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O GUARDIÃO DA CONSTITUIÇÃO

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C o p y r i g h t © 2 0 0 7 by E d i t o r a Del Rey Ltdo.

C o p y r i g h t © p o r o o q u a r t a e d i ç ã o a l e m ã d e D e r H ü f e r der V e r f a s s u n g : D u n k l e r & H u m b l o t , 1 9 9 6 .

N e n h u m a p a r t e d e s t e livro p o d e r á s e r r e p r o d u z i d o , s e j a m q u o i s f o r e m o s m e i o s e m p r e g a d o s , s e m a p e r m i s s ã o , p o r e s c r i t o , d o E d i t o r a .

I m p r e s s o n o Brasil | Prinled in Brazil

Esta o b r a {oi p u b l i c a d a o r i g i n a l m e n t e e m a l e m ã o c o m o título O e r H ü t e r der Verfossung, p o r D u n k l e r & H u m b l o t G m b H , Berlim.

C o l e ç ã o Del Rey I n t e r n a c i o n a l C o o r d e n a d o r e S u p e r v i s o r : Luiz M o r e i r a

E D I T O R A DEL REY LTDA. w w w . d e l r e y o n l i n e . c o m . b r Editor; A m o l d o O l i v e i r a C o n s e l h o Editorial: l e i . : ( 3 1 ) 3 2 8 4 - 9 7 7 0 e d í t o r (cpd e I r e y o n N n e . c o m . b r Editora assistente: W a n e s k a D i n i z Editora /OH R u o A i m o r é s , 6 1 2 - F u n c i o n á r i o s B e l o H o r i z o n t e - M G - C Ê P 3 0 1 4 0 - 0 7 0 T e l e f o * ( 3 1 ) 3 2 7 3 - 1 6 8 4 e d i t o r o ( â > d e l r e y o n l i n e . c o m . b r Editores / SP R u o M u m a i t á , 5 6 9 - B e l o V i s t a T e l e f o x : ( 1 1 ) 3 ) 0 1 - 9 7 7 5 S ã o P a u l o - S P - C E P 0 1 3 2 1 - 0 1 0 e d i f o r a s p @ d e f r e y o n l i n e . c o m . b r A n t ô n i o A u g u s t o C o n ç o d o T r i n d a d e A n t o n i o A u g u s t o J u n h o A n a s l o s i a A r i o s v a l d o d a C o m p o s P i r e s (In memoriam) A r o l d o P l i n i o G o n ç a l v e s C a r l o s A l b e r t o P e n n a R. d e C a r v a l h o C e l s o d e M o g o l h ô e s P i n t o E d e l b e r t o A u Q u s t o G o m e s L i m a E d é s i o F e m o n d e s E u g ê n i o P o c e H i d e O l i v e i r a F e r n o n d o G o n z a g o J o y m e H e r m e s V i l c h e z G u e r r e r o J o s é A d é r c i o Leite S a m p o i o J o s é E d g o r d P e n n a A m o r i m P e r e i r a M i s a b e l A b r e u M a c h a d o D e r z i P l í n i o S a l g a d o R é n o n Kfuri L o p e s R o d r i g o d a C u n h a P e r e i r a S é r g i o l e f l i s S a n t i a g o W i l l e D u o r t e C o s t a Schmitt. Carl.

S 3 5 5 O g u a r d i ã o d a Constituição / Carl Schmitt; tradução de Geraldo de Carvalho; c o o r d e n a ç ã o e supervisão Luiz Moreira. - Belo Horizonte: Det Rey, 2007. 252 p. (Coleção Del Rey Internacional) Tituloorigmal; Oer Huter der V e r f a s s u n g . ISBN 85-7308-886-9

1. Direito constitucional. I. Título.

CDD. 341.2

. CDU: 3 4 2

(4)

SUMARIO

A P R E S E N T A Ç Ã O

Gilmar Ferreira Mendes ix

P R E F Á C I O xvii

I N T R O D U Ç Ã O 1

Primeira parte

A JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

DA CONSTITUIÇÃO

1 . O C H A M A D O DIREITO DE EXAME JUDICIAL MATERIAL

GERAL (ACESSÓRIO) NÃO SE CONSTITUI NA A L E M A N H A EM UM G U A R D I Ã O DA C O N S T I T U I Ç Ã O 1 9 2 . L I M I T E S OBJETIVOS DE T O D A JUSTIÇA (JURISDIÇÃO

P E N A L NO C A S O DE DELITOS POLÍTICOS CONTRA O

E S T A D O E A CONSTITUIÇÃO, ACUSAÇÃO MINISTERIAL) . . . . 3 3 3 . E S T I P U L A Ç Ã O NORMATIVA D O C O N T E Ú D O D E U M A

(5)

4 . O T R I B U N A L DO E S T A D O PARA O R E I C H ALEMÃO 7 1

4.1 Relação objetiva entre conceito constitucional e jurisdição constitucional; reconhecimento dos limites objetivos da justiça por intermédio d o Tribunal d o Estado para o Reich alemão; especial relação entre contrato constitucional e justiça constitucional 7 1 4 . 2 O Tribunal d o Estado c o m o instituição

especificamente federativa 8 0 4.3 Jurisdição estatal e constitucional c o m o

expressão da tendência e m transformar a Constituição e m u m contrato (acordo)

constitucional 88

Segunda parte

A CONCRETA SITUAÇÃO

CONSTITUCIONAL DA

ATUALIDADE

5 . PLURALISMO, POLICRACIA E FEDERALISMO 1 0 5

5.1 Desenvolvimento do parlamento c o m o cenário de u m sistema pluralista 107 5.2 A p o l i c r a c i a n a e c o n o m i a p ú b l i c a 133

5.3 O Federalismo 137

6 . R E M É D I O S E MOVIMENTOS CONTRÁRIOS 1 4 1

6.1 Tentativas de uma Constituição econômica .... 141

(6)

6.2 O p r o b l e m a d a neutralidade d a política interna n o Estado partidário pluralista 146 6.3 Insuficiência da maioria das neutralizações;

ambigüidade dos conceitos de neutralidade e

despolitização 157

6.4 U m panorama dos diversos significados e funções do conceito de neutralidade de

política interna d o Estado 161 6.5 Procedimento d o governo constitucional

segundo o artigo 48 da Constituição d o Reich. Desenvolvimento d o estado de exceção militar-policial r u m o ao econômico-financeiro 167

Terceira parte

0 PRESIDENTE DO REICH COMO

GUARDIÃO DA CONSTITUIÇÃO

7 . A TEORIA DO DIREITO PÚBLICO DO "PODER NEUTRO"

(POUVOIR NEUTRE) 1 9 3

8 . SIGNIFICADO ESPECIAL DO "PODER N E U T R O " NO ESTADO PARTIDÁRIO PLURALISTA, EXPOSTO POR MEIO DO EXEMPLO DO CONCILIADOR PÚBLICO D E

CONTENDAS TRABALHISTAS 2 0 7

9 . O FUNCIONALISMO PÚBLICO E AS DIVERSAS POSSIBILIDADES DE UMA "INDEPENDÊNCIA" DO

E S T A D O PARTIDÁRIO PLURALISTA 2 1 9 1 0 . O EMBASAMENTO DEMOCRÁTICO DA POSIÇÃO DO

PRESIDENTE DO R E I C H 2 2 9

(7)
(8)

APRESENTAÇÃO

Gilmar Ferreira Mendes'

Tenho a honra de apresentar mais uma importante obra da Coleção Del Rey Internacional, desta feita O Guardião da

Constituição (Der Hiiter der Verfassung), da autoria do

emi-nente pensadoí alemão, o Professor Carl Schmitt.

Referido trabalho foi publicado, inicialmente, em 1929, sob o título Das Reichgerichts ais Hüter de Verfassung. Em 1931, Carl Schmitt publicou versão ampliada daquelas reflexões, de-nominada Der Hiiter der Verfassung.

Na referida obra, Schmitt questionava o papel do rio como guardião da Constituição. Schmitt negava ao Judiciá-rio o título de guardião da constituição. Segundo sua concep-ção, somente o Presidente do Reich teria legitimidade para desempenhar semelhante função.

Hans Kelsen, ainda em 1931, respondeu diretamente ao artigo de Schmitt, ao publicar um ensaio intitulado Quem deve

ser o guardião da Constituição? (Wer soll der Hüter der Verfassung sein?).' Na ocasião, reafirmou a importância de

Ministro do Supremo Tribunal Federal, Professor de Direito Constitucio-nal do Instituto Brasiliense de Direito Públicos da Universidade de Brasília. Em português, o texto dessa apresentação ganhou o nome de A

(9)

um Tribunal Constitucional para uma democracia moderna, em franca defesa de uma de suas criações, a Corte Constitucional austríaca, instituída em 1920, já destacada na célebre conferên-cia sobre a jurisdição constitucional Wesen und Entwicklung

der Staatsgerichtsbarkeit (Essência e Desenvolvimento da Jurisdição Constitucional), proferida em Viena, em 1928, pe-rante a Associação dos Professores Alemães de Direito Públi-co (Vereinigung der Deutschen Staats-rechtslehrer).

Assim se manifestou quanto à proposta de Carl Schmitt de emprestar ao Presidente do Reich a legitimidade para "guar-dar" a constituição, em detrimento da Corte Constitucional:

(...) para tomar possível a noção de que justamente o go-verno — e apenas ele — seria o natural guardião da Consti-tuição, é preciso encobrir o caráter de sua f u n ç ã o . Para tanto serve a conhecida doutrina: o monarca é — exclusiva-mente ou não — uma terceira instância, objetiva, situada acima do antagonismo (instaurado conscientemente pela Constituição) dos dois pólos de poder, e detentor de um poder neutro. Apenas sob esse pressuposto parece justi-ficar-se a tese de que caberia a ele, e apenas a ele, cuidar que o exercício do poder não ultrapasse os limites estabe-lecidos na Constituição. Trata-se de uma ficção de notável audácia, se pensarmos que no arsenal do constituciona-lismo desfila também outra doutrina segundo a qual o mo-narca seria de fato o único, porque s u p r e m o , ó r g ã o do exercício do poder estatal, sendo também, particularmen-te, detentor do poder legislativo: do monarca, não do par-lamentes, proviria a ordem para a lei, a representação popu-lar apenas participaria da d e f i n i ç ã o do c o n t e ú d o da lei. C o m o poderia o monarca, detentor de grande parcela ou mesmo de todo o poder do Estado, ser instância neutra e m relação ao exercício de tal poder, e a única com vocação para o controle de sua constitucionalidade?2

E prosseguiu em sua crítica:

ro de 2003, a edição combina oito títulos da autoria de Hans Kelsen, dispostos em ordem cronológica.

KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional. São Paulo: Martins Fontes 2003, p. 241-242.

(10)

(...) quando na Constituição de Weimar se prevê, ao lado de outras garantias, o presidente do Reich como garante da Constituição, manifesta-se a verdade elementar de que essa garantia só p o d e representar uma parte das institui-ções de proteção da Constituição e que seria uma sumária s u p e r f i c i a l i d a d e e s q u e c e r , e m f u n ç ã o do presidente do Reich atuando c o m o garante da Constituição, os estrei-tíssimos limites desse tipo de garantia e as muitas outras espécies e métodos de garantia constitucional!3

Já a crítica de Schmitt ao positivismo alemão tradicional estava claramente ligada a uma rejeição muito mais ampla do autor em relação a toda uma estrutura estatal que ele fatal-mente caracterizava como burguesa. Para um pensador que tinha convicção de que todo o conceito de direito é fundamen-talmente político, a pretensa neutralidade do positivismo de Laband e da Teoria Pura de Kelsen não passava de um reflexo disfarçado dos ideais liberais na filosofia política e jurídica, vi-sando garantir a segurança e liberdades burguesas perante o Estado. É principalmente a partir de sua visão antiliberal que Schmitt construirá seu Der Hüter der Verfassung (O

Guar-dião da Constituição).

Segundo Schmitt, a criação ou o reconhecimento de um Tribunal Constitucional, por outro lado, transfere poderes de legislação para o Judiciário, politizando-o e desajustando o equi-líbrio do sistema constitucional do Estado de Direito.

A recusa de Schmitt em aceitar um controle concentrado de constitucionalidade encontra sua origem na própria concep-ção que o autor alemão fazia de Constituiconcep-ção. Para Schmitt, a idéia de Constituição não se equipara a um simples conjunto de leis constitucionais. AConstituição seria, na verdade, a decisão consciente de uma unidade política concreta que define a for-ma e o modo de sua existência.

De acordo com o pensador alemão, o princípio político que guiava a Constituição de Weimar era o princípio da democra-cia. A democracia de Schmitt, contudo, não se assemelha em

' KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional, op. cit., p. 287-288.

(11)

nada à democracia kelseniana, que via na maioria um instru-mento útil para a realização da idéia básica da democracia: a liberdade. Para Schmitt, só há uma idéia verdadeiramente de-mocrática: a igualdade, que é fundamento de todas as outras igualdades.

No que concerne à jurisdição constitucional, tanto Schmitt como Kelsen atingiam conclusões bem distantes de seus pontos de partida. Enquanto Kelsen, que se reconhecia como herdeiro da tradição labandiana, projetara e desenvolvera um sistema concentrado de controle de constitucionalidade que contrariava frontalmente os princípios do positivismo legal do século XIX, Schmitt, que sempre construía suas obras em contraposição a uma imagem da teoria positivista liberal, acabara por chegar justa-mente ao posicionamento defendido por Laband cinqüenta anos antes: a revisão dos atos legislativos por um tribunal inde-pendente é uma afronta clara à soberania estatal.

Miguel Herrera bem ilustrou essa dicotomia:

R e f i r i é n d o s e a los t r a b a j o s de Kelsen de e s s e período, Schmitt impugna la tesis normativista de la identidad en-tre orden j u r í d i c o y E s t a d o , s e n a l a n d o q u e el m é t o d o kelseniano desarrolla la vieja negación liberal dei Estado por médio dei derecho. Según el jurista alemán, Kelsen funda su teoria dei Estado en una crítica dei concepto de ' s u s t a n c i a ' , q u e es p r o p i o de las c i ê n c i a s n a t u r a l e s , c o n s t i t u y e n d o una m e t a f í s i c a m o n i s t a q u e e x p u l s a l a excepción y lo arbitrario. De acuerdo con Schmitt, por ei contrario, la situación excepcional pertenece al derecho, siendo definido el Estado por el monopolio de la decisión. En el caso excepcional 'la existencia dei Estado conserva la superioridad sobre la validez de la norma jurídica', es allí donde la decisión se libera de toda obligación formativa y la norma 'se reduce a nada'.*

Vencedor do embate judicial realizado no caso "Prússia contra Reich", Carl Schmitt também ganhara, aparentemente,

HERRERA, Miguel. La polémica Schmitt-Kelsen sobre el guardiándela Constiísicirín, trabalho publicado na Revista de Estúdios Políticos, ri. 86,

1994, p. 195-227.

(12)

a disputa intelectual sobre quem realmente deveria ser o guardião da constituição.

Em decisão de 25 de outubro, o Tribunal do Estado nega-ra-se a definir os limites da atuação do Presidente e de seu Chanceler. Ambos ficaram livres, assim, para agirem contra as poucas instituições democráticas de Weimar que ainda de-sempenhavam algum papel relevante no cenário político ale-mão de 1932.

A história mostraria, contudo, que a vitória de Schmitt não era definitiva. Três meses após a decisão do caso "Prússia contra Reich", Hitler chegava ao poder sem romper com ne-nhum aspecto de legalidade existente à época.

Concretizava-se, em certo sentido, a previsão de Schmitt: o sistema político de Weimar permitiria que seu maior inimigo assumisse o poder e destruísse, de dentro do sistema, todo o regime constitucional de 1919.

A história parecia dar alguma razão a Kelsen!

Na famosa conferência proferida perante a Associação dos Professores Alemães de Direito Público Kelsen deixou claro que a jurisdição constitucional haveria de ter um papel central em um sistema democrático moderno:

Contra as muitas censuras que se fazem ao sistema demo-crático - muitas delas corretas e adequadas não há me-lhor defesa senão a da instituição de garantias que asse-gurem a plena legitimidade do exercício das funções do Estado. Na medida e m que amplia o processo de democra-tização, deve-se desenvolver também o sistema de contro-le. É dessa perspectiva que se deve avaliar aqui a jurisdi-ção constitucional. Se a jurisdijurisdi-ção constitucional assegura um processo escorreito de elaboração legislativa, inclusi-ve no que se refere ao conteúdo da lei, então ela desempe-nha uma importante função na proteção da minoria contra os avanços da maioria, cuja predominância somente há de ser aceita e tolerada se exercida dentro do quadro de lega-lidade. A exigência de um quorum qualificado para a mu-dança da Constituição traduz a idéia de que determinadas questões fundamentais devem ser decididas com a partici-pação da minoria. A maioria simples não tem o direito de

(13)

i m p o r a sua vontade — pelo m e n o s e m algumas questões — à minoria. N e s s e ponto, a p e n a s m e d i a n t e a a p r o v a ç ã o de u m a lei inconstitucional p o d e r i a a m a i o r i a afetar os inte-resses d a minoria constitucionalmente protegidos. Por isso, a minoria, qualquer q u e seja a sua natureza - de classe, de nacionalidade ou de religião — t e m u m interesse eminente na constitucionalidade d a lei.

Isso se aplica, sobretudo, e m c a s o de m u d a n ç a das rela-ções entre maioria e minoria, se u m a eventual maioria pas-sa a ser minoria, m a s ainda suficientemente forte para obs-tar u m a decisão qualificada relativa à reforma constitucional. S e se considera q u e a essência da d e m o c r a c i a reside n ã o no império absoluto d a minoria, m a s exatamente no perma-n e perma-n t e c o m p r o m i s s o e perma-n t r e m a i o r i a e m i perma-n o r i a d o s g r u p o s populares r e p r e s e n t a d o s n o P a r l a m e n t o , e n t ã o representa a jurisdição constitucional u m instrumento a d e q u a d o para a c o n c r e t i z a ç ã o d e s s a idéia. A s i m p l e s p o s s i b i l i d a d e d e i m p u g n a ç ã o perante a Corte Constitucional p a r e c e c o n f i -gurar i n s t r u m e n t o a d e q u a d o p a r a p r e s e r v a r os interesses d a minoria contra lesões, evitando a c o n f i g u r a ç ã o de u m a ditadura da maioria, que, tanto quanto a ditadura da mino-ria, se revela perigosa para a paz social.5

Tal como anota Pedro de Veja Garcia, a tese de Kelsen se impôs à maioria dos estados democráticos a partir da Segunda Guerra Mundial:

Bien es verdad que, a partir de la Segunda Guerra Mundial, Ias tesis de Kelsen se imponen en la praxis constitucional de la mayoría de los estados democráticos con resultados posi-tivos y encomiables. Ahí está el ejemplo de la Corte Constitu-cional italiana, dei Tribunal ConstituConstitu-cional alemán o dei todavia reciente Tribunal Constitucional espanol. Sin embargo, no es m e n o s cierto que Ias cuestiones sobre Ia legitimidad, fun-cionalidad y coherencia de la Justicia Constitucional distan m u c h o de haber sido definitivamente dilucidadas."

5 K E L S E N , Hans. Wesen und Entwicklung der Staatsgerichtsbarkeit,

VVDStRL 5, 1928, p. 80-81; Cf. também tradução italiana de GERACI, Carmelo. "La Garanzia giurisdizionale delia Constituzione", in: La

giustizia costituzionale, Milão, 1980, p. 144 (201-203).

Veja GARCÍA, Pablo. "Prólogo à obra de Schmitt". In: SCHMITT, Carl.

IM defensa de la Consiitución. 2. ed. Madrid: Tecnos, 1998, p, 22-23.

(14)

A controvérsia sobre a jurisdição constitucional, ápice de uma disputa entre dois dos mais notáveis juristas europeus do início do século XX, mostra-se relevante ainda hoje. O debate sobre o papel a ser desempenhado pelas Cortes Constitucio-nais, atores importantes e, às vezes, decisivos da vida insti-tucional de inúmeros países na atualidade, obriga os estudiosos a contemplarem as considerações de Schmitt (e, inequivoca-mente, as reflexões de Kelsen) a propósito do tema.

Como se sabe, tais controvérsias manifestam-se sob for-mas diversas, referindo-se aos limites da jurisdição constitucional, à jurisdição constitucional e democracia, à jurisdição constitu-cional e política, à jurisdição constituconstitu-cional e divisão de pode-res, para ficarmos em alguns exemplos que têm ocupado a moderna teoria constitucional.

A atualidade dessa discussão vê-se, v.g., na multicitada obra de Habermas, Faticidade e Validade (Faktizitat und Geltung), que dedica um capítulo ao estudo sobre a

legitimida-de da jurisprudência constitucional, tendo por leitmotiv as re-flexões de Schmitt em o Defensor da Constituição.

Parecem evidentes, assim, a importância e atualidade da obra que a Editora Del Rey coloca ao alcance dos estudiosos de Direito Público no Brasil.

(15)
(16)

I

PREFACIO

O artigo "O guardião da Constituição" publicado em mar-ço de 1929 (Archiv des òffentlichen Rechts, Neue Folge, XVÍ, p. 161-237) encontra-se processado e continuado no presente tratado. Ademais, foram inseridas no contexto sistemático do tema algumas formulações de artigos e palestras dos anos de

1929 e 1930.

O tratamento científico de tal objeto não se faz possível sem uma apresentação da concreta situação constitucional. Mas nisso reside uma tarefa muito difícil e cheia de perigos, não devido às falsas interpretações político-partidárias pelas quais se espera, mas isso faz parte do risco geral da liberdade de espírito, muito mais devido à extraordinária complicação das condições constitucionais atuais da Alemanha, as quais se en-contram em meio a uma grande transformação. Quem hoje quiser falar em poucas páginas e dar uma idéia geral de Statu

Imperii Germanici, não pode perder de vista uma mistura

con-traditória de sistemas, fragmentos de sistemas e tendências. Na maioria dos Estados do planeta, talvez a Constituição tenha se tomado hoje um novo problema e, até mesmo, na França. J. Barthélemy pôde recentemente (durante uma palestra perante a Union des Intérêts Economiques) partir do princípio de que a exigência por uma reforma do Estado seria o tema mais atual do tempo presente. Assim, com uma mera "reforma do Reich" como mudança do sistema federativo presente, a questão na

(17)

Alemanha ainda não estaria resolvida. O que mais dificulta o reconhecimento de nossa situação constitucional concreta é a concomitante ligação e interseção de organização federalista com outros princípios de volição estatal. Tentei caracterizá-la como "Estado partidário pluralista" e "policracia" e também tratar o problema, daí resultante, da "neutralidade da política interna do Estado", de modo algum por prazer com uma tese "brilhante" ou "estimulante", e, sim, sob a força coercitiva de uma necessidade criada com o próprio tema.

Res dura et regni novitas me talia cogunt Moliri

Berlim, março de 1931 Carl Schmitt

(18)

INTRODUÇÃO

Panorama dos variados tipos e possibilidades

da tutela constitucional

O clamor por u m guardião e defensor da Constituição é, na maioria das vezes, um sinal de delicadas condições constitucio-nais. Por isso, é instrutivo e digno de consideração o fato de os planos e as propostas de tal guardião surgirem na recente his-tória constitucional primeiramente na Inglaterra, mais precisa-mente após a morte de Cromwell (1658), ou seja, após as pri-meiras tentativas modernas de constituições escritas e em uma época de desligamento da política interna do governo republi-cano, em virtude de um parlamento incapaz de deliberações objetivas e diretamente antes da restauração da Monarquia. Naquele tempo foi proposta uma corporação especial que, seguindo o modelo do éforo espartano, deveria defender a or-dem vigente do Commonwealth e impedir a restauração da monarquia. Em especial, no círculo de Harrington, surgiram algumas idéias sobre um "defensor da liberdade" e "defensor da Constituição".1 A idéia de tais instituições parte daquelas

1 S M I T H , F. H. Russel. Harrington and his Oceana, Cambridge

(19)

O ^ G m R D I Ã O ^ Ç O N S T I T U I ^ O idéias, passando por constituições da Pensilvânia até as cons-tituições da revolução francesa. Aqui aparece na Constitui-ção do ano VIII (1799) um Senado como guardião

(con-servateur) da Constituição. Essa instituição também precedeu,

diretamente, um movimento contrário, à época de Napoleão I. Destarte, é duplamente interessante o fato de que o Sénat

Conservciteur tenha desempenhado apenas após a derrota

militar de Napoleão o papel de um defensor da Constituição e, pelo decreto de 3 de abril de 1814, abjudicado o trono a Napoleão e sua família por violação da Constituição e dos direitos po-pulares.3

Os embates constitucionais alemães do século XIX não podem ser comparados com grandes revoluções. Porém, as constituições da monarquia constitucional alemã também não desconsideram de modo algum a salvaguarda da Constituição. Especialmente características para tanto são as determinações da Constituição da Baviera (1818) e da Saxônia (1831). Sob o título "Da garantia da Constituição", elas tratam: 1. do jura-mento do rei, dos servidores públicos e dos cidadãos sobre a Constituição;4 2. do direito dos estamentos em apresentar quei-xas por violação à Constituição; 3. do direito dos estamentos

em instaurar um processo por violação à Constituição; 4. das

"guardar o que quer q u e se tenha d e c i d i d o na C o n s t i t u i ç ã o e prevenir a restauração da monarquia" [no original e m inglês. N.T.].

2 S o b r e os detalhes da t r a j e t ó r i a q u e c o n d u z de H a r r i n g t o n a

constituições norte-americanas e de lá a Sieyès, cf. S M I T H , F. Russel. Id. p. 208. Como outra prova, gostaria de chamai a atenção, no tocante às exposições de Russel Smith, para as propostas de T h i b a u d e a u citadas por B L O N D E L , A n d r é . Le contrôle

juri-dictionnel de la constitutionnalité des lois. Paris 1928, p. 177.

Thibaudeau lembra as experiências que teriam sido feitas pelos c e n s o r e s da Pensilvânia.

3 D e c r e t o d o S e n a d o de 3 de abril de 1814; j u n t a n d o - s e a ele

( " C o n s i d e r a n d o que N a p o l e ã o B o n a p a r t e v i o l o u o p a c t o constitucional" [no original em francês. N.T.]) a deliberação do corpo legislativo do mesmo dia, e m Duguit-Monnier p. 177.

4 Sobre o juramento constitucional, vide mais detalhes no excelente

(ratado de F R I E S E N H A H N , Ernst. Derpolilische Eid, Bonn 1928

(20)

I N T R O D U Ç Ã O

1

condições de uma emenda constitucional. Além disso, a Cons-tituição da Saxônia de 1831 trata ainda, sob esse título, do po-der do tribunal do Estado em decidir dúvidas sobre a interpre-tação da Constituição, desde que não haja acordo entre governo e estamentos.5 Todavia, após as experiências vividas na época

de conflito na Prússia e após os grandes sucessos da política de Bismarck, foi tacitamente desconsiderada, como era de se supor, a questão de uma garantia da Constituição e na geração seguinte, quando da indiferença geral por uma teoria constitu-cional, não se tinha mais uma verdadeira consciência dela. Georg Jellinek alude ao problema no capítulo final de sua

Teo-ria geral do Estado (Ia edição em 1900) sob o título "As

ga-rantias do Direito público". O que ele enumera como tais garantias (juramento político, responsabilidade parlamentar e acusação ministerial) corresponde às condições políticas e ao esquema do século XIX alemão. Otto Mayer diz, em seu Sachsischen Staatsrecht (1909), a respeito das determinações sobre a proteção da Constituição violada ou mal compreendi-da: "Todas elas estão determinadas a, porventura, não serem empregadas e, de fato, não tiveram até agora oportunidade para tanto".

Provavelmente naquele tempo, em meio ao sentimento de segurança política e bem-estar da proteção, já se teria qualifi-cado de "política" a mera pergunta pelo guardião da

Constitui-5 C f . p a r a a B a v i e r a : S T O E R K . Handbuch der deutschen

Verfassungen, 2. Aufl. 1913, p. 105, além disso S E Y D E L , M. v. Bayerisches Staatsrecht, 1. A u f l . 1896, I, p . 3 8 6 , 517, etc.

(característica é a repartição das garantias e m particular sobre vários pontos do sistema, enquanto a "garantia da Constituição" c o m o tal não tem mais um lugar sistemático e nem m e s m o aparece c o m o vocábulo no excelente e minucioso 4" volume (de registros)); para a Saxônia: S T O E R K . p. 343; J. H. B E S C H O R N E R . Die

Ministerverantwortlichkeit und der Staatsgerichtshof im Kònigreich Sachsen, B e r l i n 1 8 7 7 ; O P I T Z . Staatsrecht des Kõnigreichs Sachsen ( 1 8 8 4 ) , II, p. 2 4 6 ; M A Y E R , Otto. Das

Staatsrecht des Kõnigreichs Sachsen (1909) p. 214/215. Outros

(21)

4 O GUARDIÃO DA C O N S T I T U I Ç Ã O

ção e, com isso, a menosprezado. Entrementes, tivemos a experiência de que é um artifício especialmente político apre-sentar a própria concepção como apolítica e as questões e opi-niões do adversário como políticas. Sabemos, ademais, que os problemas das ciências políticas e da teoria constitucional não se resolvem resolvem com a sua negação ou recusa. Destarte, desde a Constituição de Weimar, interessa-se novamente pe-las garantias especiais da Constituição e pergunta-se pelo seu guardião e defensor. O tribunal do Estado para o Reich alemão qualifica-se como "guardião da Constituição do Reich".6 O

pre-sidente do tribunal do Reich Dr. Simons chamou o tribunal do Reich de "defensor e vigia" da Constituição do Reich.7

Nume-rosas propostas exigem um tribunal do Estado ou constitucio-nal como guardião, garante, vigia ou fiel depositário da Consti-tuição. Também na literatura jurídica, o problema novamente se tornou consciente. Meu tratado sobre o "guardião da Cons-tituição", publicado em março de 1929 no Arquivo de Direito Público (Archiv des õffentlichen Rechts, vol. XVI, p. 161 e seguintes), encontrou ampla aceitação e também levou, espe-cialmente, ao fato de que, nos últimos anos, a posição constitu-cional do presidente do Reich alemão fosse freqüentemente qualificada como a de um guardião da Constituição.8

6 Decisão de 15 de outubro de 1927, Jurisprudência civil do Reich 118,

anexo p. 4; L A M M E R S - S I M O N S . Die Rechtsprechung des Staatsgerichíshofs fur das Deutsche Reich, Bd. I, Bertin 1929, p. 295.

7 Deutsche Juristen-Zeitung [Jornal jurídico alemão], 1924, p. 246.

s Assim, e m especial, na publicação da união sobre a renovação

do Reich, " D i e Rechte des deutschen R e i c h s p r a s i d e n t e n nach der Reichsverfassung", 2. Aufl. Berlin 1930, uma obra que tem o mérito extraordinário de ter difundido uma correta concepção da posiç5o constitucional do Presidente do Reich e, c o m isto, ter resolvido numerosas opiniões e propostas de reforma, estreitas e absurdas. Além disso, pode-se citar: S I M O N S , W. Einleitung

zu Lammers-Simorts id. II, p. 9, U ; P O H L . H. "Die Zustandigkeiten des Reichsprasidenten", em A N S C H Ü T Z - T H O M A S . Handbuch

(22)

I N T R O D U Ç Ã O 5

As propostas de lei e projetos, até agora, partiam quase todos do princípio de que um tribunal do Estado deveria decidir, em um processo judicial, tanto litígios constitucionais quanto dúvidas e divergências de opinião acerca da constitucionalidade de leis do Reich. Entretanto, as várias propostas resultam em uma justaposição e confusão assistemáticas das supremas ins-tâncias decisórias, tribunal do Estado ou constitucional, tribunal do Reich (segundo o artigo 13, § 2o, da Constituição do Reich),

tribunal sentenciai do Reich ('Tribunal do Reich para a inter-pretação vinculativa da lei" no sentido dos esforços de Zeiler)' e juízo administrativo do Reich devem se juntar, sob relações coordenadas pouco claras, aos numerosos supremos tribunais existentes do Reich e dos estados, de maneira que R. Grau falou com razão de uma "maioria de guardiões constitucionais em concorrência uns com os outros e talvez para contradição uns com os outros".10 No todo, a forma hoje comum de

trata-mento dessa difícil questão constitucional continua sendo for-temente influenciada pela tendência dos "juristas da justiça" para transferir a solução de todos os problemas simplesmente para um processo judicial e desconsiderar por completo a dife-rença fundamental entre uma decisão processual e a decisão de dúvidas e divergências de opinião sobre o conteúdo de uma determinação constitucional. Sentia-se, sobretudo, a necessi-dade de uma proteção perante o legislador, ou seja, o parla-mento e, conseqüentemente, limitava-se o problema da prote-ção constitucional arbitrariamente ao problema da proteprote-ção contra leis e decretos anticonstitucionais e se desnaturava tam-bém este problema novamente por procurar o guardião da

Cons-da proprieCons-dade e desapropriaçao, 1930, p. 319, 320, e no Manual

do direito público alemão, artigo 72 (a lei ordinária do Reich),

II, p. 177-178.

0 SCHIFFER, E. Die deutsche Ju.stiz, Berlin 1928, p. 257/258; contra,

W. S I M O N S na introdução ao v o l u m e II da coleção publicada p o r ele, a s s i m c o m o L A M M E R S . " D i e R e c h t s p r e e h u n g des Staatsgerichtshofcs für das Deutsche Reich", Berlin 1930, p. 8, e G R Ü N H U T , em ludicium, 1930, p. 143.

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6 O GUARDIÃO DA C O N S T I T U I Ç Ã O

tituição no território da justiça, sem se "preocupar muito" com o próprio assunto, como Rudolf Smend disse de passagem, mas acertadamente, em uma crítica." Apenas L. Wittmayer repre-senta uma exceção entre os autores dos primeiros anos do pós-guerra, ao qualificar o conselho do Reich, devido a seu direito de oposição, como guardião da Constituição e, desse modo, faz valer novamente o nexo, muitas vezes caído em es-quecimento, entre proteção constitucional e dificultação da emenda constitucional.12 Hm contrapartida, os planos e

propos-tas existentes querem, na maioria das vezes, transferir a um tribunal (tribunal sentenciai do Reich, tribunal do Estado do Reich alemão) a decisão de dúvidas e divergências de opinião sobre a constitucionalidade de prescrições legais (leis e decretos). Em especial as propostas da 33a e da 34a assembléia alemã de

juristas (em 1924 em Heidelberg e em 1926emColônia)procu-ram solucionar o problema ao proporem ampliar a competência do tribunal do Estado para o Reich alemão, pelo artigo 19 da Constituição do Reich, de litígios constitucionais dentro de um estado para aqueles também dentro do Reich.11

Provavelmen-11 Verfassung und Verfassungsrechr, Míinchen und Leipzig 1928,

p. 143.

12 Die Weimarer Verfassung, Tíibingen 1922, p. 329.

13 Provavelmente, Alfred Friedmann (Friters) foi o primeiro após a

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I N T R O D U Ç Ã O

1

c o m p e t e n t e para litígios constitucionais dentro de um Estado) também para incluir litígios constitucionais dentro do Reich. A

34' assembléia alemã de juristas (em 1926 e m Colônia; relatores

AnschUtz e M e n d e ) r e c o m e n d o u , igualmente, « m a mudança no artigo 19 da Constituição do Reich; o tribunal do Estado para o Reich alemão deveria também decidir sobre litígios constitucionais d e n t r o do R e i c h ; a d e m a i s , o t r i b u n a l d o E s t a d o d e v e r i a ser exclusivamente competente paia examinar a validade de leis do Reich devidamente promulgadas; como objetivo legislativo, dever-se-ia aspirar reunir "a interpretação do direito constitucional do Reich na instância s u p r e m a j u n t o ao tribunal do Estado para o R e i c h a l e m ã o " . O ministério das relações interiores do Reich publicou e m 1925 (Editora Heymann) o projeto de uma "lei para a c o n s e r v a ç ã o da unidade do R e i c h " , s e g u n d o o qual, e m um processo de decisão judicial sobre questões de direito público, especialmente, também, de direito constitucional, a decisão deva ser tomada por u m tribunal sentenciai do Reich. Um projeto de lei publicado no Jornal Jurídico A l e m ã o de 1926, col. 842, pelo então ministro das relações interiores do Reich, Dr. Külz, prevê que, se existirem dúvidas ou divergências de opinião sobre se um preceito legal do direito do Reich contradiz a Constituição, o parlamento, o conselho ou o governo do Reich pode apelar para a decisão do tribunal do Estado para o Reich alemão, mas, segundo esse projeto, aparentemente não deve ser excluído o direito de exame judicial geral; cf. o artigo de Külz. DJZ. 1926, Sp. 837; POETZSCH. DJZ. 1926, Sp. 1269; B Õ T T I C H E R . Leipz. Z. 1926, p. 822; G R A U , Richard. Zum Gesetzentwurf über die Prüfung der Verfassungsmafíigkeit vort Reichsgesetzen und Rechtsverordnungen,

AõR., N. F. XI, p. 287 e seguintes (1926); M A R X , Fritz Morstein.

Variationen über richterliche Zustündigkeit zur Prüfung der RechímaJSigkeit des Gesetzes, p . 1 2 9 - 1 3 0 ( B e r l i n 1 9 2 7 ) ; S C H E L C H E R , Fischers. Zeitschr. f Verwaltungsrecht, Bd.60 p. 305; BREDT. Zeitschr. f d. ges. Staatsw. Bd. 82, 1927, p. 443; N A W I A S K Y . AõR., N. F. XII (1927) p. 130/131; H O F A C K E R .

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8 O GUARDIÃO DA C O N S T I T U I Ç Ã O

te ainda sob a impressão de resíduos do período anterior à guerra e sob a influência da naquela época muito citada "solução aus-tríaca"14, pouco se discutiu, na fadiga da primeira década após

o colapso, o significado objetivo de tais ampliações da justiça e se contentou com normativismos e formalismos abstratos.

Porém, a grande ampliação que a competência do tribunal do Estado para o Reich alemão parecia tomar a partir de 1925, em especial na prática do artigo 19 da Constituição do Reich, conduziu logo a dúvidas políticas e constitucionais, por meio das quais foi impedida a, até então, expansão naturalmente exigida em direção à esfera judicial. A prática do artigo 19 da Constituição determinou exclusiv amente pelos precedentes tanto o conceito do litígio constitucional, que não se resolve com uma "definição" ilimitada da palavra (litígio constitucional é todo li-tígio sobre uma determinação da Constituição), quanto o con-ceito dos "litígios constitucionais dentro de um estado", assim como, também, a questão decisiva da capacidade de agir em juiz diante do tribunal do Estado. Era de sobressair o fato de que partidos políticos, facções parlamentares e grupos isolados de deputados, sociedades religiosas, comunidades e, até mes-mo, cooperativas nobiliárquicas podiam citar um estado ou um

G R A U . Icl.; IMHOFF. Id.; BREDT. Id. p. 453-454, que consideram, todos, c o m o necessária uma lei de e m e n d a à Constituição; contra tal f a t o (na minha opinião, sem razão) L O W E N T H A L . DJZ. 1927. p. 1234, Reichsverwaltungsblatt 1930 p. 748. A l é m disso, deve-se ainda notar sobre a literatura a respeito do tribunal do Estado, que os autores de teses e dissertações sobre ele (aparentemente um tema preferido para "teses de doutorado") atacam a difícil questão na maioria das vezes com a ajuda de algumas fórmulas e padrões adquiridos há pouco, isso é p e r d o á v e l e n ã o c a u s a censura aos j o v e n s autores.

14 Artigos 89 e 139 da Constituição federal austríaca de Io de outubro

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I N T R O D U Ç Ã O

2.

governo estadual diante do tribunal do Estado em questões freqüentemente de alta política,15 e pareciam incalculáveis quais

grandezas e grupos sociais (representações profissionais, as-sociações de interesses, entidades de direito público) seriam um dia admitidas como partes no processo. Todavia, surgiu, aqui há aproximadamente um ano, uma certa contenção, que dizia respeito a uma questão de direito eleitoral suscitada na Prússia de 17 de fevereiro de 1930,17 que será discutida mais

em detalhes abaixo, representa um importante indício. Em todo caso, torna-se necessário apreciar o problema no contexto concreto de nossa situação de direito público e cons-titucional. Como prova dessa necessidade basta relembrar, perante as abstrações precipitadas daquelas primeiras tentativas de solução, os diversos "guardiões da Constituição" que

surgi-15 Até 1929, facções parlamentares: decisão do tribunal transitório

do Estado de 12 de julho de 1921, Jurisprudência civil do Reich 102, p. 415 e de 21 de n o v e m b r o de 1925, Jurisprudência civil do

Reich 112, anexo p. 1; partidos políticos (com cuidadosa restrição a litígios de direito eleitoral): Jurisprudência civil do Reich 118, anexo p. 22, Jurisprudência civil do Reich 120, anexo p. 19 (Gau M e c k l e n b u r g - L i i b e c k do p a r t i d o o p e r á r i o n a c i o n a í - s o c i a l i s t a contra o E s t a d o de M e c k l e n b u r g - S c h w e r i n ) ; e m contrapartida, não: partido social-democrata i n d e p e n d e n t e na Saxônia contra o Estado da Saxônia, Jurisprudência civil do Reich 121, anexo p. 8; igrejas do Estado: Jurisprudência civil do Reich 118, anexo p. 1; municípios: decisão de 12 de janeiro de 1922, DJZ. 1922, coluna 427, e, além disso, a decisão e m matérias do magistrado da cidade de Potsdam contra o Estado da Prússia de 9 de j u l h o de 1928, Jurisprudência civil do Reich 121, anexo p. 13, o grupo local Nassau da nobreza direta do Reich (5 famílias!) de então contra o ministério estatal da Prússia, decisão de 10 de maio de 1924, Jurisprudência civil do Reich 111, anexo p. 1.

16 Cf. a crítica especialmente enfática da ampla extensão da

competên-ciado tribunal do Estado por W.HOFACKER. Verfassungsstreitigkeiten

innerhalb eines Landes, Reichsverwaltungsblatt 1930, p. 33/34.

17 Jurisprudência civil do Reich 128, anexo p. 1; e (com protocolo

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1 0 O GUARDIÃO DA C O N S T I T U I Ç Ã O

ram em grande número na longa história do problema constitu-cional. O exemplo clássico dos éforos espartanos é ainda freqüentemente citado no século XJX, na maioria das vezes com o inevitável quis custodiet ipsos custodes e com a ad-vertência como aditamento de que o guardião se torna facil-mente senhor da Constituição e que ocorre o perigo de um duplo chefe de Estado, mas às vezes também com a queixa sobre as conseqüências ruins de uma instância inamovível, ir-responsável e que decide à sua discrição.18 Outras propostas e

18 Sobre o eforado no Estado lacedemônio: B U S O L T - S W O B O D A .

"Griechische Slaatskunde" (Handbuch der Altertumswissenschaft, IV, 1, München 1926) p. 670, 683-684; aí encontram-se as fontes e os outros escritos. Os éforos tinham a tarefa de conservar a ordem social e estatal existente, assim como cultura e costumes cívicos, para que o nomos fosse o único senhor no Estado. Eles ajuramentavam o rei e prestavam um contrajuramento. T i n h a m t a m b é m que, sobretudo, proteger a ordem existente contra uma rebelião dos helotas subjugados e podiam matar, sem mais, helotas suspeitos. Isso era válido c o m o guerra contra o inimigo interno, por isso, todo ano, os éforos declaravam formal e festivamente guerra aos helotas. Busolt-Swoboda (p. 670) tem isso c o m o uma "astúcia ingênua". Ele tem razão, pois há na luta contra o "inimigo i n t e r n o " m é t o d o s q u e d e m o n s t r a m m a i s a s t ú c i a d o q u e ingenuidade. Em todo caso, os éforos foram historicamente uma autoridade, c u j o caráter político se c o m p r o v a j u s t a m e n t e neste contexto c o m um termo inimigo e de política interna. Também de interesse é a queixa de Aristóteles (Política, II, 7, B 10 1272 C) sobre a instituição dos é f o r o s e d o s c o s m o s . M a s o pior é a s u s p e n s ã o do c o s m o s pelos p o d e r o s o s q u e f r e q ü e n t e m e n t e a provocam quando não querem se submeter às decisões judiciais | no original em grego e e m alemão na tradução de Stahr], Sobre os c f o r o s e m A l t h u s i u s : G. L E I B H O L Z . Der fíegriff der Repriisentation, Berlin 1929, p. 84 nota; sobre a proposta de Fichte a respeito de um eforado que levaria a um duplo chefe de Estado: K. W O L Z E N D O R F F . Siaatsrecht und Naturrecht, 1916, p. 408; M O H L . Encyclopadie 2. Aufl. 1872, p. 647; D A H L M A N N .

Politik 3. A u f l . 1847, p. 197 e s e g u i n t e s ; B L U N T S C H L I ,

Allgemeines Staaisrecht Bd. 2, 4. Aufl., München 1868, Cap. 10, p. 552. O trecho mais importante desta literatura sobre teoria do Kstado e teoria constitucional que atravessa séculos encontra-se na crítica dc H e g e l d o s p l a n o s do e f o r a d o de F I C H T E .

(28)

I N T R O D U Ç Ã O

1 1 instituições como as de tribunos,19 censores2" e síndicos21

per-tencem igualmente a este tipo de guardiões da Constituição. O segundo tipo baseia-se no modelo do senado romano que, por meio de sua tarefa inibitiva e conservadora, foi um verdadeiro

Wcrke I, p. 479: "Por causa disso (porque, se com isso quisermos obrigar o poder supremo ao acordo com a vontade geral, a volonté

générale, ao se lhe opor um outro poder igual, na verdade não está resolvido o problema e m se obrigar o poder supremo) refugia-se numa diferenciação totalmente formal. Todavia, o poder real

é colocado como único e abrangente, mas o que se lhe opõe é

o poder possível, e essa possibilidade deve ser capaz de obrigar aquela realidade. A esta segunda existência sem poder da vontade geral deve ser atribuído o j u l g a m e n t o se o poder abandonou a primeira (ou seja, a v o n t a d e geral, a volonté générale), se o poder não está mais c o n f o r m e ao conceito de liberdade geral". Ele "deve vigiar, em geral, o poder supremo e, da mesma forma q u e nele surge u m a vontade particular no lugar da geral, deve lhe privar do m e s m o e o m o d o pelo qual isso deve acontecer, deve ser uma declaração pública da nulidade total, com efeito

absoluto, de todas as ações do s u p r e m o poder público a partir deste momento". Então, continuando, este segundo representante da vontade geral teria que ter um "poder real" para poder obrigar o poder supremo. Mas c o m o o " p o d e r r e a l " está c o m o outro r e p r e s e n t a n t e da v o n t a d e geral, e s t e p o d e i m p e d i r q u a l q u e r decisão concreta e m aniquilar, "independente de quais funções foi encarregado o eforado, a vigilância, a declaração pública do interdito e quais f o r m a l i d a d e s são t r a m a d a s ; e c o m o m e s m o direito (...), pois estes éforos não são, ao m e s m o tempo, menos vontade particular do que aqueles e tanto o governo pode julgar se a vontade particular destes se isolou da vontade gera!, quanto o e f o r a d o sobre o governo".

''' Artigos 21 e 28 da Constituição francesa do ano VIII (1799) e numerosos senatus-consultes até a eliminação do tribunado pelo

senatus-consultes de 19 de agosto de 1807.

211 S o b r e os c e n s o r e s da P e n s i l v â n i a , vide acima nota 2; outros

exemplos em R. M O H L . Verantwortlichkeit der Minister, p.

223-224, sobre "censores expressamente chamados", os quais obser-vam todas as ações d o g o v e r n o no tocante a sua constitucio-nalidade. Sobre os defensores da B o ê m i a será publicada uma pesquisa pelo Dr. Rudolf Stanka.

21 SPINOZA. Tractatus politicus VIII 920921; X, §§ Io e 3o; editio

Bruder p. 108, 130; quorum (destes síndicos) officium solummodo

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1 2 O GUARDIAQ DA C O N S T I T U I Ç Ã O

defensor das condições constitucionais romanas e cuja

autori-dade — a palavra é, aqui, usada em seu expressivo sentido

para se diferenciar de potestas22 — tinha que homologar as

deliberações populares para que fossem impedidas violações da ordem constitucional e das obrigações internacionais." Este modelo também continuou a produzir efeitos por muito tempo no pensamento constitucional dos europeus. Nele baseia-se o hábito em se tomar uma segunda câmara guardiã da Consti-tuição. Segundo o artigo 21 da Constituição francesa do ano VIII, e.g., um Sénat Conservateur homologa ou anula todos os atos do tribunado ou do governo apresentados como anticons-titucionais, semelhantemente, segundo o artigo 29 da Constitui-ção de 14 de janeiro de 1852, todos os atos a ele levados como anticonstitucionais pelo governo ou pela petição dos cidadãos. Pelo direito constitucional vigente da república francesa, o se-nado (a segunda câmara) constitui-se como Haute Cour de

Justice no caso de queixas ministeriais e em outros casos de

justiça política (artigo 9 da lei constitucional de 24 de fevereiro de 1875). Na literatura a respeito de teoria do Estado e teoria

concernunt, inviolata serventur, qui propterea potestatem habent, delinquentem quemcumque imperii ministrum, qui scilicet contra jura, quae ipsius ministerium concernunt, peccavit, coram suo iudicio vocandi et secundum constituía iura damnandi, eles devem ter um cargo vitalício, ter no mínimo

60 anos, "ne longa a d m o d u m dominatione nimirum superbiant", ter exército à disposição, poder exercer um direito de convocação frente à soberana reunião do conselho, etc. C o m o a verdadeira f u n ç ã o e v e r d a d e i r a p r e s t a ç ã o d o s s í n d i c o s i n d i c a - s e , caracteristicamente, que sua autoridade deveria conservar o regime estatal (HÍ imperii forma servetur).

22 Sobre a diferença entre autorítas e potestas: S C H M I T T , Carl.

Verfassungslehre, 1928, p. 75 nota. Um emprego muito interessante dessa diferenciação para a atual situação de política interna da Alemanha na revista Die Tat, outubro de 1930, p. 509-510 (artigo anônimo "Die kalte Revolution"); além disso, Z I E G L E R , Leopold.

Fiinjundzwanzig Sátze vom deutschen Staat, Darmstadt 1931, p. 43,

2 1 M O M M S E N . Rómisches Siaatsrecht III, p. 1041; outra bibliografia

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I N T R O D U Ç Ã O

constitucional, sempre permaneceu vivo o modelo de um "senado" defensor da Constituição. Assim, Junius Brutus exige, na mais famosa publicação monarquista, um senado encarregado de vigiar e examinar a interpretação e a execu-ção das leis empreendidas, ambas pelo rei.2" Harrington já foi

mencionado, a partir dele uma linha contínua conduz a Sieyès e ao século X I X . "

Mesmo a representação do povo, ou seja, a câmara elei-ta surge em uma determinada situação constitucional como guardiã da Constituição, pelo menos dos "direitos do povo" perante o governo,26 em especial novamente uma comissão de

24 B R U T U S , Junius. Vindiciae contra tyrannos, Ausgabe Edinburg

1579,p. 128.

25 Sobre a linha histórica: S M I T H , H. F. Russel. Id. p. 15, 205/206;

sobre as idéias e propostas de Sieyès: B L O N D E L . A. Id. p. 173; sobre seus efeitos na Suíça: HIS, Eduard. Geschichte des neuern Schweizerischen Staatsrechts, Bd. 1, Die Geschichte der Helvetik und der Vermittlungsakte 1798-1813, Basel 1925, p. 196-197.

2 6 P r i n c i p a l m e n t e q u a n d o o p a r l a m e n t o e s t a d u a l r e c e b e agravos

constitucionais. Segundo o título VII, § 21, da Carta Constitucional da Baviera de 26 de maio de 1818 (na redação da lei de 19 de janeiro de 1872), e.g., qualquer cidadão ou qualquer comunidade podia apresentar ao parlamento estadual agravos sobre violação dos direitos constitucionais. E m R. Mohl, no c a s o e x t r e m o , a r e p r e s e n t a ç ã o do p o v o p o d e c o n c l a m a r o p o v o à r e s i s t ê n c i a armada no caso de violação constitucional por parte do governo

(Verantwortlichkeit der Minister, p. 575), além disso, (eviden-temente c o m a ressalva do direito de e x a m e judicial): Über die

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1 1 O GUARDIÃO DA C O N S T I T U I Ç Ã O supervisão formada por representantes do povo "para a defesa dos direitos de representantes do povo perante o governo". Aqui se pode ver, de forma mais clara, que tais instituições só podem ser consideradas no contexto concreto geral da estrutura consti-tucional. Se a Constituição se baseia, como correspondente a uma concepção difundida no século XIX, em um contrato entre príncipe e povo, governo e representação do povo,28 toda parte

contratual surge como guardiã da parte constitucional que diz respeito a seus próprios direitos e poderes e tenderá a qualificar as determinações constitucionais vantajosas a suas reivindica-ções políticas como "a" Constituição. Mas mesmo o governo, que representa a unidade, pode ser concebido, de acordo com seu conceito, como "guardião dos serviços públicos e defensor das instituições estatais".29 Otto Mayer diz em seu Sãchsisches Staatsrecht (1909, p. 214): "o guardião supremo da Constituição é

o rei." Pode-se igualmente mencionar nesse contexto a teoria - a sec tratada posteriormente mais em detalhes - do poder neutro e medianeiro do rei ou de um presidente de Estado.3"

27 O artigo 35, § 2a, da Constituição do Reich incluiu no texto da

r e g u l a m e n t a ç ã o constitucional a e x p r e s s ã o "para a d e f e s a dos direitos da representação do povo perante o governo do Reich", a p e d i d o de HauBmann, e m 4 de j u l h o de 1919. Correspondia especialmente a uma tradição d o Estado de Wilrttemberg (cf. a antiga Constituição de Württemberg de 1819, artigo 187 e ss.) c o l o c a r esta c o m i s s ã o interina s o b o p o n t o de vista da " m a -n u t e -n ç ã o da C o -n s t i t u i ç ã o " ,

21i Vide m a i s a d i a n t e s o b r e o u t r o s e f e i t o s p r á t i c o s d e s t e t e r m o

constitucional. O protesto de 10 de fevereiro de 1866 da câmara de d e p u t a d o s da Prússia c o n t é m um e x e m p l o de sua história constitucional (ata n. 41, relatos e s t e n o g r á f i c o s . p. 137, 141-142)-. "A câmara, paTa a salvaguarda de seus direitos e dos direitos de t o d o o p o v o , p o r ela r e p r e s e n t a d o p e l o a r t i g o 8 3 da Constituição, protesta" contra o pedido d a promotoria pública para a p e r s e c u ç ã o j u d i c i a l d o s d e p u t a d o s Twesten e Frentzel d e v i d o a s u a s f a l a s n a c â m a r a d o s d e p u t a d o s . M a s d e v e - s e considerar que se trata, aqui, da defesa contra uma intervenção na p r ó p r i a e s f e r a , ou seja, de um c a s o de autoproteção; cf. também mais adiante.

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N T R Q D U C Ã O

1 5 Se nas constituições alemãs do século XIX está previsto um tribunal especial do Estado para a "proteção judicial da Constituição" ao lado de outras garantias/1 manifesta-se nelas

a simples verdade de que a proteção judicial da Constituição só constitui uma parte das instituições para a proteção e garantia da Constituição e que seria uma superficialidade sumária quecer, por causa dessa proteção judicial, os limites muito es-treitos de toda judicância e os muitos outros tipos e métodos de uma garantia constitucional.

( D A R E S T E , p. 497) e o artigo 98 da Constituição brasileira de 25 de março de 1824 denominam o rei e o imperador, respectivamente, de "chave de toda a organização política" e lhe atribuem a tarefa de velar continuamente sobre a m a n u t e n ç ã o da independência, do equilíbrio e da h a r m o n i a dos outros poderes políticos, cf. nota mais à frente.

31 A f o r m u l a ç ã o "proteção judicial da Constituição" encontra-se,

(33)
(34)

Primeira parte

(35)
(36)

O chamado direito de exame

judicial material geral

(acessório) não se constitui na

Alemanha em um guardião da

Constituição

(...)

Os tribunais com jurisdição civil, penal ou administrativa não são, em um sentido preciso, guardiões da Constituição. Todavia, é normal o erro em qualificá-los como tais ao

exerce-rem um chamado direito de exame judicial material, isto é, ao examinarem as leis ordinárias em sua coerência material com os comandos constitucionais e, em caso de conflito, negarem à lei ordinária sua aplicação. Por conseguinte, o tribunal do Reich, desde que se declarou autorizado, na decisão de 4 de novem-bro de 1925, (Jurisprudência civil do Reich 111, p. 320) a examinar leis ordinárias do Reich quanto à sua concordância com a Constituição do Reich, também foi ocasionalmente cha-mado de guardião da Constituição.1

A tendência em apresentar tribunais sentenciadores como a suprema garantia de uma Constituição pode ser provavel-mente explicada, principalprovavel-mente, a partir de idéias amplaprovavel-mente difundidas sobre o supremo tribunal dos Estados Unidos da América. Es.se tribunal, que é com razão mundialmente famoso, tornou-se entre alguns juristas alemães, como parece, um tipo de mito. Nas deliberações da comissão constitucional da as-sembléia nacional de Weimar, surgiram notáveis obscuridades

1 S o b r e " o tribunal do R e i c h c o m o guardião d a C o n s t i t u i ç ã o " ,

vide o artigo no presente das faculdades j u r í d i c a s por ocasião

do 50° aniversário do tribunal do Reich, Berlin 1929, p. 1 .*54-178.

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e estão documentalmente registradas nos protocolos da comis-são constitucional. Trata-se, de um "tribunal do Estado para a proteção da Constituição" da forma como, supostamente, teria sido "introduzido por todos os grandes Estados democráticos, por exemplo, pelos Estados Unidos, onde sua existência se auto-afirmou".2 De acordo com isso, deve-se lembrar, em algumas

palavras, que o supremo tribunal dos Estados Unidos, por cau-sa de sua interpretação autoritária de conceitos como proprie-dade, valor e liberproprie-dade, tem, como se disse, uma "posição úni-ca em toda a história mundial",3 justamente em território

econômico, que, por conseguinte, não pode ser simplesmente transferida às condições de um Estado continental europeu, condições estas de um tipo, política e socialmente, bem dife-rente. A posição do supremo tribunal dos Estados Unidos desenvolveu-se nos moldes de um Estado judicial do tipo anglo-saxão, o qual, como um Estado sem direito administrati-vo, contrasta fortemente com os Estados do continente euro-peu, não fazendo diferença se o Estado europeu é uma repú-blica, como a França, ou um Estado-funcionário monárquico como a Prússia do século XIX. O supremo tribunal norte-ame-ricano é bem diferente de um tribunal de Estado e sua justiça bem diferente do que se costuma chamar, hoje na Alemanha, de jurisdição do Estado ou jurisdição constitucional. Ele se limi-ta, com uma clara consciência básica de seu caráter como instân-cia senteninstân-ciadora, à decisão de determinadas matérias litigiosas

(real, actual 'case' or 'controversy' of 'Judiciary Nature'*).5

2 Protocolos, p. 485; contra, vide anteriormente H. P R E U 6 id. p.

4R3-484.

3 "Esta corte ocupa a posição única da primeira faculdade de grande

autoridade e m economia política na história mundial" [no original e m inglês. N.T.J: C O M M O N S , J o h n R. Legal Foundations of Capitalism, New York 1924, p, 7.

4 "Caso" ou "controvérsia" real de "natureza judiciária" fno original

em inglês. N.T.J.

5 WARREN, Charles. The Supreme Court in United States History,

Boston 1924, Bd. I p. 52, 108-109; H U G H E S , Charles Evans. The

Supreme Court of the Vnited States, N e w York 1928, p. 31 (Muskrar

v. United States, 1911, 219 U. S. 346); sobre a rigorosa restrição à verdadeira justiça (cases of Judiciary Nature) p. 22.

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O C H A M A D O DIREITO DE EXAME lUDICIAL MATERIAL.. 2 1

Considerando sua strictly judicial function,6 ele recusa todo

pare-cer político ou legislativo e não deseje ser nem mesmo um tri-bunal administrativo.7 Basicamente, ele recusa-se a redigir um

parecer ao congresso ou ao presidente.8 No que tange a seu

significado e efeito práticos, não se pode, a partir da considera-ção da atual situaconsidera-ção anormal da Alemanha, avaliar sua ativi-dade pelas épocas de prosperiativi-dade econômica e de segurança de política interna, e, sim, se ter em vista épocas críticas e turbulentas. Aqui, mostram os famosos precedentes do perío-do da guerra civil — decisões que dizem respeito a questões politicamente discutíveis como escravidão ou a desvalorização da moeda - que a autoridade do tribunal se encontrava em grande risco nesses casos e não podia de modo algum impor sua concepção sobre a matéria.9 Mas a maior e, na verdade,

fundamental característica da suprema corte norte-americana residia provavelmente no fato de que ela, com a ajuda de pon-tos de vista básicos e princípios gerais, os quais só podem ser abusivamente qualificados de "normas", examina a retidão e a racionalidade de leis e, por conseguinte, dado o caso, trata uma lei como não-aplicável.10 Ela é capaz para tanto, pois ela se

6 "Função estritamente judicial" [no original e m inglês. N.T.]. 7 Provas e m H U G H E S . Id. p. 32.

8 Primeiro caso, até então, de um parecer (advisory opinion) sob o

presidente Monroe; a respeito, W A R R E N id., II, p. 56; t a m b é m a observação de H U G H E S . Id. p. 31: "nada assim poderia acontecer h o j e " [no original em inglês. N.T.]. O solicitor-general James M. B e c k fez, até agora e m vão, a proposta de dar o direito ao congresso, conjuntamente com os presidentes, de pedir à suprema corte um parecer quando um anteprojeto de lei for duvidoso no tocante a sua constitucionalidade; cf. OGG-RAY. Introduction to American Government, 2. Aufl., 1926, p. 422, nota 3.

9 W A R R E N , III, p. 22/23 (Dred Scott Case), p. 244 (Legal Tender

Case)\ e mais, a Income Tax Case, 1895.

10 Aqui é o caso de conceitos c o m o reasonableness e expediency.

Sobre as relações e identificações de "constitution", "fundamental rights", "natural equity", "will of the people", etc., as interessantes observações em D I C K I N S O N , John. Administrative justice and the Supremacy of Law in lhe United States, Cambridge, Harvard

University Press, 1927, p. 97 e 101.

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O G U A R D I Ã O D A C O N S T I T U I Ç Ã O apresenta, na realidade, como guardiã de uma ordem social e econômica, a princípio não-discutível, perante o Estado. Como R. Gneist disse de forma muito acertada, ela tem um poder

transcendental" perante o Estado. Só neste contexto é que se pode considerar a crítica freqüentemente feita referente ao fato de que ela, por muitos anos, impediu e deteve leis de pro-teção aos trabalhadores e determinações sociopolíticas, até mesmo aquelas sobre o trabalho de mulheres e crianças, que nos eram naturais na Alemanha, ao tratá-las como anticons-titucionais. Não se trata aqui, naturalmente, nem de uma apo-logia nem de uma refutação do tribunal norte-americano, mas apenas de impedir, por meio de uma pequena retificação, trans-ferências irrefletidas e mitificações. Deve-se dizer basicamente que o direito de exame judicial, por si só, apenas toma os tribu-nais sentenciadores guardiões da Constituição em um Estado

judicial que subordina a totalidade da vida pública ao controle

dos tribunais ordinários e só quando, por Constituição, forem entendidos, sobretudo, os direitos fundamentais do Estado de Direito civil, liberdade pessoal e propriedade privada, os quais devem ser protegidos contra o Estado pelos tribunais ordinários,

i.e. contra legislação, governo e administração. Dessa forma,

a prática do tribunal americano defendeu e procurou proteger contra o legislador, com. base nas emendas (Amendment) de número 5 e 14 e desenvolvendo a muito discutida fórmula due

process oflaw,n os princípios da ordem civil social e

econômi-ca como a ordem superior e a verdadeira Constituição.

" Parecer id. p. 23, cf. a citação detalhada mais adiante ao final desse livro.

12 Devido processo legal 1 no original em inglês. N.T.]. Quinta Emenda

de J791 (dirigida à união): ninguém deve ser "privado da vida, da liberdade ou da p r o p r i e d a d e sem o d e v i d o p r o c e s s o legai; nem a propriedade privada deve ser t o m a d a para uso público sem uma justa compensação" [no original em inglês. N.T.]. Décima-quarta emenda de Í 8 6 8 (dirigida aos Estados): " N e m qualquer estado deve privar qualquer pessoa da vida, da liberdade ou da propriedade, sem um d e v i d o processo legal; nem negar dentro de sua jurisdição a igualdade da proteção legal" [no original e m inglês. N.T.]. Exagerada, mas característica é a critica constante

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