FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
RICARDO PEREIRA DA SILVA
ESTUDOS DE CUSTOS NO SERVIÇO PÚBLICO
RICARDO PEREIRA DA SILVA
ESTUDOS DE CUSTOS NO SERVIÇO PÚBLICO
Trabalho apresentado à Escola de
Administração de Empresas de São Paulo
da Fundação Getulio Vargas, como
requisito para obtenção do título de
Mestre em Gestão e Políticas Públicas.
Orientadora: Professora Dra. Carmen
Augusta Varela
SÃO PAULO
RESUMO
Este trabalho se refere ao controle de custos no serviço público, procura
identificar os motivos que ensejaram a adoção dessa alternativa característica do setor
privado e pretende demonstrar sua importância para as políticas públicas, desde sua
concepção até a avaliação, destacando pontos negativos pela não adoção desse tipo de
controle e indicando sua condição de imprescindibilidade no estudo de custo efetividade
das ações dos governos.
Como forma de obter um panorama acerca do tema, fez-se um breve referencial
histórico da experiência brasileira, com destaque para a ação promovida pelo governo
federal.
Finalmente, indica benefícios não econômicos do controle de custos, muito úteis
ao momento presente da Administração Pública brasileira.
Palavras Chave: controle de custos, despesa pública, eficiência administrativa,
ABSTRACT
This essay elaborates on cost control in public services, pursuing to identify the
reasons that gave rise to the demand for this alternative, which is a characteristic of the
private sector, and its use by public administration. It then attempts to demonstrate the
importance of cost control on public policy, from its conception to its evaluation, and
emphasizes the downside of not adopting this type of control. It also demonstrates its
indispensability in the study of effectiveness of public actions.
There is a brief historical reference of cost control in Brazil, promoted by federal
government.
Lastly this essay highlights non-economic – but very useful – benefits to the
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 06
2 CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS ÀS POLÍTICA PÚBLICAS 07
3 EXPERIÊNCIA BRASILEIRA 12
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 16
1.- Introdução
O restabelecimento do estado democrático no Brasil e a Constituição Federal de
1988 são marcos de grandes mudanças na relação entre estado e sociedade,
principalmente no que se refere à ampliação do rol de obrigações do estado quanto ao
atendimento das demandas sociais, sobretudo pela característica do Brasil ser um país
marcado por forte concentração de renda e por uma cultura excludente.
Apesar da “recente” experiência democrática, é notória a capacidade de
organização da sociedade no sentido de exigir mais e melhores bens e serviços públicos
e essa circunstância de permanente pressão sobre os governos, aliada ao fato de que os
recursos não são ilimitados, deu vez à necessidade de se buscar maneiras inovadoras de
administração.
Essa reorientação aproximou a Administração Pública brasileira da New Public
Management, que tem por principal característica a busca pelo permanente
aperfeiçoamento do funcionamento das instituições, visando a eficiência das ações, e
esta é, por sua vez, avaliada em função dos resultados alcançados, havendo muitas
iniciativas de sucesso em todas as esferas de governo que podem ser atribuídas às
mudanças ocorridas, grande parte alinhada à perspectiva de performance e
racionalidade.
Há que se destacar que o sucesso em referência pode ser assim considerado em
razão de várias áreas de atuação dos governos apresentarem resultados que demonstram
objetivos definidos sendo perseguidos, pois é possível se depreender dos registros
históricos que há, em vários segmentos, mais e melhores serviços públicos sendo
prestados e, ainda, também uma forte preocupação com a universalização dos serviços,
inclusão social e diminuição das desigualdades.
Tais resultados não são aleatórios, sendo certo que, em algum momento, foram
traçadas as estratégias para que as realidades fossem transformadas, bem como
definidas as metas a serem atingidas. Nessa linha, resta claro que o estabelecimento de
objetivos é um fator fundamental, tanto no que se refere a orientar os esforços da
Administração, quanto para avaliação acerca da qualidade e efetividade das políticas
Contudo, há autores que trazem à análise o destaque para a necessidade de que
todas essas ações contemplem o controle de custos, numa perspectiva de que,
independente de aumento na quantidade e qualidade dos bens e serviços ou de
alinhamento dos resultados com as perspectivas planejadas, a ausência de conhecimento
do real valor necessário para a obtenção desses resultados impede uma avaliação mais
criteriosa, restando sempre a oportunidade para a pergunta se não seria possível alcançar
as mesmas metas com menos recursos.
No Brasil, o debate é incipiente, como recentes são as atividades voltadas ao
tema, sendo poucos os registros que permitam a obtenção de um panorama explicativo.
Apesar da aparente indiferença, tanto as normas relacionadas à gestão tem apontado na
direção da obrigatoriedade da adoção do controle de custos, como o próprio governo
federal teve a iniciativa de incluir em sua agenda o tema, sinalizando que as condições
atualmente observadas tendem a mudar.
Assim, o objetivo desse trabalho é o destaque para a importância do controle de
custos e sua associação com os princípios da Administração Gerencial, a apresentação
de algumas características de como é tratado o tema em âmbito nacional, com ênfase na
experiência do governo federal e, finalmente, a abordagem do fato de que, além do viés
da economicidade, há outros benefícios de interesse para processo de transformação da
Administração Pública, principalmente no que se refere à mudança de cultura dos
administradores e seu alinhamento com os princípios republicanos.
2.- Características relacionadas às políticas públicas
O controle de custos, como integrante do conjunto de ações necessárias para o
bom desempenho da Administração Pública, traz uma série de vantagens com a sua
adoção e todas têm consonância com os princípios da Administração Gerencial, pois,
em síntese, consiste num registro sistemático de informações com utilidades múltiplas,
sendo um componente fundamental para o planejamento das ações e, também, para sua
avaliação.
Independente das várias abordagens quanto à sua utilidade o fato é que qualquer
recursos disponíveis, não havendo caminho mais seguro e com maiores chances de
sucesso do que uma organização pautar sua atuação quando detentora de informações
objetivas acerca de quanto de recursos possui e quanto será necessário para o alcance de
seus objetivos.
Permanentemente, os anseios da sociedade têm impacto nas decisões dos
governos, sendo todos esses temas objeto de atenção e intervenção da Administração e
materializados por meio de políticas públicas, que são constantemente avaliadas e seus
resultados confrontados com os obtidos em momentos anteriores. Contudo, essa
comparação de resultados versus resultados não parece ser suficiente como padrão de
avaliação de eficiência.
Sem controle de custos o que se tem é a comparação de orçamentos e resultados,
o que já é considerável, mas pouco num contexto de busca por eficiência e
racionalidade, pois ainda que os resultados gerais sejam satisfatórios, problemas de
eficiência podem permanecer escondidos, consumindo recursos que poderiam, se
alocados de forma diferente, melhorar ainda mais o desempenho da Administração.
“Sem dúvida é possível promover ações que melhorem o
desempenho das organizações do governo sem indicadores de custos, valendo-se, para tanto, do feeling dos gerentes e das equipes. Entretanto, a utilização sistemática de indicadores tem a vantagem de propiciar uma avaliação mais criteriosa e consistente, além de institucionalizar nas práticas organizacionais o compromisso com
resultados e o valor pelo dinheiro”1
O núcleo do debate parece ser, portanto, que a ausência de controle de custos dá
vez a certa subjetividade na participação dos atores envolvidos nas ações públicas e cria,
consequentemente, um paradoxo frente aos princípios da Administração Gerencial,
acima de tudo em razão da impossibilidade de uma demonstração racional completa
acerca das vantagens e benefícios trazidos pelas políticas adotadas.
Em suma, ainda que os objetivos estejam aparentemente sendo alcançados, sem
um controle efetivo dos recursos utilizados é impossível a mensuração dos benefícios,
pois não é suficiente que os anseios sociais sejam atendidos é preciso se ter a
perspectiva de quanto se gastou nesse atendimento. Num exemplo grosseiro, não basta a
1
construção de escolas para um número determinado de jovens, é preciso saber se os
recursos utilizados foram os adequados, caso contrário, poderiam esses recursos estar
destinados ao atendimento de outras demandas.
Muitas são as análises que apontam a negligência com o controle de custos como
um impedimento ao estabelecimento de critérios adequados de avaliação dos resultados
da Administração Pública. Primeiro, se argumenta que o desconhecimento dos custos é
fator limitante, pois as análises não trazem em si uma fundamentação de sua
racionalidade e só fazem sentido numa comparação de registros históricos, e, também,
que análises dissociadas do fator econômico podem disfarçar eventual ineficiência dos
governos.
Alonso (2010, p.45) destaca certa uniformidade na experiência internacional e
na literatura especializada no sentido da impossibilidade de avaliação de qualidade
desconsiderando o fator custo, indicando que só seria possível a identificação de
melhora do desempenho da Administração Pública quando avaliados os serviços
públicos em função dos recursos necessários para sua prestação.
Silva e Drumond (2004, p.7) abordam o problema indicando a necessidade de
estar contemplado o viés econômico na análise de desempenho, argumentando que, por
maiores que sejam os esforços para elaboração de técnicas de mensuração por índices
físicos e qualitativos, não se conseguirá um método mais apropriado do que aqueles que
levam em conta os custos na avaliação dos resultados, destacando que recursos são
provenientes fundamentalmente de tributos, havendo, dessa forma, a necessidade da
demonstração de resultados numa perspectiva mais dinâmica da atuação governamental
em termos de eficiência, principalmente no sentido de ser possível a correção de
eventuais distorções observadas nas políticas em andamento.
Toda essa controvérsia atinge frontalmente a perspectiva de qualidade, pois a
simples ausência da informação já pode ser considerada um indicativo de que o controle
poderia ser aprimorado.
A apresentação de resultados sem um controle efetivo de custos compromete o
atendimento ao princípio da transparência, pois a ausência desse tipo de informação
leva à interpretação de que ou os governos desconhecem os custos ou se os conhecem
não os compartilham, sendo esses caminhos dissonantes da premissa de eficiência e
racionalidade, pois na medida em que não é possível à Administração demonstrar
efetivamente a vantagem de suas escolhas abre-se um debate sem proveito algum, pois o
resolvidas na iniciativa privada, como o preço da aplicação de uma vacina, o custo de
uma aula, ou os motivos que dão vez a diferenças de custo em unidades concebidas para
o mesmo fim.
Mas nada é tão contundente à Administração do que a tomada de decisão às
cegas, muito comum nos casos de contingenciamento quando projetos assimétricos em
termos de eficiência sofrem de forma desigual com cortes lineares, a exemplo do que
ocorreu no período de déficit de energia, quando os consumidores foram submetidos a
uma restrição em termos percentuais, sendo que aqueles que já eram eficientes em
termos de consumo foram obrigados a fazer grandes esforços para enquadrarem-se à
regra, enquanto que os esbanjavam fizeram, proporcionalmente, menos esforços.
“Como as informações sobre os gastos do governo em geral são
organizadas com vistas às necessidades da administração financeira (fluxo de
caixa do Tesouro Nacional), o governo sempre teve noção de quanto
precisaria cortar em decorrência do equilíbrio macroeconômico, mas nunca
soube ao certo como e onde deveria cortar. Ou seja, o governo nunca teve
condições de promover cortes seletivos de gastos, de modo a não
comprometer mais o desempenho da Administração Pública.”2
A resposta a essa necessidade de mais instrumentos de controle veio na forma de
incorporação na contabilidade pública de métodos de escrituração da iniciativa privada,
que contemplam informações dos custos governamentais e contribuem para o
cumprimento das obrigações relativas à responsabilidade fiscal e transparência, como
relatam Rezende et al.(2010, p. 960-961), que destacam, ainda, que essa mudança fez
parte de reformas bastante abrangentes visando, principalmente, o ajuste de contas
públicas em países como Austrália, Nova Zelândia e Reino Unido.
E essa nova sistemática tem impacto em todo o ciclo das políticas públicas, pois
não só a avaliação de desempenho sofre o impacto do desconhecimento dos custos.
Desde a inclusão de determinado problema na agenda dos governos, quando diferentes
percepções quanto à capacidade da Administração poder enfrentar eventual problema
podem alterar a decisão quanto à adoção de medidas imediatas ou seu adiamento,
passando pela formulação das políticas, que consiste na escolha e planejamento da
maneira como se atenderá a demanda, e, por fim, também a implementação e
acompanhamento. Todas as etapas se beneficiam com informações mais precisas no que
se refere às despesas pretendidas e há uma expectativa de melhores chances de alcance
dos resultados esperados.
Além da impossibilidade de avaliação das políticas quanto à sua racionalidade, o
controle de custos é muito importante também para compreensão das estruturas
administrativas e seu funcionamento, pois há que se considerar que, muito embora a
maioria das políticas tenha abrangência definida e esteja sob o comando de uma unidade
específica, há um esforço conjunto de áreas, que contribuem indiretamente para que os
objetivos sejam alcançados. Isso equivale a dizer que determinada ação, apesar de poder
ser caracterizada como uma política para saúde pública, por exemplo, demandará bens e
serviços de toda a estrutura e não só da unidade gestora, pois é próprio da
Administração o compartilhamento de recursos que não justificam exclusividade e,
dessa forma, parece razoável que despesas com gestão de pessoas, realização de
licitações, administração de contratos, utilização de bens estocáveis, consumo de
utilities, entre outras, sejam apropriadas no cálculo a ser considerado para conhecimento
do custo efetivo da política pública em análise, pois, em tese, não existe no atual
modelo uma definição específica do quantum diretamente ligado às políticas em si.
Longe de uma questão conceitual, essa prática tem demonstrado que
subunidades responsáveis por levar a termo, de forma conjunta, determinada política
concebida, postos de saúde como exemplo, registram com bastante frequência
diferenças em seus custos, fato que permite uma interpretação de que a oferta de
serviços públicos à população é influenciada por uma série de fatores, mas se essas
diferenças não forem consideradas, não há como se traçar um padrão de comparação do
custo efetividade dessa política, ficando comprometida sua avaliação.
O estudo do consumo de utilities é especialmente esclarecedor nesse sentido,
pois como mensurar quanto de água, energia elétrica ou telefonia integram a conta de
determinada política? Apenas um registro sistemático e individualizado permitirá uma
repartição justificável, de forma a proporcionar a inclusão desse tipo de despesa no
cômputo de determinada política e permitir a comparação entre unidades que possuam
similaridades funcionais.
Via de regra, o que se pretende demonstrar é que a definição de quanto se
gastará com as atividades da Administração Pública, contemplando dentre seus
de bens e serviços públicos, dependerá de um registro de todos os elementos que
signifiquem alguma despesa e a respectiva mensuração de valor.
Em outra perspectiva, o controle de custos parece ser indispensável para a
aferição da efetividade das despesas, pois a cada política poderão ser atribuídos os
custos que efetivamente são demandados, no sentido de que não é possível o
estabelecimento de padrões de avaliação de políticas sem um adequado conhecimento
dos custos envolvidos para sua efetivação. De uma forma mais concreta, o custo efetivo
de uma aplicação de vacina ou de uma aula depende do conhecimento de todos os
fatores que direta ou indiretamente estão relacionados para a produção de um
determinado bem ou prestação de um serviço.
Assim, a definição de Silva e Drumond (2004, p.1) é conclusiva quando afirma
que toda decisão implica conhecer determinadas variáveis qualitativa e
quantitativamente expostas, com toda a transparência, clareza e objetividade, inerentes a
qualquer processo da gestão pública. Nesse ponto, a gestão de custos no âmbito
governamental é decisiva, pois é um instrumento essencial ao gestor público para
condução dos interesses públicos da forma que prevê a administração pública gerencial.
3.- Experiência Brasileira
Como visto, a adoção de controle de custos nos países pioneiros dessa iniciativa
fez parte de um conjunto de ações voltado ao ajuste das contas públicas, num enfoque
de que o equilíbrio fiscal, na perspectiva de então, só seria atingido com maior rigor no
controle das despesas.
Rezende et al. (2010, p. 961) indicam que, em sentido diverso da experiência
internacional, se promoveu, no Brasil, o ajuste fiscal mediante sucessivos aumentos da
carga tributária, seja pela grande dificuldade em se conter a expansão dos gastos ou pela
ausência de registros que pudessem apontar ineficiências.
Contudo, considerando os reveses à eficiência proporcionais à carga tributária,
se despertou o interesse pelo controle dos gastos.
Na legislação brasileira, merece destaque a Emenda Constitucional nº. 19, de 04
de junho de 1998, que fez incluir no rol de princípios a serem observados pela
a Administração deveria cumprir suas obrigações, pois não seria mais suficiente a
preocupação exclusiva com a formalidade dos atos, praxe até então, devendo ser levada
em conta a racionalidade de suas ações no alcance de seus objetivos.
Esse dispositivo constitucional deflagrou uma mudança comportamental no
sentido de que os governos deveriam possuir condições de demonstrar a inteligência de
suas políticas e de justificar as alternativas adotadas.
A Lei Complementar 101, de 04 de maio de 200, conhecida como Lei de
Responsabilidade Fiscal e que estabeleceu limites de endividamento de estados e
municípios, restringiu a despesa com pessoal e trouxe determinação de austeridade à
execução orçamentária, foi além, obrigando o estabelecimento, nas leis de diretrizes
orçamentárias, de normas relativas ao controle de custos e à avaliação dos resultados
dos programas financiados com recursos dos orçamentos.
Mais recentemente, temos as normas expedidas pela Secretaria do Tesouro
Nacional, em específico as Portarias nº. 406, de 20 de junho de 2011, nº. 828, de 14 de
dezembro de 2011 e nº. 231, de 29 de março de 2012, tornando obrigatório, na nova
contabilidade a ser adotada pela Administração Pública, o controle de custos, havendo
uma agenda estabelecida para que a partir de 2014 os órgãos de controle externo possam
exigir de seus jurisdicionados o cumprimento dessa exigência.
Apesar dessa evolução no ordenamento legal, poucas são as iniciativas que
merecem nota, havendo um número reduzido de trabalhos acadêmicos acerca do tema e
poucas experiências por compartilhar.
“Não obstante as determinações legais, o fato é que a Administração Pública até 2010 (seja o Executivo, Legislativo ou Judiciário) não utilizava
sistema de custos, salvo por iniciativas isoladas de alguns órgãos. O motivo é
porque, até então, não havia nem sistema, nem metodologia adequada capaz
de ser aplicada sistematicamente e uniformemente para toda a Administração
Pública Federal.”3
Machado e Holanda (2010, p.793) informam que, buscando atender essa
demanda o governo federal promoveu, desde 2008, ações voltadas à concepção e
implantação de um sistema de informação de custos. Inicialmente, com a oficina de
Trabalho “Sistemas de custos na Administração Pública: modelo conceitual e estratégia
de implementação”, que deu vez a um projeto executivo estruturado com responsáveis, concepção teórica definida, cronograma e recursos e em março 2010 foi homologado o
Sistema de Informações de Custos do Governo Federal.
Machado e Holanda (2010, p.797) destacam, também, que os principais
objetivos do sistema do governo federal são eficiência na alocação de recursos,
eficiência operacional e subsídios para fixação de preços públicos e taxas e citam, ainda,
como finalidades, o subsídio do processo de planejamento e orçamentação, o apoio às
decisões sobre manter a produção de determinado bem ou serviço, ou entregá-la a
entidades externas e a melhoria das informações internas gerenciais para possibilitar a
medição dos resultados e desempenhos e proporcionar controles mais orientados a
resultados.
Há que se destacar que a experiência federal foi concebida numa perspectiva de
utilidade ampla, de forma que buscando o atendimento de demandas específicas, se
buscou garantir o atributo da comparabilidade, sem comprometer a possibilidade de
detalhamento das informações, em razão das diferentes expectativas e necessidades
informacionais das diversas unidades organizacionais e seus respectivos usuários.
Machado e Holanda (2010, p.795).
Depreende-se, portanto, que a experiência do governo federal terá um papel
fundamental nas mudanças pretendidas para a Contabilidade Pública, não só para
obtenção dos benefícios esperados, como também funcionando como um referencial
para os governos subnacionais, que deverão alinhar-se a essa nova diretriz.
E todas essas características dão a dimensão da dificuldade de concepção e
execução de um programa de controle de custos, dada a abrangência e complexidade do
repositório, mas, uma vez em operação, o que se tem é um meio permanentemente
atualizado para auxílio na compreensão do significado das despesas, sendo fundamental
para seu alinhamento com as demandas sociais possíveis de serem atendidas com
determinada quantidade de recursos disponíveis e principalmente o oferecimento de
subsídios para a tomada de decisão.
Em que pese o fato da primeira experiência sistematizada ter sido iniciada no
governo federal e apesar da preocupação quanto à comparabilidade das despesas e
flexibilidade para sua associação às políticas segundo necessidade das várias unidades,
ganha importância a preocupação de como se dará a continuidade do processo nos
É possível se esperar que a própria definição dos cronogramas já confirme essa
expectativa de desigualdade, pois de forma concomitante convivem entes detentores de
controles sofisticados em sua forma de ação e entes pequenos e menos favorecidos, sem
condições de acompanhar o processo na mesma velocidade. Independente desses óbices,
o fato é que estados e municípios deverão adequar-se, não só pelo impositivo legal, mas
pelos benefícios necessários à significativa tarefa que desempenham no conjunto de
ações do Poder Público.
“No Brasil, a importância que estados e municípios desempenham na
gestão do gasto público recomenda que a iniciativa que está sendo adotada
pelo governo federal estimule a adoção de mudanças similares pelos
governos subnacionais, tendo em vista evitar que metodologias distintas
venham comprometer futuramente a cooperação intergovernamental e o
comprometimento de todos os entes federados com os objetivos do projeto.”4
Por fim, com o objetivo de ilustração de como a negligência no uso do controle
de custos é prejudicial para o alcance dos objetivos da Administração Pública brasileira,
apresentamos os trabalhos “Economias de Escala na Oferta de Serviços Públicos de
Saúde: Um Estudo para os Municípios Paulistas” e “Eficiência Técnica e Retornos de Escala na Produção de Serviços Públicos Municipais: O Caso do Nordeste e do Sudeste
Brasileiros”, artigos que, a partir da perspectiva de custos, demonstram que o tamanho
dos municípios tem influência na prestação de serviços públicos e explicam porque os
municípios muito pequenos não tem retorno de escala, dando vez a gastos per capita
maiores e níveis de qualidade mais baixos, ensejando a interpretação de que o processo
de emancipação não considerou uma série de variáveis que acabam tendo um efeito
nefasto na eficiência das despesas, pois da mesma forma como os custos da saúde
indicaram a desvantagem comparativa de pequenos municípios é possível a perspectiva
de que tantas outras despesas que dependem de um volume mínimo para apresentarem
custos compatíveis com os benefícios que deveriam proporcionar foram negligenciadas,
restando a expectativa que o novo modelo de contabilidade a ser implantado venha a
identificar essa incorreções, proporcionando elementos para sua correção.
Isso equivale a dizer que muito mais que uma voluntariedade, o estudo de custos
parece ser peça chave na compreensão das demandas sociais e no alinhamento dos
recursos necessários a seu atendimento, na medida em que possui um efeito de revelar
características das despesas que levam à ineficiência.
4.- Considerações Finais
Sem dúvida, a análise realizada no cotidiano dos governos, quando da tomada de
decisão, leva em conta o viés econômico das alternativas pretendidas e considera, num
contexto de resultados, a relação entre custos e benefícios.
Contudo, políticas são complexas, abrangentes, compostas de várias etapas de
execução e incluem grandes grupos de atores para serem levadas a termo e isso tende a
tornar ações do dia a dia dispersas e aparentemente desconectadas dos grandes objetivos
das instituições.
Reunir todos os esforços e seu significado em termos de controle de custo para a
obtenção dos resultados parece ser uma maneira de se manter o controle das despesas e
ainda envolver os gestores nesse processo.
A perspectiva é que, à medida que os registros vão se acumulando, passe a
existir um padrão de comparação entre as despesas e isso estimule tanto a busca pela
compreensão das variações quanto um empenho dos atores em melhorar seus
desempenhos.
“Além disso, a melhor garantia do aperfeiçoamento do sistema de
custos são o cálculo e a divulgação dos custos unitários dos bens e serviços
entregues à população, pois eles forçarão os gestores envolvidos a analisar as
informações, buscando, de um lado, corrigir as distorções de classificação e,
de outro, tornar mais eficiente o uso de recursos.”5
Essa assertiva indica que, se por um lado a existência de registros permite a
regulação das despesas, de outro nasce a possibilidade dos gestores, a partir de um
padrão de comparação, fomentarem iniciativas de consumo sustentável, contribuindo
para que as políticas se aperfeiçoem em termos de viabilidade econômica. Isso significa
que, independente de enforcement, é possível à Administração, conhecendo e
divulgando suas despesas, com os níveis de detalhamento necessários para identificação
de ineficiências, promover uma mudança cultural.
Um caso específico é o consumo de utilities, água, energia elétrica e telefonia na
Administração Pública, pois é certo que quase toda a estrutura administrativa se vale
desses serviços e, notadamente, a ausência de um controle formal pode dar vez a certa
condescendência no consumo, pois ainda que se admita a existência de alguma gestão,
parece ser mais provável que os gestores estarão mais atentos a esse tipo de despesa à
medida que não só seu consumo seja divulgado, mas também sua posição num possível
ranking. A preocupação em posicionar-se dentro de um padrão aceitável ensejará uma
competição salutar, como se estabelecerá um permanente monitoramento recíproco, no
sentido de se manter ou aprimorar determinados gastos.
De outro lado, fomentando essa movimentação por parte dos gestores, a
Administração Pública terá condições compartilhar as experiências pontuais e
estabelecer parâmetros de conduta num formato pedagógico. Isso significa uma
tendência de uniformização dos consumos, pois àqueles que se distanciarem do padrão
deverão justificar a distorção, trazendo elementos à avaliação da despesa que
permanecem disfarçados num modelo sem esse tipo de controle e que fazem com que as
ineficiências permaneçam.
Além da mudança de comportamento face ao consumo, outro benefício
fundamental trazido pelo controle de custos é o oferecimento de subsídios para a
definição dos objetos dos certames licitatórios, pois, da mesma forma como a
negligência pode inviabilizar economicamente a prestação de serviços públicos, como
visto nos trabalhos acerca de tamanho de municípios e custo da prestação dos serviços
públicos de saúde, a contratação do fornecimento de bens e serviços, que servirão de
insumo para as políticas públicas, pode sofrer influência negativa com o
desconhecimento dos componentes de custo.
Uma característica a ser considerada refere-se à economia de escala, sendo
bastante razoável a suposição de que quanto maior a demanda de determinado bem ou
serviço, melhores as condições de negociação de preços e consequentemente de
obtenção de propostas mais vantajosa para a administração.
Se determinado serviço é utilizado pela maioria das unidades de uma estrutura
administrativa, o planejamento integrado é fator de grande importância, não só pela
expectativa de obtenção de menores preços, como visto acima, mas também pelo fato de
número de contratos, bem como facilitar o acompanhamento das respectivas execuções
contratuais, pois com a padronização dos objetos e demais características é possível que
um número menor, comparativamente, possa atender a demanda integrada, em lugar de
vários núcleos atendendo demandas individualizadas.
É preciso que se leve em conta que a Administração Pública, ao ser classificada
numa ordem hipotética de consumidores, alcançará posição de destaque em função do
grande volume de demanda de bens e serviços e essa característica não deve ser
desprezada, pois muito da capacidade de negociação de preços nos certames licitatórios,
em específico nas licitações na modalidade pregão, está condicionada ao tamanho dos
contratos. Contudo, de nada servirá essa vantagem da Administração se não houver um
registro sistemático de informações que permita o agrupamento das demandas e um
processo de contratação centralizado, fazendo valer a magnitude do consumo.
Por fim e à guisa de conclusão, buscou-se demonstrar que o controle de custos é
o meio mais eficiente para controle das despesas, como também que suas características
o colocam em consonância com as premissas da Administração Gerencial, em
específico pelo alto grau de racionalidade de ser alcançado em razão da fidedignidade
entre ações propostas e quantidade de recursos necessários para sua execução.
Fez-se destaque, também, para o fato de que por melhores que sejam os valores
acerca de economicidade e sustentabilidade, há a expectativa que a divulgação de custos
pode ser um meio de estimular os gestores de melhorarem suas atividades segundo esses
atributos, os aproximando cada vez mais dos princípios republicanos, no sentido dos
esforços da Administração Pública estarem a serviço do atendimento das demandas
sociais.
E não menos importante, a constatação de que o controle de custos poderá
também contribuir para melhoria das contratações públicas, não só no que se refere à
economia de escala, mas em relação a toda a logística envolvida, principalmente nas
atividades de fiscalização da execução contratual. Essa assertiva decorre do fato que o
controle de custos funciona como retroalimentador de informações para o planejamento
das despesas, proporcionando subsídios para identificação das melhores maneiras de
contratação e estimulando os gestores dos contratos a buscar as alternativas mais
eficientes ao atendimento das demandas.
Assim, considerando todos os benefícios apontados, os reveses decorrentes da
negligência com esse tipo de controle e o fato do controle de custos se constituir numa
iniciem atividades no sentido de criarem seus sistemas de controle de custos,
principalmente pela necessidade de controle das despesas, sendo esse a única variável
possível de ser controlada na busca de melhor produtividade do setor público, dada a
dificuldade de ajuste fiscal mediante ampliação da carga tributária, sob pena de que
imperfeições e desperdícios comprometam o ritmo de atendimento das demandas
sociais, sobretudo pela percepção de que apesar dos avanços e do crescimento do papel
do estado, há muito o que fazer para que os objetivos de inclusão social e diminuição
das desigualdades atinjam níveis satisfatórios, conferindo à eficiência das despesas um
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