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Dísseção Coronária Espontânea

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Academic year: 2021

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Dissertação – Artigo de Revisão Bibliográfica

Mestrado Integrado em Medicina

Disseção Coronária Espontânea

Joana Rita Basílio Leite (joanaleite7@gmail.com)

Mestrado Integrado em Medicina

Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

Orientador:

Dr. Paulo Alexandre Neto Palma

Assistente Hospitalar Graduado de Cardiologia e Professor Convidado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

Afiliação: Centro Hospitalar do Porto

Universidade do Porto

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Resumo

Introdução: A disseção coronária espontânea é uma patologia cada vez mais reconhecida como uma causa importante de síndrome coronária aguda em indivíduos sem os tradicionais fatores de risco para doença arterial coronária, atingindo sobretudo o sexo feminino. Consiste numa disseção da parede da artéria coronária não iatrogénica e não relacionada com trauma. Os quadros clínicos mais comuns incluem dor torácica, dispneia, diaforese e náuseas.

Objetivo: Reunir o conhecimento científico sobre a disseção coronária espontânea, desde a epidemiologia e mecanismos fisiopatológicos, até aos meios auxiliares de diagnóstico, estratégias de tratamento e prognóstico, expondo o conhecimento atual desta patologia ainda pouco esclarecida.

Metodologia: Foi efetuada uma pesquisa entre setembro de 2017 e janeiro de 2018 com o motor de busca PubMed na base de dados MEDLINE, com o uso das palavras-chave (MeSH supplementary concept) “coronary artery dissection, spontaneous”, e com os seguintes filtros: data de publicação nos últimos 5 anos e língua inglesa. Dos resultados obtidos foi realizada uma seleção de acordo com a pertinência dos mesmos para o tema abordado, nomeadamente pelo título da publicação e abstract. Adicionalmente foram utilizados alguns artigos relevantes que serviram como referência bibliográfica aos artigos selecionados na pesquisa.

Desenvolvimento: O uso mais frequente de angiografia coronária e a maior disponibilidade de meios de imagem intracoronária permitiram um aumento considerável nos diagnósticos realizados, pelo que se presume que a sua prevalência fosse anteriormente muito subestimada. A sua fisiopatologia ainda não está totalmente esclarecida, e existem alguns distúrbios vasculares associados com esta doença, sendo a displasia fibromuscular o distúrbio mais relatado e estudado até à data atual.

A abordagem terapêutica desta patologia pode passar por um tratamento conservador ou por uma estratégia de revascularização. O tratamento conservador é o preferido no que se refere a esta patologia, dada a existência de poucos estudos, no âmbito deste tema, relativamente à revascularização. O prognóstico é geralmente bom a curto prazo; contudo, verifica-se uma taxa elevada de recorrência e de outros eventos cardíacos a longo prazo. Conclusão: A disseção coronária espontânea é uma patologia de grande importância, que afeta principalmente uma população sem fatores de risco cardiovascular e na maioria do sexo feminino, com potenciais consequências graves. O seu diagnóstico deve ser estabelecido precocemente para se proceder à correta abordagem terapêutica, e a monitorização no pós-evento torna-se relevante devido ao elevado risco de recorrência.

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ii Palavras-chave: disseção coronária espontânea; síndrome coronária aguda; enfarte agudo do miocárdio

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Abstract

Background: Spontaneous coronary artery dissection is a condition that is increasingly recognized as an important cause of acute coronary syndrome, in individuals without the traditional risk factors for coronary artery disease, affecting predominantly young women. It is defined as a nontraumatic and noniatrogenic separation of coronary the arterial wall. There is a wide range of clinical presentations, and the most common symptoms include chest pain, dyspnea, diaphoresis and nausea.

Objective: This review aims to gather scientific knowledge about spontaneous coronary disease, adressing epidemiology and pathophysiological mechanisms, as well as the diagnostic tools, treatment strategies and prognosis, exposing the current knowledge of this still poorly understood condition.

Methods: A bibliographic search was made using PubMed access to the MEDLINE database, and the MeSH supplementary concept spontaneous coronary artery dissection, restricting the search to the last 5 years and articles written in English. From the results obtained, a selection was made according to the relevance to the topic, namely by the title of the publication and abstract. Additionally, some relevant articles, used as bibliographical references to the articles selected, were also included.

Development: The increasing use of coronary angiography and the wider availability of intracoronary imaging methods allowed a considerable surge in the established diagnosis, presuming that the prevalence of this condition was previously underestimated.

Its pathophysiology is not yet fully understood, and there is evidence of association with underlying arteriopathies, with fibromuscular dysplasia being the most frequently reported. There is lack of evidence on the benefits of revascularization in these patients, and as such, the conservative management is preferred, despite the importance of early percutaneous coronary intervention in patients presenting with acute coronary syndrome from atherosclerotic disease.

Although prognosis is generally good, there is an elevated rate of spontaneous coronary artery dissection recurrence, as well as of other cardiac events.

Conclusions: Spontaneous coronary disease is a condition with potentially severe consequences, and is gaining more recognition as it affects mainly a population without the traditional cardiovascular risk factors, mostly young women. The early diagnosis is crucial to proceed with the correct therapeutic approach. Due to the high risk of recurrence, a close monitorization is required.

Keywords: spontaneous coronary artery dissection; myocardial infarction; acute coronary syndrome;

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iv Lista de siglas

CABG – Coronary artery bypass grafting DCE – Disseção coronária espontânea

DCE-G – Disseção coronária espontânea associada à gravidez DFM - Displasia fibromuscular

EAMCST – Enfarte agudo do miocárdio com elevação do segmento ST EAMSST – Enfarte agudo do miocárdio sem elevação do segmento ST EI – Ecografia intravascular

ICP – Intervenção coronária percutânea

IECA – Inibidores da enzima conversora da angiotensina SCA – Síndrome coronária aguda

TCO – Tomografia de coerência ótica TIMI - Thrombolysis in Myocardial Infarction

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Índice Introdução ... 1 Objetivo ... 1 Metodologia ... 1 Definição e Epidemiologia ... 2 Fisiopatologia ... 2 Apresentação Clínica ... 4 Diagnóstico ... 6 Tratamento ... 7 Terapêutica Conservadora ... 8 Revascularização ... 9 Prognóstico ... 12 Conclusões ... 14 Referências Bibliográficas ... 15

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Introdução

A doença arterial coronária não aterosclerótica é uma causa importante de enfarte agudo do miocárdio em mulheres jovens, sendo a disseção coronária espontânea a principal patologia dentro deste grupo.

A disseção coronária espontânea (DCE) é uma entidade que se pensava ser uma causa rara de síndrome coronária aguda. A primeira descrição da lesão data de 1931 na autópsia de uma mulher de 42 anos que teve morte súbita. [1]

No entanto, com a utilização mais frequente de meios complementares de diagnóstico mais recentes, houve um aumento significativo no número de diagnósticos, começando atualmente a receber mais atenção por parte de estudos clínicos, sobretudo devido às possíveis consequências graves, nomeadamente síndrome coronária aguda, arritmias malignas e morte súbita.[2] O estabelecimento do diagnóstico de DCE é de elevada

importância, na medida em que o tratamento da mesma difere do estabelecido para a doença coronária aterosclerótica [3] tornando-se fundamental a sua deteção precoce, de

modo a otimizar o tratamento e diminuir a morbilidade e mortalidade associadas.

A classificação convencional divide a DCE em aterosclerótica e não aterosclerótica; no entanto, atualmente esta denominação é geralmente usada nos diversos estudos para se referir a doença de origem não-aterosclerótica.[3]

Para efeitos desta revisão, considera-se a DCE de causa não aterosclerótica.

Objetivo

O objetivo da presente dissertação é reunir o conhecimento científico até à data sobre a disseção coronária espontânea de causa não aterosclerótica, desde os dados epidemiológicos, fisiopatologia, apresentação clínica e diagnóstico, até às alternativas de tratamento e prognóstico. Pretende-se clarificar e fazer uma exposição do conhecimento atual sobre esta patologia, que atinge uma população sem os tradicionais fatores de risco cardiovascular, e que tem uma percentagem de subdiagnóstico importante.

Metodologia

Para realizar a presente revisão bibliográfica, foi efetuada uma pesquisa entre setembro de 2017 e janeiro de 2018 com o motor de busca PubMed na base de dados MEDLINE, usando as palavras-chave (MeSH supplementary concept) “coronary artery dissection, spontaneous”, e com os seguintes filtros: data de publicação nos últimos 5 anos (01/01/2013 a 31/12/2017) e língua inglesa. Dos resultados obtidos, foram excluídas posteriormente publicações não relacionadas com o tema, nomeadamente sobre disseção aórtica e outros territórios vasculares não coronários; de seguida foi realizada uma seleção de acordo com a pertinência dos mesmos para o tema abordado, nomeadamente pelo

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título da publicação, abstract e fator de impacto das publicações, com exclusão de alguns casos clínicos não relevantes. Adicionalmente foram utilizados alguns artigos relevantes que serviram como referência bibliográfica aos artigos selecionados na pesquisa, bem como duas revisões bibliográficas, perfazendo um total de 30 artigos.

Definição e Epidemiologia

A disseção coronária espontânea define-se como uma separação da parede da artéria coronária, na ausência de trauma ou causa iatrogénica. Esta rutura na parede arterial pode ter causa aterosclerótica ou não aterosclerótica, sendo que o uso do termo “disseção coronária espontânea” é mais empregue atualmente a natureza não aterosclerótica.[2]

Contrariamente aos já reconhecidos fatores de risco para eventos coronários, como tabagismo, diabetes mellitus, obesidade, dislipidemia e hipertensão, na DCE não se observa esta associação, visto que a maioria dos doentes não apresenta fatores de risco cardiovascular. Há também uma predominância de DCE no sexo feminino [3-7], e a idade

média de apresentação situa-se entre os 45 e 55 anos de idade.[3, 4, 6-8]

A prevalência desta patologia na população em geral é desconhecida, principalmente devido a um subdiagnóstico significativo.[2] Um dos principais fatores contribuidores para o

subdiagnóstico é a dificuldade em reconhecer variantes angiográficas não patognomónicas da DCE. [9] Estudos recentes sugerem que a DCE seja responsável por até 4% de todos

os SCA [10, 11], aumentando notoriamente para 22 a 35% dos SCA em mulheres de idade

inferior a 60 anos [10], demonstrando assim que esta patologia não é tão rara como antes

se pensava.

Fisiopatologia

A fisiopatologia da DCE levanta ainda algumas questões, necessitando de mais estudos para a sua compreensão, mas propõe-se na atualidade dois possíveis mecanismos que conduzem à DCE: pode ocorrer início de uma disseção medial e hemorragia através de uma rutura da camada íntima, criando assim um lúmen falso; ou pode iniciar-se com uma hemorragia da média, com possível origem na rutura dos vasa vasorum, sem ocorrência prévia de uma rutura da íntima.[1] Esta disseção pode ocorrer em qualquer das três

camadas arteriais (íntima, média ou adventícia). Recorrendo a métodos imagiológicos, nomeadamente à angiografia, verifica-se que o primeiro mecanismo se apresenta com múltiplos lúmens radiolucentes, com um lento washout do contraste ou mesmo retenção do contraste no lúmen; a aparência típica de uma rutura na íntima é rara. Já o segundo mecanismo pode surgir angiograficamente como um hematoma intramural criando compressão do lúmen, a mimetizar uma estenose de causa aterosclerótica; nesta situação, é necessário recorrer a meios de imagem intracoronária, como a ecografia intravascular

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3 (EI) ou a tomografia de coerência ótica (TCO), para se estabelecer definitivamente este diagnóstico.[1] A presença de arteriopatia subjacente torna a parede arterial mais frágil,

facilitando a propagação da disseção quer anterógrada quer retrógrada, o que não acontece na presença de aterosclerose, na qual a atrofia medial e a cicatrização limitam a sua propagação.[2]

A sua etiologia é desconhecida, presumindo-se que seja multifatorial. Está frequentemente associada a uma arteriopatia predisponente à lesão em causa, bem como a fatores genéticos e fatores hormonais, entre outros. No estudo de 2014 de Saw et al, observou-se que apenas 20% tinham causa idiopática.[4] A principal associação relatada é com o sexo

feminino.[3-7] Adicionalmente, existe uma associação relevante com a gravidez, relatada em

vários estudos [4, 5, 12], o que sugere um possível papel das hormonas sexuais femininas

nesta patologia. Contudo, os casos de DCE associada à gravidez incluem menos de 5% dos casos de DCE.[13]

Presume-se que os picos de estrogénio e progesterona durante a gravidez, e particularmente a sua repetição nas mulheres multíparas, podem causar alterações estruturais com degeneração cumulativa da média, devido à síntese reduzida de colagénio e aumento do conteúdo de mucopolissacarídeo, que geram fragilidade da túnica média.[13]

Adicionalmente, as alterações fisiológicas da gravidez, especificamente o aumento do débito cardíaco e os efeitos hemodinâmicos do stress do parto podem também precipitar uma DCE quando existe já uma arteriopatia prévia.[13]

Entre as várias arteriopatias relatadas em casos clínicos, a mais relevante à data atual é a displasia fibromuscular (DFM).[4] Esta patologia caracteriza-se por uma doença vascular

não aterosclerótica e não inflamatória, que pode afetar qualquer leito arterial, e que se traduz em estenose, tortuosidade, aneurisma ou disseção do vaso. Classifica-se em diferentes subtipos, sendo que o mais comum é o medial; este subtipo origina na angiografia um padrão típico em contas de rosário, correspondendo a áreas de estenose alternadas com áreas dilatadas.[14]

Vários estudos reportam uma prevalência de DFM relevante; na coorte de 168 doentes de Saw et al., 72% tinham DFM concomitante [4]; no estudo de Luong et al, a DFM estava

presente em 70,9% dos doentes [3]; no estudo de Nakashima et al., de 25 doentes

submetidos a rastreamento de DFM, obteve-se uma prevalência de 20%.[7]

Numa coorte de 50 doentes estudada por Saw et al., em 86% dos doentes identificou-se a presença de DFM em pelo menos um território vascular não coronário, sendo que 42% exibiam em mais do que uma região vascular.[14]

Na pesquisa de fatores precipitantes, surgem sobretudo duas situações, stress emocional e exercício físico extremo, presentes na maioria dos doentes, bem como terapêutica hormonal e atividades “valsava-like”, nomeadamente o parto/gravidez e tosse. [4, 7, 8, 15]

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Na coorte de Saw et al., o stress emocional precedendo a lesão foi identificado em 40,5% dos doentes; 24,4% referiram a realização de exercício físico a preceder o aparecimento de dor torácica. [4]

As atividades que provocam uma intensa ação “valsalva-like” causam um aumento transitório da pressão intratoracoabdominal, a qual é propagada como tensão de cisalhamento na parede arterial das coronárias. [4]

De modo distinto, presume-se que o stress emocional seja precipitante fisiopatológico relacionado com as catecolaminas de stress; mais especificamente, supõe-se que a elevação das catecolaminas provoque um aumento da contratilidade do miocárdio ou de vasospasmo, aumentando consequentemente a tensão de cisalhamento arterial, o que predispõe à rutura da camada íntima, ou disrupção dos vasa vasorum.[4]

A influência hormonal, para além dos casos específicos associados a gravidez, foi relatada em alguns casos clínicos pontuais, particularmente pela ocorrência no período perimenopausa, pelo uso de ACO ou terapia hormonal de substituição [4], e tratamento com

corticoterapia.[16]

Apresentação clínica

A manifestação mais comum de uma disseção coronária espontânea é sob a forma de síndrome coronária aguda [4, 6-8, 14], tendo alguns estudos 100% dos doentes com esta

apresentação.[4, 7, 14] A maioria dos casos apresenta também elevação do valor sérico das

enzimas cardíacas [4, 6, 7], contudo, este valor pode estar normal aquando da

apresentação.[17]

A predominância de EAMCST ou EAMSST varia consoante os estudos. Num estudo prospetivo realizado por Saw et al., todos os doentes se apresentaram com SCA com aumentos das troponinas, sendo que ¼ dos doentes se apresentou com EAMCST, e os ¾ restantes com EAMSST.[10] Na análise realizada por Luong et al, o EAMSST foi o modo de

apresentação em 76%.[3] Na análise de Lettieri et al., 49,2% dos doentes teve EAMCST, e

apenas 40,3 % tiveram EAMSST [6]; no estudo japonês de Nakashima et al. de 63 doentes

com DCE, 87% apresentaram EAMCST, um valor bastante superior aos 13% que se apresentaram com EAMSST.[7]

As arritmias ventriculares, nomeadamente a taquicardia ou a fibrilhação ventricular, são um modo de apresentação menos frequente, com 3 a 11% consoante os estudos [4, 5], assim

como o choque cardiogénico, em até 5% dos doentes. [4, 6]

A dor torácica é o sintoma mais frequentemente reportado nos vários estudos. [3, 8, 14]

No estudo recente de 196 pacientes com DCE realizado por Luong et al., foram analisados diversos parâmetros, como sintomas na apresentação, a sua duração, instabilidade hemodinâmica, arritmias ventriculares, e desconforto torácico aquando da angiografia.

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5 Verificou-se que a dor torácica era o sintoma de apresentação mais frequente, estando presente em 96% dos doentes; é de realçar que cerca de um terço dos doentes tinha dor no momento da apresentação, requerendo intervenção médica imediata. [3]

Os restantes sintomas mais comuns, por ordem decrescente, incluem irradiação da dor para os membros superiores, náuseas ou vómitos, irradiação para o pescoço, diaforese, dispneia, e dor dorsal. Outra sintomatologia menos frequente, incluindo tonturas, taquicardia ou fibrilhação ventricular, fadiga, cefaleia e síncope, foi reportada em menos de 20%.[3]

Considerando as diferenças no perfil de fatores de risco destes doentes, comparativamente à população com doença aterosclerótica, os sintomas na apresentação poderão também ser mais atípicos.[3]

A principal artéria afetada é, na maioria dos casos, a descendente anterior esquerda [4-6, 8, 18]; os territórios mais afetados são, por ordem decrescente, o da artéria descendente

anterior esquerda e respetivos ramos septais e diagonais, seguindo-se o território da artéria circunflexa e marginal esquerda; coronária direita e seus ramos (marginal direita, descendente posterior e ramos posterolaterais), e menos frequentemente, o tronco comum da coronária esquerda. [4-7] Na análise de Saw et al., observou-se que os segmentos

arteriais afetados são maioritariamente os médios e distais, com apenas 8,3% das disseções tendo atingimento proximal. [4]

A ocorrência de doença multivaso também é reportada em até 15% dos casos. [4, 6-8, 10]

A gravidez é um dos fatores influenciadores do modo de apresentação clínica. De acordo com o estudo de Tweet et al., entre as doentes com DCE associada à gravidez (DCE-G) houve uma maior frequência de EAMCST, quando comparadas a doentes com DCE não relacionada com a gravidez. Em termos de avaliação da função cardíaca, a fração de ejeção do VE média na altura do diagnóstico era inferior na DCE-G (46 ± 17% vs. 53 ± 7%; p = 0.0003). [12]

Nos achados imagiológicos, verificou-se que na DCE-G o envolvimento mais frequentemente reportado foi da artéria coronária esquerda descendente anterior (70%), seguindo-se a coronária direita (20%) e a circunflexa esquerda (15%). A doença multi-vaso observou-se também com maior frequência neste grupo, estando presente em 33% das doentes. [12]

Diagnóstico

É de grande importância que o diagnóstico de DCE seja estabelecido precocemente, devido à possibilidade de uma terapêutica diferente daquela que está indicada para a doença aterosclerótica. [2, 3, 5]

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A hipótese de DCE deve ser investigada sempre que uma doente jovem, sem aparentes fatores de risco, se apresente com uma síndrome coronária aguda ou arritmia ventricular.[19]

O primeiro exame auxiliar de diagnóstico nesta patologia é a angiografia coronária, que é uma técnica de imagem amplamente disponível, usada como exame imagiológico de primeira linha em doentes que se apresentam com síndrome coronária aguda.[2]

• Classificação por angiografia

Por via da angiografia coronária, é possível distinguir e classificar 3 diferentes tipos de DCE: o tipo 1 consiste na aparência patognomónica de contraste na parede arterial, surgindo múltiplos lúmens radiolucentes; o tipo 2 designa uma estenose difusa de gravidade e comprimento variáveis (tipicamente >20 mm), e com alterações abruptas no calibre da artéria. Este tipo tem duas subcategorias, 2A e 2B, que se caracterizam por estreitamento entre dois segmentos arteriais normais proximal e distal, ou estreitamento que se estende até ao final da artéria no ápice, respetivamente; por último, o tipo 3 consiste em estenose focal ou tubular (geralmente <20 mm), que mimetiza aterosclerose, necessitando assim de confirmação por meios de imagem intracoronária.[2]

Contrabalançando com a sua ampla disponibilidade, a angiografia coronária apresenta algumas limitações, nomeadamente a demonstração de uma imagem bidimensional, não sendo possível observar a parede arterial; esta limitação é uma das causas do subdiagnóstico significativo desta patologia. Este problema foi recentemente atenuado com a maior utilização de técnicas de imagem intracoronária, nomeadamente a EI e a TCO.[2]

A TCO é uma técnica imagiológica invasiva com recurso a radiação infravermelha, que produz imagens intracoronárias com uma resolução espacial superior, revelando-se melhor na visualização de ruturas da íntima, trombos intraluminais, falsos lúmens, e hematomas intra-murais. Contudo, tem como limitações a sua baixa penetração ótica, podendo não revelar a profundidade verdadeira do hematoma intra-mural.[1]

A EI tem uma resolução adequada para visualização de hematomas intra-murais e diferenciar verdadeiros de falsos lúmens, tendo maior profundidade de visualização dos vasos com melhor penetração dos ultrassons, o que permite uma avaliação melhorada da extensão do hematoma.[1] Todavia, a avaliação da extensão e profundidade parece não ter

relevância clínica.[2]

Assim, globalmente, a TCO é o método de preferência, pela superioridade e facilidade na visualização de hematomas intra-murais, disrupção da íntima, e duplificação de lúmens, bem como na avaliação do posicionamento de stents, sendo muito útil na eventualidade de intervenção posterior. [2]

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7 As técnicas de imagem intracoronária, apesar de oferecerem mais detalhe e auxílio na deteção de disseção, têm um risco superior de provocar extensão da disseção pelo cateter, extensão hidráulica pela injeção de contraste na TCO, oclusão induzida pelo cateter, ou ainda disseção iatrogénica.[2]

Relativamente aos tipos de disseção visualizados por meio de angiografia, verifica-se em vários estudos que o tipo 2, correspondente ao padrão de estenose ligeira difusa, é a manifestação angiográfica mais comum [4, 7, 9, 10], seguindo-se o tipo 1, com registos de até

43% [7], e por fim, menos frequentemente, o tipo 3. [4, 7, 10] Particularmente no tipo 2, no

estudo de Saw et al com meios de imagem intracoronária, a variante mais observada foi o subtipo 2A, com 10 das 16 disseções de tipo 2 estudadas. [9]

Nos casos de doença associada à gravidez, numa análise de 13 doentes, Cade et al. verificaram a presença do mesmo padrão de distribuição, com o tipo 2 a ser o mais observado, e sem lesões do tipo 3 naquele grupo de doentes.[20] Esta tendência de

frequência dos tipos de lesões demonstra que o tipo patognomónico (tipo 1) corresponde a menos de metade de todos os casos, o que justifica o subdiagnóstico da DCE pela dificuldade em reconhecer os restantes tipos na angiografia.[9]

Buccheri et al. desenvolveram um sistema de pontuação para auxílio no diagnóstico e abordagem da DCE (anexo 1). Este sistema aplica-se a doentes que se apresentam com síndrome coronária aguda, dor torácica, alterações no eletrocardiograma, alterações no ecocardiograma, ou uma variação de 3 valores no nível sérico da troponina, e baseia-se na atribuição de 1, 2 ou 3 pontos a diversos fatores clínicos e angiográficos que levantem a suspeição de DCE, nomeadamente, sexo feminino (1 ponto), doença do tecido conjuntivo (2 pontos), história de espasmo coronário/ SCA prévio (3 pontos), entre outros. Se a pontuação for igual ou superior a 3, é recomendada a realização de tomografia de coerência ótica ou ultrassonografia intravascular para exclusão do diagnóstico de DCE.[21]

Tratamento

A DCE continua na atualidade sem uma estratégia terapêutica otimizada, devido à sua heterogeneidade clínica, e sobretudo devido à inexistência de ensaios clínicos randomizados de comparação de estratégias de revascularização com abordagem conservadora.[2] Apesar da abordagem recomendada para SCA ser a de revascularização

precoce, não existem estudos que avaliem os resultados deste procedimento na DCE, visto que os mecanismos fisiopatológicos e história natural diferem de forma significativa dos correspondentes a SCA de causa aterosclerótica. Assim, a escolha da modalidade de tratamento é feita individualmente, em vez de ser seguida uma abordagem padronizada. Diversos estudos apoiam uma terapêutica específica para cada caso, com base nas suas características clínicas e angiográficas, a qual se revelou como uma estratégia razoável de

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tratamento desta patologia.[6] Entre os fatores preponderantes na decisão, estão a

apresentação clínica, a persistência da isquemia, as características da disseção, o fluxo sanguíneo coronário, e a extensão de miocárdio em risco.[22]

A terapêutica conservadora é a mais usada; os doentes submetidos a terapêutica de revascularização demonstraram ter um perfil de risco maior, com percentagem mais elevada de EAMCST, FE do ventrículo esquerdo reduzida, e maior necessidade de fármacos vasoativos [22]; a estratégia invasiva revelou-se também de maior benefício nos

casos com score Thrombolysis in Myocardial Infarction (TIMI) < 2, envolvimento da extremidade proximal do vaso [18, 22] ou envolvimento multivaso. [18]

• Terapêutica conservadora

Os objetivos do tratamento médico são, para além do alívio sintomático, a melhoria dos resultados a curto e longo prazo, e a prevenção de DCE recorrente. A escassa quantidade de estudos e de evidência levam a que este tópico esteja ainda pouco desenvolvido na literatura, sendo as orientações atuais baseadas em experiência clínica, observação de casos clínicos, e também baseadas nas abordagens a síndromes coronárias agudas de outras causas.[2]

Anti-agregação plaquetária e anticoagulação

O benefício do uso de agentes antiagregantes na DCE é ainda desconhecido; não obstante, a aspirina é usada sistematicamente como terapêutica de curto e longo prazo desta patologia, com base na evidência existente do seu uso nos SCA e na prevenção de doença coronária aterosclerótica, conjuntamente com o seu perfil de baixa incidência de efeitos colaterais.[1, 2]

A dupla antiagregação, obtida com a adição de clopidogrel, pode ser benéfica, na medida em que a rutura da íntima pode induzir um estado protrombótico, além de que reduziria a compressão do lúmen verdadeiro causada por trombo no lúmen falso; assim, o clopidogrel é usado nos primeiros 12 meses após a DCE, mesmo na ausência de evidência que apoie esta medida.[2] Nos doentes submetidos a terapêutica de revascularização, nomeadamente

intervenção coronária percutânea (ICP) com colocação de stent, o tratamento é feito com base nas recomendações para SCA de outras causas; deste modo, é recomendado o uso de terapêutica dupla de anti-agregação, geralmente com aspirina e clopidogrel, com duração mínima de um ano, seguindo-se de um período indefinido de toma apenas de aspirina. [10]

O uso de outros fármacos desta categoria em doentes tratados de forma conservadora não é recomendado, visto não haver ainda evidência que comprove o seu benefício.

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9 Particularmente, os inibidores da glicoproteína IIb/IIIa têm maior potência e maior risco hemorrágico, levando a um risco potencial de extensão da disseção. [2]

De forma semelhante, o uso de anticoagulantes, que faz parte da abordagem intra-hospitalar dos SCA, tem também o potencial risco de agravamento da disseção, não havendo até à data nenhuma evidência de benefício do seu uso na DCE. O seu uso pode ser considerado de forma aguda durante a revascularização, e de forma crónica nas indicações já estabelecidas para anticoagulação, como tromboembolismo.[2]

Bloqueadores beta-adrenérgicos

Na recente análise de Saw et al., verificou-se que o uso destes agentes se mostrou benéfico nos doentes com DCE, à semelhança dos seus efeitos nas SCA de etiologia aterosclerótica. Os autores propõem que a redução da contratilidade miocárdica e da pressão arterial, pelo efeito beta-bloqueador, levam a uma redução no stress da parede arterial coronária, exercendo um efeito protetor contra a disseção, sobretudo na presença de fatores de stress adicionais, tanto físicos como emocionais. [10]

Estatinas e Inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA)

A utilidade das estatinas e dos IECA nestes doentes não está ainda comprovada e necessita de mais estudos para a sua inclusão no tratamento. Atualmente está em decurso um estudo denominado SAFER-SCAD (Statin and Angiotensin-converting Enzyme Inhibitor on Symptoms in Patients With SCAD), iniciado em 2014, que inclui cerca de 40 doentes, e com término previsto em 2024. [10]

No estudo mais recente realizado por Saw et al, não foi demonstrada qualquer correlação entre o uso de estatinas e recorrência da doença.[10] Considerando que a maioria dos

doentes com DCE não tem fatores de risco vascular significativos, o uso de estatinas não é geralmente recomendado, excetuando as recomendações, já conhecidas, de uso na existência de doença aterosclerótica.[10] Os IECA têm atualmente apenas recomendação

nos doentes com DCE que apresentem disfunção ventricular esquerda significativa, em semelhança ao procedimento nos enfartes agudos do miocárdio por outras causas.[2]

• Revascularização

A realização de intervenções com o intuito de revascularização é uma opção controversa na DCE, dada a natureza da lesão; assim, este procedimento é reservado para casos específicos, entre os quais, persistência ou recorrência de isquemia, instabilidade hemodinâmica, arritmias ventriculares [2], localização da disseção na extremidade proximal

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tratamento é a ICP se a anatomia do vaso for favorável a esta intervenção, ou, em alternativa, realização de CABG.[2]

ICP

Diversos estudos corroboram o facto de a ICP estar associada a um risco aumentado de complicações nos casos de DCE.

No estudo realizado por Lettieri et al., verificou-se que a ICP teve um sucesso inferior ao esperado.[6] Foi observada uma tendência a maior incidência de eventos cardíacos major

adversos nos doentes submetidos a revascularização, os quais tiveram uma taxa de reintervenção para revascularização bastante superior. A repetição do procedimento deveu-se a trombose de stent, recorrência da disseção noutros vasos, progressão da disseção distalmente ao stent colocado, ou reestenose.[6] Em concordância, num estudo

realizado por Tweet et al., observou-se que os doentes submetidos a revascularização tinham uma probabilidade superior de requerer CABG de emergência, principalmente por falência da ICP. De acordo com os critérios de insucesso de ICP, que têm como base a presença de estenose residual, este estudo demonstrou uma percentagem de falência de 53%.[5]

Os resultados apresentados por Nakashima et al., por outro lado, demonstraram uma taxa elevada de sucesso da ICP (91%). No entanto, observou-se que a taxa de recorrência era semelhante no grupo de revascularização e no grupo tratado conservadoramente, com recorrência no mesmo vaso no grupo submetido a revascularização; os doentes tratados com terapêutica médica não apresentaram recorrência no mesmo local da primeira disseção.[7]

Estas observações sugerem que a resolução espontânea da parede arterial pode estar prejudicada, de forma não intencional, devido à realização de intervenções coronárias.[7]

Os resultados pouco favoráveis da ICP têm por base as dificuldades inerentes às características anatómicas das artérias coronárias nestes doentes em geral, nomeadamente a fragilidade dos vasos devida a arteriopatias existentes. Consequentemente estão predispostas a disseção iatrogénica ou extensão da disseção durante a realização da ICP.[2]

Numa tentativa de minimizar os riscos e melhorar os resultados da ICP, podem ser adotadas algumas medidas, como o uso de TCO/EI para garantir acesso ao lúmen verdadeiro e para verificar o correto posicionamento do stent. Outra possível abordagem inclui o uso de stents bioabsorvíveis, os quais produzem o benefício de um stent convencional, reduzindo o risco posterior de deslocação do mesmo e de desenvolvimento de trombose do stent.[23, 24] Neste contexto, Ielasi et al. realizaram uma análise a doentes

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11 avaliar a possibilidade de implantação bem sucedida, com uma estenose residual de diâmetro inferior a 30% no segmento tratado e com fluxo final TIMI 3. Verificou-se que todos os stents foram aplicados no local alvo de forma bem-sucedida, sem intercorrências à data de alta hospitalar nem num período de follow-up de 18 meses.[25]

Foi também reportado um caso tratado com fenestração da coronária através de angioplastia com “cutting balloon”, para descompressão do hematoma intramural para o lúmen verdadeiro, que revelou resultados positivos.[26]

CABG

A CABG é uma modalidade terapêutica que é escolhida, no contexto de DCE, em doentes com disseção do tronco comum ou disseções proximais, após insucesso técnico da tentativa de ICP, complicação de ICP realizada, ou quando a ICP não pode ser realizada.[2]

Não obstante vários resultados positivos obtidos em escassos casos clínicos e pequenas séries, deve ser considerado um possível viés de seleção de doentes com anatomia favorável a uma intervenção deste tipo. O estudo realizado por Tweet et al. revelou um número elevado (11/16) de falência de enxertos, tanto venosos como arteriais. Uma possível explicação pode ser a de uma resolução subsequente da disseção do vaso nativo, com consequente fluxo competitivo com o enxerto. Verificou-se também que a realização de CABG não era protetora contra a recorrência de eventos.[5] Contudo, em casos de risco

de vida, a CABG surge como uma opção fundamental para estabelecer de novo o fluxo coronário e minimizar a perda de miocárdio por isquemia em situações de emergência.[4, 5]

Nos casos de DCE-G, a terapêutica de revascularização é muitas vezes considerada, dado que as doentes se apresentam frequentemente com instabilidade hemodinâmica, sintomas de isquemia decorrente, e envolvimento do tronco comum.[13]

No estudo de Tweet et al., 41% das pacientes receberam tratamento conservador, tendo, no entanto, maior probabilidade de evidenciar progressão com necessidade de revascularização, em comparação com os casos não associados à gravidez.[12] A ICP é a

primeira escolha, tendo, porém, as limitações já descritas. Neste estudo, a ICP teve percentagem de insucesso considerável em ambos os grupos analisados (35% na DCE-G vs. 20%). [12]

No estudo italiano de Lettieri et al, verificou-se que nos casos de apresentação, quer de SCA sem elevação do segmento ST, quer de SCA com elevação do segmento ST transitória, e com TIMI de grau 2 ou 3, em vasos de pequeno ou médio calibre, a estratégia conservadora revelou resultados excelentes a curto prazo. Por outro lado, na oclusão de vasos de grande calibre, a medida a tomar deve ser revascularização de imediato. Esta

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estratégia seletiva resultou em menor percentagem de casos com necessidade de mudança de abordagem conservadora para revascularização a nível intra-hospitalar.[6]

Acerca da estratégia de tratamento, para doentes assintomáticos com DCE da porção distal do vaso, ou com um diâmetro < 3.0 mm, Buccheri et al propõem a consideração de terapêutica conservadora como primeira linha, ou o uso de uma das seguintes opções: stent bioabsorvível, ou stent ou balão com fármacos, consoantes as características clínicas e angiográficas do doente.

Nos casos de lesão na porção média ou proximal do vaso, diâmetro igual ou superior a 3.0 mm, ou se o doente continua sintomático ou hemodinamicamente instável, a opção deverá ser um stent bioabsorvível.

Posteriormente, é fundamental o acompanhamento próximo dos doentes para avaliação do risco de recorrência e garantir a resolução completa da lesão da artéria. [21]

Prognóstico

Dos vários estudos que reportam uma reavaliação da lesão por meio de angiografia coronária, verificou-se que a maioria dos doentes demonstrou “cura” angiográfica várias semanas após tratamento da lesão de modo conservador.[4, 5, 7]

Num estudo realizado por Saw et al, em 2014, verificou-se que 100% dos 79 doentes com diagnóstico de DCE, tratados de forma conservadora, teve resolução angiográfica da disseção no follow-up após 4 semanas.[4] Da mesma forma, Nakashima et al. e Tweet et

al., relataram uma percentagem de resolução angiográfica de 68 e 73%, respetivamente, nos doentes tratados conservadoramente que repetiram posteriormente angiografia no follow-up.[5, 7]

Segundo a análise realizada por Lettieri et al., o prognóstico mostrou-se em geral favorável tanto a curto como a longo prazo, com uma sobrevivência aos 6 anos de 94%. [6] Apesar

da baixa taxa de mortalidade intra-hospitalar (<5%)[4, 6, 8], diferentes estudos demonstram

que a DCE é uma patologia com uma importante percentagem de eventos cardiovasculares adversos a longo prazo, com ocorrências em até 30% dos doentes no follow-up aos três anos [7]; entre estes, salientam-se recorrência de enfarte agudo do miocárdio, com ou sem

recorrência de DCE, insuficiência cardíaca congestiva, e acidente vascular cerebral. O evento mais reportado no follow-up de três e de dez anos é a recorrência de EAM por DCE recorrente.[4, 5, 7, 10] No estudo de Nakashima et al, a taxa de recorrência foi de 27%, dos

quais 42% aconteceram nos primeiros 30 dias após o episódio de DCE.[7] Em contraste,

Degrauwe et al. reportaram em 2016 um caso de uma doente de 52 anos, sem evidência de DFM, com múltiplas recorrências em diferentes localizações das coronárias, com a

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13 última recorrência a acontecer nove anos após o primeiro episódio [27], revelando a

importância de um acompanhamento e monitorização a longo prazo.

Adicionalmente, um estudo realizado por Eleid et al, que incluiu 246 doentes, demonstrou que a tortuosidade coronária, presente com elevada prevalência na população com DCE (78% vs 17 no grupo de controlo), está associada a um risco maior de recorrência da disseção. [28]

Uma das medidas fundamentais do tratamento de um doente que sofreu uma síndrome coronária aguda é a reabilitação cardíaca. Deste modo, também os doentes com DCE têm critérios para esta modalidade, verificando-se, no entanto, que existem diferenças no encaminhamento destes doentes, comparativamente aos casos de síndrome coronária aguda de causa aterosclerótica.[29] Na análise de Krittanawong et al., a principal justificação

apresentada foi a de ausência de recomendação para programas de reabilitação cardíaca, sobre a qual os autores sugerem que se poderá dever a uma perceção de que o exercício físico pode ser prejudicial, uma vez que a DCE está associada a exercício físico intenso. Por outro lado, observou-se que outra das razões para a não realização do programa de reabilitação cardíaca é a não correspondência do mesmo às necessidades dos doentes, que de um modo geral eram fisicamente ativos antes da lesão e sem fatores de risco aterosclerótico.[29] Os estudos de Krittanawong et al. e Chou et al. demonstram que a

reabilitação cardíaca é uma estratégia segura de reintrodução do exercício físico nestes doentes, com benefícios físicos e psico-sociais. [29, 30] O estudo de Chou et al. foi o primeiro

a avaliar um programa específico de reabilitação para doentes que sofreram DCE, que consistiu numa abordagem multidisciplinar com inclusão de exercício, aconselhamento psicossocial, educação alimentar, e grupo de apoio entre pares. Os resultados demonstraram uma taxa mais baixa de eventos adversos cardiovasculares major em comparação com doentes que não participaram no programa de reabilitação, bem como uma melhoria na capacidade física e no bem estar psicossocial. [30]

Contudo, é necessário que surjam mais estudos que permitam uma maior adequação dos programas de reabilitação cardíaca aos doentes que sofreram de DCE.

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Conclusões

A DCE de causa não aterosclerótica é uma causa pouco frequente de síndrome coronária aguda, que afeta sobretudo o sexo feminino, sendo atualmente ainda subdiagnosticada. Contrariamente aos estudos mais antigos, verifica-se atualmente que a DCE não é na sua maioria idiopática, e que está muitas vezes relacionada com fatores predisponentes, como determinadas arteriopatias, bem como a diversos fatores precipitantes, incluindo o exercício físico intenso e o stress emocional.

Devido à natureza da lesão, a abordagem conservadora é a mais recomendada na atualidade, até que surjam mais estudos para comparação de abordagem conservadora e revascularização, com resultados a curto e sobretudo a longo prazo.

Apesar de ter bom prognóstico na fase aguda, a recorrência é frequente, pelo que se torna imprescindível a monitorização subsequente destes doentes. É essencial que haja maior atenção para esta doença, dada a dificuldade em estabelecer o diagnóstico e os riscos associados ao tratamento preconizado para os restantes casos de SCA aterosclerótica.

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17 Anexos

Referências

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