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Da creche ao jardim-de-infância: Organização pedagógica e continuidade educativa

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Academic year: 2021

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ATAS DO

I SEMINÁRIO

INTERNACIONAL

VOL. II – COMUNICAÇÕES LIVRES

EDUCAÇÃO, TERRITÓRIOS E

DESENVOLVIMENTO HUMANO

Porto

Universidade Católica Portuguesa

Faculdade de Educação e Psicologia

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Título: Educação, Territórios e Desenvolvimento Humano: Atas do I Seminário Internacional, Vol. II – Comunicações Livres Organizadores: Joaquim Machado (coord.), Cristina Palmeirão, Ilídia Cabral, Isabel Baptista, Joaquim Azevedo, José Matias Alves,

Maria do Céu Roldão

Autores: Adérito Barbosa, Adorinda Gonçalves, Alcina Martins, Alexandre Ventura, Almerinda Coutinho, Amelia Alberto, Amélia Simões

Figueiredo, Ana Carita, Ana Certã, Ana Cristina Castedo, Ana Cristina Tavares, Ana Isabel Vigário, Ana Maria Calil, Ana Melo, Ana Mouta, Ana Paulino, Ana Pereira, Ana Santos, Andreia Gouveia, Andreia Vale, Angélica Cruz, Angelina Sanches, António Andrade, António Neto-Mendes, António Oliveira, Bruna Ribas, Cândido Miguel Francisco, Carla Alves, Carla Baptista, Carla Cibele Figueiredo, Carla Guerreiro, Carolina Gomes, Carolina Mendes, Cátia Carlos, Christiane Barbato, Cicera Lins, Clara Freire da Cruz, Clara Gomes, Cláudia Gomes, Cláudia Miranda, Conceição Leal da Costa, Cristiana Madureira, Cristina Bastos, Cristina Palmeirão, Cristina Pereira, Daniela Gonçalves, Diana Oliveira, Diogo Esteves, Diogo Esteves, Elisabete Pinto da Costa, Elvira Rodrigues, Elza Mesquita, Emilia Noormahomed, Eva M. Barreira Cerqueiras, Evangelina Bonifácio, Fernando Azevedo, Fernando Sousa, Filipa Araújo, Filipe Couto, Filipe Matos, Flávia Freire, Florbela Samagaio, Francisca Izabel Pereira Maciel, Giane Maria da Silva, Giovanna Costa, Graça Maria Pires, Helena Castro, Helena Correia, Henrique Gomes de Araújo, Ilda Freire, Ilídia Cabral, Isabel Cavas, Isabel Machado, Isabel Rabiais, Isabel Ramos, Isabel Santos, Isilda Monteiro, Joana Fernandes, Joana Isabel Leite, Joana Sousa, João Ferreira, João Formosinho, Joaquim Azevedo, Joaquim Machado, José Almeida, José Pedro Amorim, José Graça, José Matias Alves, José Pacheco, Juan Carlos Torrego Seijo, Laura Rego Agraso, Liliana Costa, Luís Castanheira, Luísa Moreira, Luísa Ribeiro Trigo, Luiz Filipe Machado, Macrina Fernandes, Magda M. R. Venancio, Mahomed Ibraimo, Márcia Leal, Margarida Quinta e Costa, Maria da Conceição Azevedo, Maria da Conceição Martins, Maria da Graça Ferreira da Costa Val, Maria de Lurdes Carvalho, Maria do Céu Roldão, Maria Helena Martinho, Maria Ivone Gaspar, Maria João de Carvalho, Maria José Rodrigues, Maria Lopes de Azevedo, Maria Lucimar Jacinto de Sousa, Marina Pinto, Marli Andre, Marta Garcia Tracana, Martins Vilanculos, Natália Costa, Nazaré Coimbra, Neusa Ambrosetti, Oscar Mofate, Paulo Carvalho, Paulo Gil, Raquel Mariño Fernández, Raul Manuel Tavares de Pina, Regina Coelli Gomes Nascimento, Renilton Cruz, Rosangela Gonçalves de Oliveira, Rosemar Lemos, Rui Amado, Rui Castro, Rui Cordeiro da Eira, Sandra Almeida, Sérgio Ferreira, Sílvia Amorim, Sofia Bergano, Sofia Oliveira Martins, Sónia Soares Lopes, Susana Gastal, Suzana Ribeiro, Teresa Guedes, Vitor Ribeiro, Vivian Assis, Vivianne Lopes, Zita Esteves

Design e Paginação: Departamento de Comunicação e Relações Públicas, Universidade Católica Portuguesa – Porto Colaboração: Cristina Crava, Francisco Martins

ISBN: 978-989-99486-0-0

Editor: Universidade Católica Portuguesa. Faculdade de Educação e Psicologia Local e data: Porto, 2015

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DA CRECHE AO JARDIM-DE-INFÂNCIA:

Organização Pedagógica e Continuidade Educativa

MACRINA FERNANDES

1

(

macrina.fernandes@colegioefanor.pt

) & JOAQUIM MACHADO

2

(

jmaraujo@porto.ucp.pt

)

1 Colégio Efanor, Porto, Portugal

2 Universidade Católica, Faculdade de Educação e Psicologia, Porto, Portugal

RESUMO

Damos conta de um estudo de natureza qualitativa que estamos a desenvolver numa instituição privada urbana no norte de Portugal, recorrendo à observação participante, à análise de documentos não pessoais produzidos pela escola, a entrevistas à educadora e a crianças e à entrevista de grupo focal aos pais. São objetivos do estudo: caracterizar a organização e gestão do trabalho pedagógico na creche e no jardim-deinfância, analisar como os documentos formais da escola preveem a articulação curricular regulamentada, analisar e compreender as perspetivas dos diversos atores na articulação curricular efetivada, identificar facilidades e constrangimentos percecionados pelos atores no processo de transição entre os dois ambientes educativos e, por fim, reconhecer efeitos da articulação na continuidade educativa. Os dados recolhidos apontam para uma estruturação curricular regulamentada convergente e, na perspetiva dos atores, efetivada em sala. A organização convergente e a gestão do trabalho pedagógico da creche e do jardim-de-infância potenciam uma passagem sustentada de um nível educativo para o outro, contribuindo para o desenvolvimento e o sucesso educativo das crianças.

Palavras-chave: Creche, jardim-de-infância, organização pedagógica, continuidade educativa

ABSTRACT

We shall present a qualitative study under development in a private urban institution in the north of Portugal, through participant observation, the analysis of non-personal documents issued by the school, interviews to teachers and children, and focus groups with parents. The areas of study are the following: the definition of the organisation and management of the pedagogical work of daycare and kindergarten, the analysis of how formal documents within the school foresee a regulated curriculum alignment, the analysis and understanding of the perspectives of the various agents involved in the effective curriculum alignment, the identification of leniency and constraints as perceived by those involved in the transition process between both educational environments, and finally the identification of the effects of the alignment in educational continuity. The data collected reveals a converging regulated curriculum alignment which, according to those involved in it, takes place in the classroom. The converging organisation and the management of the pedagogical work of daycare and kindergarten enhance the sustainable evolution from one educational level to the next, thus contributing to the development and educational success of the children.

Keywords: daycare, kindergarten, pedagogical organisation, educational continuity.

B11

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1. INTRODUÇÃO

As atuais políticas para a educação em Portugal refletem tendências que se vivem a nível mundial nos planos educativo, social e económico. A criação de um vasto sistema de organizações internacionais de natureza intergovernamental, tanto no plano das Nações Unidas como no plano da cooperação económica num determinado espaço geográfico (como a OCDE), deu forte impulso à internacionalização das problemáticas educacionais. A enunciação das políticas educativas, particularmente nos países da periferia e da semiperiferia, do sistema mundial, começou a depender, cada vez mais, da legitimação e da assistência técnica das organizações internacionais. As constantes iniciativas, estudos e publicações das organizações internacionais desempenham um papel decisivo na normalização das políticas educativas nacionais, estabelecendo uma agenda que fixa prioridades, as formas como os problemas se colocam e equacionam, e que constituem uma forma de fixação de um mandato, mais ou menos explícito, conforme a centralidade dos países (Teodoro, 2001).

No quadro das políticas educativas ao nível da administração das escolas, Barroso (2006) refere o conceito de regulação utilizando-o para descrever dois tipos de fenómenos diferenciados, mas correlativos: os modos como são produzidas e aplicadas as regras que orientam a ação dos atores e os modos como esses mesmos atores se apropriam delas e as renovam. O primeiro coloca em evidência as dimensões de coordenação, controlo e influência exercidas pelos detentores de uma autoridade legítima, a que define de regulação institucional, normativa e de controlo. O segundo trata de uma regulação situacional, ativa e autónoma, na qual os próprios atores reajustam o que está estipulado na lei e definem regras e normas e constrangimentos que vão orientando o funcionamento das organizações.

Neste enquadramento as políticas educativas para a educação de infância têm incitado a uma organização idêntica à escola, que assenta no grupo-turma como unidade básica e tende a reger-se por uma interpretação uniformista da igualdade, que se concretiza de forma progressiva num currículo

uniforme, numa pedagogia transmissiva e numa organização pedagógica destinada a facilitar o ensino de

todos como se tratasse de um só (Formosinho e Machado, 2005, 2007). Estas caraterísticas verificam-se também na educação de infância, com a abrangência de um maior número de respostas educativas para as crianças nos dois a três anos anteriores ao ensino obrigatório, em parte por contaminação do modelo escolar elementar, mas também fruto das orientações OCDE para a maioria dos países.

Contudo, as instituições creche e jardim-de-infância podem ter culturas muito diversas, expressas em diferentes conceções (de objetivo, de criança, de profissional, de aprendizagem) e diferentes práticas. A conceção de contextos formais de educação de infância e seu uso dependem da maneira como se pensa os cuidados e a educação, o seu lugar no sistema educativo, o seu modo de organização interna, a organização do trabalho, a partilha das tarefas e das responsabilidades, a atribuição dos recursos humanos e materiais, as estratégias de avaliação e as formas de regulação das relações de trabalho e de como se envolve com a comunidade. Estas diferenças fundamentais refletem-se nas outras áreas do processo educativo: currículo, aprendizagem, metodologias de trabalho, formação e conceção do profissional.

Nesta comunicação damos conta de um estudo que estamos a desenvolver com vista a compreender como a organização e a gestão do trabalho pedagógico, em contexto de creche e jardim-de-infância, influenciam a continuidade educativa.

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VOL. II – COMUNICAÇÕES LIVRES – B: AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E PROJETOS DE MELHORIA

2. ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DO TRABALHO PEDAGÓGICO

EM CONTEXTO DE CRECHE E JARDIMDE-INFÂNCIA

A oferta educativa para as crianças com idades inferiores a 3 anos pode ser dividida em ofertas não formais e ofertas formais. Os cuidados e educação formais são definidos pela Direção Geral da Segurança Social (DGSS), que contempla dois tipos de resposta e seus enquadramentos legais: as amas e as creches. A oferta formal creche é constituída por duas redes, a pública e a privada, sob a tutela dos Ministérios da Educação e Ciência e da Solidariedade e Segurança Social, e integra as seguintes atividades e serviços:

1) cuidados adequados à satisfação das necessidades da criança;

2) nutrição e alimentação adequada qualitativa e quantitativamente à idade da criança, sem prejuízo de dietas especiais em caso de prescrição médica;

3) cuidados de higiene pessoal;

4) atendimento individualizado, de acordo com as capacidades e competências das crianças;

5) atividades pedagógicas, lúdicas e de motricidade, em função da idade e necessidades específicas das crianças;

6) disponibilização de informação à família sobre o funcionamento da creche e desenvolvimento da criança. (Portaria n.º 262/2011, Art.º 5º).

Os contextos formais de educação para as crianças dos 3 aos 5 anos têm a designação legal de jardins-de-infância, podem ser de natureza privada ou pública e um e outro empregam educadores de infância habilitados e licenciados. Estes centros podem ser orientados predominantemente para os cuidados e os centros educativos com preocupações pedagógicas. A variável institucional que faz a diferença pedagógica é a tutela e supervisão, do Ministério da Segurança Social ou do Ministério da Educação. O Ministério da Educação tem a tutela pedagógica de todas as redes e a tutela administrativa e financeira dos jardins-de-infância estatais e privados. Este Ministério define os aspetos normativos da Educação Pré-escolar, horário de funcionamento, organização, diretrizes pedagógicas, avaliação e monitorização

A Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto, estabelece as condições para a constituição dos grupos de creche e consequente rácio crianças/adulto, definindo os limites máximos de crianças por grupo em função do seu nível de desenvolvimento. Assim, o rácio crianças/adulto é de 10:2 para crianças até à aquisição da marcha; 14:2 para crianças entre a aquisição da marcha e os 24 meses; e18:2 para crianças entre os 24 e os 36 meses. O Despacho n.º 14026/2007, de 3 de julho, estipula o número mínimo e máximo de crianças (de 20 a 25) por grupo, excluindo os grupos constituídos unicamente por crianças com 3 anos de idade (máx. 15). O rácio crianças/adulto é de 25:1 ou 25:2, dependendo se existe ou não técnico auxiliar a exercer funções a tempo inteiro e de 15:1 ou 15:2 para as salas de 3 anos, igualmente, dependendo da existência ou não de técnico auxiliar.

Em Portugal, as Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar constituem um conjunto de princípios gerais e abrangentes para o desenvolvimento curricular. Ancorados nos princípios gerais e nos objetivos pedagógicos enunciados na LeiQuadro da Educação Pré-Escolar, os educadores devem orientar a sua prática profissional, na organização do ambiente educativo, nas áreas de conteúdo, na continuidade educativa e na intencionalidade educativa. As orientações curriculares possibilitam uma

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organização pedagógica da educação pré-escolar que sugere a diversidade de concretizações, potencia o agrupamento flexível dos alunos, o desenvolvimento de projetos de gestão integrada do currículo e a formação de equipas colaborativas de educadores.

A organização do ambiente educativo constitui o suporte do trabalho curricular do educador e da sua intencionalidade e comporta diferentes níveis em interação: a organização do grupo, do espaço e do tempo; a organização do estabelecimento educativo; a relação com os pais e com outros parceiros educativos.

As áreas de conteúdo constituem as referências gerais a considerar no planeamento e avaliação das situações e oportunidades de aprendizagem. A opção por áreas de conteúdo alicerça-se “na perspetiva de que o desenvolvimento e a aprendizagem são vertentes indissociáveis do processo educativo” e “pressupondo a interligação entre desenvolvimento e aprendizagem”. Por outras palavras, os conteúdos, ou seja, “o que é contido nas diferentes áreas”, são perspetivados em termos de aprendizagem (ME/DEB, 1997:47).

Distinguem-se três grandes áreas de conteúdo: a área de formação pessoal e social, a área do conhecimento do mundo e a área da expressão e da comunicação.

O educador de infância tem autonomia para a gestão do currículo, define estratégias de concretização e de operacionalização das orientações curriculares, adequando-as ao contexto e ao grupo, tendo em conta os interesses e necessidades das crianças.

A continuidade educativa é entendida como um processo que parte do que as crianças já sabem e aprenderam, criando condições para o sucesso nas aprendizagens seguintes (ME/DEB, 1997:87). Este processo é marcado por dois momentos determinantes: o início da educação pré-escolar e a transição para a escolaridade obrigatória. O educador assume, assim, no desenrolar do processo educativo um papel essencial através da comunicação que estabelece com a família na entrada para a educação préescolar, bem como, na colaboração com os professores do 1º ciclo na transição para a escolaridade obrigatória.

A intencionalidade educativa resulta do processo reflexivo de observação, planeamento, ação e avaliação desenvolvidos pelo educador de forma a adequar a sua prática às necessidades das crianças (ME/DEB, 1997:93).

Os modelos pedagógicos referem-se a um sistema educacional compreensivo que se caracteriza por combinar um quadro de valores, uma teoria e uma prática, onde se definem as grandes finalidades educacionais e os seus objetivos. No âmbito mais específico dos modelos curriculares, estes, situam-se ao nível do processo de ensinoaprendizagem e explicitam orientações para a ação pedagógica diária nas suas várias dimensões curriculares apoiando, assim, o educador na construção de um quotidiano com intencionalidade pedagógica favorável à aprendizagem onde as crianças se envolvem, persistem e desenvolvem.

Os principais modelos curriculares utilizados pelos educadores em Portugal apresentam contributos específicos e explícitos, ao nível da teoria e da prática, amplamente revisitados nos contextos de creche e de jardim-de-infância. São eles o modelo curricular HighScope, o modelo Reggio Emilia, o Modelo da Escola Moderna, o Método João de Deus e a abordagem pedagógica Pedagogia-emParticipação (Oliveira-Formosinho, 1996 e 2011; Oliveira-Formosinho e Gambôa, 2011). Na atualidade, os educadores tendem a utilizar modelos híbridos, combinam várias influências de diferentes propostas de modelos curriculares alternativos, propondo planificações diversas, baseadas em diferentes pressupostos acerca da natureza da aprendizagem e do desenvolvimento e do conhecimento.

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VOL. II – COMUNICAÇÕES LIVRES – B: AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E PROJETOS DE MELHORIA

3. CONTINUIDADE EDUCATIVA

Derricott (1985) considera que existem três planos complementares onde podemos descobrir continuidade e nos quais esta pode ser contemplada: a) Plano logístico: a organização do ambiente para a aprendizagem, determinada pela organização do centro escolar; b) plano lógico ou sequência dos conteúdos a ensinar; c) plano psicológico: consideração da melhor sequência de aprendizagem para determinados alunos. Na perspetiva da criança, a mesma transição pode ser marcante para uns e pacífica para outros, dependendo das experiências e das condições pessoais de cada um. Uma transição pode ou não ser transcendente, não só na sua notoriedade ou no grau de agressividade e na falta de gradualismo, mas depende também da quantidade de mudanças que os indivíduos acumulam ao passar por cada uma delas e no grau de maturidade dos mesmos desde o início dessas alterações. Existem três tipos de transição que têm o sistema educativo como referência, os que ocorrem com a entrada num centro educativo desde o meio familiar, os que ocorrem dentro do sistema escolar e os que constituem a passagem do ambiente escolar ao mundo adulto e laboral. As transições internas dentro do sistema educativo têm significados muito diferentes e chamam menos à atenção porque implicam mudanças menos drásticas e não se verificam tantas consequências por ocorrerem entre culturas formalmente menos separadas.

A continuidade educativa está intrinsecamente relacionada com dois eixos da articulação do currículo, que tem a ver com as dimensões sincrónica e diacrónica da atividade e do tempo escolar, cuja conjunção é desejável. Por um lado, a continuidade horizontal refere-se a coerência entre os docentes e entre áreas ou temas que as crianças aprendem simultaneamente inscritos num determinado momento num mesmo curso. Por outro lado, está a dimensão temporal, diacrónica, da continuidade vertical que se refere à conexão que deve existir entre objetivos, conteúdos e exigências com que as crianças se vão deparando à medida que passa o tempo de escolaridade.

Tanto Derricott (1985) como Richard (1982) salientam que é a continuidade curricular vertical que deve ser conseguida entre todas as experiências oferecidas às crianças, passadas, presentes e futura. A continuidade vertical consegue-se combinando dois princípios: a conveniência de alguma sequência entre os conteúdos que se ensinam e a preocupação pela progressão gradual da experiência e das exigências da aprendizagem (Youngman, 1986).

4. OBJETIVOS E METODOLOGIA DO ESTUDO

Uma vez que se pretende estudar como a organização e a gestão do trabalho pedagógico, em contexto de creche e jardim-de-infância, influenciam a continuidade educativa, optou-se por desenvolver o trabalho de investigação numa instituição privada urbana no norte de Portugal e selecionou-se um grupo do jardim-de-infância. O grupo selecionado resulta do facto de frequentar no presente ano o jardim-deinfância e ter frequentado a creche no ano transato, mantendo a equipa pedagógica, educadora e auxiliar da ação educativa. O grupo sala é constituído por 17 crianças, o grupo de estudo é constituído por 8 crianças (3 raparigas e 5 rapazes) incluindo uma criança com necessidades educativas especiais. Assim, os atores participantes no estudo estão diretamente acoplados às vivências do contexto educativo do grupo dos 3 anos, a educadora de infância, as crianças do grupo estudo e os pais destas crianças. A metodologia do estudo insere-se num paradigma qualitativo e recorre à observação participante, à análise de documentos não pessoais produzidos pela escola, a entrevistas à educadora e a crianças e à entrevista de grupo focal aos pais. São objetivos do estudo: caracterizar a organização e gestão do trabalho pedagógico na creche e no jardim-de-infância, analisar como os documentos formais da escola preveem a articulação curricular regulamentada, analisar e compreender as perspetivas dos diversos

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atores na articulação curricular efetivada, identificar facilidades e constrangimentos percecionados pelos atores no processo de transição entre os dois ambientes educativos e, por fim, reconhecer efeitos da articulação na continuidade educativa.

As dimensões do quadro teórico de Pascal e Bertram (2009) para a qualidade serviram-nos de categorias de análise. Esta perspetiva tem em conta as opiniões dos educadores, pais e crianças, dá muita importância ao contexto social da aprendizagem e especialmente ao que fazem os educadores para organizar esse contexto dando ênfase à posição de que as crianças só aprendem quando conseguem estabelecer boas relações com as pessoas com quem interagem no âmbito de um contexto educativo estimulante. Todos os textos (transcrições e documentos escritos) foram analisados tomando as seguintes dimensões: finalidades e objetivos da instituição, currículo e experiências de aprendizagem, dimensões da pedagogia (organização dos espaços e materiais, organização do tempo, relações e interações, atividades e projetos, participação dos pais e famílias) e continuidade educativa (adaptação e articulação).

5. ANÁLISE DAS FINALIDADES E OBJETIVOS DA INSTITUIÇÃO

No que concerne às finalidades e objetivos da instituição, foram analisados o Projeto Educativo (PE), o Projeto Curricular da Instituição (PCI) e o Projeto Curricular da Creche (PCC), o Regulamento Interno (RI) e o Regulamento Interno da Creche (RIC) e o Plano de Trabalho de Grupo (PTG) no âmago dos quais se centram na singularidade da pessoa humana. A instituição pretende desenvolver uma educação integral, personalista, harmoniosa (PE:6), que ajude cada criança a “estruturar-se como pessoa, no respeito por si e pelos outros” (RI:11). Colocando a pessoa como cume, fundamento e sentido da educação, a instituição faz assentar o projeto educacional de cada criança na formação intelectual e na formação da sensibilidade, na educação científica e na educação moral, no desenvolvimento individual e no desenvolvimento social, na interação com os outros e na participação cidadã (RI:10). O Projeto Educativo estabelece uma orientação de estratégia da instituição, visão, valores e princípios de orientação educativa e contempla um projeto curricular integrado. O Projeto Educativo enaltece a criança como centro da sua ação, valoriza “modos de ensinar e aprender inovadores que possibilitem o cumprimento de metas relativas à formação global e harmoniosa das crianças que nele participam, capazes de se tornarem pessoas” (PE:6).

Os princípios a partir dos quais se estabelece a organização da ação educativa da instituição são desenhados tendo como base:

a) a singularidade de cada criança e a sua diversidade no que respeita a desejos, ritmos e inteligências (PE:3);

b) a criação de um ambiente propício ao trabalho educativo “sério, disciplinado e organizado, promotor do espírito de rigor e exigência, mas motivador e gerador de alegria pela e na aprendizagem (RI:6 e10; PC:18);

c) o desenvolvimento de uma relação educativa baseada na identidade de cada um e na proximidade e no espírito de entreajuda (PE:3);

d) a modelação da ação educativa por um projeto curricular que garante as finalidades educativas definidas a nível nacional, priorizando os saberes básicos essenciais e as competências estruturantes complementados com atividades de oferta local (PE:5 e 8; PC:11-15);

e) a contextualização do projeto curricular às necessidades, interesses e motivações dos alunos e a diversificação de experiências e de ambientes de aprendizagem (RI:24-25);

f) o trabalho cooperativo dos docentes e a articulação horizontal de conteúdos, saberes e competências (RI:24-25);

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g) o compromisso dos pais e encarregados de educação com o projeto educativo e a relação de confiança e de proximidade da instituição e dos seus profissionais com as famílias (RI:15-16). Na análise do Projeto Curricular, procuramos identificar a organização do currículo prescrito a nível nacional e a oferta local e a importância percecionada pelos diversos atores (educadora, pais e crianças), damos conta dos pontos de continuidade e descontinuidade entre a organização do currículo da creche e do jardim-de-infância. O Projeto Curricular inerente a opções curriculares assumidas enfatiza, ainda, o modelo de organização e diferenciação pedagógica, privilegiado pelos pais e pela educada nas entrevistas.

6. CURRÍCULO E EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM

A instituição segue as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (ME/DEB, 1997) e concebe o currículo da creche “como um projeto aberto e flexível, coerente e integrador, respeitador de todas e de cada criança, entendida como sujeito da sua própria aprendizagem.” (PCC:6). Compete ao Projeto Curricular da Creche “selecionar e promover as aprendizagens e competências pessoais (físicas, afetivas, emocionais, intelectuais) e sociais (valores, atitudes e comportamentos) adequadas aos diferentes estádios de desenvolvimento das crianças que frequentam a creche” e “estabelecer o referencial de unidade para as práticas curriculares e pedagógicas a desenvolver pelos vários elementos da equipa pedagógica”(PCC:6), garantindo a coerência, a equidade, a relevância e a utilidade das aprendizagens para todas as crianças.

Para a educação pré-escolar a instituição apresenta um projeto de gestão curricular flexível e de contextualização local das orientações nacionais, que se consubstancia num projeto de integração das atividades curriculares de oferta local com as áreas curriculares estabelecidas no plano nacional de estudos (PE:5). A oferta local insere a aprendizagem de duas línguas estrangeiras (Inglês e Espanhol), a prática de natação e de xadrez e o desenvolvimento de um projeto integrado na área das expressões (musical, dramática e plástica) e é assegurada por professores especializados no quadro de parcerias estabelecidas com entidades locais. Na creche, para a faixa etária dos 24 a 36 meses, a instituição apresenta, dentro dos moldes da oferta local do préescolar, o projeto integrado da expressão musical assegurado, igualmente, por um professor especializado. Os dados recolhidos através das entrevistas aos pais e às crianças salientam a importância dada à oferta curricular oferecida pela sua diversidade, pela obrigatoriedade para todas as crianças desde idades precoces e pela satisfação das próprias crianças.

O modelo organizativo da instituição assume a criança como um ser ativo, competente, construtor do conhecimento e participante no seu próprio desenvolvimento, cujo fim é “encontrar uma forma de diferenciação pedagógica que assume a heterogeneidade e a diversidade como riqueza para a aprendizagem situada e oferece modos alternativos de organizar a classe e a escola” (Oliveira-Formosinho, Kishimoto e Pinazza, 2007:29). Assim, os modelos pedagógicos assumidos pela instituição respeitam a heterogeneidade e a diversidade seja no modo como são proporcionadas as experiências de aprendizagem seja na medida em que estas são inclusivas. A convergência dos discursos dos pais e da educadora é visível nos excertos das entrevistas. A adaptação das crianças às diversas atividades e interlocutores é realçada pelos pais na transição para o currículo do jardim-de-infância pelo respeito dos tempos pessoais de cada criança e pela inclusão de uma criança com necessidades educativas especiais que, não possuindo linguagem oral, comunica com os adultos e os pares por um sistema alternativo de comunicação conhecido e utilizado por todos os elementos do grupo.

Os modelos pedagógicos adotados incorporam um modo de trabalho que se baseia em “pedagogias construtivistas e participativas” (PC:15; PCC:13) e mobiliza técnicas e instrumentos de trabalho

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pedagógico centrados no grupo e na criança individualmente que facilitam a aprendizagem das crianças em contexto educativo. Estes modelos concretizam-se, na creche, através de práticas curriculares inspiradas na perspetiva ecológica preconizada por Bronfenbrenner (1987) e no modelo curricular HighScope. O jardim-de-infância preconiza um modelo híbrido apresentando contributos específicos e explícitos, ao nível da teoria e da prática, amplamente revisitados pelo modelo curricular HighScope, bem como pelo Modelo da Escola Moderna através das atividades de organização do grupo (como a assembleia de turma e o trabalho de projeto) e os instrumentos de autorregulação (como o plano de atividades, o diário da turma e os mapas de presenças e de tarefas). Esta organização social do trabalho de aprendizagem (Niza, 1998) inspira-se sobretudo no modelo do Movimento da Escola Moderna (González, 2002).

No respeitante ao currículo e respetivas experiências de aprendizagem verifica-se uma preocupação da educadora com as áreas de conteúdo previstas nas Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (ME/DEB, 1997) numa perspetiva de proximidade à diversidade e necessidades das crianças. Na exploração de áreas de conteúdo e dos seus domínios componentes, predomina a área transversal da área de formação pessoal e social e uma distribuição equilibrada dos diferentes domínios da área da expressão e comunicação e da área do conhecimento do mundo.

7. DIMENSÕES DA PEDAGOGIA

A análise do ambiente físico da instituição torna evidente o bom estado estrutural da mesma, dos equipamentos e materiais pedagógicos, quer ao nível dos espaços interiores e espaços exteriores, quer ao nível dos equipamentos e materiais ajustados em quantidade, diversidade e qualidade. Para além da estrutura física a instituição não representa um obstáculo à inclusão de crianças com Necessidades Educativas Especiais, pois está preparada para as receber sobretudo se estas se revestirem de um carácter motor ou sensorial, pela inexistência de barreiras arquitetónicas e pelo investimento em equipamentos adequados de adaptação funcional. De facto, a existência de uma criança com NEE no grupo em estudo representa um desafio às competências profissionais da educadora de infância, também nesta dimensão pedagógica, no sentido de cabalmente responder às necessidades, interesses, disposições e direitos destas crianças (Araújo e Andrade, 2008; Oliveira-Formosinho e Araújo, 2002).

A organização da sala é considerada muito importante no quadro do plano da ação, quer nos documentos estruturantes para ação, nomeadamente no Projeto Curricular da Instituição e no Projeto Curricular da Creche e no Plano de Trabalho de Grupo (PTG), quer na voz da educadora por facilitar a metodologia utilizada, possibilitar a existência de uma rotina de trabalho e conferir segurança às crianças. Todas as salas, de creche e pré-escolar, se encontram organizadas por áreas de atividade que podem variar ao longo do ano, seguindo o modelo curricular HighScope. Embora com alguma diversificação relacionada com a idade das crianças são predominante a área da expressão plástica, a área da casinha, a área da biblioteca, a área do faz de conta e a área dos jogos de construção. As crianças reconhecem esta organização identificando com facilidade as diversas áreas nos dois níveis de educação bem como o que lá fazem. O espaço interior da instituição surgiu como uma dimensão muito positiva, quer ao nível da organização e dos materiais nele existente, quer ao nível da oferta de boas condições de higiene e segurança. A qualidade do espaço constitui um fator determinante no processo de escolha da instituição por parte de alguns pais, nomeadamente na valência de creche.

Nas duas salas, de creche e de jardim-de-infância, foi constatado que a organização dos grupos ao longo do tempo era diversificada englobando situações de grande grupo, pequeno grupo, trabalho a pares e individual, e que os adultos apresentavam duas categorias presentes no comportamento do educador: a sensibilidade e a autonomia. Pais, crianças e educadora parecem concordantes na atenção

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e cuidado que os adultos demonstram ter para com os sentimentos e bem-estar emocional da criança. Inclui também empatia, capacidade de resposta e afetividade.

Ainda nos dois níveis de educação estavam contempladas a autonomia nos diversos momentos da

rotina diária, nomeadamente na gestão de tarefas e dos seus pertences, na escolha das atividades, no ciclo

planear/fazer/rever, nos cuidados de higiene pessoal e na alimentação. Esta autonomia está patente na planificação da ação do educador, reflexo da implementação do modelo pedagógico MEM e do modelo curricular HighScope, bem como nas entrevistas dos pais, percebido pelo desempenho dos(as) filhos(as) e no próprio discurso em casa.

Existe na instituição um bom ambiente de trabalho onde o respeito e as interações entre os elementos da equipa são fomentados. Pais e equipa estão de acordo sobre as boas relações existentes entre ambos e com as crianças. Os pais entrevistados referiram ainda a importância do equilíbrio criado e conseguido pelos adultos entre os fatores de supervisão e disciplina, afeto e apoio emocional, traduzidos na expressão autoridade partilhada, o que é consistente com o bem-estar patente no grupo de crianças. No contexto creche é predominante a relevância das mães, dada essencialmente a afetividade das educadoras para com as necessidades das crianças e a forma como proporcionam um ambiente de segurança e bem-estar emocional.

As entrevistas às crianças surgiram como um instrumento precioso no que respeita à perceção sobre a implementação do modelo do MEM ao nível da perspetiva de ensino aprendizagem, dos papéis dos adultos e das crianças. As crianças consideram que se aprende fazendo coisas nas diversas áreas da sala. Elas veem os adultos como alguém que os pode ajudar a aprender e elegem claramente o aprender com os outros face ao aprender sozinho. A perceção das crianças como participantes ativos no planeamento está presente nas suas respostas, referindo a possibilidade de escolha livre ou a negociação. Quando questionadas sobre os momentos de conflito entre pares referem a negociação com o apoio do adulto para a sua resolução e um grupo de crianças descreve uma situação com restrição da atividade de forma partilhada com a cooperação de três crianças participantes na entrevista. Na faixa etária dos 0 aos 3 anos esta perspetiva é descrita pela educadora.

Ao recolher e analisar os dados sobre as propostas curriculares apresentadas nos Planos de Trabalho de Grupo, percebeu-se que estas assumem uma diversidade e atualidade de fontes, oferecendo atividades também elas diversificadas e abrangentes nos diferentes domínios curriculares. Creche e jardim-de-infância apresentam planos para a ação pedagógica para o grupo convergentes na estrutura e nas opções tomadas respeitando a grupo e a individualidade de cada criança, suas potencialidades e fragilidades. A organização do espaço/sala, aparentemente idêntica, assente em diferentes áreas de atividades de livre escolha conduz à execução em individual, em pequeno grupo e em grande grupo. Quanto menor é a idade da criança maior o número de tempos livres em detrimento dos tempos de grupo. No jardim-de-infância predomina uma metodologia de trabalho diferenciada através da organização em grande e pequeno grupo na planificação da ação. A organização a pares e individual, predominante na organização de creche, muito aproximada entre si, apresenta uma diferença significativa nas relações.

A planificação diária é assumida em conjunto pela educadora com imputes das crianças recolhidos das ideias e interesses destas, explicitados nos diários de turma e nos momentos de rever, do ciclo planear/ fazer/rever, devolvido pelas crianças onde apresentam, ao grupo, as suas atividades e projetos e o seu processo de desenvolvimento. Estes são momentos de interação entre pares de forma a que as crianças sejam confrontadas com pontos de vista diferentes, promovendo, a posteriori, situações de trabalho em grande, pequeno grupo e em pares, estabelecendo entre elas momentos em que possam discutir e refletir

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sobre os mesmos. Os pais referem o reflexo deste trabalho reconhecendo a gradual “capacidade de se organizar e de arranjar um método para fazer qualquer coisa” (MF), a capacidade de argumentação tornando-se críticas e convictas das suas opções.

A participação dos pais e famílias é um eixo prioritário do projeto educativo e uma preocupação da equipa desta instituição, proferida pela educadora como um desejo de efectuar uma real parceria com as famílias. As relações escola-família constituem, segundo os pontos de vista dos profissionais e famílias, um ponto positivo que marca a cultura deste projeto educativo. Contudo, o processo de análise das entrevistas aos pais e educadora fez ver que ainda é possível melhorar esse aspeto tornando, por exemplo, mais efetiva a participação dos pais na elaboração e concretização das atividades e projetos do grupo. Os pais entrevistados mostraram-se, de uma maneira geral, informados sobre o que se passa na instituição referindo, por exemplo, a importância da plataforma digital Weduc na veiculação das atividades realizadas pelo grupo. Apuramos que a colaboração dos pais na vida do grupo é pontual e o conhecimento das atividades advém, principalmente, pela plataforma Weduc, da informação veiculada pela criança, reuniões de pais em grupo, reuniões individuais de pais e especificamente na creche, contactos informais entre pais e educadoras.

8. CONTINUIDADE EDUCATIVA: ADAPTAÇÃO E ARTICULAÇÃO

Para as crianças que iniciaram o seu percurso educativo antes dos 3 anos de idade a entrada no contexto educativo assinala a primeira transição e a passagem do contexto de creche para o jardim-de-infância constitui o primeiro passo previsto no ornamento do sistema educativo Português, indicando assim a primeira transição existente entre níveis e tipos de respostas educativas. Estas são transições que passam a ser universais para todos.

O equilíbrio de um percurso educativo nas transições ao longo do percurso educativo das crianças requer que as transições curriculares sejam olhadas como transições ecológicas bem-sucedidas, do ponto de vista do desenvolvimento do sujeito (Brofenbrenner, 1979). As transições ecológicas ocorrem sempre que uma pessoa realiza uma atividade nova, cumpre um novo papel e entra em interação com outros indivíduos sociais.

Nesta perspetiva, existem dois tipos de transição que têm o sistema educativo como referência, os que ocorrem com a entrada num centro educativo desde o meio familiar e os que ocorrem dentro do sistema educativo. Os atores, pais e educadora, diferenciam-nos explicitamente identificando os momentos e valorizando os mecanismos utilizados para os dois tipos de transição. A entrada na creche foca-se mais como um problema psicopedagógico de adaptações com o intuito de evitar traumas e conseguir o apoio mútuo entre o ambiente familiar e a escola. Pais e educadora consideram que a reunião/encontro da família e criança com a equipa educativa, no contexto da sala de atividades, prévia ao ingresso da criança é determinante para a criação empática entre ambos e de laços promotores para o sucesso do processo. A passagem do contexto educativo de creche para o jardim-deinfância denominada de transições internas dentro do sistema implicaram mudanças menos drásticas e foram consideradas pelos pais, crianças e educadora, como naturais, universais e promotoras de orgulho.

No processo de apropriação do novo currículo, onde as crianças experimentaram o ensino de diferentes docentes em distintas áreas dentro do mesmo ano escolar, sofreram um processo de adaptação exigido pela descontinuidade curricular. Estas mudanças foram vividas aparentemente sem

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um ponto de rutura nem danos pessoais ou familiares. Os dados realçam, sobretudo, três tipos de continuidade definidos por Goodlad (1992): 1º) a organização do currículo que assegura às crianças uma construção ordenada da aprendizagem de forma que os elementos antigos se interliguem com os novos numa sequência gradual; 2º) a congruência-continuidade de ambientes, exigências, regras e estímulos; 3º) a coerência de todo o processo educativo presente na opção pelas mesmas metas ao longo dos dois níveis de educação patente no Projeto Curricular da Instituição, no Projeto Curricular da Creche e nos Planos de Trabalho de Grupo.

A continuidade está prevista em todas as fases do desenvolvimento curricular, desde o currículo planificado até à experiência real de ensino-aprendizagem, ou seja no currículo em ação (Gimeno, 1988, 1996). Os pais têm um conhecimento geral sobre as atividades de preparação para a transição (reuniões com pais e atividades intervalências) e de articulação enumerando diversas atividades que os seus filhos participaram durante o ano letivo.

A continuidade implica também comunicação entre os ambientes. A passagem da creche ao jardim-de-infância é marcada por uma continuidade educativa muito positiva, porque acumula mudanças de currículo e de ambiente, mas manteve a equipa educativa, os colegas, e o mesmo centro educativo.

Bronfenbernner (1987) considera que as transições e os vínculos que se estabelecem entre ambientes podem ser solitários ou múltiplos. Neste caso, múltiplo, o indivíduo vai acompanhado de outros membros aos quais está unido por vínculos que se estabeleceram no ambiente ecológico de onde partem. As crianças e os pais dão importância ao facto de os filhos irem acompanhados pelos colegas para o novo nível educativo, com especial incidência na inclusão da criança com NEE.

Por outro lado, repensar a relação entre creche e educação de infância ofereceu aos pais uma importante oportunidade de refletir a vantagem do ingresso dos filhos na creche, considerando que as crianças vão mais bem preparadas para o jardim-deinfância, e ainda salvaguardar o descanso sentido, na globalidade das famílias, pela opção da continuidade da equipa educativa.

9. CONCLUSÃO

A continuidade educativa em educação de infância inclui bem estar emocional e aprendizagens significativas para as crianças, desenvolvimento profissional e institucional e satisfação dos atores envolvidos (crianças, pais e educadores). O estudo realizado possibilitou a participação de todos na reflexão sobre a gestão e organização pedagógica da creche e do jardim-de-infância e sobre a relação entre estes níveis educativos, assim como ofereceu importante oportunidade de definir questões críticas e buscar respostas aplicáveis a todo o espectro da primeira infância e, mesmo, nas transições subjacentes ao curso da vida escolar na instituição.

A transição é importante acima de tudo por ser uma experiência vivida, ainda que possa ser facilitada ou não pelas (des)continuidades curriculares previstas no currículo. No entanto a planificação da continuidade só por si não garante que a vivência seja gradual, sem pontos abruptos de rutura nem danos pessoais para os intervenientes. Ainda que procurada, nenhuma continuidade previamente traçada desde fora faz com que se cumpra de forma gradual a experiência real no contexto de sala. As equipas educativas, nomeadamente os docentes, como agentes ativos no desenvolvimento curricular, podem sanar descontinuidades do curriculum planificado fora das salas ou podem eles mesmos

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provocar desconexões entre as sequências pensadas de antemão. As observações e os dados de análise que fomos co-construindo ao longo do desenvolvimento desta investigação permitiram-nos identificar um conjunto de premissas que contribuem para que a organização pedagógica da instituição permita uma continuidade educativa efetiva que reafirma e reforça a identidade do estabelecimento educativo e de cada nível educativo.

Pretende-se, deste modo, a construção de um sistema integrador de múltiplos subsistemas, permitindo que cada um deles possua fronteiras claras mas flexíveis e abertas ao outro e à mudança (Alarcão, 2006). As condições identificadas como favoráveis são as seguintes: ser um estabelecimento educativo com uma identidade reconhecida e valorizada junto da comunidade; a equipa educativa assumir a sua identidade profissional; possuir condições físicas adequadas; existir colaboração/intervenção pró-ativa dos diversos atores (crianças, pais e educadores) que terá contribuído para uma melhor compreensão e valorização dos objetivos da educação de infância junto dos diferentes parceiros educativos que integram a instituição.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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