• Nenhum resultado encontrado

Mana vol.7 número1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "Mana vol.7 número1"

Copied!
26
0
0

Texto

(1)

AGIER, M ichel. 2000. Anthropologie du Carnaval: La Ville, la Fêt e et l'Af rique à Bahia. M arseille/ Paris: Parènt heses Eds. 253 pp.

Hermano Vianna

Dou tor, PPG AS-M N -UFRJ

Pa ra q u e m a b re p e la p rim e ira ve z e s -te livro, o títu lo A n th rop olog ie d u Carn a-v al p od e p a re ce r e n g a n oso. M e sm o o su b títu lo – La Ville , la Fê te e t l’Afriq u e à Ba h ia – su g e re u m a a b ord a g e m m u ito m a is a b ra n g e n te d o q u e a q u e la q u e se a p re se n ta d e im e d ia to a o le itor. Ap a -re n te m e n te , n ã o e sta m os d ia n te d e u m tra ta d o g e ra l sob re ritu a is ca rn a va le s -cos, com o a ca p a in d ica , m a s sim d e u m a cu id a d osa e d e n sa e tn og ra fia so -b re a s a tivid a d e s d e u m ú n ico g ru p o ca rn a va le sco sote rop olita n o, o Ilê Aiyê . Poré m , q u e m ch e g a a o fin a l d a le itu ra com p re e n d e a p e rtin ê n cia d o títu lo. N a ve rd a d e , o livro é u m a im p orta n te liçã o d e com o, d o d e ta lh e e tn og rá fico d e fe n ôm e n os m u ito p a rticu la re s d a s socie -d a -d e s com p le xa s con te m p orâ n e a s, p o-d e m os ch e g a r à te oria m a is “ a b stra ta ” , ilu m in a n d o n o ca m in h o q u e stõe s ce n -tra is p a ra o -tra b a lh o d e q u a lq u e r a n tro-p ólog o. Em A n th rop olog ie d u Carn av al, te oria e “ e m p iria ” – e ta m b é m m in u -d ê n cia e g e n e ra li-d a -d e – com b in a m -se d e m a n e ira e le g a n te e e n riq u e ce d ora .

Tod os os a sp e ctos p rin cip a is d a or -g a n iza çã o d o Ilê Aiyê sã o d e ta lh a d os

e m d ife re n te s ca p ítu los. O ca p ítu lo 3 co-m e ça coco-m u co-m a d e scriçã o d a Lib e rd a d e (o b a irro on d e su rg iu e sse g ru p o ca rn a va le sco), e m se g u id a a p re se n ta os fu n -d a -d ore s -d o b loco e te rm in a n a rra n -d o se u p rim e iro d e sfile d e ca rn a va l. N o ca -p ítu lo 4, e n con tra m os a h istória d o Ilê Aiyê d ivid id a e m trê s p e ríod os, n os q u a is o b loco p a ssa a se d e fin ir – e se r d e fin id o – p rim e iro com o m ovim e n to cu ltu ra l e d e p ois com o e m p re sa . O ca -p ítu lo 5 é d e d ica d o a u m a a n á lise d a s “ p osiçõe s socia is” d os m e m b ros d o Ilê Aiyê , sob re tu d o a p a rtir d e su a s tra je tória s p rofission a is e re la çõe s d e p a re n -te sco. O ca le n d á rio a n u a l d e fe sta s, a “ m itolog ia ” in ve n ta d a p e lo g ru p o e o d e sfile d e ca rn a va l p rop ria m e n te d ito sã o e stu d a d os n o ca p ítu lo 6; se u e stilo m u sica l e p oé tico n o ca p ítu lo 7 e , fin a l-m e n te , su a in se rçã o p olítica n os l-m ovi-m e n tos n e g ros b a ia n o e b ra sile iro n o ca p ítu lo 8. O re sta n te d o livro é form a -d o p or -d ois ca p ítu los in tro-d u tórios, u m a con clu sã o e u m p osfá cio te órico.

Fiz q u e stã o d e e n u m e ra r tod os e s-se s a ssu n tos p a ra d a r u m a id é ia d o g ra u d e com p rom e tim e n to d o a u tor com o p orm e n or e tn og rá fico, d o p e so q u e os “ fa tos” tê m n a org a n iza çã o d o livro. N a -d a e sca p a a o se u olh a r: o p a -d rã o g rá fico d a s ve stim e n ta s d os foliõe s; o n ú m e -ro d e toca d ore s d e cu íca e n tre os p e r-cu ssion ista s; a s re la çõe s d e g ê n e ro a tu a liza d a s n o d e sfile e n os e n sa ios; a con e -xã o com o ca n d om b lé ; a e con om ia e os con flitos a d m in istra tivos d o b loco; a

(2)

p e rson a lid a d e d os m e m b ros d a d ire toria . O re su lta d o é u m a d a s m a is com p le -ta s d e scriçõe s d o in trica d o con ju n to d e m e ca n ism os q u e p rod u z o ca rn a va l b ra -sile iro a p a rtir d o p on to d e vista e d a s a tivid a d e s d e u m ú n ico g ru p o. A p rofu -sã o d e d e ta lh e s p ou co a p ou co va i se ju stifica n d o e m te se s ou sa d a s q u e m o-d ifica m n ossa com p re e n sã o o-d a fe sta e q u e stion a m o a lca n ce d a s “ te oria s d o ca rn a va l” m a is con h e cid a s.

Pa ra M ich e l Ag ie r, o ca rn a va l é “ u m a in stitu içã o-ch a ve p a ra fa la r d a socie d a d e e se u con ju n to” (:7), p rod u -zin d o o “ d u p lo d a cid a d e ” q u e o a b ri-g a , e in sta u ra n d o n e la “ u m a fá b rica d e id e n tid a d e s” . M u itos e stu d iosos d a fo-lia ca rn a va le sca já e scre ve ra m coisa s p a re cid a s, m a s com in tu itos d ife re n te s. O ca rn a va l ta m b é m se ria u m d u p lo li-m in a r q u e in ve rte ria ou re força ria a or-d e m or-d a “ vior-d a oror-d in á ria ” , or-d a vior-d a n ã o ca rn a va le sca . M ich e l Ag ie r p rop õe u m a m a n e ira m a is com p le xa d e p e n sa r e ssa “ d u p licid a d e ” d a folia , e m q u e a fe sta n ã o te m o m e sm o sig n ifica d o (se ja in -ve rsã o ou re a firm a çã o) p a ra tod os os g ru p os e in d ivíd u os q u e d e la p a rtici-p a m , n e m o con ju n to d a socie d a d e é visto com o u m tod o h om og ê n e o org a n i-za d o e m torn o d e u m a ú n ica “ ord e m ” q u e p od e se r “ in ve rtid a ” ou “ re força -d a ” e m a p e n a s u m se n ti-d o.

N a h is t ó r ia d o c a r n a v a l d e S a lv a d or, o a p a re cim e n to d o Ilê Aiyê , e m m e a d os d os a n os 70, foi u m fe n ôm e n o d e -cisivo. É q u a se p ossíve l p e n sa r a folia e m d ois te m p os: a n te s e d e p ois d o Ilê Aiyê . M ich e l Ag ie r d e n om in a o p roce s-so, d o q u a l o Ilê Aiyê é e le m e n to ce n -tra l, d e “ re a frica n iza çã o” d a folia b a ia -n a . Re a lm e -n te : foi p a ra d e sig -n a r o tip o d e g ru p o ca rn a va le sco cria d o p e lo Ilê Aiyê q u e se criou a e xp re ssã o b loco a fro. M u itos b locos a fros su rg ira m e m ou tros b a irros, se g u in d o o e xe m p lo d a Lib e rd a d e , b u sca n d o ta m b é m te m a

ti-za r e cu ltu a r a “ h e ra n ça a frica n a ” e o “ org u lh o n e g ro” . Alg u n s d e le s se tor n a ra m con h e cid os n a cion a lm e n te , co -m o o O lod u -m ou o Ara Ke tu (u -m b loco com tra je tória m u ito p e cu lia r – se n d o con h e cid o h oje m a is com o u m g ru p o d e p a g od e – e p ou co p re se n te n e ste livro). Um a d a s ca ra cte rística s m a is p olê m ica s d o Ilê Aiyê é a d e p e rm itir a p e -n a s a p a rticip a çã o d e -n e g ros e m se u s d e sfile s. Su a d e fin içã o d e q u e m é n e g ro e q u e m n ã o é n ã o te m a ve r com a re -g ra d o “on e -d rop -of-b lood ” p op u la r n os Esta d os Un id os e q u e é a d ota d a p or a lg u n s se tore s d o m ovim e n to n e lg ro b ra -sile iro p a ra se livra r d a s te n d ê n cia s “ con form ista s” d o “ e log io d a m e stiça -g e m ” . O u vi vá ria s h istória s d e m u la tos e scu ros a q u e m fora m n e g a d os se u s p e d id os d e in g re sso n o b loco. N u n ca con -se g u i e n te n d e r a lóg ica d e ssa s n e g a ti-va s, já q u e via g e n te d e p e le m a is cla ra d e sfila n d o. Esta A n th rop olog ie d u Car-n av al ve m e scla re ce r vá rios p oCar-n tos d a m in h a q u e stã o: n ã o b a sta se r “ b e m ” n e g ro p a ra fa ze r p a rte d o Ilê Aiyê , é p re ciso te r ou tros vín cu los com se u “ u n ive rso re la cion a l e a fe tivo d e n so” (:109), se m p re d irig id o a u m se g m e n to socia l e sp e cífico e n tre os n e g ros d e Sa lva d or, a q u e le q u e p ossu i “ u m a re a l in -se rçã o sociop rofission a l n os d ife re n te s se tore s d o tra b a lh o u rb a n o” (:188) e q u e q u e r “ se e le va r socia lm e n te ” (:197). Em re su m o: “ A d istâ n cia é tn ica , d e a p a -rê n cia a te m p ora l, é , n e sse ca so, u m a form a d e d istin çã o socia l.” (:193)

(3)

A p a rtir d e e n tre vista s e d a a p lica çã o d e u m q u e stion á rio, d e scob riu q u e a m a io-ria d os com p on e n te s d o Ilê Aiyê n u n ca d e sfila ria n o O lod u m , p or e xe m p lo, e is-to n ã o p or u m a riva lid a d e com p e titiva e n tre b locos a fro, e sim p or ca u sa d e u m a d ife re n ça socia l: os n e g ros q u e d e sfila m n o O lod u m p e rte n ce m a u m ou tro se g m e n to socia l; o O lod u m é criti-ca d o p e lo p e ssoa l d o Ilê Aiyê com o u m b loco a fro d e sca ra cte riza d o, com e rcia l e n ã o tã o “ a frica n o” e “ n e g ro” com o d e -ve ria se r ou com o o Ilê Aiyê “ é ” .

Porta n to, a d e fin içã o d e q u e m é n e -g ro “ o su ficie n te ” p a ra e n tra r p a ra o Ilê Aiyê d e ve se r vista m a is com o “ u m a m o d a lid a d e d e p o s ic io n a m e n t o s o c i-a l” d o q u e com o “ u m re torn o à e tn ia ” (:197), se n d o m e lh or com p re e n d id a co-m o “ u co-m a re tórica id e n titá ria a tu a l” e n ã o com o o re sg a te d o p a ssa d o, ou com o “ a con se rva çã o d a com e com ória a frica -n a ” . Em ou tra s p a la vra s: “ o a frica -n ism o n ã o d e p e n d e d e u m a lig a çã o d ire ta com a África , e le se tra n sform ou n u m in stru -m e n to d e p osicion a -m e n to socia l -m od e rn o.” (:197) N e sse se rn tid o, o tra d iciorn a -lism o d o Ilê Aiyê é , n a ve rd a d e , u m “ n e otra d icion a lism o u rb a n o” (:141), é a in ve n çã o d e u m a n ova tra d içã o, d e u m a n ova id e n tid a d e p a ra u m g ru p o con -te m p orâ n e o, q u e só p od e ria e xistir e m u m a cid a d e con te m p orâ n e a , q u e ta lve z a té já tive sse e xistê n cia com o g ru p o, m a s q u e n ã o tin h a a u tocon sciê n cia d e ssa e xistê n cia , e a cria çã o d e sssa a u to -con sciê n cia va i a -con te ce r n o ca rn a va l.

N e sse se n tid o, ta m b é m , é q u e o ca r-n a va l p od e se r p e r-n sa d o com o “ fá b rica d e id e n tid a d e s” , te rritório q u e te m u m a “ ca p a cid a d e su p le m e n ta r d e cria r id e n -tid a d e ” (:87), d e e xib ir u m “ e xce sso ou a b u n d â n cia d e id e n tid a d e ” (:53). En -tã o, a folia n ã o a b ole a s fron te ira s q u e ord e n a m a vid a ord in á ria d a cid a d e ou d a socie d a d e , m a s e la ta m b é m n ã o for-tifica os lim ite s g ru p a is já e xiste n te s.

Se u “ tra b a lh o” é m a is a m b íg u o; é com o u m e sp e lh o q u e d istorce a ord e m p re e -xiste n te , d e sloca n d o fron te ira s, d e s-t r u in d o a lg u n s lim is-t e s e in v e n s-t a n d o o u tros. É u m trav e stis se m e n t d a re a li-d a li-d e , q u e a “ li-d e form a ” , m a n ife sta n li-d o a s te n sõe s e a o m e sm o te m p o p e rm itin d o tra n sform a çõe s, q u e , p or su a ve z, te rã o c o n s e q ü ê n c ia s m u it a s v e z e s p r o fu n -d a s n a vid a n ã o ca rn a va le sca , q u e se rã o re p roce ssa d a s n ova m e n te p e la m á -q u in a id e n titá ria d o ca rn a va l e a ssim p or d ia n te .

(4)

BARTH, Fredrik. 2000. O Guru, o Ini-ciador e Out ras Variações Ant ropo-lógicas (organização de Tomke Lask). Rio de Janeiro: Cont ra Capa Livraria. 243 pp.

Eliane Cant arino O’Dw yer

Profe ssora , UFF

A p u b lica çã o d e u m a cole tâ n e a d e te x-tos d o a n trop ólog o Fre d rik Ba rth n o Bra -sil ve m b rin d a r-n os com u m a ob ra in stig a n te , crítica d os d og m a s e p re ssu -p ostos te óricos d a d isci-p lin a , q u e a b re n ovos h orizon te s p a ra a p rá tica d a p e s-q u isa a n trop ológ ica e m ou tros u n ive rsos socia is e cu ltu ra is re con h e cid a m e n -te com p le xos, d ife re n cia d os e sin cré ticos com o o n osso. Au tor d e u m a p rod u -ç ã o in t e r n a c io n a lm e n t e c o n sa g r a d a , Ba rth te m sid o lid o e d ivu lg a d o n o Bra s il, b a s ic a m e n t e , a t r a v é s d a “ In t r o -d u çã o” a o livro G ru p os Étn icos e su as Fron te iras, con trib u içã o in e stim á ve l a os p e sq u isa d ore s q u e tra b a lh a m com so-cie d a d e s in d íg e n a s e ou tros g ru p os é t-n icos e m it-n oria s. Prit-n cip a lm e t-n te , t-n os ca sos e m q u e a fra ca d ife re n cia çã o cu l-t u r a l d e s s e s g r u p o s , im e r s o s e m u m a e stru tu ra d e in te ra çã o com ou tros su b -g ru p os d e forte s m a rca d ore s re -g ion a is (com o n o N ord e ste ), d e sq u a lifica , d o p on to d e vista d o ob se rva d or e xte rn o, a s id e n tid a d e s é tn ica s a ssu m id a s com o in d íg e n a s ou com u n id a d e s d e a fro-d e s-ce n d e n te s q u e re ivin d ica m d o Esta d o b ra sile iro, n a a tu a lid a d e , o re con h e ci-m e n t o d o t e r r it ó r io q u e o c u p a ci-m e d e u m sta tu s é tn ico d istin to, d e a cord o com d e te rm in a d os p re ce itos con stitu -cion a is. De sse m od o, a p rob le m á tica d a d e fin içã o d e u m g ru p o é tn ico, d e a cor-d o com a s re fle xõe s cor-d e Ba rth , te m sicor-d o la rg a m e n te e m p re g a d a p e los a n trop ólog os q u e e stã o e n volvid os com a e la b ora çã o d e la u d os p e ricia is n e sse con

-te xto d e a p lica çã o d os d ire itos con sti-tu cion a is.

A e d içã o e m p ortu g u ê s d e ssa cole -tâ n e a p e rm ite , ig u a lm e n te , su a d ivu l-g a çã o p a ra u m p ú b lico m a is a m p lo, d e e stu d a n te s e d e e sp e cia lista s q u e a tu -a m e m ou tra s á re a s d o sa b e r e m su a s in te rfa ce s com a a n trop olog ia , com o o ca m p o d iscip lin a r d o d ire ito. Pa ra os a n trop ólog os p rofission a is, o títu lo d o li-vro fa z ju s a se u a u tor, m e sm o q u e g u ru e in iciad or te n h a m sid o te rm os orig in a lm e n te e lm p re g a d os p or Ba rth n o con te xto d e u m a re fle xã o com p a ra tiva e n -tre d u a s g ra n d e s re g iõe s e tn og rá fica s, o Su d e ste d a Ásia e a M e la n é sia , sob re a s “ n oçõe s d e u m a sociolog ia d o con h e ci-m e n to q u e a ju d a ci-m a e scla re ce r o ci-m od o p e lo q u a l a s id é ia s sã o m old a d a s p e lo m e io socia l e m q u e se d e se n volve m ” (:143). As ca te g oria s n a tiva s d e g u ru e in iciad or sã o u sa d a s, re sp e ctiva m e n te , p a ra in d ica r form a s d istin ta s d e com-p a rtilh a r id é ia s e tra d içõe s d e con h e ci-m e n to, a tra vé s d a fa la çã o ou d o ocu l-t a m e n l-to, e p od e m se r p e n sa d a s com o e q u iva le n te s a o p a p e l a ssu m id o p or Ba rth n o ca m p o d o sa b e r a n trop ológ i-c o d e “ e n fre n ta r n ovos d e sa fios te óri-cos” (:207) e p a rticip a r d o d e b a te a p a r-tir d o m a te ria l e tn og rá fico colig id o n a s su a s p e sq u isa s e m d ife re n te s re g iõe s, com o a Ásia , O ce a n ia e p a rte d a África , q u e se rvira m ig u a lm e n te d e a n cora -g e m à s te oria s e a os -g ra n d e s te m a s d a d iscip lin a .

(5)

sim p lista d e q u e os isola m e n tos socia l e g e og rá fico fora m os fa tore s cru cia is p a ra a m a n u te n çã o d a d ive rsid a d e cu ltu -ra l” (:26). N a con ce p çã o d o a u tor n ã o se d e ve “ con sid e ra r com o ca ra cte rística p rim á ria d os g ru p os é tn icos se u a sp e cto d e u n id a d e s p orta d ora s d e cu ltu ra ” (:29). Pa ra Ba rth , “ a o se e n foca r a q u ilo q u e é socialm e n te e fe tivo, os g ru p os é t-n icos p a ssa m a se r vistos com o u m a for-m a d e org a n iza çã o socia l” (:31). N e sse ca so, “ a ca ra cte rística crítica ” n a d e fi-n içã o d e sse s g ru p os p a ssa a se r a a tri-b u içã o d e u m a id e n tid a d e ou “ ca te g o-ria é tn ica ” (:32) d e te rm in a d a p or u m a orig e m com u m p re su m id a e d e stin os com p a rtilh a d os.

A org a n iza d ora d a cole tâ n e a , Tom-k e La sTom-k , n a a p re se n ta çã o d o livro (:7-23), fa z re fe rê n cia à s tom a d a s d e p osi-çã o d e Ba rth , a o se u e m p e n h o p e ssoa l “ e m p rom ove r o p a p e l d o a n trop ólog o n a vid a p ú b lica ” (:15). Su g e re a in d a q u e isso se a p lica ria a o p a p e l q u e os a n -trop ólog os n o Bra sil tê m a ssu m id o e m re la çã o a o re con h e cim e n to d os d ire itos in d íg e n a s com o g ru p os é tn icos d ife re n -cia d os. Pod e -se con sid e ra r ig u a lm e n te ilu stra tivo, n o con te xto d e sta re se n h a , p e n sa r a s im p lica çõe s te órica s e m e to-d ológ ica s to-d o p e n sa m e n to to-d e Ba rth q u a n d o a p lica d o a o re con h e cim e n to d os d ire itos con stitu cion a is d e ou tra m in o ria é tn ica , os ch a m a d os “ re m a n e sce n -te s d e q u ilom b os” , -te rm o d e orig e m ju -ríd ica q u e a p rin cíp io p a re ce m a is a fe ito à s d e fin içõe s h istoriog rá fica s e com p rova çõe s a rq u e ológ ica s. Afin a l, a té re ce n -te m e n -te , o -te rm o q u ilo m b o e ra d e u so q u a se re strito a h istoria d ore s e d e m a is e sp e cia lista s q u e , a tra vé s d e d ocu m e n ta çã o d isp on íve l ou in é d ita , p rocu ra va m con stru ir n ova s a b ord a g e n s e in -te rp re ta çõe s sob re o n osso p a ssa d o co-m o n a çã o. A p a rtir d a C on stitu içã o d e 1988, q u ilo m b o a d q u ire u m a sig n ifica -çã o a tu a liza d a , a o con fe rir d ire itos con

s-titu cion a is a os re m an e s ce n te s d e q u i-lom b os q u e , se g u n d o o te xto con stitu -cion a l, e ste ja m ocu p a n d o su a s te rra s. C om o n ã o se tra ta d e u m a e xp re ssã o ve rb a l q u e d e n om in e in d ivíd u os, g ru -p os ou -p o-p u la çõe s n o con te xto a tu a l, se u e m p re g o n a C on stitu içã o le va n ta u m a q u e stã o d e fu n d o: q u e m sã o os ch a -m a d os re -m a n e s ce n te s d e q u ilo-m b os q u e tê m se u s d ire itos a trib u íd os p e lo d isp ositivo le g a l?

Pod e p a re ce r p a ra d oxa l q u e os a n trop ólog os, ju sta m e n te e le s q u e m a rca -ra m su a s d istâ n cia s e ru p tu -ra s com a h istoriog ra fia a o d e fin ire m se u ca m p o d e e stu d os p or u m corte sin crôn ico n o “ p re se n te e tn og rá fico” , te n h a m sid o co-loca d os n o e p ice n tro d os d e b a te s sob re a con ce itu a çã o d e q u ilom b o e a id e n tifi-ca çã o d a q u e le s q u a lifitifi-ca d os com o re -m an e sce n te s d e q u ilo-m b os p a ra fin s d e a p lica çã o d o p re ce ito con stitu cion a l. Acon te ce , p oré m , q u e o te xto con stitu cion a l n ã o e voca a p e n a s u m a “ id e n tid a -d e h istórica ” q u e p o-d e se r a ssu m i-d a e a cion a d a n a form a d a le i. É p re ciso, so-b re tu d o, q u e e sse s su je itos h istóricos p re su m íve is e xista m n o p re se n te . O fa to d e o p re ssu p osto le g a l e sta r re fe rid o a u m con ju n to p ossíve l d e in d ivíd u os ou a tore s socia is org a n iza d os se g u n d o su a situ a çã o a tu a l, p e rm ite con ce itu á -los, se g u n d o a te oria a n trop ológ ica m a is re -ce n te , com o g ru p os é tn icos q u e e xiste m ou p e rsiste m a o lon g o d a h istória com o u m “ tip o org a n iza cion a l” , a tra vé s d e p roce ssos d e e xclu sã o e in clu sã o q u e p e rm ite m d e fin ir os lim ite s e n tre os con -sid e ra d os d e d e n tro e os d e fora .

(6)

con ta b ilize a s d ife re n ça s d ita s ob je ti-va s, m a s u n ica m e n te d os “ sin a is d ia crí-ticos” , isto é , a s d ife re n ça s q u e os p róp rios a tore s con sid e ra m com o sig n ifica -tiva s. Em b ora a s d ife re n ça s p ossa m m u d a r, p e rm a n e ce a d icotom ia e n tre “ e le s” e “ n ós” , m a rca d a p e los se u s cri-té rios d e p e rte n cim e n to. Ba rth e n fa tiza “ q u e g ru p os é tn icos sã o ca te g oria s a tri-b u tiva s e id e n tifica d ora s e m p re g a d a s p e los p róp rios a tore s; con se q ü e n te m e n -te , tê m com o ca ra c-te rística org a n iza r a s in te ra çõe s e n tre a s p e ssoa s” (:27).

A ce n tra lid a d e d os con ce itos d e g ru -p o é tn ico e d e e tn icid a d e n a le itu ra d a ob ra d e Ba rth , n ã o e sg ota a n ovid a d e d e su a s con trib u içõe s, q u e p ossib ilita m d e sn a tu ra liza r o m u n d o socia l, m a s t a m-b é m os in stru m e n tos d o fa ze r a n trop ológ ico. É o q u e ocorre com a s con ce p -çõe s a n trop ológ ica s con ve n cion a is d e cu ltu ra . N o ca p ítu lo in icia l d o livro, ve -m os q u e os p re ssu p ostos i-m p lícitos n o u so d e sse con ce ito sã o tra n sg re d id os n a re la çã o d e n ã ocorre sp on d ê n cia e sta -b e le cid a p or Ba rth e n tre os lim ite s so-cia is d a s u n id a d e s é tn ica s e o com p a rti-lh a m e n to d e u m a cu ltu ra com u m , q u e d e ixa d e se r con sid e ra d a u m a ca ra cte -rística p rim á ria e d e fin itiva n a org a n iza çã o d e u m g ru p o. A n e ce ssid a d e p a -ra a a n trop olog ia d e “ re m od e la r su a s a firm a çõe s” é e xp licita m e n te coloca d a n o ca p ítu lo “ A An á lise d a C u ltu ra n a s Socie d a d e s C om p le xa s” (:107-139). O s “ p re ssu p ostos d o h olism o e d a in te g ra çã o” (:105) d a m a ioria d os con ce itos a n -trop ológ icos, com o socie d a d e e cu ltu ra , sã o q u e stion a d os. O u so e q u ivoca d o d o te rm o cu ltu ra d e ve se r te sta d o “ n a a n á -lise d a vid a re a l ta l com o e la ocorre e m d e te rm in a d o lu g a r d o m u n d o” (:108). A ilh a d e Ba li p a ssa a se r o loca l e scolh id o p a ra re fle tir sob re a “ p rá xis a n trop oló-g ica ” . A d ive rsid a d e d e a tivid a d e s, a ssim com o a m istu ra d o n ovo com o ve -lh o e m u m ce n á rio cu ltu ra l sin cré tico,

p e rm ite q u e stion a r a lin g u a g e m d o e stru tu ra lism o com su a ê n fa se n a s con e -xõe s e o p re ssu p osto d e u m a coe rê n cia lóg ica g e n e ra liza d a . Pa ra Ba rth , n a m e -d i-d a e m q u e “ a s re a li-d a -d e s -d a s p e ssoa s sã o cu ltu ra lm e n te con stru íd a s […], o q u e os a n trop ólog os ch a m a m d e cu ltu -ra d e fa to torn a -se fu n d a m e n ta l p a -ra e n te n d e r a h u m a n id a d e e os m u n d os h a b ita d os p e los se re s h u m a n os” (:111). M a s, e m ve z d e foca r a a n á lise n o in te -rior d e u n ive rsos fe ch a d os e d e cu ltu ra s d istin tiva s, é p re ciso e xp lora r a va rie -d a -d e -d e fon te s -d os p a -d rõe s cu ltu ra is, q u e p od e m se r re su lta d o d e p roce ssos socia is e sp e cíficos. Em lu g a r d e d e sca r-ta rm os a s in coe rê n cia s ob se rva d a s à n ossa volta , d e ve m os con fron ta r o q u e é p rob le m á tico e re a liza r a “ tra d icion a l ta re fa n a tu ra lista d a a n trop olog ia d e con stitu ir u m a cu id a d osa e m e ticu losa d e scriçã o d e u m a a m p la g a m a d e d a d os” (:114). A visã o d a cu ltu ra com o flu -xo e corre n te s sim u ltâ n e a s d e trad içõe s cu ltu rais (:123) d e fe n d id a p or Ba rth , n ã o re coloca a q u e stã o d a s cu ltu ra s “ fe ita s d e re ta lh os e re m e n d os” d o d ifu sion ism o. O q u e im p orta n e sse a rg u -m e n to sã o a s in te rp re taçõe s e os e sq u e -m a s d e sig n ifica çã o q u e só p od e -m se r e n te n d id os corre ta m e n te q u a n d o re la cion a d os “ a o con te xto, à p rá xis e à in -te n çã o com u n ica tiva ” (:131).

Ao zig u e za g u e a r e n tre a s se çõe s d o livro, se m ob e d e ce r à ord e m d e su a e x-p osiçã o, se g u im os ou tra x-p ossib ilid a d e d e le itu ra , su g e rid a p e la p róp ria re u -n iã o d os te xtos -n a cole tâ -n e a , q u e -n ã o p e d e m p a r a s e r c o m p r e e n d id o s a t r a -vé s d e u m a d isp osiçã o lin e a r d o m e n os a o m a is in clu sivo. Tra ta -se , a o con trá rio, d e d ife re n te s e va ria d os p la n os d e te -m a s e q u e stõe s q u e se e n tre cru za -m n a in te rse çã o d os se u s a rg u m e n tos e re fle -xõe s crítica s.

(7)

romp e r fr o n t e ir a s e n t r e d is c iromp lin a s e t r a -d içõe s -d e con h e cim e n to. N o p osfá cio (:239-243), e scrito p e lo cie n tista p olítico M a rco M a rtin ie llo, a q u e stã o d a e tn icid a icid e com o p rob le m a socia l a se r e n -fre n ta d o n a a tu a lid a d e , a o re ve rte r a cre n ça d e q u e ra ça e e tn icid a d e d e sa p a re ce ria m n o con te xto d a m od e rn iza -çã o e p ós-colon ia lism o, con vid a os ci-e n tista s p olíticos a coloca r a ob ra d ci-e Ba rth n a a g e n d a d e su a d iscip lin a . O u -tra s fron te ira s in te rn a s à a n trop olog ia , q u e se p a ra m o con h e cim e n to p rod u zid o zid e ou tra s form a s zid e sa b e re s a p lica -d os, tê m si-d o rom p i-d a s a tra vé s -d a p rob le m á tica p rop osta p or Ba rth – n o Bra -sil, m e d ia n te a n oçã o d e u m a an trop o-log ia d a ação e m q u e , d ife re n te m e n te d a ch a m a d a “ a n trop olog ia a p lica d a ” , m e n os com p rom e tid a com a s p op u la -çõe s à s q u a is se re fe re , o a n trop ólog o n ã o p e rd e su a b a se a ca d ê m ica , com o p orta d or d e sólid a form a çã o n a d iscip li-n a , a va lia d o e re coli-n h e cid o p e los se u s p a re s d a com u n id a d e cie n tífica .

Em e n tre vista p u b lica d a n a cole tâ n e a (:201228), Ba rth con cord a q u e “ fa -ça m os u so d e n ossos in sig h ts p a ra a g ir n o m u n d o e tra n sform á -lo” (:218), m a s a d ve rte q u e “ d e ve m os d e ixa r d e e n fa tiza r ta n to a e tn icid a d e , p ois e la p od e re -p r e s e n t a r a -p e n a s u m -p e q u e n o s e t o r d a h e ra n ça cu ltu ra l d e u m a p e ssoa ” (:217). Por ou tro la d o, “ p a rticip a m os d e ou tra s com u n id a d e s d e cu ltu ra q u e n ã o p od e m se r d e scrita s com o é tn ica s” (:217). Sob re a p olitiza çã o d e sm e d id a d a s id e n tid a d e s é tn ica s, Ba rth critica os ch a m a d os “ e m p re e n d e d ore s é tn icos” , p ois “ e le s u tiliza m d e m a n e ira in a d e -q u a d a u m a id é ia e xce ssiva m e n te u n id i-m e n sion a l d e cu ltu ra e d e id e n tid a d e a d vog a n d o-a p a ra se u s p róp rios fin s p olíticos” (:219).

FAUSTO, Carlos. 2000. Os Índios antes do Brasil.Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. 93 pp.

Francisco Noelli

Profe ssor, Un ive rsid a d e Esta d u a l d e M a rin g á

Este p e q u e n o livro, volta d o p a ra a d i-v u lg a ç ã o d a a r q u e o lo g ia e e t n o lo g ia in d íg e n a s, a p re se n ta com b rilh a n tism o e e ru d içã o a s lin h a s g e ra is d a ú ltim a g ra n d e sín te se d o ca m p o, a ssim com o a s p e rsp e ctiva s m a is con te m p orâ n e a s sob re os p ovos situ a d os n a Am é rica d o Su l e n o Bra sil. M u ito b e m re d ig id o, O s Ín d ios an te s d o Brasil n ã o e stá ce n tra d o n a d e scriçã o, m a s e m m od e los e p rob le -m á tica s, p rop orcion a n d o a in te re ssa d os e in icia n te s u m re su m o d a e sp in h a d or-sa l d a s te oria s e d e b a te s q u e re g e ra m a h e te rog ê n e a com u n id a d e a m e rica n is-ta n a s ú ltim a s cin co d é ca d a s. C a rlos Fa u sto p a rte d o p rin cíp io d e q u e “ Tu d o som a d o, é p ossíve l d ize r q u e vive m os e m u m a ilh a d e con h e cim e n to rod e a d a p or u m oce a n o d e ig n orâ n cia . Sa b e m os m e n os d o q u e d e ve ría m os, m a s fe liz-m e n te a in d a p od e liz-m os sa b e r liz-m a is. Pa ra a va n ça r, cu m p re fa ze r a s p e rg u n ta s ce rta s” (:9).

O livro a p re se n ta a s p e rg u n ta s a tu a lm e n te con sid e ra d a s “ ce rta s” , con -tra p osta s à s p e rg u n ta s “ e rra d a s” . Esta s, e m p a rte , fora m form u la d a s d u ra n te o p e ríod o colon ia l e e la b ora d a s d e fin iti-va m e n te n o g ra n d ioso m od e lo d e J u lia n Ste w a rd n o H an d b ook of S ou th A m e ri-can In d ian s, a p a rtir d e 1946.

(8)

m ostra com o a q u e le s q u e n ã o se g u ira m o d e te rm in ism o e cológ ico ste w a rd ia n o con se g u ira m , a p a rtir d e ou tra s p e rg u n -ta s, a b ord a g e n s e m e tod olog ia s, q u e stion á lo e torn á lo ob sole to ou , p e lo m e n os, e xp or su a s fra g ilid a d e s, con trib u in -d o p a ra b a rra r -d ive rsa s sim p lifica çõe s re p rod u zid a s n a a ca d e m ia .

De n tre os te m a s e n foca d os p or Fa u s-to, d e sta ca -se a crítica d a tip olog ia e vo-lu cion ista d a s p op u la çõe s in d íg e n a s d e sd e u m a visã o con tin e n ta l. É m ostra -d o com o Ste w a r-d e la b orou su a cla ssifi-ca çã o d e cim a p a ra b a ixo a p a rtir d o m od e lo d o im p é rio In ca , e xe m p lo d o “ á p ice d o d e se n volvim e n to n o con ti-n e ti-n te ” , d e fiti-n iti-n d o a s d e m a is p op u la çõe s d a Am é rica d o Su l p e la “ ca rê n cia , le -va n d o à ca ra cte riza çã o d os p ovos d a s te rra s b a ixa s p e la n e g a tiva ” (:15). De s-sa form a , se g u n d o Fa u sto, “ re strin g ira m se os p rob le m a s a se re m e n fre n ta -d os p e la a rq u e olog ia a -d u a s p e rg u n ta s b á sica s: se rá q u e tod os os p ovos d a s te r-ra s b a ixa s, d e fa to, n ã o tin h a m a q u ilo q u e os in ca s tin h a m ? E p or q u e n ã o ti-n h a m ?” (:15)

Ba se a d o e m p e sq u isa s re ce n te s, o a u tor a p re se n ta con tra p on tos à s con -ce p çõe s d e Ste w a rd n o q u e se re fe re a d e m og ra fia , d e se n volvim e n to d a a g ricu ltu ra , su b sistê n cia , e xp lora çã o/ m a n e -jo d os re cu rsos n a tu ra is, cria çã o d a cu l-tu ra m a te ria l, tip os d e socie d a d e e d e org a n iza çã o p olítica . Tra ça , a ssim , u m p a n ora m a su g e stivo d a va ria b ilid a d e d os p ovos in d íg e n a s, su p e ra n d o ch a -võe s e m torn o d e su a fa la ciosa u n iform id a d e sociop olítica , e con ôiform ica , cu ltu -ra l e d e m og rá fica .

Fa u sto re ve la com o a re la çã o e n tre a m b ie n te e n íve is d e “ d e se n volvim e n to cu ltu ra l” , tã o ca ra a Ste w a rd , foi tra ta -d a -d e m o-d o su p e rficia l e a p riorístico, a t r a v é s d o s s im p lific a d o s c o n c e it o s d e “ á re a m a rg in a l” e “ á re a d e flore sta trop ica l” , e la b ora d os e m fu n çã o d e u m a

su p osta (m a s n ã o in ve stig a d a n a q u e le m om e n to) p re d om in â n cia d e solos p o-b re s p a ra a a g ricu ltu ra , o-b e m com o d e u m im a g in á rio fa la cioso sob re a e sca s-se z d e p rote ín a s lon g e d os cu rsos d ’á g u a . Essa s d e ficiê n cia s, ta l com o a c r e d it a -r a m e -r -r o n e a m e n t e S t e w a -r d e m u itos ou tros, e sp e cia lm e n te Be tty M e g g e rs, le va ria m a s p op u la çõe s a u m a con sta n -te p rocu ra p or com id a e m a m b ie n -te s p ou co p rod u tivos e n ã o p e rm itiria m o d e se n volvim e n to cu ltu ra l, socia l e p olí-tico, força n d o-a s a p e rm a n e ce r n os e s-tá g ios m a is b a ixos d a im a g in a d a ca d e ia e volu tiva d a s p op u la çõe s d a Am é rica d o Su l. Ap e sa r d e a lg u m a s n oçõe s ce n -tra is d o d e te rm in ism o e cológ ico te re m sid o te sta d a s e critica d a s p or Rob e rt C a rn e iro m e n os d e u m a d é ca d a a p ós o la n ça m e n to d o H an d b ook , e m te se d e -fe n d id a e m 1957, a in flu ê n cia d a s id é ia s d e Ste w a rd p e rm a n e ce u forte n o Bra sil a té os a n os 90. M e sm o com a s n ova s id é ia s e fa t o s d e C a r n e ir o , a r e v is ã o d o d e te rm in ism o e cológ ico só g a n h ou a d e p tos n o fin a l d os a n os 60, com a s p u -b lica çõe s n e ssa lin h a torn a n d o-se visí-ve is a p ós 1975.

(9)

d e C a stro e n te n d e m , olh a n d o p a ra os d a d os p re se n te s, q u e , d a d a a fa lta d e in form a çõe s a rq u e ológ ica s e n tre a foz d o Am a zon a s e o Rio G ra n d e d o N orte , b e m com o a e xistê n cia d e d a ta çõe s a n -tig a s n o Rio d e J a n e iro, “ fica d ifícil cre r q u e te n h a h a vid o u m a e xp a n sã o d o N orte p a ra o Su l (a n ã o se r q u e re cu e -m os -m u ito a cron olog ia d e sse -m ovi-m e n to)” (:74). Fa u sto re con h e ce q u e is-to e stá “ lon g e d e se r re solvid o” (:74), a firm a n d o con tu d o q u e o ce n tro d e e x-p a n sã o “ x-p od e te r sid o a b a cia d o rio Tie tê ” (:74).

C on cord o q u e a q u e stã o e stá “ lon -g e d e se r re solvid a ” . Q u a n to à su -g e stã o d e Fa u sto, p oré m , h á tã o p ou cos d a d os sob re a b a cia d o Tie tê q u a n to sob re a re g iã o e n tre a foz d o Am a zon a s e o Rio G ra n d e d o N orte (se n d o q u e e le n ã o m e n cion a os d a d os d o in te rior d o Pia u í, Pe rn a m b u co, Ala g oa s...). Fa u sto d e fe n d e a p rim e ira h ip óte se sob re a e xp a n -sã o d os Tu p i, su g e rid a p or von M a rtiu s n a d é ca d a d e 1830 e re cicla d a vá ria s ve ze s a té a su a m a is in flu e n te form u la -çã o p or Alfre d M é tra u x (1928). C om o m ostre i e m 1996, e ste s ve n e rá ve is p e s-q u isa d ore s n ã o d isp u n h a m d os d a d os a rq u e ológ icos, lin g ü ísticos e e tn ológ i-cos ob tid os a p a rtir d os a n os 60. Ap e sa r d e ssa s n ovid a d e s, m u itos p e sq u isa d o -re s a tu a is, com o Fa u sto, -re p rod u zira m a critica m e n te a h ip óte se orig in a l e a s re cicla g e n s fe ita s a té M é tra u x se m re a -liza r u m a sín te se com p le xa e crítica q u e in te g ra sse tod os os d a d os d isp on íve is. En fim , p osso re p e tir q u e h ou ve p ou ca s p e sq u isa s n o N ord e ste b ra sile iro, com-p a ra n d o-se com a situ a çã o n o Su d e ste e Su l, re su lta n d o e m u m m a p a a rq u e o-lóg ico d e sig u a l, forçosa m e n te d istorci-d o, vu ln e rá ve l à “ con firm a çã o” istorci-d e u m a e xp a n sã o d o Su l p a ra o N orte . Re p e ti-re i, ti-re su m id a m e n te , con clu sõe s m in h a s e d e ou tros p e sq u isa d ore s já p u b lica d a s q u e re força m a “ te oria d a p in ça ” , q u e

s-tion a n d o con clu siva m e n te a h ip óte se d a orig e m d os Tu p in a m b á n a b a cia d o Pa ra n á -Tie tê : 1) o h orizon te a rq u e oló-g ico n os a tu a is e sta d os d e Sã o Pa u lo, M a to G rosso d o Su l e Pa ra n á , b e m com o n o Pa ra g u a i, n ã o a p re se n ta d e ta -lh e s ca ra cte rísticos d a ce râ m ica tu p i-n a m b á q u e sã o com u i-n s, p or ou tro la d o, n o b a ixo Am a zon a s. N e ssa á re a m e rid ion a l só e xiste , con sirid e ra n rid o p ovos tu -p i, e vid ê n cia s h istórica s e a rq u e ológ ica s d os G u a ra n i, G u a ra yo, Xe tá e G u a -ya k i; 2) é p ossíve l e se g u ro e sta b e le ce r a con tin u id a d e h istórica e n tre o re g istro a rq u e ológ ico e os p ovos h istorica m e n te d e scritos com o tu p in a m b á n a costa e in -te rior, a ssim com o n o ca so d os G u a ra n i; 3) lin g ü istica m e n te , o tu p in a m b á é d is-tin to d o g u a ra n i. A h ip óte se d a orig e m m e rid ion a l ig n ora a re la çã o d a lín g u a tu p in a m b á com a s lín g u a s fa la d a s p or p ovos situ a d os a p e n a s n a Am a zôn ia , a ssim com o d e scon sid e ra a á re a d e ori-g e m d o tron co tu p i p rop osta e , a té a ori-g o-ra , n ã o q u e stion a d a .

A q u e stã o d o se n tid o d a rota d os Tu -p in a m b á se rá re s-p on d id a q u a n d o e xis-tire m n ovos d a d os a rq u e ológ icos e n tre a foz d o Am a zon a s e o Pia u í. O d e sa fio é re a liza r isto se m ca ir e m e xp lica çõe s su p e ra d a s, com o a q u e la s d o cu ltu ra lism o g e rlism â n ico e d o d ifu sion islism o a p lica -d os a os p ovos in -d o-e u rop e u s. É n e ce ssá rio b a n ir a s con clu sõe s b a se a d a s a p e -n a s -n a lóg ica ou -n a tra d içã o e sta b e le ci-d a p or M a rtiu s, p ois e la s a p e n a s con si-d e ra m si-d e sloca m e n tos n o e sp a ço e m fu n çã o d a p osiçã o h istorica m e n te d e -te rm in a d a d os p ovos tu p i.

(10)

d a h istória d a e tn olog ia e d a a rq u e olo-g ia a m e rica n ista . Se m d ú vid a , com a e s-crita d e sse ou tro livro, te re m os u m a ob ra com os m a is n ovos con h e cim e n tos e , e s-p e cia lm e n te , a s-p ossib ilid a d e d e su scita r m a is e n e ce ssá rios d e b a te s.

FELDM AN-BIANCO, Bela e CAPINHA, Graça (orgs.). 2000. Ident idades. Estu-dos de Cultura e Poder. São Paulo: Hu-citec. 175 pp.

Giralda Seyf erth Profe ssora , PPG AS-M N -UFRJ

Esta cole tâ n e a a p re se n ta re su lta d os d e p e sq u isa s q u e foca liza m p op u la çõe s e m d iá sp ora , e n fa tiza n d o a s re la çõe s e n tre p roce ssos d e g lob a liza çã o e re con fig u ra çõe s d e id e n tid a d e . Alg u n s d os tra b a -lh os q u e a com p õe m fora m orig in a l-m e n te a p re se n ta d os n a l-m e sa -re d on d a “ G lob a liza çã o, Esta d o e Em b a te s d e Id e n tid a d e s” – I C on fe rê n cia In te rn a cion a l sob re Id e n tid a d e Étn ica e Re la çõe s Ra cia is, re a liza d a sim u lta n e a m e n te com a XX Re u n iã o Bra sile ira d e An -trop olog ia (Sa lva d or, a b ril d e 1996). O livro é u m a re e d içã o, n o Bra sil, d o volu -m e te -m á tico sob re id e n tid a d e s d a R e -v ista Crítica d e Ciê n cias S ociais (no48,

ju n h o d e 1997) – p u b lica çã o d o C e n tro d e Estu d os Socia is d a Fa cu ld a d e d e Econ om ia d a Un ive rsid a d e d e C oim b ra (Portu g a l). C on té m u m a in trod u çã o, in titu la d a “ Id e n tid a d e s” , d e Be la Fe ld -m a n -Bia n co, e cin co te xtos, re su lta n te s d o d iá log o e n tre p e sq u isa d ore s d o Bra -sil, d e Portu g a l e d os Esta d os Un id os, p re ce d id os p or u m a rtig o d e Boa ve n tu -ra d e Sou sa Sa n tos d e d ica d o a o te m a d os d ire itos h u m a n os. Esse s te xtos tê m e m com u m , con form e re g istra d o n a in -trod u çã o, “ o d e sa fio te órico-m e tod ológ ico d e e xa m in a r critica m e n te a p rod u

çã o con te m p orâ n e a d e p olítica s cu ltu -ra is e d a s id e n tid a d e s com o p olítica , n o con te xto d a s (m ú ltip la s) in te rse çõe s e n tre p roce ssos d e re e stru tu ra çã o d o ca -p ita lism o g lob a l e re con fig u ra çõe s d a cu ltu ra e d a p olítica ” (:14). Ap e sa r d a a b ra n g ê n cia su g e rid a n e ssa d e fin içã o d e ob je tivos, os a u tore s, va le n d o-se d e u m a p e rsp e ctiva com p a ra tiva , p rocu ra -ra m a p re cia r a s te n sõe s su b ja ce n te s a os p roce ssos d e form a çã o e re con fig u ra çã o d e id e n tid a d e s (d e ra ça , d e cla sse , d e g ê n e ro e tc.), e sp e cia lm e n te n o con te xto d o Esta d o-n a çã o tra n sn a cion a l, b e m co-m o os sig n ifica d os e lico-m ite s d a s p olíti-ca s id e n titá ria s, a p on ta n d o p a ra form a s d e re sistê n cia e con te sta çã o à s id e olo-g ia s h e olo-g e m ôn ica s d e d om in a çã o.

(11)

i-çõe s loca is). N e sse se n tid o, os d ire itos h u m a n os con ce b id os com o u n ive rsa is sã o im p ositivos, d a í a su g e stã o d e tra n s-form á -los e m u m p roje to cosm op olita q u e le ve e m con ta o m u lticu ltu ra lism o e n q u a n to “ p ré con d içã o d e u m a re la çã o e q u ilib ra d a e m u tu a m e n te p ote n -cia d ora e n tre a com p e tê n -cia g lob a l e a le g itim id a d e g lob a l” (:26). A d ig n id a d e h u m a n a con d icion a d ora d a tra n sform a çã o cosm op olita re q u e r o re con h e cim e n -to d a s in com p le tu d e s cu ltu ra is m ú tu a s.

O p rob le m a d a d om in a çã o, su b ja ce n te à d iscu ssã o sob re os d ire itos h u -m a n os, e stá p re se n te n os d e -m a is te xtos, q u e a b ord a m con stru çõe s id e n titá ria s d a p e rsp e ctiva tra n sn a cion a l. Sob e ste a sp e cto, o tra b a lh o d e N in a G lick Sch ille r e G e org e s Fou ron , “ La ços d e Sa n g u e : O s Fu n d a m e n tos Ra cia is d o Esta -d o-N a çã o Tra n sn a cion a l” , a p on ta p a ra u m a id e n tid a d e ra cia l a sse n te n a su -p osta re la çã o e n tre ra ça e n a çã o, e la b ora d a p or im ig ora n te s h a itia n os n os Esta -d os Un i-d os e le g itim a -d a e m u m H a iti re d e fin id o com o Esta d on a çã o tra n sn a -cion a l. O s a u tore s fa ze m u m e stu d o d o ca so h a itia n o, m a s su g e re m q u e d irig e n -te s p olíticos d e a lg u n s p a íse s d e e m i-g ra çã o – M é xico, Portu i-g a l, C olôm b ia e tc. – tê m p rocu ra d o d e fin ir os re sp e cti-vos Esta d os com o tra n sn a cion a is, p a ra p od e r in corp ora r su a s p op u la çõe s d a d iá sp ora .

O con ce ito d e ra ça sim b oliza n d o a id e n tid a d e n a cion a l, b e m com o o se u u so n a a re n a tra n sn a cion a l e n volve n d o p op u la çõe s m ig ra n te s, n ã o é n ovid a d e d a p ós-m od e rn id a d e , con form e m ostra m os n u m e rosos e stu d os sob re o n a cion a -lism o. O ju s san g u in is q u e e m b a sa a ci-d a ci-d a n ia e m m u itos Esta ci-d os n a cion a is é a con tra p a rtid a le g a l d e ssa p re m issa b iológ ica d e n a tu re za p rim ord ia lista . A n ã o se r p or u m a b re ve in cu rsã o h istóri-ca a o d e se n volvim e n to d a s id é ia s d e n a çã o e ra ça , os a u tore s n ã o se p re ocu

-p a ra m com a con tin u id a d e d e sse ti-p o d e id e olog ia , p re se n te e m m u itos con -te xtos im ig ra tórios d e sd e o sé cu lo XIX. N o e n ta n to, com b a se e m d a d os d e m i-n u ciosa p e sq u isa re a liza d a e m N ova Iorq u e com im ig ra n te s d o H a iti, d e fin i-ra m u m m od e lo d e id e n tid a d e n a cion a l con form a d o p e la id é ia d e ra ça e n q u a n -to tra ço d istin tivo su ficie n te n a situ a çã o tra n sn a cion a l. M ostra m q u e a re con ce i-tu a liza çã o d o Esta d o-n a çã o a tra vé s d a id é ia d e tra n sn a cion a lid a d e – u m a con stru çã o id e ológ ica d a q u a l p a rtici-p a m ta n to a s lid e ra n ça s d os im ig ra n te s n a d iá sp ora , q u a n to p olíticos e d e te n to-re s d e ca rg os oficia is – te ve com o to-re su l-ta d o a form u la çã o d e u m a id e n tid a d e n a cion a l e sp e cifica m e n te ra cia l, b a se a -d a e m lin h a -d e -d e sce n -d ê n cia e la ços -d e sa n g u e , n a q u a l ou tros a trib u tos d a n a -cion a lid a d e , ta is com o lín g u a com u m , h istória com p a rtilh a d a , te rritório ou m e sm o cu ltu ra , d e sa p a re ce m d a sim b ó-lica con stitu tiva d a n a çã o. Ap e sa r d a s p ossib ilid a d e s d e con stru ir m ú ltip la s in -te r-re la çõe s d a vid a cotid ia n a d os im i-g ra n te s, visto q u e a s re d e s tra n sn a cio-n a is p rod u ze m im p orta cio-n te s re la çõe s so-cia is e n tre os q u e e m ig ra m e os q u e fi-ca m , e sse tip o d e n a cion a lism o ra cia liza d o q u e p rod u z id e n tid a d e é critica m e n te a n a lisa d o com o form a p rob le m á -tica d e re sistê n cia a o p re con ce ito e à d o-m in a çã o.

(12)

ri-sõe s d os Esta d os Un id os, a re tórica d o “ d a lton ism o cu ltu ra l” (vin cu la d a à su -p e ra çã o d o ra cism o) re a -p ro-p ria d a -p e la d ire ita a m e rica n a p a ra n e u tra liza r a q u e stã o ra cia l, o d e b a te sob re q u e m é n e g ro n o Bra sil, p a ra m ostra r a s a tu a is d isp u ta s re la cion a d a s à ig u a ld a d e d e d ire itos e cid a d a n ia e n volve n d o cla ssi-fica çõe s ra cia is e o p rog ra m a d e affirm a-tiv e action . N o ca so b ra sile iro, e n u n cia o “ a p a d rin h a m e n to n e olib e ra l” , con tra -d itório, -d a a ffirm at iv e action q u e , p or e ssa ra zã o, n ã o é id e n tifica d a com a lu -ta d os n e g ros p e la cid a d a n ia e con tra o ra cism o.

A q u e stã o d a affirm ativ e action se r-ve d e m ote p a ra critica r a lg u m a s a n á li-se s a ca d ê m ica s re la tiva s à id e n tid a d e ra cia l, e sp e cia lm e n te a q u e la s q u e re -corre m à s a m b ig ü id a d e s d e u m siste m a cla ssifica tório “ m u ltip ola r” vin cu la d o à m e stiça g e m . C om e te a lg u n s e xce ssos re tóricos – com o o u so d os te rm os “ n e -g rólo-g os” e “ p orte iros d a a ca d e m ia ” (:99100) p a ra re fe rirse à p osiçã o h e g e -m ôn ica d e b ra n cos fa la n d o d e re la çõe s ra cia is n os m e ios a ca d ê m icos b ra sile i-ros – m a s, in d u b ita ve lm e n te , su a crítica à p e rsp e ctiva m u ltip ola r a ju d a a p e n sa r sob re p olítica s p ú b lica s e ra cism o.

Em u m tra b a lh o e xtre m a m e n te in -te re ssa n -te sob re a p oe sia p rod u zid a p or im ig ra n te s p ortu g u e se s n o Rio d e J a -n e iro e Sã o Pa u lo, i-n titu la d o “ A Poe sia d os Im ig ra n te s Portu g u e se s n o Bra sil: Ficçõe s C ríve is n o C a m p o d a (s) Id e n ti-d a ti-d e (s)” , G ra ça C a p in h a a n a lisa o p ro-ce sso d e con tín u a re e la b ora çã o d a id e n -tid a d e p ortu g u e sa n a d iá sp ora , e m u m a situ a çã o su b je tiva d a e con tra d itória d e fron te ira cu ltu ra l in d ife re n cia d a . Tra ta d a id e n tid a d e (cu ltu ra l) com o u m p ro-ce sso d e a rticu la çã o e re p re se n ta çã o, sim u lta n e a m e n te lin g ü ístico e lite rá rio, a tra vé s d a a n á lise te xtu a l, p a ra m ostra r a s a m b ig ü id a d e s p re d om in a n te s n a s ca te g oriza çõe s id e n titá ria s e m q u e os

p ortu g u e se s a p a re ce m ora com o colon i-za d ore s (e p a rte d a h istória form a tiva d o Bra sil), ora com o im ig ra n te s. N e sse con te xto m a is p rop ria m e n te lite rá rio, a id é ia d e ra ça n ã o te m im p ortâ n cia , p re va le ce n d o a re tórica d a “ irm a n d a d e lu sob ra sile ira ” e d a lín g u a com p a rtilh a d a q u e , su p osta m e n te , d e ve ria m ig u a la r, m a s q u e o sota q u e e ou tros in d ica -d ore s -d a n a cion a li-d a -d e -d ife re n cia m n a con fig u ra çã o d o lu g a r su b a lte rn o d o im ig ra n te n a situ a çã o p ós-colon ia l. C on form e re g istra a a u tora , n a p oe sia sã o e n con tra d a s a s “ id e n tid a d e s q u e re su lta m d a in te rse çã o d e cu ltu ra s q u e , m e sm o q u a n d o d e fin id a s p e lo ‘M e sm o’ q u e é a Lín g u a , te im a rã o se m p re e m tra -ze r o ‘O u tro’ e a Dife re n ça ” (:112).

(13)

s-sa p oe sia , a ssim com o a n osta lg ia , n ã o p r o p r ia m e n t e d o E s t a d o - n a ç ã o , m a s d o loca l d e p rove n iê n cia (a p rovín cia , a a ld e ia , a te rra n o se u se n tid o m a is re s -trito).

N o ú ltim o a rtig o, “ Tra n sid e n tid a d e s n o Loca l G lob a liza d o. N ã o Id e n tid a d e s, M a rg e n s e Fron te ira s: Voze s d e M u lh e -re s La tin a s n os E.U.A” , M a ry G a rcia C a stro a b ord a o d e b a te sob re p od e r e su b a lte rn id a d e n a situ a çã o tra n sn a cio-n a l, e cio-n foca cio-n d o, e sp e cia lm e cio-n te , te xtos p rod u zid os p or m u lh e re s id e n tifica d a s com o “ la tin a s” e / ou “ n e g ra s” n os Esta -d os Un i-d os. A e scolh a -d e ssa s “ voze s” p e rm itiu à a u tora lid a r com su b a lte rn i-d a i-d e s m ú ltip la s – i-d e ra ça , i-d e cla sse , i-d e g ê n e ro, d e op çã o se xu a l –, p rob le m a ti-za n d o o con ce ito d e id e n tid a d e “ la tin a ” n a m e d id a e m q u e a lite ra tu ra e m q u e stã o, p rod u zid a p or e scritora s e m ilita n -te s d e d ife re n -te s m ovim e n tos, a lg u m a s fe m in ista s, n e g ra s e / ou h om osse xu a is, va i a lé m d a s fron te ira s id e n titá ria s, e m u m d e sa fio à d iscrim in a çã o e op re ssã o. In ve stig a te m a s m e n os e xp lora d os n a s situ a çõe s d e d iá sp ora , p re se n te s n os te xtos d e ssa s m u lh e re s: o corp o e a se xu a lid a d e , p or e xe m p lo, ou com b in a çõe s e n tre p olítica s d e cla sse , ra ça , e t -n icid a d e , g ê -n e ro, -n a cio-n a lism o e tc., q u e le va m à re cu sa d o e n q u a d ra m e n to e m p olítica s d e id e n tid a d e s u n ívoca s.

O s a rtig os re u n id os n a a n tolog ia d ã o su b síd ios im p orta n te s p a ra o e n te n d im e n to d a s con tra d içõe s, su b je tivid a d e s, sim b olism os e p a ra d oxos su b ja ce n -te s à s con ce p çõe s d e id e n tid a d e n a s situ a çõe s d e tra n sn a cion a lid a d e m a rca d a s p e la re d e fin içã o d o m od e lo d e Es -ta d o-n a çã o. Sã o e stu d os q u e foca liza m p roce ssos a tu a is d e re con fig u ra çã o id e n titá ria ; n ã o ob sta n te , se ria ú til a com p a ra çã o com p roce ssos im ig ra tórios d e ou -tros p e ríod os h istóricos, sob re tu d o p or-q u e o Esta d o-n a çã o tra n sn a cion a l e stá lon g e d e se r u m fe n ôm e n o re ce n te –

so-b re tu d o q u a n d o a cion a d o u m p rin cíp io d o n a cion a lism o cu ja p re m issa é p ri-m ord ia lista e ri-m u ri-m se n tid o b iológ ico. Por ou tro la d o, o m u lticu ltu ra lism o n ã o e stá su ficie n te m e n te p rob le m a tiza d o. Se g u n d o a lg u n s d os se u s críticos, e sp e -cia lm e n te a q u e le s id e n tifica d os com os in te re sse s d e m in oria s, a d istin tivid a d e cu ltu ra l p od e se r tra n sform a d a e m n ova m e tá fora d a d e sig u a ld a d e , a tra vé s d o d iscu rso d e le g itim a çã o d a d ife re n ça . As con trové rsia s sã o m u ita s e , ce rta -m e n te , a s con trib u içõe s con tid a s n o li-vro a ju d a m a e lu cid a r os m e a n d ros d a s id e n tid a d e s e n q u a n to p olítica , e m u m m u n d o g lob a liza d o on d e p e rsiste o lo-ca l n a form a d o Esta d o-n a çã o.

GOLDM AN, M arcio. 1999. Alguma An-tropologia.Rio de Janeiro: Relume Du-mará. 178 pp.

Pablo Semán

Dou tor, C O N IC ET/ Un ive rsid a d N a cion a l d e G e n e ra l Sa n M a rtín

(14)

-ce p çõe s e d e b a te s p re -ce d e n te s. Exa m i-n a re i ca d a u m d e sse s i-n ú cle os i-n a ord e m a q u i e n u n cia d a .

N o a rtig o “ Um a C a te g oria d o Pe n -sa m e n to An trop ológ ico: A N oçã o d e Pe ssoa ” , a firm a se : “ É cu rioso q u e os a n -trop ólog os a ce ite m a id é ia d e u m in d i-vid u a lism o ocid e n ta l e , a o m e sm o te m-p o, d e d iq u e m tod os os se u s e sforços a e n con tra r e n tre n ós re p re se n ta çõe s q u e n ã o ob e d e ce m a e sse m od e lo su p osta -m e n te d o-m in a n te ” (:25). Ta l con tra d i-çã o d e p e n d e d a fu sã o in d e vid a e n tre a n e ce ssá ria d e sn a tu ra liza çã o d o a g e n te e su a con ce p çã o e m te rm os d a in te ra çã o in d ivíd u osocie d a d e . Esta , su b e n te n d e n d o o in d ivíd u o e m ve z d e colocá lo e n tre p a rê n te se s, d u p lica o im a g in á -rio ocid e n ta l q u e p re te n d e in te rp re ta r. Tod a via , p re se rva r a p rob le m a tiza çã o d o a g e n te n ã o sig n ifica b u sca r, e m u m a re g re ssã o ad in fin itu m , o e fe ito d e id e o-log ia s con stitu in te s, m a s in ve stig a r o p la n o d e a rticu la çã o con tin g e n te d e re -g ra s, d iscu rsos e ob je tos n o q u a l a s id e olog ia s sã o d e riva d a s e se torn a m e fica ze s. É p or isso q u e se su ste n ta q u e “ à s te oria s q u e b u sca m ca p ta r a su b s-tâ n cia d e id e olog ia s e n g lob a n te s, se ria p re ciso op or u m a a n a lítica d os p roce s-sos im a n e n te s à s m ú ltip la s p rá tica s” (:35). Ab rin d ose à con tin g ê n cia , torn a -se ce n tra l o e le m e n to h istórico q u e o a u tor te n ta re a lça r n a p rá tica e n o ob je -to d a a n trop olog ia . Essa op e ra çã o se p rolon g a e e scla re ce com o g iro q u e se e fe tu a e m “ An trop olog ia C on te m p orâ n e a , Socie d a d e s C om p le xa s…” . Socie d a d e “ com p le xa ” é u m a n oçã o on ip re -se n te n a p rá tica d os a n trop ólog os, q u e a op õe à s “ sim p le s” , ob je to p róp rio d a a n trop olog ia , ou a d e fin e d e lim ita n d o a s con d içõe s e a sp ira çõe s d o e xe rcício a n trop ológ ico n a s socie d a d e s ocid e n -ta is m od e rn a s. Em a m b os os ca sos, a a n trop olog ia clá ssica e m od e rn a , corp o d e sa b e re s d e riva d os d a con stâ n cia d e

u m a p rá tica , con sa g ra e ssa con stâ n cia n a ilu sã o d e corre sp on d ê n cia com u m ob je to. Este con stitu i e sp e cu la rm e n te a a n trop olog ia com o ciê n cia d os ob je tos d e p e q u e n a e sca la . A a lte rn a tiva é p e n -sa r q u e q u a lq u e r socie d a d e é , on tológ i-ca e e p iste m olog ii-ca m e n te , h istória . N ã o se tra ta d e a p osta r n o con h e cim e n to id iog rá fico ou d e a filia rse a o p ólo ro m â n tico d a te n sã o con stitu tiva d a s ciê n -cia s so-cia is, m a s sim d e d istin g u ir e n tre o p la n o d a g e ra çã o socia l d a s in stitu i-çõe s e o p la n o q u e con fig u ra o con ju n to d e la s, já in stitu íd a s, p rivile g ia n d o o p ri-m e iro. A d istin çã o re fe re -se a lóg ica s d e a n á lise d ife re n te s e , se é ób vio q u e a g e ra çã o socia l d e in stitu içõe s re cicla o p re via m e n te crista liza d o, ta m b é m o é q u e o d isp ositivo n ã o é a m e sm a coisa q u e o já d isp osto, q u e n ã o se rá a m e s-m a coisa e stu d a r cria d ore s e cria tu ra s. Essa n oçã o, trib u tá ria d e Ve yn e e Fou -ca u lt, e n te n d e com o h istória o e stu d o e a p rod u çã o d e tra m a s q u e se te ce m a q u é m d a n e ce ssid a d e , d o te m p o e d o e sp a ço tra n sce n d e n ta is. N a in te rse çã o d e te m p ora lid a d e s con flitiva s q u e n u n -ca se rã o a H istória e d e e sp a ços p re ca -ria m e n te fixa d os q u e n u n ca se rã o su b s-tâ n cia , sã o d e cid id a s e con d e n sa d a s a s sin g u la rid a d e s: p on to d e a rticu la çã o d e p rove n iê n cia s e e m e rg ê n cia s, te rre n o d e e n g e n d ra m e n to d os u n ive rsa is q u e e sse s m e ca n ism os d e g e ra çã o torn a m se m p re p re cá rios. Assim a a n trop olo -g ia , p rá tica tra n sve rsa l à s ciê n cia s form a liza d a s, tra n sita e form â form b ito “ su b lu -n a r” q u e -n ã o im p lica m i-n ia tu riza çã o, m a s d e lim ita çã o d e u m p la n o e m q u e op e ra m va riá ve is d ife re n te s d a s q u e re in a m n o ca m p o e m q u e os ob je tos sã o e n g e n d ra d os.

(15)

a tiva m e n te d e scon h e cid o p e la su p osi-çã o d e q u e e sta s ú ltim a s e ra m p a ssíve is d e cog n içõe s tota is. A com p le xid a d e d e q u a lq u e r form a socia l se im p õe a q u a lq u e r p re te n sã o d e re g istro tota l, a sso -cia d a ilu soria m e n te à s a sp ira çõe s d a lon g a d u ra çã o d a s ob se rva çõe s e à su -p osta im e d ia te z d a s m e sm a s. N ã o se tra ta d e a b a n d on a r o rig or d a e tn og ra -fia : o tre in a m e n to p róp rio d a d iscip lin a n ã o ca d u ca , m a s su a s a sp ira çõe s se vê e m d im e n sion a d a s p e la e lu cid a çã o d a on tolog ia d o socia l q u e e sta va se n d o e n cob e rta .

A p rob le m a tiza çã o d e ssa on tolog ia se re a liza d e d u a s m a n e ira s. Prim e iro, com o crítica d a s m a n e ira s d e con h e ce r; se g u n d o, com o e la b ora çã o d a s d e te rm i-n a çõe s te órica s d o ob je to. A p rim e ira , d e se n volvid a e m “ C om o se Fa z u m G ra n d e Divisor?” (e m co-a u toria com Tâ n ia Stolze ), a ssin a la u m p rod u to con -tra d itório d a s a n á lise s a n trop ológ ica s: a re cu sa à op osiçã o “ n ós/ e le s” d e scon h e -ce a lóg ica q u e a su ste n ta e a re p rod u z e m ou tros n íve is a o p ostu la r a s se p a ra -çõe s e n tre , p or e xe m p lo, m u n d os h olis-ta s e in d ivid u a lisolis-ta s, ora lid a d e e e scriolis-ta . Em p rim e iro lu g a r, é p re ciso e n te n d e r q u e a p e rg u n ta “ o q u e , e m g e ra l, n os a p roxim a e / ou d istin g u e d os ou tros” (:85), su p õe a re a lid a d e d e u n id a d e s e d ife re n ça s cu ja e xistê n cia d e ve ria se r ob je to d e su sp e ita . Em se g u n d o lu g a r, ch a m a -se a a te n çã o p a ra a s con d içõe s lóg ica s sob a s q u a is se re a liza m os ra -ciocín ios com p a ra tivos. C om o d e m on s-tra m os a u tore s, u m ve rd a d e iro a rse n a l d e fa lá cia s p e sa sob re os ra ciocín ios a n -trop ológ icos e volta a coloca r p e rg u n ta s g e n e ra liza n te s se m n e ce ssid a d e d e e n u n ciá -la s.

A se g u n d a lin h a d e a n á lise é d e se n -volvid a e m “ As Le n te s d e De sca rte s, Ra zã o e C u ltu ra ” , “ Lé vi-Stra u ss e os Se n tid os d a H istória ” e “ O b je tiva çã o e Su b je tiva çã o n o Últim o Fou ca u lt” . N e

s-te s a rtig os, e xp lora -se a id é ia d a a n tro-p olog ia com o h istória a tra vé s d o e xa m e d e ob ra s-ch a ve d a a n trop olog ia e filoso-fia . De Lé vi-Stra u ss e xtra i-se u m a liçã o p re cisa , p e rtin e n te e m u ita s ve ze s e lu -d i-d a com a a cu sa çã o -d e a n ti-h istoricis-m o. Se a H istória é n osso istoricis-m ito, é p orq u e e ssa te m sid o n ossa form a d e re a g ir d ia n te d a te m p ora lid a d e . Esse ra ciocí-n io su ste ciocí-n ta , m a is d o q u e u m a re la tivi-za çã o d o sa b e r h istórico, a a firm a çã o d a e xistê n cia d e h istoricid a d e s d ife re n te s ju n to a d istin ta s form a s d e re fle tir sob re e la s e d e con stitu íla s. Assim , a se p a ra -çã o d a h istoricid a d e e m re la -çã o à H is-tória e à s filosofia s d a h isis-tória n ã o sig n i-fica n e g a çã o d a p rim e ira m a s sim , p e lo con trá rio, a b e rtu ra d e u m “ ca m in h o p a -ra u m a re fle xã o h istórica a fa sta d a d a s a rm a d ilh a s d e tod os os e volu cion ism os e d e tod a s a s id e olog ia s ce le b ra tória s” (:63). Se a in te rve n çã o d e Lé vi-Stra u ss d e p u ra o a con te cim e n to d a s p ré -n oçõe s q u e b u sca m cin g ilo, o re cu rso a Fou -ca u lt p od e se r in trod u zid o n a te n ta tiva d e con ce itu a lizá -lo p ositiva m e n te . As-sim , re ssa lta d a le itu ra d e ste ú ltim o a rarid ad e d os fa tos h u m a n os, su a e m e r-g ê n cia e m u m e sp a ço d e tra n sform a çã o e fra tu ra , su a d e riva çã o n o cru za m e n to d e ca m p os d e sa b e r e d e n orm a tivid a d e e d e form a s d e su b je tivid a d e . N e ste cru -za m e n to, o re su lta n te n ã o é o ú n ico p ossíve l, p orq u e tod a ra rid a d e e stá h a b ita -d a -d e p olitici-d a -d e , -d e ca p a ci-d a -d e -d e d e cid ir, e m u m ca m p o d e p ossib ilid a -d e s, p or u m a a tu a liza çã o q u e b e m p o-d e ria te r sio-d o ou tra . Essa ra rio-d a o-d e imp lica , a d e m a is, o imp rivilé g io d a sin g u la -r id a d e (com o com b in a tó-ria loca l d e li-n h a s d e força d ifu sa s à d istâ li-n cia d e q u a lq u e r u n ive rsa lid a d e e n ã o com o d ife re n ça irre d u tíve l), e m ve z d a oscila -çã o e n tre os p a rticu la rism os in son d á ve is e a s u n ive rsa liza çõe s e tn ocê n trica s.

(16)

tivis-m o. De u tivis-m p on to d e vista e p iste tivis-m ológ ico, tra ta se d e com p re e n d e r q u e a su -b ord in a çã o d a se m e lh a n ça à d ife re n ça n ã o su p õe u m a d ife re n ça m e ta física , a b solu ta e tra n sce n d e n te . C a storia d is, e n tre ou tros, e n te n d ia a in stitu içã o m a is com o ve rb o q u e com o su b sta n tivo. Da m e sm a m a n e ira , d e ve e n te n d e r-se a d i-fe re n ça : com o tra b a lh o d e con stitu içã o d e ce rta s sin g u la rid a d e s a p a rtir d e ou -tra s, com o m ovim e n to d e d istin çã o a se r e sta b e le cid o a ca d a m om e n to. Pa ra e se ob je tivo, o criticism o ca rte sia n o con s-titu i u m m od e lo d e p e n sa m e n to m a is p róxim o d a a n trop olog ia d o q u e se p od e ria su p or: m a is od o q u e ce ticism o cog -n itivo ou m ora l, é a a titu d e q u e p e rm i-t e torn a r h istórico e sin g u la r o q u e se a p re se n ta com o n a tu ra l e u n ive rsa l. Do p on to d e vista é tico, a s con se q ü ê n cia s n ã o sã o m e n os im p orta n te s. O re la tivis-m o e tivis-m e rg e n te n ã o su rg e d o con tra ste e n tre p a râ m e tros a b solu ta m e n te ou tros op ostos a p a râ m e tros a b solu ta m e n te p róp rios. Eq u iva le a con tra sta r o q u e e m u m ca m p o d e p ossib ilid a d e s é a tu a -liza d o com ou tra s a tu a -liza çõe s d e sse m e sm o ca m p o, a a ssu m ir q u e e ssa s p ossib ilid a d e s p od e ria m com u ta rse . A in -te rp re ta çã o d e C la stre s p or De le u ze e s-cla re ce e sse p on to: se a s socie d a d e s p rim itiva s n ã o e ra rim se rim Esta d o e sirim ca -ra cte riza d a s p e la p re se n ça d e p od e rosos m e ca n ism os con tra o Esta d o, é p re -ciso a d m itir q u e e ssa s socie d a d e s re g is-tra va m o fu n cion a m e n to d e m e ca n ism os d e Esta d o q u e fora m in ib id os, e q u e a s n ossa s n ã o b loq u e a ra m p or com p le to os m e ca n ism os q u e a e le re siste m . Isto é m a is q u e u m e xe rcício e p iste m ológ ico: h á u m va lor é tico q u e se a g re g a a o e p is-te m ológ ico e o su b ord in a . Ve ja m os e m d e ta lh e : a a n trop olog ia com o h istória , com o ciê n cia d e d isp ositivos, e n con tra n os ou tros “ p rim itivos” , m a is q u e o p a s-sa d o d e n oss-sa con te m p ora n e id a d e , a tu a liza çõe s, m od os d e op e ra r a con tin

-g ê n cia , q u e a b a la m a se -g u ra n ça com q u e p ra tica m os n ossa s vid a s. N a a lte ri-d a ri-d e p ori-d e p a te n tiza r-se o q u e n ossa s socie d a d e s e scon d e m com re la tivo su ce sso, o n a tu ra liza d o a o lon g o d e b a ta lh a s cu jo ra stro se p e rd e u , o q u e a p re n -d e m os a -d e ixa r -d e tom a r e m con ta . Se é isto o q u e e stá e m jog o n a re la çã o com a a lte rid a d e , é ju sto con clu ir q u e a a ti-vid a d e d a a n trop olog ia g a n h a se n tid o é tico con trib u in d o p a ra re la tiviza r a tu a -liza çõe s lig a d a s à p oliticid a d e q u e d e ci-d e n ossa con tin g ê n cia h istórica .

(17)

e le itore s n ã o con stitu e m o re su lta d o d o e n con tro e n tre e ssa in stitu cion a liza çã o e u m a tá b u la ra sa , m a s u m p on to d e e n -con tro -con flitivo e n tre lóg ica s cu ltu ra is e m d isp u ta e m u m a e q u a çã o cu jos te r-m os sã o in ce rtos, r-m a s q u e , ce rta r-m e n te , e xclu e m o p a rtid o, o cid a d ã o e a e le i-çã o, com o form a s u n ive rsa is e com o te r-m os u n ívocos.

LUSTOSA, Isabel. 2000. Insult os Im-pressos. A Guerra dos Jornalist as na Independência (1821-1823).São Paulo: Companhia das Letras. 497 pp.

Candice Vidal e Souza

Dou tora n d a , PPG AS-M N -UFRJ

A m a g n ífica h istória d os p e rson a g e n s va n g u a rd e iros d a im p re n sa n o Bra sil e d e su a p re se n ça d e cisiva n a s lu ta s p olí-tica s d a In d e p e n d ê n cia e stá re com p os-ta d e m od o in é d ito n e ste livro d e Isa b e l Lu stosa . Se u te xto d istin g u e -se d o e sti-lo n a rra tivo tra d icion a l d a s ob ra s d e h istória d a im p re n sa p a ra o p e ríod o – m a is p re ocu p a d a s com a cita çã o lin e a r d e jorn a is e p u b licista s – p orq u e coloca o le itor n o ce n tro d os d e b a te s d o te m p o a o re fa ze r o e n re d o d a in te rlocu çã o e n -tre a q u e la s fig u ra s n otá ve is d o m u n d o d o jorn a lism o n a p rim e ira m e ta d e d o sé cu lo XIX. As con te n d a s re g istra d a s e m jorn a l e n tre a p a rtid a d o re i D. J oã o VI (a b ril d e 1821) e o fe ch a m e n to d a Asse m b lé ia p or D. Pe d ro I (n ove m b ro d e 1823) sã o a m a rca p re se rva d a d a -q u e la e fe rve scê n cia p olítica . N o re la to, a o m e sm o te m p o e m q u e se m a n té m o ca lor d os d iscu rsos, coloca n d o-os n o se u con te xto orig in a l d e e n u n cia çã o, ta m b é m se re sg u a rd a o vín cu lo e n tre os a u tore s e se u e stilo d e e scrita ca ra cte -rístico. Esse s se n h ore s d a s a rtim a n h a s re tórica s cria m u m a lin g u a g e m jorn a

lística q u e com b in a e xp re ssõe s re volu cion á ria s d e 1789, a d á g ios p ortu g u e -se s, h u m or a p u ra d o e ofe n sa s p e ssoa is. Acom p a n h a m os o d e stin o d e jorn a lista s e d e p osiçõe s p olítica s p or e le s a b ra ça -d a s com fe rvor (g e n u ín o ou op ortu n is-ta ); o le itor a in d a é b e m a m p a ra d o q u a n to a os d e ta lh e s d e fa tos h istóricos n e ce ssá rios à com p re e n sã o d o e ve n to d e scrito e tod os os n om e s m e n cion a d os re ce b e m n ota s b iog rá fica s.

O re la to d e Lu stosa d e scre ve com ra ra m in ú cia o e n la ce e n tre jorn a lism o e p olítica n o p e ríod o d a In d e p e n d ê n cia . N e sse ce n á rio, é o re tra to d a vid a in te -le ctu a l b ra si-le ira n o se u n a sce d ou ro, q u a n d o se con stitu i a fig u ra d o in te le c-tu a l com p rom issa d o com o lu g a r on d e vive , q u e sob re ssa i d a h istória con ta d a p e la a u tora . H om e n s q u e se vê e m com a m issã o p e d a g óg ica d e form a r e orie n -ta r p olitica m e n te o p ovo, ou m e lh or, a s e lite s colon ia is, d a q u e le Bra sil e m via d e a ssu m ir a con d içã o d e n a çã o in d e -p e n d e n te . Pa ra ta n to, “ a im -p re n sa foi o m e io p rivile g ia d o d e su a a çã o” (:33).

Tra ta -se , a fin a l, d e u m te xto su g e s-tivo a lé m d a s fron te ira s d a h istória d a im p re n sa p rop ria m e n te d ita . N e le h á d a d os p a ra a ca ra cte riza çã o sociológ ica d o jorn a lism o b ra sile iro – os a tore s e a s p osiçõe s id e ológ ica s e socia is a p a rtir d a s q u a is op in a va m – e m se u in sta n te form a tivo, a q u e le e m q u e o p ú b lico le i-tor p a ssa a se r p e n sa d o com o b ra sile iro e a s p osiçõe s d os jorn a lista s se d e fin e m e m re la çã o a se r ou n ã o se r p e lo Bra sil. N e sse s a n os, a rticu lou -se d e form a d e ci-siva o e m p e n h o d a p a la vra e scrita – e p or e xte n sã o, d os in te le ctu a is – com a ca u sa d a In d e p e n d ê n cia ou d a e xistê n -cia d o Bra sil com o n a çã o.

(18)

lis-ta a í a con te cid a . C om o d iz Lu stosa , “ e ra a im p re n sa b ra sile ira q u e n a scia , comp rom e tid a com o comp roce sso re volu cion á rio, n o m om e n to e m q u e , d e u m d ia p a -ra ou tro, d e ixá va m os d e n os con sid e -ra r p ortu g u e se s p a ra n os a ssu m irm os com o b ra sile iros” (:25-26). N e ste p on to e la co-m u n g a coco-m ou tra s ob ra s d e h istória d a im p re n sa b ra sile ira (p a ra cita r a p e n a s a u tore s re n om a d os a tu a lm e n te , N e lson We rn e ck Sod ré , Ba rb osa Lim a Sob rin h o e J u a re z Ba h ia ) n a s q u a is a a d je tiva çã o “ b ra sile ira ” e stá con d icion a d a à s con -d içõe s p olítica s -d a In -d e p e n -d ê n cia . É, p ois, u m a p re m issa in te rp re ta tiva q u e id e n tifica o su rg im e n to d o “ tim b re b ra -sile iro” (e xp re ssã o d e N e lson We rn e ck Sod ré ) n os jorn a is circu la n te s. Por e sse ra ciocín io, n ã o é o loca l d e im p re ssã o q u e d e fin e p rim a ria m e n te a con d içã o “ g e n tílica ” d e u m jorn a l, m a s o se u g ra u d e con sciê n cia e com p rom isso n a -cion a l. N ã o se ria d e sca b id o d ize r q u e a re g ra g e ra l n a s n a rra tiva s e m q u e stã o é a a d e sã o d os a u tore s a o ím p e to n a cio-n a lista d e se u s p e rsocio-n a g e cio-n s. In su ltos Im p re ssos m a n té m e sse e sp írito d e a d -m ira çã o p a ra co-m n ossos a n te p a ssa d os in te le ctu a is. C om u m a d ife re n ça fu n d a -m e n ta l: e ste livro n ã o p ossu i o to-m n orm a tivo d a s h istória s d a iorm p re n sa , à s ve -ze s in d istin g u íve l d a su ce ssã o fa ctu a l d e jorn a lista s e jorn a is.

Isa b e l Lu stosa re ve la d e sa cord os p on tu a is e m re la çã o a os a rg u m e n tos d e ce rtos a u tore s d a b ib liog ra fia d e re fe -rê n cia e n ã o se in tim id a a o d e scon stru ir op in iõe s a sse n ta d a s sob re fig u ra s com o J osé Bon ifá cio. En tre ta n to, ca ra cte rísti-ca s re ve la d ora m e n te “ n a cion a lista s” d e sse a ce rvo d e ob ra s sob re h istória d a im p re n sa n o Bra sil p a ssa m d e sp e rce b i-d a s p e la a u tora . A p e rg u n ta sob re com o a con te ce u a im p re n sa d a In d e p e n d ê n -cia , ce rta m e n te , n ã o ve m re ce b e n d o u m a re sp osta u n ívoca d os e stu d iosos b ra sile iros q u e p rop u se ra m ve rsõe s d os

p rim órd ios d a im p re n sa b ra sile ira . C a so a s e scolh a s b ib liog rá fica s vie sse m a com-p a n h a d a s d e u m m a com-p a b á sico d a s ocom-p i-n iõe s a ce rca d os “ fa tos” d a im p re i-n sa n a tra n siçã o d a C olôn ia p a ra o Im p é rio, te ría m os u m a in d ica çã o sa tisfa tória d o te or d a s in te rp re ta çõe s d isp on íve is so-b re o p e ríod o. C om o ta n ta s ou tra s h is-tória s, a d a im p re n sa b ra sile ira ta m b é m é u m a n a rra çã o com e fe itos p e rform a ti-vos, o q u e re siste à p e rce p çã o a rg u ta d e Lu stosa . A m e u ve r, e sta é a ra zã o p e la q u a l a se le çã o d e te xtos d e re fe rê n cia n e ssa á re a – com p re fe rê n cia a ce n tu a d a p or tra b a lh o d e C a rlos Rizzin i – m e -re ce ria e xp lica çõe s.

Em q u e tip o d e jorn a is, a fin a l, circu -la va m os “ in su ltos” ? N o g e ra l, e ra m e d içõe s fu g a ze s, im p re ssa s e m tira g e n s re d u zid a s e cu jo a lca n ce g e og rá fico d e circu la çã o n ã o costu m a va u ltra p a ssa r a cid a d e d e p u b lica çã o. Alé m d isso, a d is-trib u içã o se fa zia d ire ta m e n te a os a ssi-n a ssi-n te s, p ois ssi-n ã o se u sa va , a issi-n d a , o e x-p e d ie n te d a ve n d a a vu lsa n a s ru a s. A q u a se tota lid a d e d a s fon te s tra b a lh a d a s p e la a u tora p od e se r n om e a d a com o “ jorn a is ca rioca s d a In d e p e n d ê n cia ” (:32). A q u a lifica çã o “ n a cion a l” d irig id a a e ssa s folh a s n ã o se re fe re p rop ria m e n -te à re a lid a d e d e su a d istrib u içã o e m p ra ça s a lé m -C orte , e sim à “ n a çã o” co-m o re fe re n te d o e scritor.

Referências

Documentos relacionados

críticas e sugestões possam ser analisadas pelo “grupão”. No entendimento da pesquisadora, é necessária uma maior discussão para correção e alinhamento das

[r]

Durante a pesquisa, foram entrevistados dois Agentes de Acompanhamento de Gestão Escolar que orientam as escolas objeto da pesquisa para verificar quais são as percepções

O Programa de Educação do Estado do Rio de Janeiro, implementado em janeiro de 2011, trouxe mudanças relevantes para o contexto educacional do estado. No ranking do

O Processo Seletivo Interno (PSI) mostra-se como uma das várias ações e medidas que vêm sendo implementadas pela atual gestão da Secretaria de Estado.. Importante

O fortalecimento da escola pública requer a criação de uma cultura de participação para todos os seus segmentos, e a melhoria das condições efetivas para

[r]

As fontes escritas oficiais, que se encontravam sob os cuidados da própria Escola Nossa Senhora Auxiliadora (ENSA) serviram de suporte para a construção de um