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)
rUNDAçi'\O GETOLT O VARGAS
INSTITUTO SUPERIOR DE ESTUDOS E PESQUISAS PSICOSSOCIAIS CENTRO DE P6S-GRADUAÇAO EM PSICOLOGIA
O PSIC6LOGO NOS SERVIÇOS DE SAODE ESCOLAR
ANA MARIA FERRARA DE CARVALHO BARBOSA
FGVjISOP/CPGP
CENTRO DE POS-GRADUAÇAO EM PSICOLOGIA
O PSICOLOGO NOS SERVIÇOS DE SAODE ESCOLAR
por
ANA MARIA FERRARA DE CARVALHO BARBOSA
Dissertação submetida como requisito parcial para obten
cação do grau de
MESTRE EM PSICOLOGIA
criar no homem criar na massa
criar
criar com os olhos secos
(
...
)Criar criar
criar liberdade nas estradas escravas
algemas de amor nos caminhos paganizados do amor
criar
criar amor com os olhos secos",
Agostinho Neto
-
~"A gente nao tem leitura mas a gente ve longe",
A Eliane Duailibe Siqueira, sem o amor de quem nao
-teria se realizado esse trabalho.
. ~ .
Ao Professor Antonio Gomes Penna, pela cXlgencla e
orientação.
A Lúcia e Adernar, meus pais.
A Maria Lúcia Mendes e Gisela da Silva Fernandes
com quem dividi dúvidas e incertezas.
Ao Luis Carlos Bevilaqua , Leão Lanksner, Sérgio F~
lix, Elisabete Castro Alves e todos os amigos que me apoiaram
e estimularam nestre trabalho.
A FGV pela bolsa de estudo recebida durante o curso.
Based in Althusser's theoretical reference index,
we intend to explain the ideological significance of the
praxis demanded to psychologists in the Health Departments of
the Public Schools. Reflecting about our experience as
psychologist in a School MedicaI Center, we intend, also,
search other possibilities for such professional work, in
order to help the activity of other advanced social groups to
resolve the school contradictions of our society.
o
significado ideológico da prática solicitada aopsicólogo nos Serviços de Saúde Escolar e explicitado a partir
de um referencial teórico que tem sua base em Althusser. Procu
ra-se também, por meio de uma reflexão sobre a experiência
co-mo psicóloga num Setor de Medicina Escolar do Município do Rio
de Janeiro, buscar alternativas para a atuação desse profissi~
nal, para que possa colaborar com outras forças sociais
trans-formadoras na superação das contradições da Escola em nossa so
ciedade.
Agradecimentos --- v
Resumo --- vi
Summary --- vii
APRESENTAÇÃO --- 01
CAPfTULO I: A Escola como Aparelho Ideológico do Estado. A Contribuição Crítica de Althusser--- 03
CAPITULO 11: A Escola como Instituição Destinada a Repro-duzir e Preservar o Sistema Dominante e sua Estruturação em Classes. A Repetência e a Ev~ são como "Objetivos" da Escola. --- 12
CAPITULO 111: Os Problemas da Evasão Escolar e da Repetê~ cia e a Tentativa IdeolóSica de Medicalizá-los. 21 CAPITULO IV: A Medicalização da Escola e a Implantação dos Programas Especiais de Medicina Escolar. O l~ crutamento do Psicólogo e Análise do Papel que se espera, seja por ele Representado. O Discu! so da Psicologia da Privação: a Caracterização 00 "Excluído" como Decorrência da Limi tação In-dividuais. --- 28
CAPITULO V: Uma Reflexão Crítica em Função da Perspectiva Marxista sobre as Causas dos Problemas Enfrenta dos pela Instituição Escolar. A revisão do Pa-pel Desempenhado Pa-pelos Psicólogos (A Questão da "formação". 42 BIBLIOGRAFIA --- 58
A presente dissertação sustenta-se teóricamente nos
trabalhos de Althusser e Baudelot e Establet. Estrutura-se na
tese de que existem aparelhos ideológicos cuja destinação é a
de concorrer para que se preserve e para que se reproduza o
sistema dominante centrado na divisão de classes sociais, por
sua vez expressa0 de determinado modo de produção.
Entende-se, em função desse pressuposto, que a
Es-cola, como um dos aparelhos ideológicos do Estado, tem urna
destinação específica. dela se esperando que contribua para a
reprodução do sistema dominante.
A evasao e a repetência, fenômenos que se apontam
como características do sistema escolar vigente, são
encober-tos através de um processo, efetivamente ideológico, de
medi-calização, ou seja, são encobertos atrav6s da afirmação de
que os fenBmenos mencionados se dão por problemas individuais
que justificam que se fale em desvio e doença.
Dentro dessa visão encobridora do problema
instala-se o sistema de Medicina Escolar ao qual instala-se incorporou o psi~
cólogo.
Espera-se, dentro desta perspectiva, que o psicólo
go colabore no sentido de caracterizar o aluno com
conflitos de natureza neurótica ou mesmo psicótica.
A idéia central da presente dissertação consiste
na tentativa de se denunciar esse tipo de procedimento e,
me-diante esforço de reflexão crítica, reanalisar as verdadeiras
causas dos problemas que atingem a Instituição Escola.
Procura-se, também, ã partir da crítica efetuada,
recriar-se o papel que efetivamente cabe ao psicólogo desemp~
CAPíTULO 1: A ESCOLA COMO UM APARELllO IDEOLC5cICO DO ESTADO.
A CONTRIBUIÇAO CRrTICA DE ALTHUSSER E BAUDELOT
E ESTABLET (REFERENCIAL TEC5RICO) .
Como já foi citado na apresentação desse trabalho,
a presente dissertação sustenta-se teóricamente em Althusser,
mais especificamente em sua obra inti tulada "Ideologia e
Apa-relhos Ideológicos do Estado" e em Baudelot e Establet, cujo
livro "L'école capitaliste en France" foi importante
referen-cial para nossa reflexão crítica.
Este esquema teórico foi utilizado nao com o
obje-tivo de estudo de uma teoria da sociedade capitalista, mas c~
mo instrumento orientador para a interpretação dos fatos por
nós observados em nossa prática enquanto psicóloga de um
Cen-tro Municipal de Saúde, no Rio de Janeiro.
Por acreditar que seria útil ao leitor ter esse re
ferencial teórico explícito. passamos a expô-lo. mesmo que em
suas linhas gerais.
I - DESCRIÇÃO DA SOCIEDADE CAPITALISTA
A sociedade capitalista se constitui de dois nl-
..
fi. infra-estrutura identificou-se com o modo de pr~
dução dominante envolvendo a inter-relação das forças produt~
vas (relação do homem com a natureza, promovendo a produção) ;
e as relações sociais de produção (relações dos homens entre
si, no processo produtivo).
A superestrutura 6 constituída pelas formas jurf
dicos-políticas (organizações e instituições sociais) e
ideo-16gicas (ideologias religiosa, moral, jurídica, política
etc) e que são determinadas pela base econômica.
A relação que existe entre a infra-estrutura e a
superestrutura 6 o de determinação desta última pela base
e-conômica. Nesta perspectiva. uma sociedade é entendida não
-
apartir do que seus componentes dizem, imaginam ou pensam, mas,
sim
à
partir da forma em que produz os bens materiais necessesários para sua vida.
A superestrutura tamb6m atua sobre a base
econômi-ca, produzindo condições necessárias para a reprodução do
mo-do de produção da sociedade capitalista.
A estrutura de classes da sociedade capi talista e
o resultado das relações dos homens com a natureza e dos
ho-mens com os demais hoho-mens, no processo de produção social.
São duas as classes sociais, fundamentais, a nível
- a classe Jominante, a burguesia n~o trabalhaJora,
proprietária dos meios de produção e do
exceden-te Jo trabalho;
- a classe dominada, o proletariado, trabalhadores,
produtores ,que mant6m uma relação direta com os
meios de produção.
As classes sociais sao, pois, numa formação capit~
lista, antagônicas, desde que desempenham papéis diferentes
no processo produtivo, gerando relações de dominação e
explo-ração. A classe dominante, ao apropriar-se do trabalho da
ou-tra, opõe-se a ela, definindo-a enquanto uma classe dominada
e explorada.
Para sobreviver, toda formação social precisa nao
so produzir, mas também reproduzir as condições de produção.
Como falaAl thusser , citando Marx, "se uma formação social não
reproduz as condições' da produção ao mesmo tempo que produz
não conseguirá sobreviver um ano que seja". E segue
concluin-do que "a condição última da produção é portanto a reprodução
das condi ções da produção".
E essa reprodução nao é apenas a dos meios de
pro-dução, isto 6, das condições materiais da produção. g tamb6m
da força de trabalho.
-lho a maneira de se reproduzir é o salário. Este é indispens~
vel ã sua reconstituição para que cada assalariado possa "ter
casa para morar, roupa para vestir, ter de comer, numa pala
-vra, poder apresentar-se amanhã - cada amanhã que Deus dá
ao portão da fábrica". (Althusser, 1974: 18).
Mas apenas isto nao basta.
E
necessário também quese produza,
"o mascaramento da exploração e dominação gera-das pe las relações de 'produção, j á que es te mas caramento é indispensavel para prosseguir com certo tipo de produção. O mecanismo de mascara
mento é acionado pela ideologia desta classe áo
minan te" (AI thusser, 1974:
A reprodução das relações de produção implica, Po!
tanto, em uma reprodução da submissão desta (da força de
tra-balho) à ideologia dominante. para os operários, e uma
repro-dução da capacidade para manejar bem a ideologia dominante p~
ra os agentes da exploração e da repressão. a fim de que
pos-sam assegurar também, 'pela palavra' dominação da classe domi
nante CAlthusser, 19741
2 - O ESTADO E OS APARELHOS DO ESTADO
Para garantir a reprodução das relações de produ
-çao, isto
é.
garantir a existência das classes sociais com seurespectivo relacionamento de dominação e subordinação econôm~
ca,política e ideológica .• as classes dominantes utilizam-se do
asse-gurauor ua uOlllillaçi:ío de primeira sobre a classe operária.
A função do Estado é, pois, a de manter a coes ao
da estrutura de uma formação social. Ele tem como função
per-mitir ~s classes dominantes assegurar a exploração da classe
trabalhadora, consistindo essa exploração na apropriação da
mais-valia no sentido de acumulação privada de capital e imp~
dimento ~ classe trabalhadora de opor-se a essa dominação.
o
Es tadoé,
então, um conj un to de "apare lhos", quese dividem em dois tipos:
- o Aparelho Repressivo de Estado, indicando que o
Aparelho de Estado em questão funciona pela
vio-lência, física ou "administrativa"; compreende o
Governo, a Administração, o Exército, os Tribu
-nais, as Prisões, a Polícia.
- os Aparelhos Ideológicos de Estado, que se
dife-renciam do ARE (que funciona "pela violência")por
funcionar "pela ideologia". São constituídos
pe-la família, pepe-la escope-la, pelos sindicatos, pelos
partidos, pelos meios de comunicação cultural
pelas igrejas, etc. Apesar de sua aparente dive!
sidade, eles se unificam através da "ideologia do
minante", que é a da classe dominante.
articula-da; os aparelhos repressivos auxiliam o funcionamento dos ap~
relhos ideológicos, enquanto estes auxiliam aqueles,
apresen-tando-os como legitimos.
o
ARE e os AlE se combinam para a imposição,defe-sa e reprodução das condições que garantem os interesses da
classe dominante. A esta classe não basta dispor do Aparelho
Repressivo do Estado;
é
necessário também exercer suahegemo-nia sobre e nos Aparelhos Ideológicos de Estado.
E é por intermédio da ideologia dominante que é as
segurada a "harmonia" entre o ARE e os AlE e entre os
diferen-tes Aparelhos Ideológicos do Estado.
3 - A IDEOLOGIA
. Para abordar a estrutura e funcionamento da ideolo
gia, Althusser propõe duas teses.
A primeira é a que afirma que "a ideologia repre
senta a relação imaginária dos indivíduos com as suas condi
-ções reais de existência". :8', pois, a natureza imaginária de~
ta relação que fundamenta toda a deformação imaginária que se
pode observar em toda a ideologia. Então, o que é
representa-do pela ideologia não é o sistema das relações reais que go
-vernam a existência dos indivíduos, mas a relação imaginária
A segunda afirmação é a de que a ideologia tem uma
existência material no sentiJo ue que ela existe sempre num a
parelho e na sua prática.
o
sujeito que age é submetido a ação do seguintesistema:a ideologia existindo num aparelho ideológico mate
rial, prescrevendo práticas materiais, reguladas por um
ri-tual material, as quais epráticas) existem nos atos materiais
de um sujeito agindo em consciência segundo a sua crença.
Althusser conclui, então que, "só existe prática
através e sob uma ideologia" e que "só existe ideologia atra
-vês do sujeito e para sujeitos" (Althusscr, 1974:91)
Em uma sociedade de classes a ideologia é
uma ideologia de classe e a ideologia dominante (~ da
dominante) tem um duplo papel nesta sociedade:
sempre
classe
exerce-se sobre a consciência das explorados
pa-ra fazer-lhes aceitar como natupa-ral sua condição
de explorados;
- exerce-se sobre os membros da classe dominante p~
ra permitir-lhes exercer como natural sua
explo-ração e dominação.
A ideologia, enquanto definida como princípios e
-bertadora da classe dominada como, ao contrário, poderá
orien-tal' uma ação cOllscrvaelora, elc manutcnção elo "status quo". Esta
última trará em si a conotação falsa e mistificadora da ideolo
gia da classe dominante na sociedade capitalista.
4 - O APARELHO IDEOL6GICO ESCOLAR
O Aparelho Ideológico de Estado que foi colocado em
posição dominante nas formações capitalistas maduras é o Apar~
lho Ideológico Escolar. b na Escola que se dá a inculcação ma~
siva da ideologia dá classe dominante e como fala Althusser
"ncnhum Aparelho Ic.1eológico ele Estaelo elispõe durante tanto tem
po de audiência obrigatória (c ainda por cima gratuita").
(Althusser, 1974:66)
Em outro ponto, o mesmo autor diz que:
"A Escola (mas também outras instituições do
Es-tado, como a Igreja e outros aparelhos como o
Exército) ensinam 'saberes práticos', mas em
moldes que asseguram a sujeição ã ideologia
do-minante
C
... ).
Todos os agentes da produção, daexploração e da repressão devem estar penetra -dos' desta ideologia, para desempenharem, 'cons-cienciosamente' a sua tarefa - quer de explora-dores (os capitalistas), quer dos exploradQs
(os proletários)
C ••• ).
A reprodução da força detrabalho tem pois como condição 'sine qua non' não só a reprodução da 'qualificação' desta for
ça de trabalho, mas tambem a reprodução da sua
sujeição ã ideologia dominante" (Althusser
1974: 22)
r
comum a atribuiçãoà
educação do papel de insordem econômica encarada como nao sendo intrinsecamente inju~
ta. Há um pressuposto, também de que a escola não está, ou p~
de não estar ligada
ã
ordem que produz as desigualdades ese-ria um meio neutro, desprovido de ideologia.
o
aparelho escolar e principalmente a rede de ensino de primeiro grau, onde a maioria da clientela pertence ~
a
classe proletária, veicula uma visão de mundo da classe
domi-nante como sendo a única verdadeira, sugerindo, ainda, que ou
tras visões são inferiores e anticulturais.
Baudelot e Stablet dizem que a escola, na socied~
de de classes, obriga os alunos a interiorizarem ensinamentos
e princípios que geram práticas e atitudes que favorecem o mQ
delo sócio-econômico-político defendido pela classe dominante.
A Escola tem pois, nesta sociedade, o objetivo I
-deológico de dissimular os mecanismos de discriminação de ori
gem e conômi ca, bem como os seus prõpri os mecanismos de dis cri
CAP[TULO 11: A ESCOLA COMO INSTITUIÇAO DESTINADA A REPROD!!. ZIR E PRESERVAR O SISTEMA DOMINANTE E SUA ES-TRUTURAÇAO EM CLASSES. A REPETbNCIA E EVASAO COMO "OBJETIVOS" DA ESCOLA.
Diversos autores ja explicitaram os mecanismos uti
lizados pela escola na produção do fracasso escolar, demons
-trando como a evasao e a repetência, apresentados pela ideol~
gia da escola como exceções, são, na verdade, a regra (Cunha,
Stablet, Bourdieu. Fernandes). E que esses problemas não inci
dem igualmente nas diversas classes sociais.
Senão. vej amos:
"se o número de vagas na primeira s.érie do
pri-meiro grau nas escolas oficiais é reduzido em
relação ao total de crianças de sete anos de i
dade (em. 1970, apenas 34,4% de alunos nesta T
dade matricularam-se na primeira série), a par ticipação das classes sociais na distribuição-das vagas tambem e desigual. Como agravantes
desta situação, competem os altos fndices de
reprova~io e evasio: 28,3% dos alunos de pri
-meira serie são reprovados e a evasão durante
e após o término do ano letivo faz com que ape
nas 40,1% do contingente que ingressou no iní~
cio do ano nesta série se matricule na segunda série no ano seguinte. Este processo continua, embora menos intenso, e a proporçio dos que a-tingem a quarta série, em relação ao contingen te que ingressou junto na primeira e apenas
-8.6%. sendo a percentagem dos que concluem a
quarta serie ainda menor" CFernandes, 1981: 12)
Como a autora acima citada menciona, a repetência
e a evasao nao se distribuem igualmente entre as diversas clas
ses sociais. mas. ao contrario. se concentram nas clas.ses tra
Bourdieu e Passeron revelam que um filho de um pr~
fissional de nível superior de escolaridade tem 80 vezes mais
oportunidades de entrar na Universidade de que um filho de um
assalariado agrícola e 40 vezes mais que um filho de operário.
Luis Antonio Cunha afirma que:
"ao longo da escola primária, já no primeiro ano de escolaridade, os alunos provenientes da bur-guesia permanecem na faixa 'normal' ou avançam, os do proletariado se retardam; os provenientes
da pequena burguesia tem iguais chances de se
situarem num ou nout ro grupo". (Cunha. 1980: 40)
E diversos estudos demonstram que o insucesso esco
lar nao 6 um problema franc~s ou brasileiro, mas sim um pro
-blema inerente a todos os países cuja sociedade está dividida
em classes e cujo sistema de ensino traduz a supremacia, quer
o queiramos quer não, duma classe sobre as demais. Em outras
palavras. a escola 6 "uma forma histórica de educação,
carac-terÍstica .do modo de produção capi talista". (Cunha. 1980)
Constatamos. então, que a escola primária dita gr~
tuita, obrigat6ria e igual para todas as crianças. na verdade
tem um caráter de conservação social, de reprodução das
clas-ses e da estrutura social e não o de promoção coletiva de
to-das as crianças. A escola transforma diferenças sociais entre
as crianças em diferenças escolares, jus tificando depois por
estas diferenças escolares as futuras diferenças sociais. Des
ta forma, podemos até afirmar que o insucesso escolar dum gra.!!
cola primária. E o diploma escolar passa a ser o passaporte ~
través do qual os filhos de classe dominante "justificam" os
seus privilégios individu&is.
Apesar de nao ser o único agente de conservaçao e
reprodução das classes sociais a escola possui mecanismos de
Jivis50 que s50 extremamente eficientes. Cunha fala em três
mecanismos básicos: "os padrões burgueses que são impostos a
todos os alunos como um ideal a realizar; as formas de ensino
de leitura e escrita, e. finalmente, a ação das professoras". (Cunha, 1980:39)
Vamos comentar brevemente cada um deles.
Sabemos que nas camadas populares, há, em geral
pouco contato com a cultura letrada, com os livros, com o
ci-nema, o teatro, com tudo aquilo que é chamado "cultura" na
noss a so ciedade. Ora, sao emas que a "cul tura" da escola e exa
tamente esta e o que ocorre então é que:
"as crianças dos meios populares sentem grande estranheza diante de linguagem, normas e valo res da escola, que são totalmente diferentes-daquelas a que está habituada. Elas se senti-rão ainda mais inferi ori z adas pe 10 fato de não
poderem trazer para a escola sua maneira de
falar e sua experiência na família e no bairro menos favorecido. Elas se sentirão perdi -das diante de falta do sentido e utilidade i-mediata dos exercícios escolares, confusas pe
lo lado artificial das si tuações vividas na sa la de aula.
Este mal-estar experimentado pelos alunos dos meios menos favorecidos pode desembocar numa atitude de recusa da escola, que se traduz em
erros constantes', num mutismo dentro de sala
de aula, em suma, na instalação progressiva do
Nesse processo, a aprendizagem de leitura e
escrita desempenham um papel central. A questão ultrapassa o pro
-blema de técnica empregada na alfabetização. Na verdade, para
os alunos das classes populares, trata-se de aprender a falar
e a escrever uma lingua estranha, que não é a sua ou de seus
pais: "trata-se da 'lingua escolar estandardizada' a única re
conhecida pela escola como correta" (Harper, 1981: 50 ). A es
te aspecto alia-se um outro: em geral, o conteúdo do que se
lê não diz nada a criança das classes populares. Diz Piaget(1975)
que a afetividade é a energética dos comportamentos. IstosiK
tlifica que para uma criança aprender é preciso que a matéria
lhe interesse, que ela queira aprender. Quando a escola se
transforma num campo de experiência difíceis, frustantes e
muitas vezes negativas, sera muito difícil que essa criança a
prenda seja o que for.
Tão grave quanto esse aspecto de um conteúdo desli
gado da realidade vivencíada pela criança é a questão datran~
missão da ideologia de uma classe social - a dominante - como
se ela fosse "a verdade absoluta", através dos programas esco
lares e dos textos didáticos. Como afirma Nosella, 1980:16).
"o problema de transmissão da ideologia dominan
te, através dos textos de leitura das quatr~
primeiras' séries do primeiro grau. é grave e im portan te, quando se pens a na pos tu ra acrí t
ica-das receptores destas mensagens ideológicas que
se encontram no período entre sete e dez anos
de idade, aproximadamente" (Nose11a. 1980: 16) .
"o embasamento psicológico desta afjrmação
con-~;i:;ll' IH) r;llo de;1 CdllCHJío, ;10 I rall:;lIIi I i r COIl
te~dos ideológicos atraves de textos de leitu~
ra, moldar a personalidade das crianças a par-tir desta determinada postura ideológica domi-nante. Isto é possível, porque a personalidade se desenvolve através de sucessão e articula -ção de uma série de estruturas, que se armam a
partir da interação e comunicação entre o eu
(conjunto de funções e protencialidade psiqui-cas) e o mundo (conjunto de pessoas e objetos) que o rodei ali. (Nose lIa, 1980: 16)
Pelos processos de assimilação e acomodação, de
que fala Piaget, a ideologia dominante atua como elemento
es-truturador da personalidade, passando a se constituir num ele
mento intrínseco a estrutura dessa mesma personalidade.
Mesmo que tenhamos claro os limites desses procedi
mentos de inculcação ideológica - a escola não é o único
"a-parelho ideológico do estado" e, como diz Vanilda Paiva
"esta reprodução Cda desigualdade social) não é privativa da educação nem como característica
nem como função: € a sociedade de classes que
se reproduz através de um conjunto de mecanis-mos entre as quais a educação é relevante, mas não tem o mesmo peso que a vida econômica". (Va
nilda Paiva, 1980:83)
-' J
- nao podemos negar que as crianças submetidas a esse
processo terão sua estrutura de pensamento impregnada pela ideolo
-gia das classes dominantes.
E
€
muitas vezes doloroso constatar como essas crianças introjetam, após algum tempo de escola, a id€ia de que
são "fracassadas" e/ou "doentes" pois nao sao capazes de
res-ponder "corretamente" às tarefas que lhes são propostas naqu~
o
último aspecto a ser aqui comentado, e a ação doprofessor prim;,ulo.
Esta ê uma profissão mal paga e que atrai
sobretu-do elementos sobretu-do sexo feminino (em 1965, as mulheres represen~
tavam 94,56% dos alunos das escolas normais do País e o corpo
docente das escolas primárias chega a ser quase totalmente fe
minino. ) ( Saffioti, 1~)76: 221).
Até anos atrás, o professor provinha das camadas
médias e média-altas da população e a profissão trazia um cer
to prestígio social para o indivíduo.
Hoje parece que esta situação se transforma e o
professor é recrutado, em geral, na pequena burguesia (Cunha,
1980).
A sua atitude. a sua expectativa positiva ou
nega-tiva diante dos alunos, a sua maneira de ensinar t~m sido
estudados no quadro do insucesso escolar. Trabalham em benefí
-cio da ideologia da escola unificada:
"alfabetizam a massa trabalhadora e selecionam os intelectuais; difundem o 'catecismo peque-no burgues' peque-nos trabalhadores e a ideologia
burguesa para os que serão seus intérpretes a
ti vos". (Cunha , 1980: 43)
Sabemos que a espectativa do professor em relação
a criança influencia fortemente o seu aproveitamento. Rosen
riência que pode ser resumida corno se segue: cerca de 20% dos
alunos de uma escola elementar foram apresentados aos seus
professores corno sendo capazes de um desenvolvimento
particu-larmente brilhante, pois teriam alcançado um escore elevado
num teste de Inteligência. Na verdade, os nomes destes alunos
tinham sido escolhidos aleat6riamente. Oito meses mais tarde,
ao serem avaliados novamente por um teste de Inteligência estas
mesmas crianças mostraram um progresso muito mais sensível que
os dos outros alunos.
A mudança de atitudes dos professores acerca das
pos s ib i li dades in tele ct uais destas supostas cri anças "espe
-ciais" escolhidas ao acaso tinha provocado progressos intelec
tuais reais. Em suma, isto mostra a importância do
preconcei-to do professor em relação aos alunos.
Como aponta Benavente,
"a importância do recrutamento dos professores está no fato que um indivíduo que vem dum
de-terminado meio social é portador dos valores
e normas do seu meio.
Se a formação que recebe não o sensibiliza pa
ra o problema da diferença entre os meios so~
ciais, não o alerta para a relação entre a o-rigem social das cri anças e os res uI tados
es.-colares,
é
evidente que o professor vai, maisou menos inconscientemente, valorizar os com-portamentos de seu pr6prio meio, a linguagem de seu pr6prio meio, vai considerar os valo -res e normas veiculadas pela instituição esco lar como valores e normas únicas e absolutas-e avaliar cada criança absolutas-em rabsolutas-elação a absolutas-essas nor mas, sem qualquer relativização nem
espírito-crítico" CBeiJ.avent~ , 1979:61).
-l~s de m~gistério não propoe aos alunos-futuros professores
conhecimentos a respeito das reais necessidades das crianças
nas suas diversas etapas evolutivas nem sobre a função social
da escola. Seu ensino ~ antiquado, rígido, formal e estáti
co, sem qualquer espaço para a criatividade e a reflexão,
co-mo o da escola primária. Coco-mo diz Mascellani,
"o futuro' educador aprende que a educação e um processo independente que não guarda relação
com a sociedade. C ... ) O educador aprende a
obedecer e a ser dependente. C ... ) O que esse educador não aprende? Não aprende a formar u-ma visão crítica dos aspectos econômicos e po
líticos da sociedade, não aprende que a educa
çã6 opera neste contexto, sujeita aos proces~
sos sociais mais abrangentes, como dimensão e
minentemente política por ser, antes de tudo~
práxis. Não aprende a refleti r sobre a pos tu-ra do homem, numa sociedade situada, a enten-der o conhecimento de forma integrada". CMas-cellani.1980)
Como consequência, os profissionais aí formados não
tem consciência do real funcionamento da escola, sendo os prl
meiros a apelar para "dotes" ou "deficiências" para explicar
as dificuldades encontradas por seus alunos e por eles
pro-prios.
Sem formação nem informação que lhes permita terem
uma consciência clara da questão escolar, tornam-se agentes
inconscientes da seleção escolar e social.
Em outras palavras:, a formação profiss.ional é de
-terminada pela mesma estrutura sócio-econômica que nossa
pra-tica usual - não transformadora - ajuda a manter. Também
Transformar a formaç5o dos professores e
fundamen-tal para a tr;J.nsformação lb escola primária.
Concluindo, através dos mecanismos de inculcação da
ideologia da classe dominante, a Escola realiza para esta me~
ma classe o seu objetivo primeiro, sempre negado e camuflado:
a produção do fracasso escolar, que passa então a aj udar a jus
CAPfTlJLO TIl: OS PROBLEMAS DA EVASÃO ESCOLAR E DA REPETENCIA
E A TENTATIVA IDEOL()GICA DE MEDICALIZÁ-LOS. RE LAÇ7\O ENTRE FRACASSO ESCOLAR E SA(JDE.
Já foi visto nesta dissertação que um dos princi
-pais fundamentos ideológicos da sociedade de classes, é o que
afirma ser a Escola um meio neutro, desprovido de ideologia,
aberta a todos e igual para todos.
Num determinado momento, porem, os enormes índices
de repet~ncia e evasao nas primeiras séries do primeiro grau
ameaçam por fim a ilusão da "Escola Democrática".
À partir de uma leitura ideologicamente
determina-da desses fen5menos, a Escola vem se especializando em
encon-trar depositárias individuais da culpa pelo fracasso escolar.
Observase com frequencia que as dificuldades en
-frentadas pelas crianças das classes populares na Escola sao
explicadas pelos problemas sócio-econômicos que ela e suas
famílias vivenciam.
Como diz uma Orientadora Educacional de uma Escola
pública de primeiro grau da Cidade do Rio de Janeiro,
"os prob.lemas principais aqui sao a agressivid~
de ext rema Cdos aI unos) e a aprendi z agem fraca decorrente de problemas sócio-econômicos
fami-liares. C ••• ) O grande problema das crianças é
intei-ro, scm conJiçõcs Jc cJucar c scm conJiçõcs
fí
sic;ls. 1:11 SOl! bem :11 illll'nt:ld:J, cl:ls II:tO. Telll cr~
anças t{uc Jcsmaiam Jc fomc"
Esta "explicação" é práticamente repetida pela
Su-pervisora Pedagógica dessa mesma escola, que diz que as
prin-cipais causas que concorrem para a repetência sãos "as deficl
ências de alimentação, os pais desquitados e os pais que
pra-ti camente abandonam os fi lhos porque trabalham".
o
discurso destes dois profissionais contém doisconceitos muito difundidos como tentativa de explicar as con
-tradições da Escola:
- O primeiro trata a questão da marginalização s~
cial como um dado circunstancial, gerado pelo desemprego, fal
ta de moradia e de outros recursos de vida.
Sem dúvida, nao há como negar a importância desses
fatores na determinação de problemas de aprendizagem e de com
portamento.
Mas o que fica claro, também, é que, ao se atri
buir às famílias a incompetência não só de gerar filhos
sa-dios como de educá-los convenientemente, esquece-se de que
elas, embora situadas no todo da sociedade, são por esta margi
nali zadas .
"O processo de marginalização social ê inerente
ao sistema sócio-econômico vigente no Brasil .
C
... )
Raramente se divulgam as verdadeirasdo de JJlarginalizados. ( ... ) De fato essa
popu-I :Il:~() 11:10 (- l"OIl:;e<!IIt-llci:1 do :'lIhdl's<.'llvol vimcllto,
e silll o produto direto do processo capitalista de desenvolvimento". ( Lobo, 1981:02).
O segundo conceito é o que estabelece urna rela
-çao direta entre a questão da saúde e os problemas de aprendi
zagem.
Como aponta Fernandes,
"dado que o fracasso escolar se localiza quase que majoritariamente nas classes trabalhadoras e, dado que, estas estão sujeitas is condições de vida bastantes precárias, a saúde parece ser a área mais frágil e com mais possibilidades de fornecer as explicações de que a Escola neces-sita".
E continua dizendo que:
"ao assumir a doença como mantendo relação com o
fracassá escolar, a Escola ssume uma visão do
processo saúde-doença que passa pelo reconheci-mento do papel do social na determinação da mor
bidade. No entanto, este social nada tem a vei
com a divisão da sociedade de classes e, portan
to, com a inserção no processo produtivo e, si~,
com uma série de fatores como má qualidade das
habitações, aus~ncia de bons hábitos de higiene,
a ignorância dos pais no trato com as crianças, a
baixa renda familiar entre outros. (Fernandes, 1981: 5)
O que permanece nas. "explicações" dadas pela
Esco-la e a abordagem individualizante da questão do fracasso esco
lar, o social visto como um atributo individual.
Entender o processo saúde/doença desta forma
"his-tória Natural da Doença".
-Esta e vista como um processo que pode ser assim
representado:
HISTc5RIA NATURAL DE QUALQUER PROCESSO Mc5RB IDO NO HOMEM
Pe ríodo de
pré-patogênese Período de patogênese
..
...
-Antes ele o homem adoecer
O curso de doença no homem
Interação de:
Agente Hospedeiro Doença
da humano HORIZONTE precoce
Doença
Morte
!---'C-on-v-a-l-e-Es
!
a~o cronlCO cençado arNICO discemível avançada
~-~ ~ .~~ _ _ _ _ _ _ ~~~~ _ _ _ _ _ _ _ _ - L _ _ _ _ _ _ .~~ _ _ _ _ _ _ _ _
r
_ 1
Patogênesé ., Invalidezt
precoceFatores ambientais que produzem
ESTIMULO.
à doença
Interação HOSPEDEIRO-ESTIMULO
A "novidade" decorrente desse modelo é a
Recuperaçao
proposta
de tratamento dos fatores patogênicos antes que seja transpo~
to o horizonte clínico.
Leavel e Clark falam. então, de níveis de aplica
- A prevenç~o pode ser feita no perrodo de pr6pat~
gênese, atrav6s de medidas destinadas a desenvolver uma saúde
geral ótima, pela proteção específica do homem contra agentes
patológicos ou pelo estabelecimento de barreiras contra os
a-gentes do meio ambiente. Estes procedimentos foram chamados de
~vençao primária.
Tão logo o processo da doença seja detectável, no
início de patogenese, deve-se fazer a prevenção secundária
por meio do diagnostico precoce e tratamento imediato e ade
-quado. Quando o processo de patog~ncse houver progredido e a
doença avançado al€m de seus primeiros estágios, a prevençao
secundária deve ser continuada, através de tratamento
adequa-do, para evitar sequelas e limitar a invalidez. Mais tarde
quando o defeito e a invalidez se tiverem fixado, pode-se con
seguir a prevençao terciária, atrav€s de reabilitação.
Dentro destas tr~s fases de prevençao existem pelo
menos, cinco níveis distintos, nas quais se podem aplicar
me-didas preventivas, dependendo do grau de conhecimento da
his-toria natural:
Promoção Proteção Diagnóstico Linú tação de Re ab i l i tação
de saúde específica e tratamen- invalidez
~ _ _ _ _ --y--_ _ '-_
.J
to precoce L. ..IJ' - J '--y
Ao abordarem a questão dos fatores ambientais afir
mam que "existe pouca dúviela ele que o meio ambiente, em senti
do amplo exerça um papel tIos mais importantes" para o desen
-volvimento e instalação das doenças.
Mas, se por um lado, essa afirmação reconhece que
más condições de vida geram doenças por outro, continua um
a-bordagem individualizante destes aspectos sócio-econ6micos, co
mo se eles nada tivessem haver com a estrutura social vigente.
Segundo Arouca,
"O social no modelo original de Leavel e Clark participa simultaneamente como fator causal li gado ao hóspede e ao meio amóiente, funcionan do em ambos como um conjunto de caracteres 11
gados ao indivíduo, como status econômicos
e
social, atitudes em relação ao sexo, etc. ins-tituições e estruturas sociais óem caracterfs
ticas de determinados agrupamentos como famf~
lia, comunidade, etc." (Arouca, 1975 :164).
Em outro ponto de seu traóalho, Arouca afirma que:
"assim o homem é colocado com seus atributos em
um ponto, não é o homem como ser histórico em
sua relação com a natureza através do traba -lho, em que esta passa a ser histórica, não é o homem constituido pelo conjunto de suas re-lações sociais, enfim, não é o homem que fala, produz e vive mas o conjunto de seus atribu tos que se transforma em fatores de morbida
-de". (Arouca, 1975: 167)
E contínua dizendo que, desta forma, ao falar de
uma história "natural" da doença. aqueles autores tiraram do
problema o seu cariter histórico. no sentido de que é produzi
o
que se pode afirmar também é que, além deconsi-derar "o social como atributo individual", a perspectiva
pre-ventivista significa uma ampliação dos objetos de intervenção
da medicina e da higiene, num primeiro momento, e da
psicolo-gia e de psiquiatria em seguida (Costa, 1979).
Na sociedade brasileira, na medida em que vai se
dando essa ampliação, a escola passa a recorrer também a esse
discurso.
Observa-se, então, uma "medicalização e uma
psico-logização de toda a sociedade e muitas vezes os programas pr~
ventivistas são usados de acordo com interesses polfticos-
i-deológicos de conjuntura. já que eles legitimam a açao do pr~
fissional de saúde sobre tudo aquilo que é considerado "des
-viado" ou "marginal", enfim, tudo o que ameaça a Ordem Social
Vigente.
Podemos concluir. então, que, a medicalização da
questão do fracasso escolar é mais uma forma, efetivamente 1
-deológica, de se encobrir sua verdadeira origem: a ordem
CAPfTlJLO I V: A MI;IlI CALI Zl\ç7\O ])1\ ESCOLA ]; A lMPLI\NTAÇ7\O DOS PROGRAMAS DE "MEDICINA ESCOLAR". O RECRUTAMEN TO DO PS1 CdLOCO E ANÁLISE DO PAPEL QUE SE ES-PERA SEJA POR ELE REPRESENTADO. A CARACTERIZA ç7\O DO "EXCLUIDO" COMO DECORRENCIA DE LIMITA-ÇOES INDIVIDUAIS: O DISCURSO DA PSICOLOGIA DA PRIVAÇAO.
1 - BREVE NOTA HISTdRICA SOBRE A ASSISTENCIA, A SAODE
ESCO-LAR NO RIO DE JANEIRO.
Neste ponto desta dissertação, vai-se apresentar um
breve histórico dos serviços ligados à questão de Saúde Esco
-lar na Cidade do Rio de Janeiro, até o momento em que e
imple-mentado o Programa Especial de Medicina Escolar - PROEMEI - mo
menta este em que se da a entrada oficial do profissional
psi-cólogo nos Setores de Medicina Escolar dos Centros de Saúde li
gadas à Secretaria Municipal de Saúde.
O movimento de medicalização da Escola nao se ini
-cla num passado próximo. no Brasil. Ele surge no começo do
sé-cuIa, no Rio,
ã
partir da implantação da Saúde públicanoPaís.Em 1902. no Governo de Rodrigues Alves, sob a
direção de Oswaldo Cruz, foram instituídas novas técnicas de tra
Já no ano seguinte é impJantada, no Rio de Janeiro,
a "Saúde Escolar", pelo Prefei to Pereira Passos, como Orgão
da Secretaria de Educação do antigo Distrito Federal. Desse
modo, a população escolar é incluída nas prioridades da Saúde
Pública, sendo este o primeiro momento de atenção oficial ao
grupo materno-infantil.
Já,
"em 1910. pelo decreto 778 de 9 de maio de 1910, o Prefeito do Distrito Federal, Innocenzio Ser
zedello Correia, cria o Servi~o de Inspeção
Sã
nitária Escolar, subordinado a Diretoria de Hy giene e Assistência Pública. Os serviços de hi giene escolar teriam como atribuições básicas-a vigilincibásicas-a higiênicbásicas-a dbásicas-as escolbásicas-as e de seu mbásicas-a terial, a profilaxia das moléstias transmissí= veis e evitáveis, a inspeção médica individual dos alunos e professores, a sistematização e a fiscalização do exercício físico escolar. O pro
fessor deveria auxiliar esses trabalhos, incl~
sive indicando os alunos suspeitos. O exame me dica visava secundariamente a detecção de
ano-=-malias físicas e mentais através de exame dos
olhos, ouvidos, nariz, garganta, dentes, ossos, psique. As providências para o isolamento e tra
tamento adequado das crianças com doenças trans
missÍveis e para a correção das anomalias, en~
tretanto não eram previstas na lei.
Quanto à Educação Sanitária dos alunos e pro
-fessores. ela se limitava ao fornecimento de
instruções. pelo médico escolar. às professo -raso sobre os sintomas das moléstias
transmis-sÍveis, comuns nas' coletividades infantis e à
conferências sobre higiene infantil". CBustamante. 1980: 5)
No início dos anos 20, passam a ser incluídas nos
programas das "Escolas Normais" (formação de professores
pri-mários) os cursos de Higiene e Puericultura. Isto porque a
Educação Sanitária começou a ser vista como a "saída
"ignorân-cia" da população a maior responsável. Assim, orientando os
professores para que instruíssem as mães e crianças sobre as
questões de saúde, as doenças poderiam ser evitadas. O profe~
sor seria praticamente um "agente de saúde" cuj a função seria
a promoção de hábitos sadios nas crianças e suas famílias.
Vale aqui marcar que essa perspectiva com relação
a educação - superada a "ignorância" da população o País
su-pe rari a seus prob lemas principais, i ncl us i ve os de saúde - vem
da perspectiva liberalista, sintetizada no pensamento de John
Dewey e introduzido no Brasil por Anísio Teixeira, (Cunha
1977) .
Também nesta mesma época Cinício dos anos 20) sao
criados os Postos Municipais permanentes, mas no Rio de Janei
ro só havia um dispensário de Higiene Escolar, criado em 1927
e que funcionava no Posto de Inhaúma.
g
interessante notar que, já nesta época l1926) oDiretor do Laboratório de Psicologia da Colônia de Alienados
do Engenho de Dentro propunha o trabalho conj un to dos psi cólo
gos com os médicos escolares.
"1: nesta década ainda que assistimos a uma mu dança de atitude frente a educação sanitária propriamente dita. Para a saúde, como para a
linguagem, primeiramente o hábito, depois a
instrução. Neste sentido, deu-se maior
ênfa-se i formação de hábitos sadios nas crianças,
através da repetição cotidiana de atividades
de higiene na escola. Iniciou-se então, nas
diária dos alunos, lavagem das mãos antes da me -renda, ao sair da privada, lavagem dos dentes, banhos, corte de cabelos, distribuição de rou-pas, calçados, alimentos e pesagem periódica.
Procurava-se habituar a criança a: não cuspir, andar limpa e calçada, não consentir na pedicu
losidade, ter o copo individual, praticar os
exercícios físicos e os jogos ao ar livre ( em 1926, em todo o Distrito Federal, foi institui do o ens ino de Educação Fís i ca), t rat ar dos de-n tes e da boca, beber leite e organizar Pelotões
de Saúde. C ••• )"
"A instituição do Pelotão representava uma
for-ma de exercer a educação sanitária sem de
basear em sanções e repressão dos hábitos anti -gos, mas obtendo o assentimento das crianças pa
ra a concretização cotidiana das atividades e~
ducativas.
Des ta maneira, para adquiri r bons hábi tos de nu trição, e não unicamente para tornar-se bem nu trida a criança deveria ingerir diariamente es
cola alimentos nutritivos - a merenda escolar~
especialmente leite em copo individual, para
adquirir hábitos de limpeza, e não unicamente
para ficar limpa e evitar contágio das doenças transmissíveis, a criança deveria lavar as mãos antes da merenda escolar; quando sujas, as cri anças seri am advertidas na revis ta, para habi-=-tuar a criança a cuidar dos dentes e não unica mente para que conservasse os dentes sãos,se -=-ria necessário ensiná-la a escovar os dentes e dar-lhe assistência dentária." (Bustamante 1980:11)
Nestas propostas fica implícito como as defici~n
-cias de vida dos alunos são transformadas em deficiên-cias da
educação. O que ocorre hoje
é
a tentativa de se explicar o fracasso escolar ã partir dessas deficiências de vida das crian
ças, mas ainda tomando essas "carências" como um dado inques
tionável, uma realidade imutável, que não teria nenhuma rela
Já vem tlesta época, também, o problemada"falta de
recursos" para o atendimento completo - educativo e curativo
- dOs alunos e a denúncia de que se não houvesse
possibilida-de possibilida-de se tratar as crianças já doentes, a educação sanitária
seria um absurdo.
Quanto a este aspecto - educação sanitária - Cardo
so de Melo - nos diz não ter encontrado nenhuma publicação so
bre o assunto entre 1930 e 1937.
"Em 1931, Vargas, através de um decreto extin-guia os centros de saúde. ( ... )"
"A partir de 1942 e, principalmente após a 11
Guerra Mundial, a educação sanitária rcssur -ge, através de inúmeros trabalhos publicados, com um novo discurso. Nesse perrodo e inicio dos anos 50, vários intelectuais vão se espe-cializar em educação sani tária nos Estados Uni dos. Na segunda metade dos anos 50 são intro'=-duzidas novas idéias - desenvolvendo a organi
zação comunitária, participação, integração dOS
setores 'atrazados' no desenvolvimento
nacio-nal. Esse dis curs'o at raves sa os anos 6 O" •
(Cardoso de Melo, 1981:1)
Os Serviços de Saúde Escolar ressurgem sob ares
-ponsabilidade da Secretaria de Educação, que absorveu em seus
quadros médicos e enfermeiras que se organizavam em "Distri
-tos de Saúde Escolar", orgãos executivos locais.
Em 1972, a Saúde Escolar do então Estado da
Guana-bara foi transferida integralmente para a Secretaria de Saúde
e as Seções de Medicina Escolar, dos Distritos de Saúde
Esco-lar, passaram para a estrutura dos Centros de Saúde,
No uno seguinte u então Divisão de Suúde Escolar
transformou-se em "Assessoria de Proteção Materno-Infantil" ,
da Coordenação Geral de Saúde Pública. Em 1974, o decreto "E"
7477 de 29 de outubro, estabelece ser da competência desta As
sessoria "estudar, planejar, orientar e coordenar todas as
a-tividades relacionadas com a saúde escolar, especialmente o
atendimento médico-psico-pedagógico dos escolares com
proble-mas de aprendi zagem" .
Parece-nos importante explicitar neste momento a
nossa perspectiva de que as medidas técnico-administrativas nao
se dão isoladas de um contexto político-social. A aplicação e
fetiva do saber depende, principalmente, de fatores econômi
-cos e sociais e não propriamente de sua "validade científica"
(Rosen, 1979).
Em 1974 o modelo brasileiro de desenvolvimento
a-tinge um ponto crítico. :E' o fim do "milagre brasileiro". No
campo da saúde, a deteriorização das condições de vida da
maior parte da população se expressa nos altos índices de mor
talidade infantil e nas epidemias La de meniginte é um
e-xemplo) • Na irea da educação, o censo de 1970 aponta dados co
mo os seguintes: apenas 34,4% das crianças de sete anos de
i-dade matricularam-se na primeira série, no País. E destes,
a-penas 40,1% chegaram à segunda série no ano seguinte.
Torna-se, então, necessirio aliviar as tensões
na da educação são elaboradas.
o
PROEMEI Programa Especial I de Medicina Esco-lar - da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, e
um desses planos e tem sua implantação efetiva no ano de 1978.
g
através dele que se dá a entrada oficial dos psicô10gos na Secretaria Municipal de Saúde, que foram lotados
nas, então, Seções de Medicina Escolar dos Centro Municipais
de Saúde. Com a reestruturação administrativa de agosto de
1980 as Seções de Medicina Escolar são transformadas em "seto
res", a nível local. (Anexo 11)
2 - A ESTRUTURA DA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAODE E DO
DEPARTAMENTO GERAL DE SAODE PUBLICA. O SETOR DE
MEDICINA ESCOLAR.
Antes de iniciarmos a apreciação do PROEME I,
en-quanto proposta de trabalho para o psicólogo. parece-nos
im-portante "localizar" os Centros Municipais de Saúde, pois a
implantação do referido programa se deu através da rede de saú
de pública.
A Secretaria Municipal de Saúde do Município do
Rio de Janeiro divide-se em dois grandes departamentos: o
De-partamento Geral de Saúde Pública (DGSP) e o DeDe-partamento
dill:ldos os vinte c dois Centros Municip~Jis de Saúde, cuja
es-trutura é apresentada no Anexo 11. Ao analisarmos essa
estru-tura identificamos o Setor de Medicina Escolar, dentro da
Se-ção Materno-Infantil.
Este Setor tem como objetivo geral
"assegurar ao educando da rede municipal oficial,
no campo da saúde física, mental e social, as
me lhores condições para a sua aprendi zagem" .
(Portaria S/DGSP n9 79 de 10/08/78).
Esse objetivo seria alcançado através das seguin
-tes ati vidades :
a) - O Registro de Saúde dos escolares de matrícula nova - ao
se matricular numa escola da rede municipal oficial, o !
luno é encaminhado ao Centro Municipal de Saúde da Região
Administrativa onde se localiza a escola para uma
inspe-ção de saúde de cunho profilâtico e de orientainspe-ção quanto
ao tratamento de doenças detectadas;
b) - Exame peri6dico de saúde dos alunas de matrEiula
renova-da, com os mesmos oh j et ivos da consul ta do "re gi st ro de
saúde" ;
c) - A "consulta especializada" (neurologia, oftalmologia, psi
cologia, etc.) dos alunos com deficit de aprendizagem e/
d) - O controle das condições de saúde dos servidores
escola-res, dos moradores de prédio escolar e de todos quanto
mantenham contato com os alunos, de forma permanente, no
recinto escolar;
e) - Estabelecer estreita relação com o Círculo de Pais e Pro
fessores, procurando colaborar com a educação em saúde;
f) - A inspeção dd prédio escolar. de suas instalaç6es e do
material pedagógico;
g) - Registrar a existência de variáveis intervenientes
capa-zes de dificultar a aprendizagem;
h) - Orientar e fiscalizar as cantinas escolares e colaborar.
no campo da saúde, com os orgãos ligados ã merenda
esco-l ar;
i) - Encaminhar às clInicas especializadas os casos que o exi
girem, bem corno solicitar ou providenciar tratamento e /
ou correção. (Jortaria S;DSP n9 79 de 10;08/78).
O psicólogo foi incluido nas chamadas "comi S5 õe s
multiprofissionais", responsáveis pelas consultas especializ~
das. Essas comiss6es seriam coordenadas pelo Chefe da
Medici-na Escolar e constituidas pelo pediatra. psiquiatra, odontol§
r:
i.nteressante observar o modo como o setor é no-meado: "Medicina Escolar" e, não, "Saúde Escolar", apesar de
nele constatarmos a presença oficial de profissionais de
sau-de sau-de diversas especialidasau-des, entre eles, o psicólogo.
3 - O PAPEL SOLICITADO AO PSICOLOGO PELO PROEME I E PELAS
NORMAS T~CNICAS À PARTIR DELE ESTABELECIDAS.
Quando a medicalização do fracasso escolar nao dá
mais conta de sua tarefa, uma outra saída é buscada. Para
aquelas crianças em que problemas orginicos não estão eviden
-tes busca-se um novo tipo de compreensão de suas dificuldades.
t aí, então, que entra a princípio, o discurso da Psicologia
e, depois, o profissional psicólogo. E pede-se que ele,
atra-vés de suas técnicas, liste os fatores, sempre numa perspecti
va individualizante, que estão produzindo os problemas apre
-sentados por cada criança. E as devolva a escola, com seu
a-val pretensamente "neutro" e "científico".
O PROEME I teria como objetivos principais a'pre
-vençao e o tratamento de doenças que possam interferir no pro
cesso de aprendizagem e seu principal instrumento para
alcan-çar tal objetivo é o "Registro de Saúde", realizado antes que
a criança comece a frequentar a escola. A prioridade, então,
e a de atendimento de crianças pré-escolares e as de primeira
série com vistas a "contribuir para diminuir a retenção na
o
psic6logo foi incluido nas chamadas equipes in-terdisciplinares juntamente a outros profissionais corno o
mé-dico especialista e o assistente social para trabalhar com as
crianças que apresentaram "distúrbios de conduta e de
apren-di z agem" .
o
trabalho Jesta equipe também está voltaJo priori.tariamente para o atendimento de pré-escolares e alunos de pri
meira série, com ênfase especial no atendimento das crianças
de turma CAD - Classe de adaptação. Csob essa denominação
criança CAD - eram colocados os alunos considerados imaturos
para a alfabetização. Atualmente a denominação mudou para CP
- classe preliminar, mas seus objetivos são os mesmos).
~ de que forma se operacionaliza o atendimento de~
tas crianças pelo psicólogo? Aí as "Normas Técnicas" respon
-dem: através do diagnóstico e atendimento psicoterápico, indi:.
vidual ou grupal, das crianças encaminhadas pela escola ou p~
los pediatras do setor.
o
que, tanto o PROEMEr,
quanto os profissionais deescola e do Centro de Saúde solicitam é que se atenda ã cria,!!
ça e sua família e, praticamente, se providencie uma "recei
4 - ANÁLISE DO PAPEL QUE SE ESPERA DO PS I CaLOGO. O DISCUR-SO DA PSICOLOGIA DA PRIVAÇl\O; A CARACTERIZAÇl\O DO
"EX-CLUIDO COMO DECORRENCIA DE LIMITAÇOES INDIVIDUAIS.
Vimos que o que ê solicitado ao psicólogo é que
receba as crianças encaminhadas por apresentarem dificuldade
ue aprenuizagcm ou "problemas de comportamento", faça um
psi-codiagnóstico e as encaminhe a um atendimento psicoterápico ,
ou faça ele mesmo esse atendimento, no âmbito do Centro de
Saúde.
Neste ponto surge novamente a questão discutidanes
sa dissertação: a demanda acima apontada tem um caráter ineg~
velmente iJeológico. As dificuldaJes Jc aprendizagem e os pr~
blemas de comportamento dentro da escola mais uma vez são con
siderados como fenômenos individuais que justificam, portanto,
uma intervenção indiyidualizada que não leva em consideração
as características do sistema escolar vigente.
O saber psicológico tem tido uma grande importân
-cia enquanto "justificadór" do fracasso escolar.
"A definição de uma idade teórica ou normal, pre tensamente propiciadora de tal ou qual nível de
conhecimento é um meio de explicar o retardo e
de organizar institucionalmente suas consequ~n
ciaspráticas". (Cunha, 1980:39)
Em sua tese de doutoramento, Patto aponta que,
"ao psicólogo tem cabido diagnosticar as
defici-~ncias psicológicas causadas pela marginaliza
vi t ;Í v l' i s j ií q 1Il' o p a ti r ã o de Jl o r 111 ;1 I i li a de p s i c o
lógica é o homem bem sucedido na vida urbana~
industrial. Uma vez feito este diagnóstico, o psicólogo procura, através de um trabalho solitário ou de equipe, direto ou de consulto -ria a profissionais da educação, os meios psi
copedagó~icos e psicológicos para promover
a
integraçao do marginalizado ã chamada socieda
de de classe média, vista como única via de
a c e s s o à sua r e de n ç ã o ."
CP
a t to. I 9 81 : 2 1 8 )o
discurso da Psicologia da privação cultural quepermeia as intervenç6es do psicólogo que atua da forma acima
citada assume que há contingentes populacionais "a margem" do
sistema social, sem que a questão da relação entre o Estado e
a estrutura de dominação existente na constituição de situação
de marginalidade seja sequer levantado. Quando entendemos a
situação "marginal" no marco dos processos históricos do
capi-talismo periférico, podemos entender que a marginalidade, no
sentido de exclusão do sistema social que este termos assume
em determinados contextos te6ricos, não passa de um mito.
Sabe-se, também. que a atual psicologia do desenvol
vimento não disp6e de um corpo integrado de conhecimentos so
-bre as mudanças psicológicas que se dão à medida que o
envelhece. Copit afirma que
"os conhecimentos obtidos até agora pela psicologia do desenvolvimento, de modo geral, res -tringem-se as aquisiç6es de determinados atri-butos psicológicos, em estágios específicos da
vida
C
... ).
Além de não se conhecer o processode desenvolvimento humano em sua globalidade , antecipa-se a sua relatividade frente ao diferentes aspectos culturais e momentos históri -cos dos agrupamentos sociais". (Copit. 1981 :415)
E conclui dizendo que,
"nos di as atuais, o máximo que a ps i cologi a do desenvolvimento nos pode fornecer são explica
ções relativas a processos restritos e perti~
nentes a aspectos parciais do processo' global de desenvolvimento psicológico. Além disso,os dados por ela obtidos não tem grande poder de generalização, circunscrevendo-se as determi-nadas amostras com caracteristicas culturais e históricas específicas". (Copit, 1981:
Atender a solicitação de contribuir na "rotula
ção" e "adaptação" a escola das crianças que se "desviam" dos
parâmetros de normalidade estabelecidas pela Psicologia
a-tual é uma forma de compactuar, conscientemente ou não, com a
posição ideológicamente encobridora que tenta individualizar
os problemas, sem que se explicite de que forma a instituição
escolar e a estrutura da sociedade estão, na verdade, produ
-zindo estes "problemas".
Com Maria Helena S. Patto concluimos que
"postas em dúvida as afirmações que nortearam a
té agora a atuação do psicólogo junto ao opri~
mido, sobretudo no âmbito escolar, resta o tra
balho de conhecer as reais repercussões psico~
lógicas da pobreza e const~uir um conhecimento
que venha a substituir o discurso ideológico predominante e funcione como ponto de partida na busca de caminhos de uma Psicologia liberta
dora. Para isto,
há
que rever os conceitos, 05jetivos e métodos da Psicologia e repensá-la ~
não mais numa perspectiva empirista, mas no
-CJ\prTULO V: J\ IUJVlSAO DO PAPUL DESl:MPl:NllADO PULO PSIC()LOC;O
À PARTIR DA REFLEXÃO CRrTICA SOBRE AS CAUSAS
DOS PROBLEMAS ENFRENTADOS PELA INSTITUIÇÃO ES-COLAR.
l-ALTERNATIVAS E PROPOSTAS
As alternativas aqui apresentadas para o trabalho
do psicólogo na instituição escolar partem de dois
pressupos-tos:
- o primeiro é o de que
é
a partir de uma práticarefletida críticamente, cotidiana e nos locais de trabalho que
se inicia um movimento de transformação da ordem social vige~
te. As mudanças no contexto social mais amplo nunca se deram
à revelia dos profis'sionais que atuam nas insti tuições dessa
sociedade. São eles um dos agentes desta transformação.
- o segundo pressuposto é o de que a
"desescolari-zação" da sociedade, como já proposto por inúmeros autores
não é a solução para as contradições encontradas no interior
da Es cola.
Como aponta Vanilda Paiva, nao parece que a classe
trabalhadora responda com um "não"