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Doenças Desmielinizantes Esclerose Múltipla

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Academic year: 2021

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Temas da Aula

• Doenças Desmielinizantes – Esclerose Múltipla o Epidemiologia o Dados Demográficos o Fisiopatologia o Padrões Evolutivos o Quadro Clínico o Diagnóstico o Terapêutica

Bibliografia

 Anotada do Ano Anterior;

 FERRO, J., PIMENTEL, J.; “Neurologia – Princípios, Diagnóstico e Tratamento”;

 Slides da aula.

Doenças Desmielinizantes – Esclerose Múltipla

As doenças desmielinizantes caracterizam-se por inflamação e destruição selectiva da mielina do sistema nervoso central (SNC). O sistema nervoso periférico (SNP) não é atingido e a maioria dos doentes não tem evidência de doença sistémica associada.

Tema da Aula Teórica: Esclerose Múltipla Autores: Eduardo Espada e João Vian Nunes Equipa Revisora:

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Embora a sua etiologia não esteja ainda totalmente esclarecida, evidências apontam para um mecanismo auto-imune subjacente que tem por alvo a bainha de mielina dos neurónios do SNC.

A EM atinge o SNC de forma politópica, com focos dispersos nos hemisférios cerebrais mas com especial predomínio na substância branca periventricular, tronco cerebral, cerebelo e medula espinhal. Em termos anatomopatológicos a doença caracteriza-se por:

• Lesões focais da substância branca (placas);

• Desmielinização e axónios relativamente preservados nas lesões mais recentes;

• Gliose (formação de cicatrizes) e perda neuronal nas lesões mais antigas; • Infiltrados inflamatórios perivasculares.

As manifestações da doença variam desde uma forma benigna a uma doença rapidamente progressiva e incapacitante, que exige profundas modificações do estilo de vida.A esclerose múltipla é a grande causa de incapacidade em adultos jovens por doença primariamente neurológica no ocidente. É uma doença imprevisível, com um prognóstico de difícil definição e sem elementos preditivos (clínicos, paraclínicos ou laboratoriais) de valor seguro.

E

PIDEMIOLOGIA

A prevalência da EM apresenta grande variabilidade no mundo Ocidental, variando entre os 30 e os 200/100.000 habitantes, sendo que em

Portugal esta será de

aproximadamente 50/100.000

(prevalência intermédia).

Estudos epidemiológicos recentes demonstraram que existe um gradiente crescente da prevalência da doença

com a latitude, ou seja, esta é praticamente inexistente nas regiões equatoriais e máxima nas regiões temperadas (Figura 1).

Figura 1. Variação da prevalência de EM com a latitude.

(3)

Dados fornecidos por estudos sobre migrações vieram demonstrar que o risco de desenvolver a doença varia com a idade em que a migração ocorre: se esta tiver lugar antes dos 15 anos (idades precoces), os indivíduos adquirem um risco semelhante ao dos residentes da latitude para onde migraram; se a migração ocorrer mais tardiamente (idade adulta), o risco de desenvolver a doença é igual ao existente na latitude a partir da qual migraram.

Deste modo é possível concluir que a EM é provavelmente uma doença de etiologia multifactorial para a qual contribuem aspectos individuais (genéticos) e factores ambientais ainda não identificados.

D

ADOS

D

EMOGRÁFICOS

A EM é uma doença do adulto jovem, estando a idade de início compreendida entre os 20 e os 40 anos e o pico de diagnóstico na 3ª década de vida (as manifestações são raras antes dos 15 e após os 60 anos). A relação de incidência Feminino:Masculino é de 2:1. Um familiar directo de doente com EM tem um risco 4 a 5 vezes superior de desenvolver a doença relativamente a um indivíduo sem estes antecedentes.

Esta patologia apresenta incidência diferente consoante as etnias. Estudos nos EUA demonstram que a razão de incidência nos Afro-Americanos é 0,43 dos Caucasianos, sendo que para os asiáticos se verifica uma razão ainda menor (0,22). Para além disto, há minorias em que se verifica uma elevadíssima incidência da doença: ciganos, índios americanos e esquimós. Parece também haver uma correlação entre estado sócio-económico e frequência da doença.

F

ISIOPATOLOGIA

A condução nervosa nos axónios mielinizados ocorre em saltos, com o impulso nervoso “saltando” de um nódulo de Ranvier para o seguinte, sem despolarização da membrana axonal que se encontra sob a bainha de mielina entre os nódulos. Este mecanismo permite velocidades de condução consideravelmente mais altas do que as produzidas pela propagação contínua nos nervos não-mielinizados. Quando o impulso nervoso não consegue atravessar o segmento desmielinizado há bloqueio

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Tal como referido anteriormente, embora a fisiopatologia da doença não esteja ainda suficientemente esclarecida, admite-se que a EM seja uma doença imunomediada e que factores genéticos e ambientais contribuem para uma resposta imunológica alterada, cuja consequência mais imediata é a inflamação e a desmielinização e, por fim, a perda neuronal.

Nos doentes com EM existem subpopulações de células T auto-reactivas1 contra determinantes antigénicos existentes na mielina do SNC, subpopulações essas que são activadas por factores ainda desconhecidos que podem incluir superantigénios, infecções virais ou o próprio stress. Originam-se deste modo células Th-1 activadas que são susceptíveis de penetrar no SNC através da barreira hemato-encefálica, ligando-se para tal a receptores específicos da membrana endotelial – E-selectina, molécula de adesão vascular 1 (VCAM-1) e molécula de adesão intracelular 1 (ICAM-1).

Uma vez no interior do SNC, através de um fenómeno de mimetismo molecular essas células Th-1 activadas atacam os determinantes antigénicos da membrana de mielina. Os detritos da membrana são entretanto fagocitados pela microglia (constituída por fagócitos do SNC derivados da medula óssea) e posteriormente apresentados a novos linfócitos T, num fenómeno mediado pelo complexo HLA classe II – deste processo resultará a activação de outros tantos mecanismos imunitários envolvendo a via do complemento, células B e anticorpos, IFN-γ, a activação de macrófagos e a libertação de factores de necrose tumoral (TNF-α e TNF-β), para além de ainda outros mediadores cujo papel só agora começa a ser estudado, como a via do glutamato, óxido nítrico, proteases, via das caspases e sistema da perforina/granzima. Há assim uma auto-perpetuação da inflamação e são criadas as condições para a apoptose e morte dos oligodendrócitos e neurónios.

Embora a preservação dos axónios seja típica da EM, pode também ocorrer destruição axonal parcial ou total, existindo fortes evidências de que a perda axonal é uma causa importante de deficiência neurológica irreversível na EM.

Podemos, então, considerar três graus de lesão, com características de transitoriedade e recuperação variáveis:

1. Inflamação  Defeito transitório; Remissão espontânea.

1 Sabe-se, no entanto, que a percentagem total de células Th1 auto-reactivas não é mais elevada

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Figura 2. Os processos patólogicos e imunológicos subjacentes à EM.

2. Desmielinização  Defeito permanente, com flutuações induzidas pelo calor; Recuperação potencial, nunca completa, através de Remielinização pelos Oligodendrócitos.

3. Perda neuronal  Defeito permanente, sem flutuações; sem Recuperação potencial.

A ordem comum de aparecimento das lesões é: medula espinhal  tronco cerebral  hemisférios cerebrais. Resta ainda esclarecer o porquê da EM ser uma doença crónica do SNC e não apenas uma situação aguda.

(6)

P

ADRÕES

E

VOLUTIVOS

O aspecto mais relevante respeitante à clínica da EM é a sua grande variabilidade, daí que encontremos vários padrões evolutivos e uma clínica muito rica e diversificada, facto que se explica pela multiplicidade aleatória de lesões disseminadas na substância branca do SNC. Com a passagem do tempo, a díade Inflamação-Reparação tende a diminuir e a Neurodegeneração tende a aumentar.

I: EM Recorrente-Remitente

A doença tem uma evolução inicial por episódios neurológicos ou surtos que se sucedem no tempo com periodicidade variável; geralmente verifica-se um surto por cada 2 anos. Devido a isto, também se chama a este tipo de manifestação da doença Esclerose Múltipla com “Evolução por surtos” (Figura 4).

Os surtos caracterizam-se por sinais e sintomas que traduzem a presença de múltiplos focos de inflamação do SNC e desmielinização, com uma topografia preferencial: nervo óptico, substância periventricular, cerebelo, tronco cerebral e medula espinhal. Esses sintomas instalam-se durante alguns dias e estabilizam dentro de 4 semanas, regredindo parcial ou totalmente – quer isto dizer que a recuperação pode ser total ou ter sequelas e haver deficiência residual após a recuperação.

Por definição, um surto não é induzido pelo calor ou por febre, dura mais de 24 horas e estende-se por um período de 4 a 6semanas, sendo que todos os sinais e sintomas neurológicos que surjam ao longo de 1 mês fazem parte do mesmo surto. Os surtos podem incluir novos sinais e sintomas ou consistir num agravamento de sinais pré-existentes.

Esta forma de EM verifica-se em cerca de 85% dos casos de início de doença. Figura 4. EM Recorrente-Remitente.

(7)

Figura 5. EM Primariamente Progressiva.

Figura 6. EM Secundariamente Progressiva.

II: EM Primariamente Progressiva

A doença progride desde o início com plateaus sem que haja individualização de surtos (Figura 5). Estas formas primárias progressivas têm algumas particularidades importantes:

• Surgem mais tardiamente, nas 4ª ou 5ª décadas de vida;

• Atingem igualmente os dois sexos;

• Há menos lesões inflamatórias e

desmielinizantes na substância branca encefálica, predominando a perda neuronal;

• As formas mais frequentes são as que afectam especialmente a medula, manifestando-se a doença como uma paraparésia ou tetraparésia lentamente progressivas.

Esta forma da doença é encontrada em menos de 10% dos doentes com EM.

III: EM Secundariamente Progressiva

A evolução inicial da doença é sob a forma Recorrente-Remitente, mas depois entra numa fase progressiva – formas secundárias progressivas (Figura 6).

Com o passar dos anos vai-se somando incapacidade cumulativa e os surtos tornam-se menos frequentes. Passados, em média, 15 anos após o diagnóstico da doença um importante número de doentes refere agravamento insidioso dos defeitos neurológicos.

Embora a evolução progressiva da EM não seja inevitável, 80% dos doentes encontram-se em fase secundária progressiva 25 anos após o diagnóstico.

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Figura 8. Frequência de alguns Sinais e Sintomas, no início da EM, e durante a evolução da doença.

IV: EM Remitente-Progressiva ou Transicional

Em casos muito mais raros (menos de 5% da totalidade dos doentes) a doença pode ter uma evolução insidiosa e progressiva desde o início, pontuada no entanto por surtos de agravamento muito bem individualizados (Figura 7).

O que é fundamental reter quanto a esta doença é que nela coexistem 3 fenómenos

biológicos distintos: Inflamação, Desmielinização e Perda axonal.

A inflamação e a desmielinização são os fenómenos responsáveis pelos episódios de exacerbação da doença e os defeitos residuais que daí resultam, enquanto a perda axonal explica a evolução progressiva da EM, condicionando incapacidade cumulativa e irreversível.

É ainda importante perceber que, embora seja possível individualizar estes 4 padrões evolutivos da doença, a sua variabilidade é a regra: os surtos ocorrem com periodicidade muito diferente, variando quer num mesmo doente quer de doente para doente. Um indivíduo pode estar vários anos sem aparentemente experimentar um episódio de exacerbação, tendo depois vários surtos num curto intervalo de tempo e a evolução progressiva, embora frequente, não é inevitável.

QUADRO

CLÍNICO

O Quadro Clínico da EM divide-se em Sinais e Sintomas Típicos e Atípicos, sendo que os primeiros aparecem por lesão na substância branca, sendo mais precoces na doença e os últimos

aparecem por lesão na

substância cinzenta, surgindo em fases mais tardias da patologia.

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Figura 9. Nevrite Óptica com escotoma central, devido a nevrite retrobulbar aguda.

Sinais/Sintomas Típicos

• Nevrite óptica • Fraqueza

• Espasticidade e outros sinais piramidais (hiperreflexia osteotendinosa, clónus e sinal de Babisnki)

• Sintomas e sinais sensitivos • Sinal de Lhermitte

• Nistagmo, diplopia e vertigens • Disfunção vesical e sexual

A Nevrite Óptica (Figura 9) apresenta-se como diminuição da acuidade visual, turvação unilateral da visão ou redução da percepção das cores no campo central da visão; estes sintomas podem ser leves ou evoluir para perda visual grave. A preceder ou a acompanhar a perda visual existe muitas vezes dor peri-orbitária, que é agravada pelos movimentos oculares.

O quadro clínico instala-se em poucos dias,

estabiliza e regride em semanas ou meses. Enquanto a recuperação da acuidade visual é habitualmente total num período máximo de 6 meses, podem por vezes persistir alterações da percepção cromática.

A Nevrite Óptica é surto inaugural de EM em cerca de 35% dos casos e cerca de 60% dos doentes com a doença experimentarão um episódio ao longo da sua evolução.

A Fraqueza dos membros pode manifestar-se como perda de força ou destreza, fadiga ou distúrbios da marcha. A fraqueza induzida pelo exercício físico é um sintoma típico da EM – essa fraqueza é do tipo do neurónio motor superior e acompanha-se frequentemente de outros sinais piramidais. Tende a aparecer como um dos primeiros sintomas em 48% dos doentes.

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A Espasticidade está muitas vezes associada a espasmos musculares espontâneos e induzidos por movimentos. Mais de 30% dos doentes com EM têm espasticidade moderada a grave, especialmente nos membros inferiores, no início da doença, sendo que mais de 80% dos doentes apresentarão este sinal no decurso da sua doença. Em numerosos casos ocorrem paralelamente espasmos dolorosos que podem interferir na capacidade de andar, trabalhar ou cuidar de si mesmo.

Os Sintomas sensitivos são variáveis e incluem parestesias e hipostesias, sendo inaugurais em 31% dos doentes.

O Sinal de Lhermitte consiste numa sensação de choque eléctrico, suscitada pela flexão do pescoço ou outro movimento, que se irradia ao longo da coluna vertebral até às pernas. Mais raramente irradia também para os braços.

A Diplopia pode resultar de oftalmoplegia internuclear ou da paralisia do VI par craniano (raramente do III ou IV). A primeira, que é particularmente sugestiva de EM, consiste no comprometimento da adução de um olho por lesão do fascículo interno/medial homolateral. Com frequência verifica-se Nistagmo proeminente no olho em abdução juntamente com ligeiro desvio simétrico. As Vertigens podem aparecer de forma abrupta e simular Labirinte aguda. A sua origem no tronco cerebral (e, portanto, num contexto de EM) em vez de no órgão-alvo é sugerida pela presença de disfunção crescente coexistente no N. Trigémeo ou no N. Facial, de nistagmo vertical, ou de nistagmo que não exibe latência no início, nem inversão da direcção e não fatiga.

Disfunção vesical – Os sintomas de disfunção vesical estão presentes em >90% dos doentes com EM, e em 33% a disfunção resulta em episódios semanais (ou mais frequentes) de incontinência.

A Disfunção sexual é comum na EM; os homens relatam impotência, redução da libido, menor sensibilidade genital, deficiência da ejaculação e incapacidade de atingir/manter a erecção; as mulheres referem dormência genital, diminuição do orgasmo, redução da libido, sensações desconfortáveis durante o acto sexual e menor lubrificação vaginal.

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Figura 11. Ataxia axial. Figura 10. Ataxia apendicular: dismetria e tremor intencional.

Sintomas/Sinais Atípicos

• Afasia

• Hemianópsia

• Perturbações dos movimentos extra-piramidais • Atrofia grave da massa muscular

• Fasciculação muscular

• Ataxia apendicular (Figura 10) ou axial (Figura 11), com disartria e nistagmo cerebeloso – tétrada de Charcot

• Obstipação ou Incontinência fecal

• Demência (quadros mais avançados da doença)

• Defeito cognitivo (perturbação dos mecanismos de evocação e, sobretudo, lentificação no processamento da nova informação, com repercussão na aprendizagem)

De seguida é apresentada uma tabela que representa a correlação entre as localizações mais frequentes das lesões de EM e os sintomas a elas associados.

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Figura 12. Relação da distribuição de lesões com sintomas.

Esclerose Múltipla e Incapacidade

A EM é uma doença imprevisível e com prognóstico difícil de estabelecer individualmente. A incapacidade que a caracteriza resulta essencialmente de 2 factores:

• Defeito cumulativo que resulta das sequelas de surtos sucessivos,

• Evolução progressiva da doença, a qual irá determinar a severa incapacidade que os doentes com EM poderão vir a experimentar.

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Figura 13. EDSS. A incapacidade do

doente com EM pode ser avaliada segundo uma escala desenvolvida por John Kurtzke e que se

denomina EDSS

Expanded Disability Status Scale (Figura 13).

Esta escala está graduada por meios pontos e varia entre 0 (exame

neurológico normal) e 10 (morte por EM). Foi construída atribuindo ao exame neurológico dos diferentes sub-sistemas funcionais – isto é, funções cognitivas, funções piramidais, funções cerebelosas, funções do tronco cerebral, funções sensitivas, funções esfincterianas, funções visuais, funções mentais – uma pontuação que traduz o grau de incapacidade do doente com EM.

Vantagens: A escala encontra-se amplamente difundida, e há uma correspondência imediata entre determinada pontuação e o perfil de desempenho motor do doente com EM.

Ex: 2  Incapacidade mínima,

4  Grande limitação da capacidade de andar,

6  Doente precisa do apoio unilateral de canadianas para andar, 6,5  Doente utiliza apoio bilateral de canadianas para andar;

7  Doente confinado à cadeira de rodas, mas capaz de conduzi--la e de se transferir.

Desvantagens: Avalia fundamentalmente as funções motoras não tendo em linha de conta outros sintomas que podem igualmente ser muito incapacitantes e limitativos, como é o caso da fadiga. Não é uma escala linear, pois um ponto expressa diferenças de incapacidade de grandeza muito diferente. A partir dos 5 a

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Os patamares cruciais da EDSS e que mais importa ter em consideração, são: • EDSS 5: 200 metros sem assistência, limitações no desempenho de 1 dia

de trabalho – patamar que é atingido, em média, ao fim de 10 anos de doença;

• EDSS 6,5: apoio bilateral constante – patamar alcançado aproximadamente ao fim de 15 anos de evolução;

EDSS 7: cadeira de rodas; transfere-se; conduz a cadeira – patamar atingido ao fim de 29 anos.

Esclerose Múltipla e Gravidez

Actualmente sabe-se que a gravidez exerce um efeito protector sobre a jovem adulta grávida, havendo menor número de surtos durante a gestação. Pelo contrário, no puerpério2 há uma maior susceptibilidade de sofrer surtos de exacerbação.

Apesar disto não há evidência de que esses surtos sejam mais graves ou que causem mais sequelas que quaisquer outros surtos que a doente tenha noutro período que não durante a gravidez.

Deste modo, o aconselhamento médico que deve ser feito relativamente à gravidez vai depender fundamentalmente de 2 factores:

• do grau de incapacidade que a doente apresentar no momento em que deseje engravidar;

• da necessidade de manter terapêuticas necessárias para o controlo da doença.

D

IAGNÓSTICO

Para fazer o diagnóstico de EM é necessário demonstrar a existência de duas ou mais lesões da substância branca do SNC disseminadas no espaço e no tempo e excluir situações que possam apresentar um quadro clínico semelhante. No entanto, não existe um exame definitivo para a EM, recorrendo-se então a:

a) Elementos clínicos, nomeadamente à história de múltiplos episódios e a um exame neurológico revelando alterações passíveis de serem provocadas por lesões múltiplas no SNC;

2 Período que decorre desde o parto até ao restabelecimento físico da parturiente, sendo geralmente

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Figura 14. Critérios de McDonald.

b) Dados fornecidos pelos exames complementares de diagnóstico, em concreto da ressonância nuclear magnética (encefálica e medular), dos potenciais evocados multimodais (visuais, auditivos e somatossensitivos) e dos exames laboratoriais (imunoelectroforese do LCR).

Para facilitar o estabelecimento de diagnóstico de EM utilizam-se hoje em dia os Critérios de McDonald (Figura 14) que integram os dados clínicos com os da RMN e da imunoelectroforese do LCR.

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Figura 15. RNM de doente com EM:

Esquerda: Ponderação T1 com Gd, mostrando lesões captantes (activas ou recentes) e lesões hipointensas (perda neuronal).

Direita: Ponderação T2, mostrando lesões

hiperintensas periventriculares

(desmielinização, inflamação e perda neuronal).

Clínica

O diagnóstico de EM é fácil nos casos típicos em que há evidência de múltiplos surtos e um exame neurológico muito alterado. Contrariamente, nos casos em que há um só surto inaugural monossintomático ou nas formas de EM de evolução atípica, com progressão inicial e sem surtos aparentes, o diagnóstico torna-se muito mais difícil.

Um diagnóstico de EM não pode ser formulado sem uma clínica relevante e muito sugestiva, pois a história clínica e o exame objectivo permanecem como elementos fundamentais para estabelecer um diagnóstico definitivo da doença.

Ressonância Nuclear Magnética (RNM)

Esta técnica imagiológica permite não só confirmar o diagnóstico de EM como também compreender melhor a sua história natural.

A RNM craniana

(Figura 15) revela a distribuição típica das lesões, as quais são muito

bem visíveis nas

ponderações T2: lesões ovóides, hiperintensas, com distribuição preferencial na

substância branca

periventricular, nos centros semi-ovais, no corpo caloso, no tronco cerebral e na medula espinhal. Com a introdução da utilização do contraste paramagnético injectável (Gadolíneo - Gd) verificou-se

que existem lesões captantes de contraste e outras que não o captam; essa captação tanto pode ser de toda a lesão ou apenas da sua periferia, tomando a forma de anel ou de crescente. Actualmente sabe-se que a captação de contraste

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Figura 16. Potenciais Evocados Visuais:

Gráfico de Cima: Abolição de resposta do olho direito: defeito axonal do (que ocorre por um período de 4 semanas) é feita por lesões inflamatórias que expressam a actividade da doença.

Ultimamente tem-se dado especial importância às lesões que, sendo hiperintensas em T2, são hipointensas em T1 (black holes) – estas lesões correspondem a áreas de gliose e de perda axonal, sendo por isso lesões mais antigas e o seu número vai aumentando à medida que a doença evolui. Percebe-se assim o porquê dos black holes serem mais numerosos nas formas secundariamente progressivas de EM.

Potenciais Evocados Multimodais (PEM)

Os potenciais evocados consistem numa técnica neurofisiológica em que se avaliam os potenciais desencadeados a vários níveis – medula espinhal, tronco cerebral, vias ópticas, córtex cerebral – por estímulos específicos e padronizados, como por exemplo, ecrãs de televisão com padrão axadrezado, em que há alternância preto/branco dos quadrados de tempos a tempos (Figura 16); choques eléctricos (Potenciais Evocados Somato-sensitivos) e estímulos auditivos (Figura 17). Os potenciais evocados visuais são especialmente úteis em fases inaugurais da doença, em que apenas há Nevrite Óptica, por exemplo, sendo que, mesmo sem queixas, podem ocorrer alterações dos potenciais evocados.

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Utilizando os PEM é possível:

• Estabelecer a presença de lesões sub-clínicas,

• Definir a extensão do processo patológico a áreas que são difíceis de estudar pelos métodos de imagem;

• Distinguir, sobretudo na via óptica, lesão desmielinizante caracterizada por aumento do tempo de latência do potencial respectivo (P100) que conserva.

Punção Lombar e Electroforese de LCR

O estudo das imunoglobulinas do líquido céfalo-raquidiano (LCR) fornece elementos de estudo que contribuem significativamente para o diagnóstico, nomeadamente no surto inaugural de EM com expressão monossintomática e nas formas primárias progressivas da doença. Cerca de 98% dos doentes com EM têm produção intratecal de imunoglobulinas, particularmente IgG, o que evidencia a presença de processo imunológico activo no seio do SNC (Figura 18).

Existem fórmulas e diagramas que permitem calcular se há ou não síntese intratecal de imunoglobulinas, doseando os diferentes tipos de Igs no soro e no LCR. Para além dessas, pode-se realizar uma imunoelectroforese do LCR e do soro, e comparar as bandas da zona de migração de imunoglobulinas – a presença de bandas oligoclonais no LCR, ausentes no soro, é reveladora de síntese intratecal.

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Figura 18. Electroforese de LCR na EM, na qual se identificam bandas de IgG oligoclonais.

Embora as bandas oligoclonais não sejam específicas da EM, elas constituem verdadeiras “impressões digitais” da doença e a sua presença não é afectada pela corticoterapia ou pelas terapêuticas imunossupressoras ou imunomodeladoras utilizadas no tratamento da doença.

Quanto ao exame

citoquímico do LCR num contexto de EM, este apresenta-se frequentemente normal podendo por vezes haver um aumento discreto de células com predomínio linfocitário (em geral, <10.000). Pleocitose superior a 50 células/mm3 torna o

diagnóstico de EM pouco provável, sendo muito mais consentâneo com outros processos inflamatórios do SNC: doença de Lyme, sarcoidose, neurosífilis, meningoencefalite do HIV, formas severas de encefalomielite aguda pós-infecciosa, doença de Behçet e outros processos de vasculite ou meningite crónica.

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial de EM é feito com outras patologias que afectem de forma polisegmentar o SNC (Figura 19).

Especialmente difícil é o diagnóstico diferencial entre um surto inaugural e os quadros monofásicos de desmielinização agudos pós-infecciosos ou pós-vacinais. Nestes últimos, a RNM evidencia geralmente lesões numa mesma fase evolutiva, lesões essas que captam igualmente contraste para-magnético, e o LCR pode ter mais frequentemente celularidade aumentada e é muito mais raro estarem presentes as bandas oligoclonais.

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Figura 19. Doenças frequentemente confundidas com EM.

T

ERAPÊUTICA

O tratamento da EM pode ser dividido em 3 secções: 1) Terapêutica dos surtos;

2) Terapêutica destinada a modificar a história natural da doença; 3) Terapêutica sintomática.

1) Terapêutica dos surtos

Os episódios agudos da doença podem ser tratados com corticosteróides, sendo o esquema mais frequentemente utilizado o de doses elevadas de corticoterapia (metilprednisolona) por via endovenosa em administrações diárias de 1g, durante 5 dias consecutivos. As principais vantagens deste esquema são a sua rápida eficácia, a produção de escassos efeitos secundários e o facto de não

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necessitar de desmame (por não causar depressão do eixo Hipotálamo-hipofisário); tem como inconveniente a administração hospitalar.

Alternativamente tem-se o esquema de corticoterapia oral com prednisolona com uma duração muito maior, 3-4 meses, mas que apresenta maior número de desvantagens que a primeira: tem um período de desmame extenso e tem a ela associados os efeitos secundários normais da corticoterapia crónica.

E quais os efeitos dos corticosteróides? • Encurtam o período de duração do surto, • Reduzem a severidade do mesmo,

• Não afectam as sequelas que possam resultar dos surtos, • Não alteram a história natural da doença.

Percebe-se assim a ilegitimidade de tratar com corticoterapia surtos de reduzida severidade que não impliquem incapacidade ou desconforto para o doente.

2) Terapêutica destinada a modificar a história natural da doença

Interferão beta

• Citocina regularizadora da resposta imunitária T dependente, promovendo a transformação de linfócitos Th1 em Th2.

• Apresenta também propriedades anti-virais e anti-proliferativas.

- IFN β 1-a: Rebif®; Avonex® - IFN β 1-b: Betaferon®

- Via de administração parentérica (Subcutânea em Rebif® e Betaferon® e Intramuscular em Avonex®)

 Reduz em cerca de 30% a frequência dos surtos  Reduz a severidade dos surtos

 Reduz em cerca de 50% o número de novas lesões em RNM’s seriadas  Ineficaz no controlo da fase progressiva da doença, uma vez instalada  Não está ainda provado que a terapêutica precoce com IFN β possa atrasar

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- Efeitos Secundários:

o Quadros gripais com febre, mialgias e cefaleias (horas a seguir à administração)

o Fadiga o Depressão

o Alterações hepáticas (hepatotoxicidade) o Alterações tiroideias (tiroidite auto-imune) o Fadiga crónica

o Irregularidades menstruais

o Efeitos locais (ulceração e necrose - só com as formulações subcutâneas)

- A multiplicidade de ensaios realizados com IFN β na EM com resultados reprodutíveis, robustos e eficazes, faz com que este seja normalmente a 1ª escolha para tratar os doentes com EM com evolução por surtos.

Acetato de Glatirâmero (Copolímero-1)

• Polímero sintético formado pela repetição aleatória de 4 aminoácidos que mimetizam componentes da mielina.

• Actua provavelmente induzindo perifericamente subpopulações de células T reguladoras inibidoras da resposta exacerbada Th1.

- Administração diária por via subcutânea

 Eficaz na prevenção de surtos na EM recorrente-remitente

 Não há efeitos benéficos nas formas progressivas da enfermidade

- Efeitos Secundários: Efeitos no local da injecção (São escassos, não induz fadiga, fazendo com que o fármaco seja bem tolerado).

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- Não há bons estudos comparativos de eficácia entre o Copolímero e o IFN β, pelo que o primeiro é reservado para os doentes que tenham intolerância ao IFN β.

Mitoxantrona

• Imunossupressor derivado da antracilina, com marcada actividade anti-mitótica

 Eficaz nas formas de EM recorrentes-remitentes muito agressivas

 Eficaz nas formas da doença secundariamente progressivas com elevada frequência e surtos e deterioração rápida

 Os seus efeitos são cumulativos durante um longo período de tempo que se pode estender por 5 anos

- Efeitos Secundários: o Cardiotoxicidade o Indução de leucopénia

o Efeito tóxico sobre as gónadas (gravidez futura problemática)

- Este fármaco é basicamente utilizado nas formas mais graves da doença. Natalizumab

• Anticorpo humanizado monoclonal que actua impedindo a ligação das células agressoras Th1 aos receptores endoteliais, negando assim a sua penetração no SNC.

 Redução de surtos em 65%

 Uma administração endovenosa mensal

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- Especialmente útil nas formas graves e resistentes às outras terapêuticas disponiveis

Outros Fármacos (em estudo) • Azatioprina

• Imunoglobulinas EV • Metotrexato

3) Terapêutica sintomática

O doente com EM tem frequentemente múltiplos sinais e sintomas neurológicos que podem ser tratados, e que o sendo modificam a sua qualidade de vida (ex.: a espasticidade, as disestesias, as dores paroxísticas, a vertigem, a oscilópsia, o tremor, a disfunção vesical e sexual, a fadiga, a depressão).

A reabilitação contribui para o melhoramento, mais ou menos evidente, do desempenho diário dos doentes que padecem desta patologia, utilizando estratégias diversificadas:

• Fortalecimento muscular; • Treino de marcha;

• Postura e equilíbrio;

• Adequada adaptação a canadianas ou a cadeira de rodas; • Prevenção de escaras;

• Treino de auto-algaliação; • Uso judicioso de órtoteses.

Diminuem a frequência de surtos Terapêutica das formas progressivas

Referências

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