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A CONSTRUÇÃO DO PATHOS NA TRAGÉDIA. Renato de Mello UFMG. 1 Pathos entre a Linguística e a Literatura

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A CONSTRUÇÃO DO PATHOS NA TRAGÉDIA

Renato de Mello – UFMG

1 Pathos – entre a Linguística e a Literatura

As emoções estão por toda parte e tem, nos últimos tempos, chamado a atenção dos analistas do discurso. Elas se tornaram objeto de investigação, visto que estão evidentemente presentes nos discursos. Diretamente ligado às emoções, o conceito de pathos, por exemplo, tem sido revisitado por pesquisadores das mais diversas disciplinas – dentre elas a Análise do Discurso e a Literatura –, e aplicado das mais diversas formas. Isso pode gerar, para alguns, um mal estar. Charaudeau, no prefácio do livro Análise do discurso & Literatura (Mello, 2005), expõe a querela entre Literatura e Linguística. Segundo ele, por questões de território e de método, as duas disciplinas nunca se deram muito bem. Mas hoje,

... parece que há um reconhecimento recíproco. Criou-se em cada uma dessas disciplinas, uma conscientização de que quanto mais as análises tomam de empréstimo noções e procedimentos de várias disciplinas, mais elas serão apuradas. Assim, a análise dos textos não pode ser senão pluridisciplinar ou transdisciplinar: “Nenhuma delas deve abjurar-se, cada uma guardando sua autonomia. Mas nenhuma pode, doravante, acreditar-se toda poderosa. A isso podemos chamar de interdisciplinaridade fecunda.” (Charaudeau, 2005, p.16)

Assim, a pesquisa sobre pathos não pode e não deve se restringir a uma única disciplina e tampouco a uma tradição retórica ou a estudos sobre argumentação política ou jurídica. Nós, analistas do discurso, podemos sim tratar de pathos na Mídia, na Literatura, no Teatro e dentro dele mais particularmente na Tragédia, que conta, necessariamente, com heróis que se vêem ligados tanto à ordem moral quanto à ordem do sensível. Vemos o pathos como algo que se constrói na e pela linguagem, na e pela palavra, como representação do mundo, como representação social. Esse texto pretende ser, assim, uma modesta colaboração para a interseção entre os estudos linguísticos e literários.

2 O Pathos para Análise do Discurso

De acordo com Charaudeau (2000), a Análise do Discurso não tem por objetivo caracterizar ou definir as emoções1 em estado bruto, como o fazem as abordagens da Sociologia ou da Psicologia. O objetivo da Análise do Discurso é analisar discursiva e situacionalmente quais efeitos as emoções desencadeiam no público. Em outros termos, lhe interessa a emoção enquanto “efeitos visados”, sem que jamais se possa garantir os “efeitos produzidos”.

Assim, ainda segundo Charaudeau (2000), esses efeitos patêmicos surgem da configuração de três aspectos, ou melhor, se ligam a três pontos básicos, quais sejam, a uma ordem intencional, a saberes de crença e se inscrevem em uma representação psicossocial. Deixemos, entretanto, o próprio autor falar, ainda que de forma resumida, desses três aspectos:

· les émotions relèvent d’un «état qualitatif» d’ordre affectif, du fait d’un sujet qui éprouve et ressent des états euphoriques/dysphoriques en rapport avec sa physiologie et ses pulsions,

1 Charaudeau, (2000) prefere as palavras “pathos”, “patemização” e “patêmico” às palavras “emoção”, “emocionais” etc, e explica o porquê:

“ Cela me permet d’une part d’insérer l'analyse du discours des émotions dans la filiation de la rhétorique qui depuis Aristote traite les discours dans une perspective de visée et d’effets.”

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· mais elle relèvent en même temps d’un «état mental intentionnel» d’ordre rationnel, en tant qu’elles visent un objet qui est figuré par un sujet qui a une vision sur le monde, qui juge ce monde à travers des valeurs, lesquelles font l’objet d’un consensus social, constituent des savoirs de croyance en imaginaires socio-discursifs qui servent de support déclencheur à la fois à l’état qualitatif et à une réaction comportementale.

· les émotions sont donc en même temps origine d’un «comportement» en tant qu’elles se manifestent à travers les dispositions d’un sujet, et contrôlées (voire, sanctionnées) par les normes sociales issues des ces croyances.

O pathos, mesmo se construindo no discurso, não diz respeito, entretanto, somente ao receptor (leitor/espectador), Assim como o ethos, o pathos diz respeito a todas as quatro instâncias enunciativas, a saber: o eu-comunicante, o eu-enunciador, o tu-destinatário e o tu-interpretante, instâncias que se valem dos elementos situacionais, discursivos, lingüísticos e psicososiais. Na tragédia, tanto as personagens quanto nós leitores/espectadores somos responsáveis tanto pela construção do ethos quanto dos efeitos patêmicos. Antes mesmo de ter contato com a peça, os conhecimentos prévios a respeito, por exemplo, do gênero tragédia, do autor, coletamos ou presentificamos uma série de informações preliminares que nos ajudam na construção do ethos e nos preparamos, ou melhor, nos tornamos abertos, sensíveis a efeitos patêmicos que a tragédia, em sua estrutura fixa, nos faz vivenciar.

Vale lembrar que tanto o ethos quanto o pathos também não se restringem somente à dimensão puramente enunciativa, ou seja, ao presente da enunciação. Eles podem antecedê-lo e se comporem a partir de situações de comunicação já vividas, de enunciações anteriores, de um quadro histórico e psicosocial anterior à produção da enunciação, além, evidentemente, dos conhecimentos prévios e dos saberes partilhados entre todos os envolvidos. Assim, tanto o ethos quanto o pathos podem abranger também a esfera dos dados situacionais, históricos e psicológicos das instâncias enunciativas. O estatuto social de Fedra, sua reputação, suas qualidades morais, seu comportamento podem nos ser fornecidos, é claro, durante o desenrolar da peça, no momento em que ela enuncia, verbalmente ou não, momento em que partes ou facetas do ethos são fabricadas ou confirmadas naquele quadro comunicacional. Digo facetas, porque, evidentemente, o ethos e o pathos são construções poli ou multiformes, movimentos dinâmicos, imagens cambiantes que se constituem de fragmentos que mudam segundo a situação de produção e de recepção discursiva, segundo a ação e a reação dos interlocutores.

O pathos tem como objetivo influenciar ou emocionar o receptor e este quase nunca pode controlá-lo, visto que ele é involuntário, inconsciente, assimétrico e naturalmente construído nas relações sociais e na situação de comunicação. Ele é uma manifestação polifônica, dialógica, inter-, intra- e extradiscursiva, incluindo vozes, corpos e tons, enfim, tudo o que compõem o quadro comunicacional. Desse modo, pathos diz respeito ao sujeito visado, o interlocutor previsto, imaginado, o tu-destinatário e, em última instância, diretamente à pessoa real, sujeito empírico, sujeito interpretante.

O contato entre os interlocutores, a imposição do enunciador, a forma de tocar o outro, de sensibilizá-lo, de provocar nele a adesão passional, levando-o a certas emoções fazem parte da estrutura da tragédia e podem ser explicados à luz da Análise do Discurso e do conceito de patemização. O conceito de patemização pode ser definido como os efeitos possíveis a serem deflagrados no receptor. Desse modo, é perfeitamente possível perceber, como veremos mais adiante, que o recurso aos efeitos patêmicos é constitutivo da tragédia.

3 Os 4 princípios que regem o contrato e o pathos

Charaudeau apresenta os quatro princípios que dizem respeito, direta ou indiretamente, ao pathos. Tentamos, na sequência, relacionar o que diz o autor ao nosso propósito que é o pathos na tragédia.Vejamos como:

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psicossocial). Na tragédia, os parceiros do processo comunicacional têm obrigatoriamente uma identidade (psicossocial) delimitada: reis, rainhas, príncipes e princesas. Os coadjuvantes como, por exemplo, as amas e os criados também têm identidade e função bem marcadas: são como ecos dos pensamentos (reflexo da consciência) e intermediários das mensagens entre as personagens principais e também entre estas e o público.

A finalidade: o sujeito falante está aqui para fazer o quê e para dizer o quê? (componente intencional). A tragédia coloca em cena uma personagem principal que cometeu uma desmedida e que está ali para sofrer e ser punida, não importando o que ela diga. A finalidade dos coadjvantes foram descritas acima.

O propósito/domínio temático: qual é o assunto? Eles se comunicam para falar de quê? Qual é o tema? Na tragédia, no interior do universo ficcional, o propósito/domínio temático é fixo: a encenação de uma desmedida cometida e a punição. No universo externo, ou seja, a representação, o propósito é, como veremos, a catarse.

As circunstâncias/suportes materiais: em qual ambiente, com quais recursos, qual canal? (componente comunicacional). As circunstâncias/ suportes materiais na tragédia tem haver com a cena, o cenário, com o palco e atores, no universo da representação (inclusive com a bienséance e com a vraisemblence) e também com a história de vida das personagens e o ambiente em que elas vivem. 4 O Pathos no Teatro trágico

O Teatro, em sua duplicidade enunciativa e em sua irredutível reflexividade, como diz Maingueneau (2001), é um gênero pouco estudado no campo dos Estudos Literários, que têm tratado preferencialmente das formas narrativas, e também pouco estudado no campo da Análise do Discurso, que têm tratado, sobretudo, de textos não-literários. Por conseguinte, os pesquisadores dispõem de poucos instrumentos conceituais e metodológicos para dar conta do caráter particular do texto dramático e negligenciam, muitas vezes por falta de conhecimento, as condições particulares de sua existência. Vale lembrar que o texto dramático é igualmente pouco estudado no campo dos Estudos Teatrais, que geralmente têm visto a representação cênica como tendo uma existência relativamente independente do texto, que apresenta, para o tipo de análise proposto, exigências metodológicas propriamente textuais.

Sabemos que a enunciação no Teatro é pseudo-enunciação e guardamos as devidas proporções; essa análise deve se dar, assim, por analogia. Teatro é representação da vida real, que só funciona a partir de convenções e contratos que tornam verossímeis situações, às vezes, pouco prováveis. Entretanto, a verossimilhança não pode ser confundida com o realismo cotidiano. Concordo inteiramente com Maingueneau (2001, p.16), quando ele afirma que “... o texto literário aparece como um ‘pseudo-enunciado’, que só comunica pervertendo as regras do intercâmbio linguístico. [...] os textos literários constroem suas cenas enunciativas através de um jogo de relações internas ao próprio texto.”

A escolha da tragédia como tema dessa reflexão não foi aleatória. O teatro é um espaço privilegiado da expressão, lugar propício para o espetáculo das emoções. Essas se mostram tanto no discurso verbal quanto no não-verbal. Ethos, Pathos e Logos (trilogia aristotélica) parecem ser três personagens em cena. São como três personagens de mesmo peso e mesma importância. Elas se completam, se complementam e comandam a mise en scène. Emoções, sentimentos, sensações e reações como amor e dor, paixão e ódio, vingança e arrependimento, sofrer e fazer sofrer, chorar e fazer chorar, matar e morrer, tudo isso encenado pela palavra, pelo discurso. E a tragédia é também por excelência o local do drama, da espetacularização das emoções, dos sentimentos, dos afetos, das paixões, enfim, do pathos.

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É pois a tragédia imitação de uma ação de caráter elevado, completa e de certa extensão (...) que se efetua e não por narrativa mas mediante atores, e que, suscitando o “terror e a piedade, tem por efeito a purificação [catarse] dessas emoções.” (...) E como a tragédia é imitação de uma ação e se executa mediante personagens que agem e que diversamente se apresentam, conforme o próprio caráter e pensamento (...) daí vem por conseqüência o serem duas as causas naturais que determinam as ações: pensamento e caráter; e, nas ações (...), tem origem a boa ou a má fortuna dos homens. Ao decidir ler ou ver uma tragédia, o sujeito, tacitamente, participa de um contrato comunicacional e ele deve se inteirar das cláusulas desse contrato. Uma dessas cláusulas é o gênero do texto ou do discurso. De uma tragédia espera-se uma estrutura fixa milenar, tanto formal quanto temática. Traçamos, na sequência, algumas das características básicas da tragédia, com o objetivo de ligá-las ao conceito de pathos.

Uma tragédia é, como o próprio nome indica, uma história obrigatoriamente triste, uma história de dor, de sofrimento e de morte, feita para comover o público, seja o leitor, seja o espectador. A tragédia impõe ethé convencionais. Exige, como personagem principal,alguém de elevada condição, ou seja, alguém da corte: um rei, uma rainha, um príncipe, uma princesa. Esta personagem é sempre detentora de poder político, religioso e/ou econômico. É sabido que a Tragédia geralmente envolve uma questão política, uma questão de Estado e também um conflito entre a personagem principal e algum poder de instância maior, como a lei, os deuses, o destino ou a sociedade. A personagem precisa, então, necessariamente, viver uma desmedida inconsciente que faz agir (hybris), ou seja, um desequilíbrio interno em seu caráter. Suas ações serão postas em questão e constituirão objeto de reflexão. Essa personagem trágica se vê necessariamente entre duas ordens de fenômenos: ela pretende guiar-se por seu próprio caráter (ethos), mas está pré-determinada por um destino (dáimon). Geralmente a tragédia mantém estas ordens sem optar por uma delas. Ela simplesmente revela a consciência trágica dessa ambigüidade. Há sempre um clima tenso. Do primeiro ao último ato há um crescendum na intensidade dramática que culmina na morte do herói (ou da heroína) ou de alguém que lhe é muito próximo. O herói trágico está, desse modo, fadado à morte. Por isso a tragédia desperta compaixão, já que o herói não pode vencer e porque as forças mobilizadas contra ele não podem perder. As primeiras cenas sempre servem para familiarizar o leitor/expectador com a intriga, com as personagens e ajudam a compor tanto o ethos prévio das personagens quanto preparar o terreno para o início dos efeitos patêmicos. As últimas cenas são sempre o ápice do trágico, momento do desfecho, da correção, da justiça mas, também, o momento em que os efeitos patêmicos adquirem toda a sua força, comovem, fazem chorar... E sabemos de tudo isso antes mesmo das cortinas se abrirem.Dizem que há três palavras que sustentam uma tragédia: poder, saber e querer, todas três tematizando relações de violência. Todo esse processo tem um objetivo final: levar o leitor ou o espectador a sentir o terror e a piedade que seriam desencadeadores da purgação, da purificação (catarse). Desse modo, o conceito de catarse tem uma relação direta com o conceito de pathos. Catarse nada mais é do que a purgação das paixões. Ambos dizem respeito à recepção do texto ou do discurso. Ambos tratam de sentimentos, de emoções. A catarse é o objetivo último do dramaturgo: no final da peça, o público deve se sentir “purificado”, “pacificado” por aquilo que nomeamos de tópicas, ou seja, sentimentos e sensações. Falaremos um pouco, na sequência, dessas tópicas.

Cabe lembrar, antes, que na tragédia, influenciar é sempre uma atividade consciente e programada: um discurso que pretende reforçar pensamentos, condutas ou estados psicológicos. Daí a importância de se considerar o gênero e o endereçamento do discurso, as características do receptor (leitor/espectador) visado, os saberes sócio-culturais dos sujeitos em interação e, em suma, a situação histórica e institucional dos atos de linguagem.

5 Algumas tópicas do pathos

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em particular. Por uma questão de economia, trataremos aqui somente de algumas que consideramos as mais evidentes: o sofrimento, a tristeza, a dor, a angústia, a indignação, o ódio, a compaixão. Reparem que essas tópicas quase sempre (ou sempre?) levam o público a experimentar, a viver esses mesmos sentimentos, mas, também ajudam a construir o ethos das personagens. Dito de outra forma, na tragédia, os efeitos patêmicos nada mais são que um processo de identificação entre o leitor/expectador e as personagens. Desse modo, ethos e pathos, ações e sentimentos, personagens e público se completam, se complementam. Dependendo das intenções e das estratégias do autor – dramaturgo, sujeito empírico e instância fundamental no processo de comunicação –, se a rainha sofre, ou nos indignamos, nos solidarizamos e sofremos junto com ela ou achamos que é isso que ela merece por ter cometido alguma falha, alguma desmedida e temos a sensação de que a justiça está sendo feita. Se o rei pune e mata, ou compartilhamos com ele a sensação de justiça feita ou nos horrorizamos, o odiamos, diante de tamanha injustiça. Quando a princesa morre, ou choramos, nos compadecendo, comungando com essa dor imensa, ou ficamos com a sensação de missão cumprida, de reparação de algum mal cometido.

No que diz respeito à tópica da dor, não se trata, evidentemente de dor física (ainda que ela também possa ter um lastro do universo discursivo. Como diz Charaudeau (2000): “... il ne s’agit évidemment pas de son aspect sensoriel (avoir mal au bras), mais de son état mental, même si des phénomènes de somatisation relient parfois les deux.” Na tragédia, geralmente, essa dor é provocada pela exteriorização (da palavra) de um mal estar, por uma desmedida cometida pelo herói (hybris). Essa dor está, sempre, de alguma forma, ligada a uma moral e a uma crença. Ela é socialmente partilhada. Consequentemente, partilha-se, além da dor, a tristeza, o desespero etc. Na tragédia nunca se admite a tópica oposta à dor, ou seja, a felicidade, a alegria, o contentamento, caso contrário, não se teria uma tragédia.

A angustia, outra tópica constante nas tragédias, advém da impossibilidade de poder mudar o rumo das coisas, o rumo do destino (moira). O herói trágico não consegue superar suas angústias, visto que a fatalidade é constitutiva de todas as suas ações. Não há o que fazer para modificar seu destino. O herói está predestinado a sofrer e a morrer. Daí surge no público também a partilha dessa tópica, e com ela vem outras: a compaixão, o sofrimento etc. O oposto da tópica da angústia também não cabe na tragédia: a esperança. Se ela se mostra presente é só por momentos fugazes, para trazer a todos ainda mais angústia.

Não nos esqueçamos, entretanto, que nem tudo é válido na utilização dessas tópicas. O gênero tragédia exige certas restrições, seja por questões éticas e morais, seja por questões estéticas. Na tragédia, deve-se levar o público a experimentar deve-sentimentos e deve-sensações, mas não deve-se deve chocá-lo. É quadeve-se deve-sempre proibido, por exemplo, mostrar sangue em cena ou expor corpos de personagens mortas, principalmente de reis e rainhas. Cenas de intimidade física, de sexo são praticamente proibidas na tragédia. A esse tipo de restrições dá-se o nome de bienséance. Também a vraisenblance configura uma restrição no teatro que acaba por afetar os efeitos patêmicos. O tempo e o espaço na tragédia recebem atenção especial. A história encenada geralmente deve acontecer dentro do limite de 24 horas. O local geralmente é circunscrito ao castelo ou ao palácio onde vivem as personagens principais. Tudo isso ajuda para que o público não se disperse e aceite o contrato de verossimilhança dos acontecimentos e para que os efeitos patêmicos sejam mais eficazes.

Considerações finais

Vimos, ainda que superficialmente, como o pathos é importante em uma tragédia. Sem ele, certamente, não há tragédia. O pathos é, afinal, constitutivo da tragédia. Os leitores/expectadores partilham com os heróis trágicos todos os efeitos patêmicos, pelo menos, essa é a intenção, o objetivo desse gênero. O contrato feito nesse gênero entre todas as instâncias leva todos, sob a forma de espelhamentos, a purgar os pecados e a se purificarem. E tudo isso pela linguagem, pela palavra em ação, ou melhor, pela enunciação encenada.

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aplicabilidade dos conceitos referentes aos efeitos patêmicos em uma tragédia específica, ou melhor, tratar, discursivamente, as formas como estes efeitos, ainda que visados, se dão na enunciação e os contratos comunicacionais daí advindos. Essa será, certamente, tarefa para um próximo trabalho. Referências

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