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Envelhecimento e Lazer: reflexões sob a perspectiva das relações de gênero

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Academic year: 2021

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Envelhecimento, representaçoes sociais, saúde e cidadania: perspectivas de gênero. ST 45 Terezinha Campos1

Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas São Luís/ Universidade Federal do Maranhão Palavras-chave:

Envelhecimento e Lazer: reflexões sob a perspectiva das relações de gênero

Envelhecimento e Lazer: reflexões sob a perspectiva das relações de gênero na velhice

Na busca do entendimento sobre a relação envelhecimento e lazer sob a idéia de gênero é fundamental compreender que, para fins deste trabalho, envelhecimento é entendido como “o processo de mudanças universais pautado geneticamente para a espécie e para cada indivíduo [...] dependentes de eventos de natureza [...] biológica, sociohistórica e psicológica” e a velhice como um “a última fase do ciclo vital e é delimitada por eventos de natureza múltipla, incluindo perdas psicológicas, afastamento social, restrição em papéis sociais e especialização cognitiva” (Neri, 2005, p. 114/115). A concepção de gênero, por sua vez, envolve uma série de significados culturais que permeiam a distinção biológica entre homem e mulher, traduzida por Rorin (2001, p.1) como:

Refere-se aos atributos, funções e relações que transcendem o biológico/reprodutivo e que, construídos social e culturalmente, são atribuídos aos sexos para justificar diferenças e relações de poder/opressão entre os mesmos. É importante assinalar que o gênero varia espacialmente (de uma cultura a outra), temporalmente (em uma mesma cultura há diferentes tempos históricos) e longitudinalmente (ao longo da vida de um indivíduo).

Esta compreensão articula o pensamento veiculado ao significado atribuído ao lazer frente a tais referenciais, a partir de sua indicação como uma dimensão do construto qualidade de vida4, sobretudo quando compreendido em sua função de desenvolvimento pessoal para homens e mulheres, isto é, quanto ao que podem, como indivíduos, entregarem-se de “(...) livre e espontânea vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se ou, ainda para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais” (DUMAZEDIER, 2001).

Viguera (2004) destaca que muitos estudos têm prestado especial atenção na influência que as atividades de lazer e o tempo livre têm sobre a qualidade de vida, o estado de saúde físico e a cotidianidade das pessoas idosas. Entretanto, existem dificuldades para se pensar parâmetros ou definir o alcance desta influência em função da própria complexidade do significado de qualidade de vida e, fundamentalmente, devido aos fatores subjetivos e objetivos que a determinam; uns são próprios do indivíduo e outros do meio sócio-econômico e cultural no qual se desenvolve e nem todos mensuráveis da mesma forma.

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De fato, para Neri (1993, p. 9) “a promoção da boa qualidade de vida na idade madura excede os limites da responsabilidade pessoal e deve ser vista como um empreendimento de caráter sócio-cultural”. Isto é resultante, portanto, não só do estado biológico, mas também das condições do meio ambiente em amplo sentido: interação social, hábitos, cultura, condições econômicas, o próprio uso do tempo livre, dentre outras.

O tempo livre é a condição necessária para que o lazer tenha espaço. De fato, o conceito de tempo livre faz referência à existência de uma determinada quantidade de tempo, geralmente alheio às obrigações laborais, sociais ou de outro tipo e que constitui, em potencial, um tempo para o exercício da expressão e liberdade pessoal. Neste contexto, quando se trata de idosos é comum a sua associação com a posição de estar em situação de lazer, sobretudo quando vinculada ao tempo livre advindo com a aposentadoria (Tedrick e McGuire, 2000). Diz Lápiz (2003) que esta abertura dá lugar a uma situação na qual com freqüência se postula a idéia de que com a aposentadoria tem-se uma vida com escassa atividade, tem-sem deveres ou obrigações; uma vida de tempo livre e lazer; ou seja, a velhice emerge como uma fase privilegiada da vida para o aproveitamento da “estação” lazer.

Estabelecendo-se, porém, um contraponto com a situação, é importante enfatizar que, embora não desqualificando a relevância e o significado do lazer para os idosos, convém chamar atenção para certos pontos interessantes desta relação, tais como a forma como os sujeitos constroem seus próprios lazeres, como os definem conforme suas necessidades, condições e significados, além da maneira como se processam as pesquisas sobre o tema.

O estudo de Calegari (1997, p. 142), por exemplo, que buscou compreender a relação entre lazer e aposentadoria, revelou que o primeiro não é norteador da vida dos sujeitos em todas as suas dimensões, posto que existem os compromissos familiares e domésticos e, muitas vezes, o retorno ao trabalho. Isto é, embora o lazer sendo considerado como "diversão para grande parte dos entrevistados, nem todas as atividades de suas vidas são consideradas como tal”.

Divergências à parte, o que se acredita ser ponto de comunhão para as discussões sobre a temática em questão é que prioritariamente há que se considerar o envelhecimento como um processo de crescimento, estruturado em torno do tempo e marcado por mudanças biológicas, psicológicas e sociais, o que abre espaço para investigações sobre a experiência do lazer entre pessoas idosas. Desta forma, tal relevância é amparada exatamente no panorama que qualifica a velhice como heterogênea frente à diversidade de elementos que intervém em sua configuração (o gênero, a saúde, a escolaridade, a renda, a ruralidade ou o urbanismo, o trabalho desempenhado....), possibilitando reflexões amplas de significados, conseqüência da própria amplitude do termo lazer e, por extensão, das diferentes maneiras de percebê-lo.

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A perspectiva de gênero oferece elementos para uma análise interessante acerca desta situação e programas direcionados à chamada terceira idade podem constituir espaços privilegiados para a sua observação. Neste sentido, uma ação concebida e executada no campo das políticas públicas – esfera federal – foi o referencial da investigação2, na medida em que, conforme coloca Debert (1999, p. 1), as representações de uma velhice gratificante, vibrante e produtiva ganham expressão quando estão em “[...] jogo os programas para a terceira idade, com suas universidades e grupos de convivência e de lazer”.

Na caracterização mais geral dos sujeitos pesquisados, a questão de gênero se sobrepôs: a superioridade quantitativa das mulheres em relação aos homens, um aspecto que Debert (1999, p. 139) também analisa quando registra que, no Brasil, “os programas para a terceira idade têm mobilizado, sobretudo, um público feminino. A participação masculina raramente ultrapassa os 20% (...)”, fato realmente constatado. Do lado masculino, o machismo e a vergonha são a justificativa para a diminuta participação masculina nos programas para a terceira idade, corroborando outro olhar da autora, segundo o qual “as mulheres têm dificuldade de explicar a ausência de um público masculino nos programas. São os homens, em número reduzido nos programas, que estão mais preocupados em ressaltar a participação feminina e dar razões para a ausência masculina” (p. 158).

Entre os sujeitos da investigação o preenchimento do tempo livre com atividades de lazer antes do engajamento no programa era quase nulo, posto que o papel profissional e a assistência familiar sobrepunham-se à condição de ter lazer. Daquilo que os homens relacionaram como lazer em seu tempo livre, ficou explícito o domínio das atividades em termos de lazer passivo, isto é, aquelas ocupações que, “no nosso tempo livre, poderemos exercer tranqüilamente sentados, usando apenas os sentidos da visão e da audição: ler, ouvir música, assistir à televisão...” (RODRIGUES, 2000, p. 46). Para as mulheres a relação foi diretamente estabelecida aos aspectos religiosos: as idas à igreja e a participação em comemorações e atividades circunscritas a este ambiente. Tais colocações expressaram as experiências de lazer vivenciadas pelos sujeitos no contexto de seu tempo livre.

O tempo, teoricamente bastante amplo na terceira idade, pode ser revestido de muitas significações no contexto da experiência humana na qual é identificado por uma variação de nomes - tempo de trabalho, de lazer, de aprendizagem, etc. O “tempo humano é único e limitado, mas a sociedade qualifica cada forma de vivenciá-lo de maneiras diferentes, construções sociais de uma única dimensão” (Moragas, 1997). O lazer é uma dessas dimensões, juntamente com as suas diversas possibilidades e formas. Neste sentido, para os homens e as mulheres a experiência de lazer trouxe uma dimensão diferenciada para esse tempo disponível das obrigações profissionais e, de certa forma, familiares também, combinando aspectos de tempo e atitude face às possibilidades

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não só de diversão verificadas nas atividades, festas, brincadeiras e comemorações do ambiente do clube, mas também de desenvolvimento pessoal e social.

Moragas (1997) observa ainda que se para várias pessoas o lazer corresponde a qualquer um desses significados, ele pode ser qualquer coisa "tornando-se numa definição subjetiva de sua experiência dificilmente sujeito à homogeneidade ou à categorização". O lazer aparece assim, como uma experiência universal da pessoa, que, como o trabalho, o amor ou a relação social, responde a desejos diferentes em cada uma.

A motivação para o engajamento no programa e a participação em atividade de lazer está, então, referenciada a uma experiência quase sempre contrária a esta nova situação. Os depoimentos registrados quase sempre se ligaram à necessidade de enfrentar episódios difíceis emocional e psicologicamente relacionados ao momento pós-aposentadoria, aos sentimentos diversos advindos com esta condição (depressão, solidão) ou à distância da família, muito mais entre as mulheres, ou a necessidade de ocupação e desvio de preocupações com questões financeiras, entre os homens.

Independentemente do gênero, o que se observou é que os sujeitos associaram seu ingresso no programa a sentimentos de liberdade – liberdade que implica uma resignificação do processo de envelhecer, como descreve Debert (1999) – e reconfiguração de um convívio social, na medida em que o descrevem com enfático prazer. O quadro posto a partir dos depoimentos vai ao encontro da abordagem de Ferrari (1996, p. 103) que assenta a contribuição de agremiações voltadas às pessoas de terceira idade num conjunto de benefícios que as levam a se transformar, instituir novos valores, novas formas de refletir, de sentir e de agir. “Facilitam as modificações e transformações das relações sociais que continuamente vão se enriquecendo. Nesses centros as pessoas conhecem outras pessoas, redescobrem-se, trocam, vivem, sonham, ajudam-se”.

O cenário retratado a partir da apreciação dos sujeitos mostrou ainda como esses homens e essas mulheres se colocam face à fruição das atividades de lazer típicos do ser humano moderno. O turismo, por exemplo, na condição de atividade de lazer, dá margem a esta análise, uma vez que o valor atribuído pelos sujeitos entrevistados à experiência turística, que ora tende a ter semelhanças, ora pequenas diferenças, especificamente no que se refere ao significado pessoal conferido à realização do ato, vai corroborar aspectos assinalados na literatura pesquisada quanto à heterogeneidade das motivações e benefícios almejados com o turismo entre as pessoas idosas.

Para os homens é mais a integração, o alargamento do círculo de amizades e o encontro com novos destinos, lugares diferentes. Estes motivadores são chamados por Cooper et al (2001), de culturais quando explicitam aqueles identificados pelo desejo de ver e conhecer mais sobre outras culturas, aprender sobre os nativos de um país, seu estilo de vida, música, arte, folclore,

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dança, etc., ou motivadores interpessoais quando incluem o desejo de conhecer novas pessoas, visitar parentes ou amigos e buscar experiências novas e diferentes.

Para as mulheres, alguns fatores semelhantes, porém realçados por componentes afetivos e até de cuidado com a saúde física – para Goeldner, McIntosh e Ritchie (1995) este último refere-se aos motivadores físicos, isto é, aqueles ligados ao relaxamento do corpo e da mente, a questões de saúde, aos esportes a ao prazer – e a possibilidade de conhecer lugares novos formam aspectos também mencionados pelos respondentes.

O lazer, qualquer que seja a sua modalidade, além de contribuir para mobilizar nos sujeitos o interesse de desfrutar de novas interações sociais guarda relação com o sentimento de bem-estar físico, na medida em que, conforme alguns depoimentos há uma percepção positiva quanto à saúde pela inter-relação com os outros aspectos, convergentes em sua essência motivacional, estimuladora de razões de viver. A visão global dos depoimentos mostra que o lazer é vivenciado pelos sujeitos como oportunidade a mais de aprendizagem, conhecimento de novos destinos e pessoas e também de entretenimento, com repercussões favoráveis na auto-estima e na postura diante da vida e do envelhecimento. Marcellino (1995) destaca que uma das linhas, de análise do termo lazer é a que se fundamenta na atitude segundo a qual a ênfase é a relação entre o indivíduo e a experiência vivida, ou seja, a satisfação provocada pela atividade. Isto foi sentido entre os idosos ouvidos por evidenciar que para estes, o lazer implica um universo complexo de significados, representados por interpretações de caráter moral, religioso, filosófico que variaram muito ao longo da história. Estes significados e conceitos sobre lazer podem justificar-se, por vários motivos, como: as diferenças de utilização do tempo livre em diferentes países, regiões, culturas, e até mesmo, por conceitos pessoais e ideológicos.

REFERÊNCIAS

CALEGARI, K. C. Lazer e aposentadoria: relações e significados. Campinas, SP, 1997. 145 p. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Educação Física, UNICAMP.

COOPER, C. et al. Turismo: princípios e práticas. 2 ed. Porto Alegre: Bookman, 2001. Tradução: Roberto Cataldo Costa.

DEBERT, G. G. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: EDUSP, 1999.

DUMAZEDIER. J. Sociologia empírica do lazer. São Paulo: Perspectiva, 2001.

FERRARI, M. A. C. Lazer e ocupação do tempo livre na terceira idade. IN: PAPALÉU NETO, M. (org.). Gerontologia: a velhice e o envelhecimento em visão globalizada. São Paulo: Atheneu, 1998.

GOELDNER, C. R., RITCHIE, J. R. B., McINTOSH, R W. Turismo: princípios, práticas e

filosofias. 8. ed. Porto Alegre: Bookman, 2002.

KORIN, D. Novas perspectivas de gênero em saúde. Adolescencia Latinoamericana. V.2 n.2. Porto Alegre mar. 2001

LÁPIZ. E. F. Tiempo libre y nuevas responsabilidades em los adultos mayores. Universidad de Granada. Departamento de Psicología Evolutiva y de la Educación. Disponível, 2003.

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MORAGAS, R. M. Gerontologia social: envelhecimento e qualidade de vida. São Paulo: Paulinas, 1997.

NERI, A. L. Palavras-chave em gerontologia. Campinas, SP: Alínea, 2005. Coleção Velhice e Sociedade.

__________. Qualidade de vida e idade madura. Campinas, SP: Papirus, 1993. Coleção Vivaidade.

RODRIGUES, N. C. Situação social do velho em diferentes épocas e sociedades. IN: SHONS, C. M., PALMA, L. T. S. (orgs.). Conversando com Nara Costa Rodrigues sobre gerontologia

social. Passo Fundo, RS: UPF Editora, 2000.

TEDRICK, R., MCGUIRE, F. Envejecer em el país de Ulises. Desarrollo humano e ocio. IN: CABEZA, M. C. (org.). Ocio e desarollo humano. Bilbao, Espanha, 2000.

VIGUERA, V. Calidad de vida y envejecimiento. Disponível na web

<www.psicomundo.com/tiempo> Acesso em: 18 dezembro 2004. Notas

1

Bacharel em Turismo (UFMA). Mestre em Gerontologia (Unicamp). Professora do Programa Universidade Integrada da Terceira Idade (UFMA). Professora do Curso de Graduação em Turismo da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas São Luís. Contato: tdjcampos@yahoo.com.br.

2

Qualidade de vida: a expressão passou a definir-se como conceito integrador que compreende todas as áreas da vida (caráter multidimensional) e faz referência tanto a condições objetivas como a componentes subjetivos (VUGUERA, 2004)

3

Clube da melhor idade: ambiente no qual foi empreendida a pesquisa empírica, parte da dissertação de Mestrado. Agremiação parte do Programa Clube da Melhor Idade instituído pelo então Ministério do Esporte e Turismo, sob a coordenação da Embratur, como parte de articulações interministeriais direcionadas à Política Nacional do Idoso (criada pela Lei 8.842/94 e regulamentada pelo Decreto n° 1.948/96) (BRASIL, 1998). O Programa é operacionalizado pela Associação Brasileira dos Clubes da Melhor Idade (ABCMI) que "procura propiciar a melhoria da qualidade de vida - pelo lazer e turismo - dos brasileiros com mais de cinqüenta anos" (EMBRATUR, 1996). , considerando ter sido este o ambiente no qual foi empreendida a pesquisa empírica, parte da dissertação de mestrado.

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