¸ão,cercade100cmnassemanasque antecedemonascimentoe200cmnasprimeirassemanasde vida.7Oestímulodocolostronesseprocessoédeexpressiva
relevância.7
Aalimentac¸ãodoprematuroconstituiumenorme desa-fioselevarmosemconsiderac¸ãoaimaturidadedosistema digestivo,especialmentedoreflexodadeglutic¸ão,amenor atividadede lactaseeo padrãoimaturodemotilidadedo tratogastrintestinal.Essesfatosexplicam,pelomenosem parte,aaltaprevalênciadeintolerânciaalimentar,refluxo gastroesofágicoeconstipac¸ãointestinalemprematuros.7
Colonizac¸ãodotubodigestivo
O desenvolvimento de técnicas de biologia molecular, que não dependem do isolamento das bactérias por cul-tura convencional, proporcionou extraordinário aumento nos conhecimentos sobre os microrganismos que vivem no intestino.8 No cólon, podem ser encontrados mais de
1013 microrganismos por grama do conteúdo intestinal.
compõem a microbiota do trato gastrintestinal. Acredita--sequeonúmerodegenes nomicrobiomahumano écem vezesmaiordoquenocorpohumano.Deve serdestacado queexisteinterac¸ãomútuaebenéficaentreamicrobiotaeo hospedeiro.Assim,ocorremnãosomenteinterac¸ões nutrici-onais(fermentac¸ãocolônicacomproduc¸ãodeácidosgraxos decadeia curtaque sãoabsorvidos nocólon, hidrólisede lipídeoseproteínas),mastambémcomosistema imunoló-gicointestinal.1,8
Deve ser lembrado que a microbiota intestinal não é constituída exclusivamente por bactérias. Fungos e vírus também são encontrados na luz do trato gastrintestinal. Opotencialdoempregoterapêuticodevírusqueinterfere nacomposic¸ãodamicrobiotaintestinalrepresentaumnovo desafionaspesquisassobreomicrobiomadoserhumano.9
A convicc¸ão deque ofeto vive em umambiente esté-ril está sendo modificada nos últimos anos em func¸ão dasevidênciasdaexistênciademicrorganismosnolíquido amniótico, no sangue do cordão umbilical, nas mem-branas fetais e na placenta.10 Esses achados devem ser
interpretados com cautela em func¸ão da possibilidade de contaminac¸ão das amostras no momento da coleta.10
Deve ser destacado que ao longo da gestac¸ão ocorrem modificac¸õesnamicrobiotavaginalecolônicadamãe.Essas mudanc¸as são relevantes, considerando que a microbiota maternateminfluêncianaformac¸ãodamicrobiotadofeto edorecém-nascido.10
No primeiro dia de vida ocorre rápida colonizac¸ão do intestinodorecém-nascidocommicrorganismos provenien-tes da microbiota materna e do ambiente.8 Os primeiros
colonizadores pertencem aos gênerosEscherichia e Ente-rococcus.Posteriormente,aparecembactériasdependentes de anaerobiose dos gêneros Bifidobacterium e Bacteri-odes. Ou seja, as primeiras bactérias são anaeróbias facultativas(Staphylococcus,Streptococcus,Enterococcus,
Enterobacter) quecontribuem parao desenvolvimentode ambiente anaeróbio no intestino, que, assim, permite a instalac¸ãodeanaeróbiosobrigatórios(Bifidobacterium, Bac-teriodes, Clostridium, Eubacterium).1 Com a introduc¸ão
de alimentos complementares ao leite materno na dieta do lactente observa-se um importante impacto sobre a microbiota intestinal, caracterizado pela diminuic¸ão da participac¸ãode bifidobacterias(que, noentanto,se man-têm predominantes) e pelo aumento da diversidade com maior participac¸ão de bactérias dos gêneros Bacterioi-des eClostridium.1 Estudo feitocomlactentes brasileiros
em aleitamento natural exclusivo identificou seis filos na microbiotafecal:bacteroidetes,firmicutes,fusobactérias, proteobactérias,actinobactériaseverrucomicrobias.11 Aos
trêsmesesdevidaobservou-se,predominantemente, Strep-tococcus e Escherichia e aos seis meses, predomínio de
Escherichia.11
Acolonizac¸ãodotubo digestivodorecém-nascidoe do lactentedependedealgunsfatores,especialmentedotipo departoedealimentac¸ão.Aolongodosdoisprimeirosanos devidaobserva-sequeopartoporcesáreaassocia-secom maiorabundânciadefirmicutesemenordebacteriodetes. Ao longo do primeiro semestre de vida constata-se que a instac¸ão dos bacteriodetes ocorre em uma fase mais tardia.Nofimdosdoisanosdevidaaabundânciarelativa dos constituintes da microbiota é semelhante tanto nos
nascidospor partonormal comoporcesárea. Observou-se tambémque osníveis circulantes de citocinas produzidas porlinfócitosTauxiliadoressãomenoresnos nascidospor cesárea. Deve ser destacado que a microbiota fecal das mãesdecrianc¸asnascidasporpartocesáreaevaginalnão eradiferente.12
Com relac¸ão ao tipo de alimentac¸ão, é bem conhe-cidoque amicrobiota intestinalde lactentesalimentados exclusivamentecomleitematernoédiferentedaqueles ali-mentados comaleitamento artificial.13---15 O leitematerno
éricoem oligossacarídeosqueinfluenciam nacomposic¸ao damicrobiotaintestinal.16,17Sabe-se,também,queoperfil
deoligossacarídeosnoleitematernonãoéigualem todas asmães.18,19Osefeitosespecíficosdesses diferentesperfis
deoligossacarídeos namicrobiota intestinalaindanãosão plenamenteconhecidos.18,19Poroutrolado,oleitematerno
atéhá alguns anos era considerado praticamente estéril. Recentemente,foielaboradaumahipótesequesugereuma novavia decomunicac¸ãoentrea microbiotadamãeedo lactente.20,21 Nesse contexto, sugere-se que bactérias da
microbiotaintestinaldamãealcanc¸ariam oleitematerno por meio de translocac¸ão a partir da luz intestinal e do transportepela via sanguínea, o que caracteriza uma via interna enteromamária.20,21 Essa hipótese foi elaborada a
partirdeestudosemanimaisdeexperimentac¸ão.Essas bac-térias poderiam influenciar o processo de colonizac¸ão do lactenteeamaturac¸ão dosistemaimunológico. Outravia possível é a entrada das bactérias do tecido cutâneo da mãe na glândula mamária através do mamilo.20,21 Assim,
o colostro e o leite humano são fontes não somente de oligossacarídeos,queestimulamaformac¸ãodamicrobiota intestinal,mastambém,provavelmente,debactériaspara olactente. Estima-seque 800ml deleitematernopodem conteraté 105 a107 unidades formadoras de colônias.As
bactériasquevêmsendoidentificadasemamostrasdeleite maternopertencemprincipalmenteaosgêneros Lactobacil-lus,Staphylococcus,EnterococcuseBifidobacterium.20,21
Amicrobiotaintestinalatravésdeestruturas molecula-resqueconstituemaschamadasviasmolecularesassociadas aosmicroorganismos(MAMPs---microbe-associated molecu-larpatterns)interagecomosistemaimunológicointestinal ecomabarreiraintestinale,também,interferenaproduc¸ão de muco. Estimulam a proliferac¸ão de células nas crip-tasenascélulasdePanethresponsáveispelaproduc¸ãode peptídeosantimicrobioanos denominados defensinas.Essa interac¸ão (crosstalk) ocorre com receptores específicos, como os toll-like receptors. Respostas pró-inflamatórias podemserneutralizadasporcélulasTespecializadas deno-minadas reguladoras (Treg) por meio da produc¸ão de interleucina 10. Esse mecanismo é muito importante no desenvolvimentodatolerânciaoral. Bactériasprobióticas, comoo LactobacillusGG e Bifidobacteriumbreve,podem estimularoprocessodetolerânciaimunológicapormeiode estímuloparaaproduc¸ãodeinterleucina.1,22,23
As células M situadas próximas àsplacas de Peyer são responsáveispelaapresentac¸ãodeconteúdospresentesna luzintestinale,assim,estimulamosistemaimunológicoda mucosa.1
Sinaisesintomasgastrintestinaisnolactente
Nos primeirosmesesde vida é frequentea ocorrênciade sintomasdigestivos,comoregurgitac¸ões,vômitos,cólicae constipac¸ãointestinal.Algumasmanifestac¸õesclínicas, ape-sardenãoconstituirumadoenc¸adefinida,podemsermotivo depreocupac¸ãoparaospais,comoéocasodaflatulência, que,porsinal,édifícildeserquantificadaparaser caracte-rizadaounãocomoexcessiva.Muitosdessessintomaspodem sertransitóriose sãoatribuídos àimaturidade e/oucomo parte dodesenvolvimento dotrato gastrintestinal. Muitas dessasmanifestac¸õesclínicasestãoincluídasnosdistúrbios gastrintestinaisfuncionaiseseudiagnósticopodeser esta-belecido pelo critério de Roma III.25 A doenc¸a do refluxo
gastroesofágicoeaalergiaàproteínaaoleitedevacanão sãodistúrbiosgastrintestinaisfuncionais,noentantopodem ocasionarsinaisesintomasgastrintestinaisprincipalmente no primeiro ano de vida.26,27 Na prática pediátrica, com
frequência,aalergiaàproteínadoleitedevacaeadoenc¸a dorefluxogastroesofágicoconstituemdiagnóstico diferen-cialdosdistúrbiosfuncionaisgastrintestinais.28,29
Assim, o lactente podeapresentar diferentessintomas e sinais gastrintestinais,especialmente nos primeirosseis mesesdevida.Cabeaomédicoreconheceramanifestac¸ão clínica como isolada e/ou transitória ou como parte de algumdistúrbiogastrintestinalfuncional,alergiaaoleitede vacaou,ainda,doenc¸adorefluxogastroesofágico. Outras doenc¸asnãorestritasaoaparelhodigestivofazempartedo diagnósticodiferencial.Somenteapóscuidadosaavaliac¸ãoe definic¸ãodahipótesediagnósticaserápossíveldefinira con-dutaaseradotada.Atabela2apresentainformac¸õesque podemcontribuirparao diagnósticodiferencial dossinais e sintomas gastrintestinaisno lactente.25---32 Síndrome dos
vômitoscíclicoseruminac¸ãonãoforamincluídospornãoser tãoprevalentesquantoosdemaisdistúrbiosgastrintestinais funcionais.
Em 2015, um grupo de especialistas de vários países avaliou as informac¸ões disponíveis na literatura sobre a prevalênciadosdistúrbiosfuncionaisgastrintestinaisno pri-meiroanodevida.5Amedianadaprevalênciadecólicado
lactenteem30artigosfoide18%.Noentanto,foiobservada grandevariabilidadeem func¸ão,pelomenosemparte, da diversidadede critérios diagnósticos.É interessante men-cionarqueumapesquisafeitanoBrasilequecaracterizou cólicadolactente, segundoocritériodeWessel, foi posi-tivaem16%dos 1.086lactentesinvestigados;noentanto, segundosuas mães, 80% apresentavam cólica.33 Portanto,
nãoexiste plena concordância entreos critérios diagnós-ticosusadosnosestudossobreprevalência,como também comaopiniãoeaexpectativadospais.Comrelac¸ãoà pre-valência de regurgitac¸ão no lactente, foram encontrados 13 artigos com resultados que variaram entre 3% e 87%. Em apenas dois desses 13 artigos foi usado o critério de RomaIII (duas ou maisregurgitac¸õespor dia por maisde três semanas), foram encontradas prevalências de 17% e 26%.Deveserdestacadoque,em geral,aregurgitac¸ão do lactentedesapareceespontaneamente atéos12mesesde vida.5,34,35Porsuavez,aprevalênciadedoenc¸aderefluxo
gastroesofágicoédesconhecidanolactente,masseaceita queémuitomenordoqueaderegurgitac¸ãodolactente.35
A prevalência de constipac¸ão intestinal funcional no pri-meiroanodevidaapresentougrandevariac¸ão,entremenos
de1%e39%nasoitopublicac¸õesidentificadas.5Doisestudos
transversais que usaram o critério de Roma III encontra-ram prevalência de constipac¸ão intestinal entre 0,05% e 5%.5 Em nossa opinião, o critério de Roma III subestima
o diagnóstico deconstipac¸ão intestinal,especialmenteno primeiroanodevida.36,37Estudorecentecomparoua
preva-lênciadeconstipac¸ãointestinalem831lactentesbrasileiros com o uso do critério de Roma III e outro critério mais abrangente(eliminac¸ãodefezesdurascomdor/dificuldade e/ou frequência menor do que três vezes por semana ou eliminac¸ãodefezesdurascilíndricascomrachadurasouem cíbalos,mesmo que eliminadassemdoroudificuldade).38
De acordo com o critério de Roma III, a prevalência de constipac¸ão intestinalfoiigual a1,1% enquanto ocritério maisabrangenteidentificouconstipac¸ãointestinalem19,6% dapopulac¸ãoestudada.38
Estima-sequeaprevalênciadealergiaàproteínadoleite devaca situa-seentre2% e3% noprimeiro anodevida.27
Deve ser lembrado, no entanto, que manifestac¸ões clíni-cas sugestivasdealergiaao leitedevaca estão presentes em maiorpercentualdos lactentes,cercade9%, segundo estudoprospectivofeitonaHolanda.39Pode-seestimarque
apenas uma parcela dos lactentes (cerca de 30 a 50%) quefazdietadeeliminac¸ãoiráapresentartestede desen-cadeamentopositivoqueconfirmaodiagnóstico.39,40
Assim, pode-se constatar que número elevado de lac-tentesapresentasinaisesintomasgastrintestinais.Parcela desses lactentes apresentamais de um sintoma.4,41 Essas
manifestac¸ões gastrintestinaisfrequentementesãomotivo demudanc¸asnoesquemaalimentardolactente, principal-mente,mudanc¸asnostiposdefórmulasinfantis.42,43
Assistênciapediátricaparaolactente commanifestac¸õesclínicasgastrintestinais
Oprimeiropontoaserconsideradoéseosinalousintoma gastrintestinalque o lactente apresentaefetivamentefaz partedeumadoenc¸aouseésimplesmenteparteda fisiolo-giadigestivanormaloudoprópriodesenvolvimentodotrato gastrintestinalnoprimeiroanodevida.
Nas consultas pediátricas é frequente os pais mencio-narem que seus filhoseliminam gases em excesso. Artigo comsugestãodecondutaparaossinaisgastrintestinais fre-quentesnolactente discuteessa questão ea vinculacom choroedesconforto(fussiness).3Destaca-sequeapresenc¸a
degásnotubodigestivoénormal.Excessodegases pode-riaresultardetécnicainapropriadadeamamentac¸ãocoma ocorrênciadeaerofagia.3
Choroexcessivoedesconfortosãofrequentemente consi-deradoscomomanifestac¸õesgastrintestinais.44,45Em1954,
Wessel definiu cólica do lactente como episódios de irri-tabilidade,agitac¸ãoouchorointensoporpelo menostrês horas, em três dias dasemana e com durac¸ão superior a trêssemanas(‘‘regrados3’’).46 Emgeral, desaparecepor
volta dos quatromesesde vida.44,45 Em 2006,a cólica do
lactente foi incluída no critério de Roma III (tabela 2), que se destina à padronizac¸ão do diagnóstico dos distúr-biosgastrintestinaisfuncionais.25 Naprática,tantoparaos
Tabela2 Critériosdiagnósticosparadoenc¸asdolactentequecursampredominantementecomsintomasgastrintestinais
1.Cólicadolactente CritériodeRomaIII(2006):25todasascaracterísticasaseguirentreo
nascimentoe4meses:1)episódiosdeparoxismodeirritabilidade, agitac¸ãoouchoroquetêminícioefimsemrazãoóbvia;2)episódiosque durammaise3horaspordiaem3diasporsemanaporpelomenosuma semana;ausênciadefaltadeganhodepeso.
2.Regurgitac¸ãodolactente(‘‘refluxo fisiológico’’)
CritériodeRomaIII(2006):25todasascaracterísticasaseguiremlactente saudávelemtodososoutrosaspectos:1)duasoumaisregurgitac¸ões pordiapor3oumaissemanas;2)ausênciadenáuseas,hematemese, aspirac¸ão,apneia,déficitdeganhodepeso;3)dificuldadepara alimentac¸ãooudeglutic¸ão,posturalanormal.
3.Constipac¸ãointestinalfuncional CritériodeRomaIII(2006)25ediretrizEspghan/Naspghan(2014):30durac¸ão depelomenos1mêsdeduasoumaisdasseguintescaracterísticas:1) menosdoquetrêsevacuac¸õesporsemana;2)pelomenosumepisódio semanaldeincontinênciafecalapósocontroleesfincteriano;3)histórico deretenc¸ãoexcessivadefezes;4)históricodedore/oudificuldadenas evacuac¸ões;5)presenc¸adegrandemassafecalnoreto;6)históricode eliminac¸ãodefezesdegrandediâmetroquepodemobstruirovaso sanitário.Sintomasadicionais:irritabilidade;diminuic¸ãodoapetitee saciedadeprecoce.Essessintomasdesaparecemapóseliminac¸ãodegrande quantidadedefezes.
4.Diarreiafuncional(síndrome dointestinoirritável)
CritériodeRomaIII(2006):25todasascaracterísticasaseguir:1)trêsou maisevacuac¸ões,semdor,defezesnãoformadasemgrandequantidade; 2)durac¸ãosuperiora4semanas;3)inícioentre6e36mesesdeidade;4) evacuac¸õesduranteoperíododiurno;5)ausênciadedéficitdepesocom ingestãoenergéticaadequada.
5.Disquesiadolactente CritériodeRomaIII(2006):25deveincluirasduasseguintescaracterísticas emlactentescommenosde6meses:1)pelomenos10minutosdeesforc¸o echoroantesdaeliminac¸ãocomsucessodefezesmoles;2)ausência deoutroproblemadesaúde.
6.Doenc¸adorefluxogastroesofágico DiretrizNaspghan/Espghan(2009):26estápresentequandoorefluxo gastroesofágicoocasionasintomasqueconstituemincomodoe/ou complicac¸ões.Manifestac¸õesclínicassugestivasdeDRGEantesdos18 meses:regurgitac¸õese/ouvômitosrecorrentesacompanhadosdedéficitde ganhodepeso;comportamentoestressadoouchorosemexplicac¸ão. 7.Alergiaàproteínadoleitedevaca ConsensoBrasileiro(2007)31eDiretrizEspghan(2012):27reac¸ãoadversaà
saúde,reprodutível,provocadaporreac¸ãoimunológicadesencadeadapor antígeno(s)dedeterminado(s)alimento(s).Nolactente,comfrequênciaé umareac¸ãotardia(nãomediadapelaIgE).Emumgrupode159lactentes comsuspeitadealergiaàproteínadoleitedevacaforamencontradosos seguintessintomasesinaisgastrintestinais(cadalactentepoderia apresentarmaisdeumamanifestac¸ãoclínica):regurgitac¸ãoevômitosem 53,5%;cólicaem34,0%;diarreia25,2%,cercade30%dessescomsangue; sanguenasfezesem14,5%econstipac¸ãoem15,7%.Déficitdepesoe comprimentoforamfrequentementeobservados.32
Namaioriadasvezes,odiagnósticodeveserconfirmadopelotestede desencadeamentocomoalimentosuspeitoaserfeitoapós4a12semanas doiníciodadietadeeliminac¸ãoquandoossintomasjáforam
controlados.27,31
Cólicadolactente,regurgitac¸ãodolactente,constipac¸ãointestinal,diarreiafuncional,disquesiadolactenteestãoincluídasnos dis-túrbiosfuncionaisgastrintestinaiseparaodiagnósticopodemserusadososcritériosdeRomaIII(vercomentáriosnotexto).Doenc¸ado refluxogastroesofágicoealergiaàproteínadoleitedevacaestãoincluídasnatabelaporsercausasprevalentesdesinaisesintomas gastrintestinaisnolactentequetemmanifestac¸õesquesãosemelhantesàsdosdistúrbiosfuncionaisgastrintestinais.
problema.Inquéritofeitoemservic¸odeurgênciapediátrica da Holanda demonstrou que nos atendimentos de lacten-tescomchorocomocausaprincipaldaconsulta, cercade 6%dospaisreconheceramapráticadeac¸õesquepoderiam constituirumagravoàsaúdedolactente,como sacudir(o quepodesercausadeshakingbabysyndrome)etentativas
desufocac¸ão.47Resultadospreocupantesforamencontrados
emoutro estudo feitonoJapão.48 Mães delactentescom
cólicapodemapresentardiminuic¸ãodaqualidadedevida, especialmentenosdomíniosdedesempenhofísicoesocial,e maiorriscodedepressão,49,50quepodediminuircomo
chorointensoeinconsolável,constituiumimportante pro-blemadesaúdenosprimeirosquatromesesdevida.Alémdo sofrimentodolactente,ocasionamuitaansiedadenospais epodereduzir aqualidadede vidadafamília.49 Deve ser
enfatizadoqueaavaliac¸ãopediátricadolactentecomchoro deveserdetalhadaecuidadosaparaidentificarcausasque exijamterapêuticaespecífica.Estudoretrospectivofeitoem Torontodestacaaimportânciadaanamnese,doexamefísico edeurinanaavaliac¸ãodolactenteafebrilcomchoro, irri-tabilidadeedesconforto.52Deveserlembradoqueacólica
dolactente ocorreigualmentena vigênciadealeitamento naturaleartificial.44,45
Em geral, regurgitac¸ões como manifestac¸ão isolada no lactenterefletemaocorrênciadochamadorefluxo fisioló-gico(regurgitac¸ãodolactentesegundoocritériodeRomaIII,
tabela2).Nadoenc¸adorefluxogastroesofágico
observam--seoutras manifestac¸ões associadascom as regurgitac¸ões e os vômitos, entre as quais déficit do ganho de peso e manifestac¸õesclínicas atribuídas àprovável esofagite por refluxo como irritabilidade, choro excessivoe dificuldade paraaalimentac¸ão.26,34,35OdiagnósticodeDRGEé
essenci-almenteclínico.Oslactentescomsintomaslevesenenhum sinaldealertasãochamados ‘‘vomitadoresfelizes’’e não há necessidade de tratamento medicamentoso.34 Existem
questionáriosdesenvolvidos paraauxiliarna diferenciac¸ão entre regurgitac¸ão do lactente e doenc¸a do refluxo gas-troesofágico. Na análise de um questionário para essa finalidadeusou-secomoreferencialaavaliac¸ãoclínicapor especialistaexperientecomplementadaounãocomoutros examessubsidiários.53 Aultrassonografianãotemvalorna
diferenciac¸ão daregurgitac¸ão dolactente e dadoenc¸a do refluxo gastroesofágico.26,34,35 Não deve ser indicada na
avaliac¸ãodolactentecomsuspeitadedoenc¸adorefluxo gas-troesofágico.Édegrandeutilidadequandoexistesuspeita de estenose hipertrófica do piloro. A radiografia contras-tada de esôfago, estômagoe duodeno pode ser indicada quandosesuspeitade anormalidadesanatômicasdotrato gastrintestinalsuperior.26,34,35
Doisartigosforampublicadosrecentementesobrea prá-tica de pediatras brasileiros em relac¸ão à avaliac¸ão de lactentes com choro excessivo ou suspeita de doenc¸a do refluxogastroesofágico.54,55 Noprimeiro estudo,132
pedi-atras foram convidados a analisar um caso clínico de um lactentecomchoroexcessivo,regurgitac¸õeseganhodepeso plenamentesatisfatório na vigência dealeitamento natu-ral exclusivo. Hipótese diagnóstica de doenc¸a do refluxo gastroesofágico foi aventada por 63% dos entrevistados, enquanto 24% consideraram a possibilidade de cólica do lactente.54 Esse resultado sugere que existe uma
supe-restimativa quanto à possibilidade de doenc¸a de refluxo gastroesofágiconesse contexto clínico. O segundo estudo envolveu140profissionaisqueanalisaramdoiscasosclínicos típicos,umderegurgitac¸ãodolactente(refluxofisiológico)e ooutrocomdoenc¸adorefluxogastroesofágico.53Apartirdas
respostassobreacondutaaseradotada,osautores concluí-ramqueamaioriadospediatrasdiferenciavacorretamente refluxofisiológicodadoenc¸adorefluxogastroesofágico.55
Com relac¸ão ao hábito intestinal, deve ser assinalado que, em geral, a primeira eliminac¸ão de mecônio ocorre nasprimeiras24horasdevida.Osprematuroscommenos de 1.500g de peso ao nascimento podem ter a primeira eliminac¸ãodemecônioapós48horas.56
Na literatura existem poucos estudos que avaliaram o hábito intestinal do lactente.56---62 Considerando as
informac¸õesdessesartigos,pode-seafirmarquenoprimeiro mês de vida a maioria dos lactentes apresenta quatro a seis evacuac¸ões pordia. Esse númerodiminui a partir do segundomêsdevida.Onúmerodeevacuac¸õesea consistên-ciadasfezesapresentarelac¸ãocomotipodealimentac¸ão. Éfatobemestabelecidoqueoslactentesalimentadoscom leitematernoapresentammaiornúmerodeevacuac¸õesem relac¸ãoaoslactentesemaleitamentoartificial.58,60Asfezes
delactentesemaleitamentonaturalsãomaisamolecidasdo queosquerecebemfórmulainfantil.56,58Otipodefórmula
infantiltambémpodeinfluenciarnaconsistênciadasfezes e na frequência deevacuac¸ões. Oslactentes alimentados com fórmulainfantil convencionaloude sojaapresentam metadedafrequênciadeevacuac¸õese maiorconsistência das fezes quando comparados com os lactentes em alei-tamentomaterno.63 Porsua vez,osque recebemfórmula
comproteína extensamentehidrolisadaapresentammaior frequênciadeevacuac¸õesemenorconsistênciadasfezes.63
Asprincipaismudanc¸asnohábitointestinaldolactente são adiarreia e a constipac¸ão intestinal. Genericamente, diarreia é definida pela ocorrência de três ou mais evacuac¸õesamolecidasnas24horasprecedentes.64,65
Trata--se deuma definic¸ão ampla que inclui asinfecc¸ões virais e bacterianas dotubo digestivo (diarreias agudae persis-tente)que podemocasionar desidratac¸ão e desnutric¸ãoe quenãoestãoincluídasnoescopodesteartigo.Entretanto, vale mencionarque algunspaisconsideram erroneamente a frequênciae consistênciadasfezes no primeiromês de vidacomo‘‘diarreia’’,oquenarealidadeconstituiohábito intestinalnormal.Poroutrolado,aconstipac¸ãointestinal, emgeral,teminíciopelaeliminac¸ãodefezesendurecidas, comdoroudificuldade,naformadecíbalos.66Entretanto,o
critériodeRomaIII25nãolevaemconsiderac¸ãooformatoe
aconsistênciadasfezesparacaracterizarconstipac¸ão intes-tinalnolactente,oquepoderetardarodiagnóstico.
Princípioseperspectivasparaocontroledossinais esintomasgastrintestinaisnolactente
Para lactentes com cólica e regurgitac¸ão o procedimento maisimportanteéoesclarecimentodospaissobreo cará-ter benigno e transitório dessas manifestac¸ões.3,4,26,34,44,45
Nessecontexto,ospaisdevemestarsegurosdequenãosão necessáriosexamessubsidiáriosequeseusfilhosnãocorrem riscos imediatos oufuturos. É aconselhável que se verifi-quemasfontesqueospaiseventualmenteconsultampara obterinformac¸õessobre asaúdede seusfilhose, quando necessário,orientac¸õespediátricasapropriadasecorretivas devemseroferecidas.
Éimportanteevitaraprescric¸ãodemedicamentos desne-cessários.Umacondutacomuméfazertratamentoempírico injustificado,e muitasvezesprolongado,deprovável eso-fagiteporrefluxogastroesofágicoemlactentescomchoro excessivoeirritabilidade.
Nessecontexto, deve-se alertar parao uso abusivo de inibidoresdebomba deprótons emlactentes.67 Conforme
ensaiosclínicos68,69 emetanálise,70 osinibidoresdebomba
adversos.67 Estudo feito no Brasil mostrou que
procinéti-cos,comoadomperidonaeabromoprida,sãoconsiderados nostratamentodelactentescomregurgitac¸ãodolactente e doenc¸a dorefluxo gastroesofágico,55 o que contraria as
recomendac¸õesmaisrecentes.26,34,35Estudofeitoem11
paí-seseuropeus,71queenvolveu567pediatras,demonstrouque
poucosseguemadiretrizNaspghan/Espghan(North Ameri-canSocietyforPediatricGastroenterology,Hepatologyand Nutrition/EuropeanSociety forPediatricGastroenterology, Hepatology,andNutrition),publicadaem2009.26Asrazões
que levam à falta de adesão aos protocolos assistenciais devesermotivodeestudosfuturos.Deveserdestacadoque nãoexistemevidênciasdequeadimeticonasejaeficazno tratamentodacólicadolactente.44,45
Com relac¸ão ao esquema alimentar, é importante res-saltarquesempreoaleitamentonaturalexclusivodeveser mantido.Nenhumsintomaousinalgastrintestinalémotivo de interrupc¸ão do aleitamento natural, conforme pode ser constatado nas revisões34,44,45 e diretrizes26,27,30,31,35,36
destinadasaotratamentodosdistúrbiosfuncionais gastrin-testinais.Comrelac¸ãoaolactentecomsuspeitadiagnóstica dealergiaaoleitedevacanavigênciadealeitamento natu-ral exclusivo,amãedeve fazerdietacom eliminac¸ão das proteínas doleite devaca.27,31 Lactentescom alergia
ali-mentar durante o aleitamento natural e que apresentam manifestac¸ões clínicasgraves, comdéficit decrescimento e/ouanemiapordeficiênciadeferro,porexemplo,devem ser avaliados individualmente por especialistas. Avaliac¸ão especializadadeveserfeitatambémcomoslactentescom suspeita de doenc¸as como a galactosemia e má absorc¸ão congênitadeglicose-galactose,entreoutras.
Paraolactentequenãorecebemaisleitematernoenão seconsegue arelactac¸ão,existem fórmulasdesenvolvidas paracontribuirparaocontroledossintomasesinais gastrin-testinaisdolactente,entreasquais:1)fórmulasespessadas; 2)fórmulasdesoja;3)fórmulascomproteínasparcialmente hidrolisadasemenorteordelactose;4)fórmulascomadic¸ão de prebióticos; 5) fórmulas com proteínas extensamente hidrolisadas,semecomlactose;e6).fórmulasde aminoá-cidos.
As fórmulas espessadas proporcionam diminuic¸ão na frequência e no volumedas regurgitac¸ões. Assim, podem diminuiraansiedadedospais.Deveserdestacadoquesão fórmulas quereduzemasregurgitac¸ões,masnãootempo totaldeexposic¸ãodoesôfagoaoácidogástrico.26,34,35
Outra situac¸ão que constitui um grande problema assistencialé o lactente comregurgitac¸ões,vômitos, irri-tabilidade e choro excessivo associado ou não a outras manifestac¸ões clínicas. Com frequência são aventadas as hipóteses diagnósticas de doenc¸a do refluxo gastroesofá-gico e alergia à proteína do leite de vaca. A diretriz da Naspghan/Espghan para lactentes com regurgitac¸ões fre-quentes e irritabilidade, associadas ou não à diminuic¸ão do ganho de peso, recomenda a exclusão da proteína do leite de vaca dadieta durante duas a quatro semanas.26
Adiretrizsugereasfórmulascomproteínas extensamente hidrolisadasoufórmulasdeaminoácidoscomosubstitutos.26
Assim,apósesseperíododedietadeeliminac¸ão,casoocorra melhoriadopaciente,deveserplanejadotestede desenca-deamentoparacomprovac¸ãododiagnóstico.27 Entretanto,
muitos médicos que preconizam dieta de eliminac¸ão do leite de vaca não fazem teste de desencadeamento para
comprovac¸ãododiagnósticodealergiaaoleitedevaca.72,73
Esseprocedimentomantémumaproporc¸ãoconsiderávelde lactentes39,40 que não tem alergia ao leite de vaca (mas
quecasualmentetiveramreduc¸ãodasmanifestac¸ões clíni-cas)comdietasubstitutiva,queémaiscara,porumperíodo maisprolongadodoqueonecessário.Apesardenãoser indi-cadaparalactentescommenosdeseismesesdevida,cerca deumterc¸odos pediatrasusariafórmuladesojaparaum lactentecomsuspeitaderefluxogastroesofágicosecundário àalergiaaproteínadoleitedevaca.55Deveserressaltado
quefórmulasdesojanãosãoindicadasparaotratamentoda cólicadolactente,3,4,44,45alergiaàproteínadoleitedevaca
noprimeirosemestredevida,27,31regurgitac¸ãodolactente
oudoenc¸adorefluxogastroesofágico.26,34,35
As fórmulas com proteínas parcialmente hidrolisadas e baixo teor de lactose são usadas em lactentes com manifestac¸õesgastrintestinaiscomo cólica, regurgitac¸ões, flatulência e evacuac¸ões endurecidas com base em estu-dos clínicos abertos.74---77 Pode ser levantada a hipótese
de que sua eficácia, nessas circunstâncias, esteja relaci-onadacom osseguintes mecanismos:1) maiorvelocidade de esvaziamento gástrico78,79 e 2) diminuic¸ão dos efeitos
da fermentac¸ão excessiva de carboidratos na luz intesti-nal,considerandoqueempacientescomcólicadolactente demonstrou-semaiorproduc¸ãodehidrogênionoteste respi-ratóriodohidrogênionoarexpirado.80---82Deveserressaltado
quenenhumafórmulacomproteínas parcialmente hidroli-sadas, com teor normalou reduzido de lactose, deveser usadanotratamentodolactentecomsuspeitadealergiaà proteínadoleitedevaca.77
Lactentes em aleitamento natural têm baixo risco de apresentarconstipac¸ãointestinal.Esse fatopodeser con-sequênciadoteordeoligossacarídeosnoleitehumano, os quaisaumentamafrequênciadasevacuac¸õese diminuem aconsistênciadasfezes.83Váriosmecanismospodem
expli-caresseefeito:811)aumentodamassamicrobiana(inclusive
porbactériasprobióticas)emfunc¸ãodadisponibilidadedos oligossacarídeosaseremfermentados;2)crescimento sele-tivodebactériasdosgênerosbifidobactériaselactobacilos quefermentamosoligossacarídeoseproduzemácidos gra-xosdecadeiacurtaqueaumentamoconteúdodeáguanas fezes.83Porsuavez,osácidosgraxosdecadeiacurtapodem
estimularamotilidadeintestinalporserusadoscomofonte deenergiapeloscolonócitosepelainduc¸ãodecontrac¸ões tônicas e fásicas na musculatura circular do cólon; 3) os oligossacarídeostêmpapeldefibrasolúvele,assim, aumen-tamoconteúdo deágua nobolo fecal.83 Omesmo efeito
nohábito intestinale na consistência das fezes podeser obtidopelaadic¸ão deprebióticosna fórmula infantil.84---87
Assim,evacuac¸õesmaisfrequentesecommenor consistên-ciapodemser obtidascomo empregodefórmulainfantil com adic¸ão de prebióticos, o que pode, potencialmente, reduziraprobabilidadedeiníciodaconstipac¸ãointestinal. AdiretrizdaNaspghan/Espghanofereceumalgoritmo espe-cíficopara constipac¸ão intestinalantesdos seis mesesde idade.30
Probióticossãomicrorganismosvivosque,quando consu-midosemquantidadesadequadas,proporcionamumefeito benéfico para a saúde do hospedeiro.88,89 Lactentes com
cólica90oualergiaàproteínadoleitedevaca91podem
outrasdoenc¸asalérgicas.92Dessaforma,opapeldos
probió-ticosnocontroledessasdoenc¸asnolactentetemsidomotivo de várias pesquisas. Ensaios clínicos51,93---95 e metanálise96
mostraramqueo Lactobacillus reuteriDSM 17938 propor-cionareduc¸ãonadurac¸ãodiáriadochoroempacientescom cólicadolactente.Porsuavez,oLactobacillusGGpode ace-leraraaquisic¸ãodetolerânciaporlactentescomalergiaà proteínadoleitedevaca.22,23 Do pontodevistaclínico, é
importanteressaltarqueoefeitodeumdeterminado pro-bióticoé específicodeumadeterminadacepa. Umensaio clínicomostrouqueaadministrac¸ãodeLactobacillusreuteri
DSM17938 podereduzira frequênciasintomas gastrintes-tinaisnosprimeirosmesesdevida.97 Essesdadosmostram
comoépromissorodesenvolvimentodepesquisasnocampo dosprebióticos eprobióticos paraa prevenc¸ãoe controle dossinaisesintomasgastrintestinaisnolactente.
Emconclusão,émuitoaltaaprevalênciadesintomase sinaisgastrintestinaisnolactente. Odiagnóstico em geral tem como base as informac¸ões dos pais e o exame clí-nicodacrianc¸a,incluindoaavaliac¸ãoponderal.Afaltade examessubsidiáriosespecíficoseprecisospodedificultaro diagnósticodiferencial.Orientac¸ãoeapoioparaospaissão fundamentais,independentementedodiagnóstico. O alei-tamento natural exclusivo sempre deve ser estimulado e mantido.
Conflitos
de
interesse
Oautorjáfezconferênciase/ouconsultoriascientíficaspara a DanoneNutric¸ão Especializada,Danone Early Nutrition, MeadJohnson,LaboratórioBago,LaboratórioAchê.
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