MARHWE
|=Á'nw›.~Passé/-uzspnxsíou
MENINOS
E
MENINAS
EM
RISCO
ANÁ|.|sE
DA
PRÁT|cA DA (nEs)PRoTEçÃo
Em
Resume
na
Aamçso
ii
mARrA
DE
FÁnMAEPEssÓA
LEPu‹$oN
MENINOS
E
MENINAS
EM
RISCO
ANÁL|sE
DA
PRÁ'r|cA
DA
(DEs)PRo'rEçÃo
Em
Resume
DE
AEBER-meu
D1ssER'rAÇÃo
sUBME1'1DA
À
UN1vERs_11›ADE
FEDERAL DE SANTA
CAz1=.‹uuNAzPARA A
DDIENÇÃDVDDDEAUDE
MESTRE
EM
EDUQAÇÃD
MAR|sTE|.A FANTIN
OR1EutADoRA
_ Â. .LS TzÍ_`_?l _; *_`-L-_¶¬.¡¡ S -A :_ -, 'sf 2..
UNIVERSIDADE
FEDERAL
DE
SANTA
CATARINA
CENTRO DE
CIÊNCIAS
DA
EDUCAÇÃO
PROGRAMA
DE
PÓS-GRADUAÇÃO
CURSO DE
MESTRADO
EM
EDUCAÇÃO
“MENINOS
EM
R1sCo.-
ANÁLISE
DA
PRÁTICA
DA
(I›Es)PRoTEÇÃo
EM
REGIME
DE
ABRIGO
"Dissertação
submetida ao
Colegiado
do
Curso de Mestrado
em
Educação do
Centro
de
Ciências
da
Educação
em
cumprimento
parcial
para a
obtenção
do
títulode
Mestre
em
Educação.
'
APROVADO
PELA
COMISSÃO
EXAMINADORA
em
01/12/1998Dra.
MaristelaFantin
(Orientadora) ñti-'Cl-'\Áz7§U~›'‹-*Q‹Ç1›ãQ'LA
Dra.
Maria
StelaSantos Graciani
1Dr.
Reinaldo Matias
FleuriM
‹
Dra.
Gilka
ElviraPonzi
Girardello (Suplente) l\Ó‹OC G"\\LCLzÍ'zͧ3(:3 <)~- «»--~..-_0*
Maria
de
Fátima
PessôaLepikson
.z-›'
iv
Dedico
este trabalhoA
Herman,
porque
foicompanheiro
e
mestre,porque
estevecomigo
até
mesmo
em
momentos
em
que
nem
eumesmo
me
agüentava.A. ele
que
foi. exemplo.de
perseverança eem
quem
tanto busquei acoragem
de prosseguir e aosmeus
filhos Pedro, Alexandra e João,porque
aprenderam
a. acreditarque
o
serhumano
não
pode
pararde
buscareconstruir.
Porque
tãoamorosamente compreenderam as minhas
ausênciasesouberam
esperar, contribuindo pacientemente paraque
esta experiêncianos ajudasseacrescer
como
sereshumanos
ecompanheiros
dejornada.\
A
meu
pai,que não
pôde
esperarque
eu terminasse estaminha
longa. jornada,porque
tanto seorgulhou
da. minha.vontade
de
mudar
este cruel e interminável processode
exclusão que, de certa forma,também
contribuiu para
que
ele fosseemboratão
cedo, eaminha
mãe, porque
em
momento
tão doidode
nossas vidas soube sermulher
guerreira e,pacientemente, abriu
mão
de
meu
apoio paraque
eu
chegasse atéo
fim
deste Mestrado. .
Pelo tanto
que
renunciaram paraque eu
aqui chegassee
pelo muitoacreditaram
em
mim.
Aos
meninos
e. às meninas,porque
me
ensinaramque
o tempo não
pára.A
essespequenos
e pequenas cujas vidasme
provaram
que a indecisão, acovardia,
a
omissão, a. negligência e.a
incompetência lhes.podem
ser fatal. 'A
eles, aquem
tanto devo, dedico este trabalhona
esperançade
que
elenão pare na biblioteca,
mas
que
possa contribuir parao
resgate de seuV
AGRADECIMENTOS
O
finalizarde umadissertação
daperdas
<-Lganhos.Tantaeoisa
poderia ter sido
melhor
aproveitada, tanta coisaque
poderia ter sido feitaem
prolde
um
trabalho que.. aparentemente
chegowao.
tim. Trata-se,.nêLrealidade,.deumprocesso
que
não
acaba neste trabalho. Este inicio foi
o
meu
tempo
de
solidão,de
distanciamentonão
sóda
prática
como também
dos
amigos.Tempo
emqueeumeisoleido
mu11do,me.afasteLdaquelesque
me
eram
caros parame
preparar para devolver aosmeninos
emeninas
um
pouco
do
muito que. lhes foi roubado.
A
Sandra, Cláudio,Osmar, Renato,Verruga,Ande1:son,
Vivian.,..Mar:isaTAndré,.Nico,Toco, Pretinha,
Osmar, Deco,
Leandro, PauloHenrique
Alveles, Ester,Mano,
Tarcisio,Trouxinha,
Mônica,
Marco
Aurélio, Tarcísio, Sandro, Doraci. Padilha,Ieanetantos
outrosmeninos
emeninas que
ajudaram a solidificarmeu
projetode
vida.A
Maristela,que
foi maisque.orientadora.0hrigada.pela.amizadequeme.dedicou, pelaconfiança
que
depositouem
mim,
pelo contratode
riscoque
assumiucomigo,
e,especialmente, porque
compreendeuqueestadissertaçãoeummomentodeumsonho
maior.A
Valmor,
pelaetema
amizade, construída a partirda
convivênciacom
os nossosamigos
darua, pelomuito.que-meensinou
atravésdeseuexemplo
decompiromisso,
ternuraeseriedade.
A
Eliane, minha. madrinha_de. pesquisa,.o.meu-muito. obrigado.pelosespaços que
me
abriu e pela
amiga que você
setomou.
A
Telma
Piacentini,minha
co-orientadora,que
se mostrou
tão disponível-para
discutircomigo o
capítulo sobre a infância.Obrigada
especialmente pela sua contribuição, vibração,ternura e estímulo. '
A
Nadir Zago,
pelas vezes que.se colocouàdisposição
para discutir estetrabalhoAo meu
especial interlocutor, Reinaldo Fleuri, agradeço a acolhida queme
ofereceunesta Universidade,
que
muitas vezes se mo`stroutãoimpessoaLAos
professoresdo Mestrado
em
Educação, pelo apoio, sugestões e críticasque
contribuíram para
que
eu. amadurecesse e. crescesse..a
partir da.sua
experiência e conhecimento.A
Eliane, Pe. Wilson, Paulo, Solange,Dóris
e..Patrícia:que
a
lutaem
favor. dospequenos não
fique
na
academia,mas
que
nossos estudostenham
marcado, definitivamente,o
_ vi
Aos
colegasde
turma, pelo companheirismo.A
Tanira.Piacentiniquereviso1Lotexto desta,dissertaçãocom.tan1o rigorerespeitmAos
fimcionáriosda
Secretariada Pós-Graduação
em
Educação, especialmente Mauríliae
Romílda,
portoda
a atenção.À
CAPES--e
ao-€NPq›que, atravésde reeursos-públiees,- possibilitaramestapesquisa.A
todos os irmãos, 'companheiros eamigos que
tiveram paciência parame
esperar eque
me. apoiaram.. e. torceram
para
queerrpudesseconchzirestetrabalho.Finalmente, agradeço aos colegas
da
ACOPAMEC
por teremcompreendido
asdificuldades. inerentes ao. processo
deconclusão deumadissertação demestrado.
Espero
retribuir a todoscom
os resultadosque
este estudo eo
meu
trabalhopossam
viraVII
suiv|zÁRto
Banca
Examinadora
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . iiiDeàizzióúz ...
_ . ivAgradecimento
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .v
Sumário
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . viiResumo
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . _ . ix Abstract. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .x
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 01A
pesquisa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . _ .05
A
sistematizaçãodos
estudos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . _09
1. Capítulo
L-
Ainfanciaprotegidaeainfänciaadultizada-. ... ..H-"
_- f _ _ -. 151.1.
A
presençada
infânciana
sociedade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151 .2.
As
diferentes condiçõessociaiseeconômicasquedetenninama
construção
de
infâncias e juventudes heterogêneas . . . . . . . . . . . . . . . . 171.3.
As
infânciasheterogêneasea.re1ação.eoma.escola.eomundadatrabaIho.
. . . 19 1.4. Juventude:um
tempo
de transição e preparação parao
mundo
adulto . . .23
1.5.Os
meninos
e.meninas
demodo
de.vida_.adulto,.oLLa.adultimçãdprecoceda
infância pobre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
25
1.6.As
perspectivasde
navida.de.g¡:uposdemeninose
meninas
em
situações sociais eeconômicas
diferentes . . . . . . . . . . . . .29
2. Capítulo II -
Tempos
emtransição eazvidados
meninose.35
s
2.1.
Menor
x
crianças e adolescentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . _35
2.2.A
interferência da- lei eda
assistêncianavida-desmeninose meninasemrisce»
42
2.3.
Código de Menores
de1979
e a assistência prestada aos menores _ . .4
. . . . . . . .
43
2.4. Entre códigos eo
tratamentodornenor. . . . . . . . . . . . . . . . .48
2.5.
Da
FUN
ABEM
à abertura política:novos
tempos
de transição . . _ .A. . . . . . . . .
55
2.6.Osnovosrumos:
aprendendocotnaprática..-.,...--,-...--- --- ,-62
2.7.
O
Estatutoda
Criança edo
Adolescente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .67
2.8.
A
condição de protegidos eacondição.de
meninosemeninasriscu
emrisco
_ - 752.9.
O
regime de abrigo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .77
3. Capitulo III -
A
Construção das SituaçõesdeRisco
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .80
3.1.As
situações de risco . . . . . . . . ..' . . . . . ..' . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 813.2.
As
situações de riscona
vidados
meninos
emeninas
. . . . . . . . . . . 3,3.Os
caminhosdassituações.de.risco--.,.-..---.,..-,.,.-,- -, --W
f- _Hz
3,4.
A
urgênciada
proteção à infância . . . . . . . . . . . ~. . . . . . . . . . . . . . . .
CapítulocI,V -
Um
regimedeabIigoen:LElo:ianópolis,-.,c- r ,,,,F-,----
fa- , _-4.,l.
Atendimento
em
regimede
abrigoem
Florianópolis . . . . . . . . . . . . .4,zu
Aosâmzçâz
dezbznâmm
d‹›s.¢ózz‹zzzd‹zz¢s.--e_-.,i__,,.-Q;e- - ._t,,-__-,--_ _,.,-.o_-oe-4.3.
Os
meninos
emeninas
abrigados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.4.Os
conflitos cotidianos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4.5,Os
adolescentesque pediram voz
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ./ Referências Bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . vi
85
86
99
_102
104
. 108 -113116
121 Consideraçõesfinais...-..,,..;,...-,.-._, _--- -,--, _- - ,, , - -- 143 151Ê
ix
Resumo
A
pesquisa
visa a. investigação. atendimento. a. e-. a. adolescência*9
\ ..` `
especificamente a análise
da
relação estabelecida entreo
ser"menino
e menina",do
estarem
1
situação. de...risco eter. direito.a.preparação.para.um.Ífi1mro.digno-..Apartir..daJeferênçia à
infância e juventude
em
geral,o
estudo é dirigido aosmeninos
emeninas
vítimas- dasdesigualdades sociais, que.
os expõemasituaçõesderisco
etempos
detransiçãodixersosflcom
implicações importantes
no que
tangeao
afastamentode
espaçosde
socialização, desgaste dasrelações familiares. e precoce. \O. trabalho avalia. o.
processa
de..da
legislação brasileira relativa
ao
menor
de
idade (1979) até apromulgação do
Estatutoda
Criançae
do
Adolescente.(.1990)lj Destacaatransição.da.visão. legal; da.condíçãodenrenor
em
situação irregular à criança e adolescente sujeito de direitos.Ao
estudaro
Estatuto, centraa. atenção.
na
políticade
atendimento, cor1Lênfase.n‹11:egime..de.abrigo-O
trabalho analisa aimplementação
'deum
abrigoem
Florianópolis, avaliando as dificuldades operacionais e asconcepções
introjetadas,com
destaqueparao
dacondiçãode
sujeito.edo
potencial
dos
meninose
meninas. Conclui que,ao
"guardá-los"em
abrigos, resguarda-se partedo
direito à. infância,mas
que, frente. aos.. senviçoaprestados. e. às relações construídas, osfilhos e filhas
da
pobreza dificilmente terãoum
fiituro digno, ou, seja, permanecerão,na
idadeX
Abstract
This research.
aims
to. investigate and.analyzethe.protection.anciattendancemechanism
to the Brazilian childhood and adolescence.
More
specifically, it deals with the relationestablished
between
been
a.child.and,. atthe..same_time,been
in sociaLand
individuaLriskysituation
and
having or not the opportunity to a dignified future. Startingfrom
the generalreferences to the
childhoodand
adolescencerthe tesearchfocuses onhthose.who.are\Licti1nVsof
the social inequality.
These
inequalities are observed as responsible for the risky situationsand, for the. different transition. times. in.. early life, it. has. importantiinplications in the
deviation
from
the socialization space, the degradationof
the familiar relationsand
theprecocious introduction to adultlife,
In
a.secon¢moment,the
researclLeva1uates.the..revisionprocess
of
the Brazilian legislation, startingby
the minority laws (as itwas
named
in 1979)and
going
until. the promu1gation.o£theChildhood.and.Adolescence Statute-(l990).Thestudy
punctuates the transition
from
the conceptionof
minority class in irregular situation tochildhood.
and
adolescencewitlt righ1s..'lÍhe..Statute isthem
studied. wit1tspeciaLattention tothe attendance politics, emphasizing the shelter system.
One
shelterhouse
in the cityof
Florianópolis is analyzed as
a
case
study. It. is evaluate. its assimilateiconceptionsand
operational difficulties, detaching the
ways
how
the children historyand
potential are ignored.Concluding, it is verified.
thatkeepingthe
childrertinsheltersmay preseLve-some.o£thetheir rights but, facing the qualityof
the services offeredand
the constructed relations, the childrenofúze póvzzry
win
hzfôiyhave
ztwozmy
fiúuzarizzy.win
zzmzin, in, zzâzúr1tfe,.âzpzz1âzzzrsaf
1
Introdução
O
que
cada pessoa seleciona para "ver"depende
muitoda
história pessoal eprincipalmente
de
suabagagem
cultural.No
meu
caso específico, durante 14 anos dediqueiminha
vida profissional às populaçõesem
situaçãode
exclusão.Mais
especificamente, volteiminhas
ações para a causados meninos
emeninas de
rua.Sempre
ligada à Pastoraldo
Menor
ou
aosmovimentos
populares,tomou-se
impossível, paramim,
olharcom
outros olhos, senãoaqueles
de
quem
conhece e convivede
pertocom
o sofiimento
das vítimasda
excludentesociedade capitalista brasileira. Talvez esta radical
opção
pela causa dosmeninos
emeninas
tenha dificultado olhar a prática
de
atendimentosem
a criticidadede
quem
exigeo
resgateda
infância, a partir' de
um
afetivo ecomprometido
serviçode
qualidade.A
partir deste olhar exigente, passei, duranteminha
atuação profissional,a
observar ecomparar
omovimento
visível das crianças e adolescentesque
circulam pelas ruas.Alguns
deles simplesmente passam, outros
ficam. Retendo
minha
atenção nesse simples detalhe,o
movimento
da
rua, constateiuma
diversidadede
relações ede
atenções dirigidas aospequenos que
ostomava
extremamente
diferentes e diferenciados. Essa diferenciaçãodemarcava, especialmente, a origem, os espaços e a as formas de proteção a eles dirigidas.
Pelo simples recurso
da
memória
dessas figuras infantise
juvenisque
circulamna
rua,pude`eonstatar
que
a infância e a juventudenão
são categoriashomogêneas
e abstratas.São
construídas
a
partirda
condição socialde
classe.Conforme
o
lugar socialque ocupam,
ascrianças receberam tratamentos diferenciados.
Na
diferenciação dostempos da
vida, a escolae a família estiveram presentes
como
prolongadoresda
infância das classes mais abastadas.Quanto
às crianças submetidas às situaçõesde
exclusão,foram
adultizadasprecocemente
pelas necessidades
de
terque
assumir responsabilidades inerentes aomundo
adultoda
sobrevivência
Segundo
a condição social de classe, a inl"`ancia submetida a situaçõesde
exclusão sofi^e,inclusive, processos de transição dos
tempos da
vida deforma
diversa.”Se
os jovens adultos das classes abastadas são, gradativamente, preparados parac
mundo
das relações adultas,os
meninos
e asmeninas
em
situação de exclusão pemianente são encaminhados, bruscamente,sem
a
devida preparação, parao
mundo
adultoda
auto-subsistência e auto-proteção.Durante muitos anos as crianças e adolescentes das classes populares
foram
submetidasa concepções e tratamentos baseados
na
tutelado
Estado e amecanismos
científicos. pautados2
partir
do Código de Menores de
1979), dentre outras caracteristicas, foi intervencionista eclassista. Baseava-se
na
retirada arbitráriada
convivência familiar e contençãoem
intematos.Esses espaços
de
ressocialização,ou
de
prevenção, pretendiam recuperaros meninos
emeninas dos
supostos males decorrentesda
pobreza,ou
prevenir que, por sua vulnerabilidadeinerente
à
idade,pudessem
ser vítimasde
marginaisou
de
"inescrupulosos comunistas".Este estudo discute
como
o
“ser criançaou
adolescente”, entendidocomo
sujeitoem
processo
de
formação e preparação parao
mundo
adulto, foi continuamente desconsideradonas classes empobrecidas. Essa desconsideração se materializava através de projetos voltados para
a acumulação do
capital,mesmo
que
em
detrimento das condiçõesde
vidada
maioria.Tais projetos caracterizavam-se por formas sutis
de demarcação
de espaços, práticas epolíticas falaciosas a elas direcionadas,
conforme
sua condição social.Ao
longoda
históriado
atendimento
ou
proteção, essas criançasforam
socialmente reconhecidas edenominadas
segundo
sua condição de classe: criança e adolescente, para aquelasque
correspondiamao
padrão entendido
como
“normal”ou
os“bem
nascidos”. Jáo
termomenor
serviu para os filhos e filhas das classes populares e foi, quaseque
automaticamente, associadoà
categoriados potencialmente perigosos.
Historicamente, a Igreja,
o
Estado, a sociedade e seus organismos judiciários criaramalternativas para "atender
o
menor".A
internação associada à reclusão foi vista -especialmente durante a vigência
da
legislação relativa aomenor
de idade até apromulgação
do
Estatutoda
Criança edo
Adolescente,em
1990
-,como
solução viável para osmales
extremos
da
pobreza, dentre eles,o “abandono do
menor”.Aos
poucos,a
ineficácia,irregularidades e custos dela decorrentes
provocaram
uma
revisãode
princípios,fundamentos
e práticas. Durante a vigênciados
"Códigosde
Menores",o
"menor" foi rotuladopor
conceitos estigmatizantes e idéias
que
responsabilizavam suas familias pela sua situação“irregular”,
ou
melhor, pela situação de carência materialou
moral. Foi, ainda, tratadoa
partirde métodos
coercitivos enão
raramente submetido a situaçõesde
violência fisica epsicológica. '
O
amplo movimento
de redemocratizaçãodo
Brasil (especialmentena
décadade
80)provocou, dentre outras,
mudanças de
ordem
legal.Nesse
periodode retomada da
participação políticada
sociedade civil, os direitosda
infânciaforam amplamente
revistos eo
menor
passou a ocupar, naagenda
política, o status de prioridade nacional.A
mobilizaçãosocial
ganhou
força nacional, culminando,em
1990,com
a
promulgaçãodo
Estatutoda
Criança e
do
Adolescente, Estatuto Lei 8069/90.A
grande novidadedo
Estatuto foi3
brasileiros. Seus direitos
foram
revistos e ànorma
legal passou a exigir respeitoà
sua condição infanto-juvenil.Além
disto, introduziu regimesde
atendimentoque
privilegiam a convivência familiar, comunitária e os programas educativosem
meio
aberto.As
razõesde
simples carência material
ou
moral
deixam,na nova
ordem,de
sermotivo de
reclusão edistanciamento
da
convivência familiar.Para aquele cujos direitos são violados
ou
ameaçados, a legislaçãodefiniu
mecanismos
de
proteção e de resgatede
direitos.A
normativa legal de proteção à infância,ao
superar avisão de irregularidade e substitui-la pela Doutrina
de
Proteção Integral, introduz espaçosde
participação e defesa
de
direitoscom
o
poder ea
responsabilidadede
deliberar politicas edefinir
encaminhamentos de
proteção à criança e ao adolescenteque
seencontram
submetidos à situaçãode
risco,como
a não escolarização, a fome, situações de violência, dentre tantasoutras situações
de
ações, omissõesou
negligênciasque
desrespeitam os seus direitosf Essesespaços
de
deliberação e participação são os Conselhos de Direitos,de
âmbitos nacional,estadual e municipal e os Conselhos Tutelares,
como
instância responsável por velar pelosdireitos estabelecidos
na
legislação.Legislação, teorias e instituições
foram
avaliadas e revistas.A
partirdo
Estatuto,passou-se a buscar
que
a situaçãode
risco fosse superada.Programas de
atendimentoforam
fortalecidos
ou
criados a partir desta óticaNa
prática, o respeito à condição infanto-juvenil,como
tempo
de preparação e de formaçãozdo
individuo parao
convívio social e transiçãopara a vida adulta,
tem
esbarradoem
sérias dificuldades.Mesmo
como
atendimentoem
meio
aberto -
ou
seja,'não maisem
intematos - , nos muitos programas dirigidosa
essa populaçãoinsiste-se
em
perceber a criançaou
adolescente, dentre outros entendimentos,como
limitado,incapaz
ou
potencialmente perigoso.Nesses
programas, osmeninos
emeninas
são preparados para,como
pobres,buscarem
alternativas pobres e adultas para adaptarem-se ao
modelo de
relações e distribuição desigualde
riqueza, sobrevivendoconforme
as possibilidades e os padrões decomportamento que
sãoprevistos e exigidos
da
infância e juventude pobres.A
partir dessas práticas, pode-se constatarque as "soluções" adotadas, inúmeras vezes,
têm
sido pautadasem
respostas às necessidadesimediatas,
sem
uma
perspectiva maior de fomtação integraldo
indivíduo criançaou
I
Estatuto e que ameace a sua proteção e desenvolvimento integral, ou seja, biológico, psicológico, afetivo,
L
pedagógico e social. -4
adolescente, esquecendo sua condição de sujeito de direitos e portador
de
histórias ecaracterísticas próprias.
A
situação de risco socialque
aquelas sepropõem
a superar,a
ambigüidade
dos valores ecompreensões
introjetados, ainda são definidoresde
muitasintervenções semelhantes às apresentadas aos ditos
“menores” ou à
população adultaempobrecida
em
geral.Ou
seja, realizam-seencaminhamentos
prematuros e desqualificadospara a pretendida reinserção social das crianças e adolescentes, exigindo-lhes atitudes
maduras, responsáveis, tolerantes e educadas,
de
modo
contraditório aoque
social eculturalmente se poderia esperar daqueles a
quem
atémesmo
o
direito à convivência familiare escolar foi sistematicamente negado.
As
relações travadas pelos educadores repetidamente estão “contaminadas” por valorese idéias já, ao
menos
legahnente, superadas.No
cotidianoda
relação educador e educando,mais
uma
vez sereafirmam
os valores, concepções, padrões e regrasde
convivência socialintrojetados pela classe dorninante, que os preparam, inevitavelmente, para
um
mundo
de
conformismo, submissão
ou
revolta.Um
mundo
que, maisuma
ver, desrespeitao
seu processo de desenvolvimento.Mundo
que
reproduz e perpetua, assim, atravésdo
tratamentooferecido à infância e juventude ernpobrecidas,
a
categoria social eeconômica dos
indivíduosem
"situaçãode
exclusão".Em
tais programas,o
passado,marcado
pelas experiências de exclusão das crianças eadolescentes,
tem
sido definidor de seus objetivos, de suas práticas. Taisprogramas
têm
como
referencial a situação
de
pobrezada
população atendidaMuitos
superestimam essa situaçãooferecendo, a partir desta visão, alternativas
que a
insira,de
imediato,no
mundo
adulto,de
forma
adaptada e submissa.As
iniciativas oferecidas aos filhos e fillias dos excluídosrepetem
a história
de
seus pais, isto é,da
desqualificação profissional,da
baixa remuneração,da
dependência institucional e
comportamentos
submissos.As
crianças e adolescentes assistidosnos programas de atendimento continuam
a
ser preparados -ou
não preparados - para espaçose trabalhos subaltemos,
como
o encaminhamento
para espaços irregulares e provisóriosde
moradia, dentre eles pensões e ocupações
em
terrenos baldios, e para serviçosde
empregada
doméstica, oflice-boy, assistente de pedreiro, dentre tantos outros que se
configuram
como
uma
maquiagem
ao seu já delineado futurode
desemprego
ede
desqualificação.2
Por preparação entendemos a condição dc tomar apto, pôr
cm
condições dc cnficntar determinadas exigênciaspráticas.
Em
relação à formação, comprccndcmos o processo dc educação integral, ou seja, educação c proteção para a construção do cidadão feliz.A
respeito da construção dohomem
novo, partc integrada dcum
colctivo5
A
pesquisa
O
problema
investigado diz respeito ao espaço social ocupado. pelas crianças eadolescentes excluídos e
o
tratamentoa
eles dirigido. Pretendo,a
partir' deste trabalho,contribuir para
que
os educadores e as instâncias de proteção e atendimentoem
questão revejam a sua prática ede
fato, estabelecer relações críticas, solidárias e libertadoras,que coneorram
para a superaçãodo
risco imposto aosmeninos
emeninas
submetidosa
permanentes situações
de
exclusão,de fomia a
garantir-lhes desenvolvimento integralconcernente
à
sua condiçãode
criançaou
adolescente.Neste estudo, busquei a.
compreensão
da
contradição entreo
ser criançaou
adolescente,estar
em
permanente
situaçãode
risco e ter direito aum
fiituro digno.. Pretendi investigar eanalisar a prática
da
“Proteção Integral”em
um
regimede
abrigo. Para tanto, foi necessário,preliminarmente,
compreender
o
espaço socialocupado
pela infância e juventude submetidasa
situações de contínua exclusão.Tomou-sc
imperativo, assim, levantar e estabelecer relaçõesentre as idéias correntes sobre as situações
que excluem
as crianças e adolescentesempobreeidos.
O
espaço socialocupado
pela intãncia e juventudetem
determinado, historicamente,a
sua relação
com
a
lei e, por esta razão, foi indispensável investigar a evoluçãoda
legislação relativaà menoridade
brasileiraa
partir das idéias e atendimento oferecido às crianças eadolescentes das classes populares mantidas
em
situaçãode
exclusão contínua.Além
de
investigar a relação entre aorigem de
classe das crianças e adolescentes das populações empobrecidas e sua relaçãocom
a legislação, busquei conhecer e analisar osprojetos e práticas a eles dirigidos.
A
pesquisa pautou-sena
perspectivada
investigação qualitativa.Segundo
Bogdan
eBiklen, a "pesquisa qualitativa supõe
o
contato direto e prolongadodo
pesquisadorcom
o
ambiente e
a
situaçãoque
está sendo investigada, viade
regra atravésdo
trabalho intensivode
campo"(Bogdan
e André, 1986: p.ll).A
realização desses estudos, por isto, precisoucontar
com
uma
observação intensa e prolongadano
espaçoonde
realizei a pesquisade
campo.
Na
observação cotidiana éque
as situações construídasforam
direcionandomeu
olharpara os aspectos
que
mais respondiam aosmeus
interesses.A
respeito dos interessesdo
pesquisador,Ludke
eAndré
(1986)destacam
acaracterística seletiva
da
mentehumana.
Dizem
os autores ser muito provável que, ao olhar6
das pessoas,
em
relação aoque escolhem
para "ver",dependem
de
sua história, cultura, visãode
mundo
ecompromisso
social.H
Com
o
intuitode compreender
esta problemática, dirigimeu
olhar paraum
determinado grupode
indivíduos que, ao longoda
história,tem
sido precocemente excluídodo
convívioregular
com
sua família e demais instituições formadoras ede
proteção e, conseqüentemente,impelido a assumir responsabilidades inerentes ao
mundo
adulto.A
opção de
pesquisaro
atendimento dirigidoàs “crianças e adolescentesem
situaçãode
risco", especificamente os excluídos (ou parcial/momentaneamente incluídos)
dos
mecanismos
regularesde
socialização, justificou-se porserem
eles osmais
lesados pelosmúltiplos e contínuos processos de exclusão.
A
elesforam
negados os direitosfimdamentais,
restando-lhes apenas a alternativa dos regimes
de
atendimento, definidaa
partirdo
Estatuto(Estatuto
da
Criança edo
Adolescente, art.90).A
população “atendida” nos programas de atendimentotem
como
característica,desenvolvida
ao
longo de sua história,mecanismo de
defesa e resistência a todo o processode
exclusão sofiido, e
a
teimaem
sobreviverbuscando
altemativas diversas.Dessa
populaçãoforam
selecionados aqueles cujas exigênciasde
sobrevivênciaimpuseram-lhes
um
modo
de vida adulto, traduzido pela busca demecanismos de
auto-sustentação
ou
auto-proteção, e pela necessidade de recorrer às instituiçõesde
auxílio, dentretantas outras características
comuns
aos adultosem
situaçãode
exclusão social e econômica.Embora
não
tivesse definidocomo
sujeitosde
entrevista as crianças e adolescentesatendidos, circimstâncias especiais
levaram-me
a entrevistar aquelesque o
permitiram aíincluídos os que,
a
princípio, haviam-senegado a
prestar qualquer depoimento, e depoisreviram sua posição e pediram
que
eu lhes dessevoz no
“livro”3, poisqueriam que
fosseregistrado
como
percebiamo
atendimentoque
lhes era dirigido.Os
sujeitos envolvidos, portanto,foram
as crianças e adolescentesem
situação de risco,além
daquelesque
com
eles trabalharam.Foram
igualmente sujeitos e objetosda
pesquisaaqueles
que
por -ou
sobre - eles falaramou
escreveram.Em
síntese,foram
sujeitos-objetos ascrianças e adolescentes, os educadores dos programas
que
os receberam,os
própriosprogramas, através
de
seus educadores e técnicos, e a legislação pertinente.Dentre os projetos analisados, foi selecionado,
a
priori,um
dosprogramas de
atendimento desenvolvidos pela Prefeitura
de
Florianópolis,o
Albergue Santa Ritade
Cássia.3 Assim
7
A
seleção tevecomo
critérioo
fimcionamento
da
instituiçãoem
regimede
abrigo4,o que
acaracteriza
como
um
espaço mais representativodo
relacionamentoda
sociedadecom
apopulação alvo,
além
das caracteristicas dascriançasou
adolescentes assistidos: encontrarem-se
em
situação de risco e corresponderem aos que,na
antiga legislação, certamente seriamencaminhados
para instânciasde
intemamento, reclusão e, conseqüentemente, seriam alvode
práticas educativas de “recuperação, ressocialização, reeducação, readaptação, re...,' re..." -
aqui por
mim
cunhadas de práticasda
"re".Fundarnentada
na
"escolha"da
situação a ser pesquisada e para alcançar os objetivospropostos, recorri, inicialmente, a estudos de publicações, artigos, periódicos, pesquisas.
Como
instrumento de pesquisa, fizuso
das técnicas de entrevista semi-dirigidas e observaçãodo
cotidianono
espaço pesquisado.A
partir da técnicade
observação,pude
dirigirminha
atenção a situações específicas
que
resgatavam os direitos violadosou expunham
as criançaseos adolescentes a novas situações
de
risco.Dessa
observação detalhada, continua e cuidadosa,foram-se revelando os elementos necessários para
uma
melhor compreensão
da problemáticaque
eume
havia proposto a estudar.A
observaçãoem
um
espaço determinado facilitou a aplicação das entrevistas e,principalmente, a observação,
no
cotidiano,da
proposta institucional,da
prática e das relaçõestravadas entre educador-educando.
No
espaço definido, realizei observações e entrevistassemi-dirigidas, aplicadas aos educadores, crianças e adolescentes deste programa.
Em
outrosprogramas, levantei elementos
que
subsidiaram a análise idas idéias sobre a infância eadolescência, a partir de suas propostas e práticas educativas.
Além
da análise dos projetosoficiais, realizei quinze entrevistas
com
educadoresnão
sódo
Albergue,mas
também
da
retaguarda institucional de atendimento municipal.
Foram
também
entrevistadosmembros
dos
Conselhos Tutelares (cinco entrevistados)
em
funçãode
sua relação direta, obrigatória eimprescindível
com
o
atendimento prestadono
abrigo.H
'
Objetivando viabilizar
a
pesquisa pretendida, organizei os procedimentos metodológicos básicos e,em
seguida, a partir dos fatos observadosno
cotidianodo
atendimento,
foram
elaborados roteiros de entrevistascom
a conseqüente sistematização das informações e observações obtidas.Vale
ressaltarque
cadaum
dos entrevistadosou grupo de
entrevistados teve roteiro de entrevista especifico, pautado nas relações que eles estabeleciam
com
o
abrigadoou
com
a instituição,como
espaço educativo de resgate de direitos dascrianças e adolescentes atendidas.
4 4 Estatuto
8
A
pesquisa desenvolveu-se a partir demomentos
e eventos diversos quevieram
a seentrecruzar e intercomplementar.
Foram
eles: participaçãono
curso deformação de
educadores
promovido
peloMOVERS,
observação, entrevistas realizadascom
educadores emeninos
emeninas
em
risco, participaçãoem
reuniões internas ecom
a retaguardainstitucional; visitas e entrevistas a programas- complementares,
acompanhamento
a técnicosou
adolescentesem
atividades externas-
procurade
emprego, procura de espaço paraegressos
morarem,
mendicância de adolescente abrigado, detenção de adolescentesem
programa de
intemarnento provisório, ações concretasde
desligamento,além de
acompanhamento
de egressos. «'
Como
os profissionaisdo Abrigo
investigado limitarn, na grande maioria, seu âmbitode
ação ao espaço ñsico
da
instituição, foi necessárioque
eu buscasse apoio, para informações complementares, junto a educadores e técnicosdo Programa
Abordagem
de Rua,que
serelacionam cotidianamente
com
as crianças e adolescentes expostos a situaçõesde
ma,
jáque
esse Programa, ao
menos
em
tese, deve cumpriruma
etapa preliminar aoencaminhamento
auma
entidadede
atendimento.Além
dosProgramas do
Albergue Santa_Ritade
Cássia ede
Abordagem
deRua,
osProgramas de
Liberdade Assistida/Prestaçãode
Serviço àComunidade, Casa da
Liberdade -Espaço Cidadão
e ainda os Conselhos Tutelarescomplementaram
e enriqueceram asinformações obtidasó.
Cabe
ressaltarque algumas
colocações oriundas das entrevistaspodem
parecermuito
categóricas
ao
leitor desavisado. Objetivei, contudo,o
rigordo
diálogo mantido a partir dasafirmações que
se repetiramcom
expressiva freqüência durante as entrevistas realizadas.transição para a colocação
em
família substituta, não implicando privação de liberdade."SMOVER
- Núcleo de Movimentos Sociais do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Catarina.Durante a pesquisa, as fichas de inscrição de participantes no Curso de Formação dos Educadores do Albergue se tomaram instrumental de extrema importância
6
Percentual de profissionais entrevistados por programa:
Albergue
Sama
Rita de Cássia: 5 educadores (65% do total), l Arte Educadora' (100%), l Assistente Social (l00%) e coordenadora (100%).I Casa da Liberdade: nesse espaço só a coordenadora foi entrevistada.
A
entrevista foi direcionadaexclusivamente aos preconceitos percebidos pelos educadores do Albergue no que diz respeito à "rejeição
camuflada" do Programa
em
relação aos meninos e meninas encaminhados para participação nos cursos profissionalizantes (sic ‹ educadores do Albergue e da Abordagem de Rua).I Conselho Tutelar da Ilha: 4 conselheiros, correspondentes a
100%
de sua totalidade.A
entrevista emborainicialmente tivesse sido combinada de se realizar individualmente, por solicitação dos próprios conselheiros se realizou de forma coletiva.
O
resultado, sem dúvida, foi muito mais rico.' Conselho Tutelar do Continente: 1 Conselheiro entrevistado por ocasião de
um
operaçãoem
que as crianças pedintes foram recolhidas das mas e suas famílias encaminhadas para o Promotor da Infância e daJuventude.
1 Liberdade Assistida e Prestação de Serviço à Comlmidade:
50%
dos técnicos foram entrevistados.9
Para analisar os procedimentos de proteção adotados, optei por trabalhar a partir
de
trêssituações específicas, pinçadas dentre várias,
mas
que melhor
ilustraramo
aspectosque
pretendi analisar neste trabalho.
A
escolha das situaçõesnão
sedeu
aleatoriamente,mas
apartir das relações estabelecidas
com
os abrigados, dosencaminhamentos
sobre as suas vidase, especialmente,
da
relação de dependência institucional.Foram
analisadas as detemiinaçõesdirecionadas aos adolescentes abrigados entre os
meses de
outubro de1996
a fevereirode
1997.
É
indispensável salientarque
percorrium
caminho
cauteloso parame
aproximardos
meninos
abrigados. Inicialmente passei a fieqüentaro
Albergue Santa Rita de Cássiacomo
membro
da
coordenação deum
Curso de
Extensão deFormação
deEducadores promovido
pelo Centro de
Educação da
Universidade Federalde
Santa Catarina, realizadono
prédiodo
Albergue.
Aí
mantive os primeiros contatoscom
osmeninos
e meninas.Terminado o
curso, jámantendo
um
bom
relacionamentocom
educadores e meninos, discuti não sócom
acoordenadora,
mas
também
com
educadores e adolescentes abrigados a proposta de realizar aminha
pesquisa naquele espaço. meninas,em
particular, mostraram- senão
somente
abertas para colaborar
no
estudo proposto,mas
especialmente ansiosas paraserem
entrevistadas, chegando, inclusive, a cobrar as entrevistas.
Sempre que
possível(80%
dasentrevistas), ouvíamos,
menina
e eu,o
resultado das gravações e discutíamos oque
havia sidodito.
Os
meninos, inicialmente,pediam
para serem entrevistados,mas
evitavam falarde
si próprios.À
medida
queo
tempo
passou, epudemos
nos
conhecermelhor
e - porque não
dizer? -,puderam
confiarmais
em
mim,
passaram a colaborar ativamente, falandode
suasvidas e, especialmente, de seus sentimentos de rejeição, insegurança, ñustração, "raivas" e
medos.
A
questãoque fundamentou o
processode
pesquisa pautou-seno
entendimentoda
relação entre
o
atendimento das necessidades imediatas eo
futuro dosmeninos
e dasmeninas
"atendidos".
O
estudo desta relação, por sua vez, desencadeou outras questõesde
especialimportância para a
compreensão do
atendimento investigado.Vejamos algumas
delas: osprogramas
de atendimento não estariam limitando-se a guardar e sustentar osmeninos
emeninas
em
espaços institucionais,sem
uma
preocupaçãocom
o
futuro dos seus"protegidos"?
Os
instrumentos oferecidos duranteo
processo de atendimentotêm
oportunizado ao
jovem
adulto condições de superar a condição social de dependentede
açõesda
assistência compensatória? Estariao
atendimentotomando
osmeninos
e meninas, antesadultizados,
em
jovens adultos infantilizados, desprotegidos e fadados a pertenceremao
grupo dos "desprotegidos"'?10
Vale destacar que, para construir elementos de
compreensão
das questões levantadas,foi imprescindível conhecer e
compreender
as situações que, geradas (oumesmo
reforçadas)no
cotidiano,tornam
osmeninos
emeninas
mais vulneráveis, mais sujeitos às situaçõesde
risco.
Buscando compreender melhor
esta questão, busquei,em
um
primeiromomento,
através
de
entrevistascom
educadores, trabalhar a partir deuma
única "questãoprovocadora
que
motivosexpõem
as crianças e adolescentes a situações de riscode
modo
alevá-las a precisar
da
proteção deum
programa
de atendimento específico?Terminado o
processode
investigaçãoda
práticado
atendimento, passei a sistematizaros elementos de análise que se destacaram,
ou
melhor,que mais
me
chamaram
a atenção para,em
seguida, organizar idéias ecompreensões que
surgiram e se interrelacionaramao
longodo
~
processo de investigaçao.
A
sistematização dos estudos
_A
partir da pesquisade
campo
passei a centrarmeus
estudosem
uma
categoria euma
situação específica: "a infância e a juventude"
como
tempo
de vida presente ede
formação/preparação para
o
mundo
adulto eo
atendimentode
meninos
emeninas
submetidos(as) a situações de risco.
Inicialmente vale destacar
que algumas
idéias básicasforam
construídas duranteo
processo de pesquisa.
A
primeira diz respeito às relações contraditórias construídas a partirda
divisão da sociedade
em
classes sociais antagônicas. Paracompreensão da
idéiade
contradição e sua superação trabalhei especialmente
com
Cury. Outro elementoque
serevelou durante
o
processo de pesquisa diz respeito à idéia detempos de
transição.Para
compreensão
deste tema, foi indispensável a contribuiçãode
Freire.O
primeiro capítulo tratade
uma
introdução à questãoda
infância eda
juventude.Destaco aí a heterogeneidade
da
infância eda
juventude a partirdo
lugarisocial ocupado,construído este, historicamente, pela divisão
da
sociedadeem
classes desiguais e antagônicas.De
acordocom
a condição social éque
a infância e a juventude se desenvolvem.A
partirdo
lugar social ocupado,
o
seu desenvolvimentopode
se caracterizar pelo prolongamentodos
tempos
de convivência familiar e dilataçãodo
tempo
e escolarização formal ou, ao contrário,pela troca desses espaços de proteção e formação pelo
mundo
adulto das responsabilidadesde
auto-subsistência e auto-proteção.
Em
seguida,sem
intençãode
esgotar o assuntonem,
muito menos, detomar
homogênea
ll
preparação para
o
mundo
adulto,ou
seja, a maioridade social e legal. Trabalho, nessecapítulo, especialmente
com
os estudos realizados por Ariès,Abramo
eCarmo.
No
segundo
capítulo,aproximando-me
gradativamentedo
objetode
estudo, localizo ainfância e a adolescência
no
Brasil.O
tempo
de
transição para a idade adulta aí é relacionadodiretamente
com
a menoridade e maioridade legal.Nesse momento,
os estudosde
Rizzini(Irma e Irene) se tornaram instrumental básico
de
reflexão.A
partirda
análise das diferentes infâncias eda
relação das crianças e adolescentes excluídoscom
a lei ecom
a assistência, passo a enfatizar a legislação específica, isto é,da
transiçãodo Código
deMenores
(1979) eda
práticado
internamento dos filhos e filhas dospobres, até a
promulgação do
Estatutoda
Criança edo
Adolescente (1990). Aí contraponho ateoria
da
Situação Irregular -Código
- â Doutrinada
Proteção Integral - Estatuto.Nesse
momento,
autores vinculados aos estudos danorma
legalcomo
Altóé,Campos,
Rizzini ,Costa, Petry, Volpi e Sandrini,
tomaram-
se imprescindíveis.1
A
prática e a realidade, aoserem
lastro para a interpretação deste todoque
restringeo
direito dos excluídos â infância, apontam, por sua vez, elementos norteadores para a
investigação implementada.
A
Pastoraldo Menor, o
Projeto'Axé eo
Movimento
Nacionalde
Meninos
eMeninas
deRua
(MNMMR)
foram referência especial, pelo seu entendimento erespeito â condição infantil, e tornam- se estudos enriquecedores para aqueles
que
ainda acreditamque
os direitosda
infânciadevem
ser prioridade deuma
humanidade que não
tem
poupado
o
seu próprio futuro.No
terceiro capítulo, analiso, após ter apontado algumas dificuldades de conceituar aposição
ocupada
pelas crianças e adolescentesque
vivenciam situações continuadasde
extrema pobreza, as dificuldades
que
ocorrem,em
todo período de transição, para a implantação 'do Estatuto. São levantadas então,conforme
entrevistas realizadasem
cinco dosProgramas
Municipais de Proteção à Infância e Adolescência florianopolitanas, as situaçõesque mais
expõem
as crianças e adolescentes das classes populares ao risco deperderem
o
seudireito â condição infanto-juvenil e,
com
isto,verem
seqüestradas as suas possibilidadesde
preparação e
fomiação
parao
futuro. _A
idéiada
exclusão, maisdo que
qualquer outra, fez-se presente duranteo
processode
investigação e construção de
minha
análise.Marx
(1996), Nogueira (1993), Martins (1997) eConel (1995) sustentaram as idéias
de que
a exclusão decorreda
divisão socialem
classesantagônicas.
Embora
existam nuanças que.fazem
com
que
classes intermediárias seintercmzem
em
determinadas circunstâncias, epossam
semovimentar
parcialmentede
um
12
forma
coletiva e orgânica.Aproximando-se da
realidade brasileira, desta vez localizadana
classe dos excluídos, contar-se-á
com
os preciosos estudosde Rago, Gouvea,
Kramer
esz-móúzú.
`
Aponto, inicialmente,
o
riscoda
exclusão estmtural7 e a sua relaçãocom
a conjugação de elementosque
se articulam, interpenetram e a reforçam. Esse risco engendra situaçõescotidianas
que
desgastam as relações intra-familiares e inserem as crianças e adolescentespobres, precocemente,
no
mundo
adulto submetido aos muitos e permanentes processosde
exclusão (pela imposição de responsabilidades
de
auto-subsistência e auto-proteção).Sem
a pretensão deuma
análisemais
profunda,o
quarto capitulo, finalmente,tem
um
caráter apresentador
do
quadro institucional e das relações e articulações externas,da
proposta pedagógica e das relações entre educador e abrigado. Atenho-me, aí,ao
propósitode
destacara dinâmica
do
espaço pesquisado.Nessa
faseda
pesquisanão
só as relações se encontraram,compondo
um
todo,como também
construíramum
entendimento integradodo
tema.Os
estudiosos dos direitos
da
infância eda
adolescência, especialmente Petry, Sandrini e Passeti,encontraram-se
com
especialistasda
assistência, Sposati eYasbeck
que, por sua vez,relacionam-se
com
autoresda
educação, Freire e Graciani. Estes, por sua vez, exigiramque
profissionais
da
antropologia,como
Rago
e Lecziniski, viessem a auxiliarnuma
compreensão
mais
completado
quadro a ser formado.Destaco,
em
seguida, a atenção diferenciadano
tratamento a partir dostempos de
vida,isto é, das idades.
Aí
ostempos da
vida (infância, juventude) são visivelmente caracterizadospela
concepção da
docilidade dosmeninos
emeninas menores
em
contraposição à rebeldia,irreverência e irreversibilidade da condição “irregular” dos
meninos
emeninas
maiores.Uma
vez apresentada a posição socialocupada
pela infância e juventude pobres (cap. l)e
o
seu respectivo atendimento (cap. 2 e 3), e tendo destacadoum
regime eum
programa
específico (abrigo, Albergue Santa Rita de Cássia), ainda
no
capítulo4
afunilandoo
âmbitoda
análise a situações específicas de encaminhamentos, dividoa
voz, atémesmo
porque
assimeles solicitaram,
com
os sujeitos de direitos abrigadosno
Albergue. Dito melhor, analiso osencaminhamentos
técnicosem
relação a situações de violações específicas, entre as quais se7
Quando faço referência à exclusão estrutural, trato das situações geradas pelo modelo capitalista pautado na
divisão do trabalho, modelo que aliens o
homem
não só dos meios de produção como também da capacidade de assegmar sua subsistência Vale ressaltar que, dentro da perspectiva que este trabalho assume, não pretendo aqui estabeleceruma
relação mecânica de causa e efeito entre a estrutura e a supcrcstrutura. Parto do principio que,embora as relações econômicas capitalistas determinem situações de exclusão estrutural, as demais relações (especialmente aquelas que repercutem nas idéias, políticas, instituições, organizações especificas e no
cotidiano) não são estáticas e definitivas, mas produzem efeitos e reagem sobre a estrutura
em
um
processo de13
destacaram os problemas
de recambíamento
familiar, a inoperânciado
atendimento prestado, as irregularidadesno encaminhamento
parao
trabalho eo
desligamentosem
a devida preparação e apoio ao egresso.Situados
em uma
realidadede
exclusão, atendidos porum
programa de
proteção,Sandro João, Ester,
Mano,
Tarcísio e Jackonscontinuam
a ter os seus direitos violados eo
seufuturo negado.
Na
medida
em
que
seutempo
de
infância passou, e a sua juventude não foi (oué) respeitada, passaram a ter à sua fiente
uma
nova
situação de risco,o
riscoda
maioridade.Se
antesforam
descritoscomo
crianças e adolescentes adultizados pela inserção precoceno
mundo
das relações adultas, a maioridade os impele parauma
nova
categoria - a de adultosimaturos, desqualificados e desprotegidos e usuários
de
espaços paliativos e pontuaisde
atenção à população adulta
em
situação de risco, os jovens-adultos excluídos.Na
conclusão retomo a dificuldadede
implantar as novasnormas
legais e asnovas
concepções sobre os direitos
da
infância eda
adolescência a partir de sua condição social.O
tempo
presente exige a implantação danova
legislaçãoem
um
momento
em
que
ainda sãointrojetadas práticas e representações que, teórica e legalmente, deveriam ter sido superadas.
O
tempo
presente, portanto, é.um
tempo
de
transição de leis e concepções. Este éo
grandedesafio na implementação do
Estatutoda
Criança edo
Adolescente: garantir os direitos, aproteção e a
formação
para a vida adulta das crianças e adolescentes excluídos, a partirde
um
novo compromisso,
clareza e determinação por parte das instâncias responsáveis.Da
opção
ideológica e
compromisso
social dessas instânciassurgem
possibilidades diversas: areprodução
da
exclusão de jovens-adultos, a inserção parcialcom
a devida adaptação dessesjovens ou, sob
uma
nova
perspectiva, a construçãode
jovens aptos a assumir seu lugarde
sujeitos
da
história.Vale ressaltar
que
os diversosmomentos
da
pesquisa não ocorreram deforma
estanque.Como
elementos deum
todo, as partes entrelaçaram-se, contrapuseram-se, integraram- se einterpenetraram- se, negaram- se
ou confirmaram-se formando
um
todo.Os
conhecimentosobtidos através
da
pesquisa pretenderam captar essas partes, suas contradições e mediações,de
forma
ame
levar a entender a raiz, as repercussões e os caminhos de superaçãoda
problemática analisada.
Finalmente quero ressaltar a dificuldade
que
tiveem
mantero
distanciamentocomo
pesquisadora,
sem
poder intervir diante de tantas violações, ações e omissões presenciadas8
Os nomes apresentados são fictícios, ou melhor, apresentei aos adolescentes que participaram deste processo de
estudo nomes de outros estimados adolescentes que fizeram parte da minha vida profissional enquanto educadora de rua
14
durante todo
o
processode
investigação.Embora
não
tivesse pretendido,em
momento
algum,tomar
este espaço decompreensão da
realidadeum
espaço de denúncia, foi inevitávelque
istoocorresse.
Oxalá
a presente dissertaçãovenha
servir de elemento para revisão das politicas epráticas educativas
que
cristalizam a isituação de risco de ser criança e adolescente
em
situação
de
exclusão.Espero, através deste estudo sobre as atenções dirigidas à- infância e juventude
brasileiras, poder contribuir para