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O novo Estado, gestão e governabilidade

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Academic year: 2020

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E N S A I O

O

NOVO ESTADO, GESTÃO E

GOVERNABILIDADE

Roberto Nicolau Je h a

A

ntes dc sc falar da gestão e da governabilidade, temos que ver a questão

do Estado na sociedade brasileira. Q ual é esse novo Estado? É um

Estado produtor? É um Estado, articulador? É um Estado mínimo? Eu, como diretor da FIESP, noto que hoje uma grande parte do empresariado nacional está sendo ilu d id o pela sereia do nco- lib e ra lism o . Eles acham, um a grande parte do empresariado, que o Estado deve ser mínimo. Que o mercado vai resolver tudo. E que o Estado deve realm ente se resignar e cuidar das questões de saúde, de educação e de promoção de justiça. Eu sou totalm ente contrário a esse ponto de vista. É e vidente que aquele Estado socialista, aquele Estado produtor, burocrático, ninguém pensa mais. J á virou u m Estado jurássico. Evidentemente que não é esse o Estado que a gente defende. Mas acho que temos que ter no Brasil um Estado enxuto, que não perca a sua capacidade de articulação, dc indução e mesmo a sua capacidade de intervenção. Se nós analisarmos a industrialização brasileira, para falar num ramo do qual eu sou

r

E

preciso dar ao Estado condi­

ções para que possa governar

esse país tão cbeio de contras­

tes, paradoxos e com um potencial

tão grande e que se encontra numa

situação tão miserável. Nesse parti­

cular, algumas reformas são abso­

lutamente indispensáveis. E não vejo

como fazer isso sem uma revisão da

Constituição.

mais ligado, vamos ver que, em 1930, quando o Brasil era ainda uma grande fazenda agro-pastoril, até os fins da década de 70, passamos de uma grande fazenda para a oitava e co n o m ia industrializada do mundo. Isso se fez com u m processo de sub stitu ição de im p o rta ç ã o comandado pelo Estado nacional, já que a iniciativa privada em 1930 não tin h a nem o grau de articulação nem o grau de concentração dc capitais que tem hoje. E n aq u e le m o m e n to foi necessário que o Estado nacional ou Estado de Vargas, o primeiro governo de Vargas, fizesse esse program a de s u b s titu iç ão de importações e, com o auxílio de p ou p an ça externa, iniciasse o program a dc in d u s tria liz a ç ã o brasileira. É mais uma vez o Estado

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RSP

Roberto N icolau Jeha

nacional que em 1940/1941, dá um passo decisivo nessa história da industrialização brasileira com a

fundação da Com panhia

Siderúrgica Nacional. Na época, havia uma guerra. E o Presidente Vargas, que na época era um ditador, negociou a ida do Brasil, ao lado dos aliados, com a condição de que os Estados Unidos aqui instalasse uma usina siderúrgica, já que haviam grandes dificuldades, postas pelo próprio Estados Unidos e pelas nações industrializadas da época, para que o Brasil se industrializasse. Novamente o Estado teve uma atuação fundam ental nesse processo de crescimento e de

urbanização da população

brasileira. Termina o governo Vargas e vem o governo do Marechal Dutra. E o governo do Marechal Dutra foi neoliberal. Era um governo em que o mercado deveria resolver tudo e o Estado deveria se recolher. Houve, naquela época, uma abertura comercial brasileira. E o Brasil gastou durante o governo Dutra todas as reservas que tinha acum ulado durante a guerra. Gastou importando geladeiras, automóveis, liqüidificadores. Porque nós não produzíamos nada naquele momento? É um momento em que o Estado se afasta da condução da vida econômica brasileira. E o resultado foi dos piores. É preciso que cinco anos mais tarde volte Getúlio Vargas e crie as grandes holdings estatais brasileiras, que até hoje estão aí. E sem elas dificilmente poderia se ter

conseguido a c o ntin uidade do processo de industrialização até o fim da década de 70. Que são a Petrobrás c a Eletrobrás? É dessa época também a criação do BNDE, que é o primeiro banco de fomento brasileiro. Ou seja, o primeiro que financia a iniciativa privada a longo prazo os seus projeto s de investim entos e de in d u s ­ trialização. Não só a iniciativa privada com o o p ró p rio setor público, nos seus setores de infra- estrutura. Quando a gente diz que o BNDE foi o primeiro banco a fazer isso, foi o primeiro banco formalmente a fazer isso. Porque essa missão, esse papel, antes da existência do BNDE, coube ao Banco do Brasil. Teve um grande papel cm toda essa história brasileira da industrialização, da agricultura, e nfim , d o d e se n ­ vo lvim ento e c o n ô m ic o desse século. Houve um m omento em que o Banco do Brasil, além de ser um banco comercial, um banco agrícola e rural, era o banco Central e, ao mesmo tempo, era o banco de desenvolvimento econômico. Posteriormente é que veio o Banco Central substituindo a SUMOC - Superintendência da M oeda e Crédito - que era um departamento do Banco do Brasil. E que vem o BNDE su b s titu in d o tam bém o Banco do Brasil como financiador de longo prazo. Mais uma vez, o papel do Estado n o sistem a financeiro p ú b lic o brasileiro alavancando, in d u z in d o e a rtic u la n d o o processo de crescimento econômico.

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RSP

O novo Estodo, gestão e governabilidade

O

governo Kubitschek foi dc planejam ento. É o governo do Plano dc

Metas. Foi um govemo no qual o Brasil, aproveitando todo esse

esforço mundial, dá o seu grande pulo para a industrialização. É o m o m e n to da siderurgia. É o momento da energia elétrica. É o m omento das telecomunicações. Das estradas rasgarem esse país. É o m om ento de Brasília. Se não fosse Brasília, certamente que a economia brasileira ainda estaria na b o rda costeira d o Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte. É o m omento da marcha para o oeste. Sc não fosse Brasília, não teria sido possível Rondônia, Mato Grosso, Acre ou, pelo menos, o desenvolvimento de todos esses estados.

Q u a n d o acaba o g o v e rno Kubitschek, nós temos um inter­ valo dramático no país. Entra o senhor Jân io Quadros com um program a tam bém neoliberal. Um program a que atendia no campo interno aos interesses do capital internacional e ao gran­ de capital nacional. E no campo externo, fazer um a abertura po ­ lítica para a União Soviética. Foi uma grande controvérsia. Essa foi um a das contradições que o pre­ sidente Jân io cometeu, que aca­ bou renunciando e sendo suce­ d id o po r Jango Goulart. Jango Goulart fez u m govemo bastan­ te tum ultuado e turbulento que acabou sendo derrubado pelo golpe m ilitar de 64.

Q u a n d o vem os m ilitares, novamente após os dois anos dc arrumação de casa feita pelos cnlão m inistros B ulhões e R oberto Campos, é novamente o Estado nacional quem toca o segundo plano, o segundo m om ento do crescimento econômico brasileiro. É o Banco do Brasil, o BNDE, a Petrobrás, a Eletrobrás, Fumas, enfim, há um fortalecimento do Estado nacional como condutor da política econômica. E, apesar dos erros que os militares cometeram e que foram muitos, especialmente n o cam po social e n o cam p o político, eles tiveram um razoável êxito na questão do crescimento econômico. Esse processo atingiu o auge durante o govemo Geisel. Foi aí que realmente a estatização brasileira atinge o seu auge. Nesse momento, porém, fim do govemo Geisel e com eço d o governo F igueiredo, esse m o d e lo dc crescimento econôm ico com an­ dad o pe lo Estado acaba. No m u n d o in te iro a situ a ção se m odifica. O Brasil sofre dois choques nesse m o m e n to . O choquc do petróleo e o choque dos juros. E o Estado nacional, que até então era um Estado supera vi tário, que até e ntão p o d e ria estar cumprindo razoavelmente as suas funções no cam po econ ôm ico entáo tão bem no campo social mas, ainda cumpria muito melhor do que hoje, entra num processo de queda. Entra num processo dc dissolução e deterioração cujas conseqüências mais dramáticas são o estado que está a saúde pública hoje, o estado em q u e está a

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Roborto Nicolou Joha

educação pública hoje e mesmo a condição de infra-estrutura que é uma função do Estado e que hoje está num a situação lamentável. As estradas brasileiras estão de dar dó. Os portos brasileiros têm que serreaparelhados. O próprio setor elétrico, que no Brasil é um setor tipicamente estatal, está parado há 4 ,5 ,6 anos. E se nós não tivermos u m a nova retom ada do desenvolvimento poderemos ter graves problemas devido a falta dc energia elétrica. Então, nesse m o m e n to , acaba esse projeto c o m a n d a d o p e lo Estado cm substituição dc importação. Mas isso não significa que o Estado deve ser afastado. Isso não significa q u e a gente deva a dotar um modelo neoliberal com funções do Estado m ín im o . O Estado só eventualmente se ocupando da educação e saúde, e deixando todo o resto para o mercado. Se assim fosse, teria sido muito facil a gente ter crescido nos anos 80. Porém, nós não conseguimos nos anos 80 e nesses anos 90 formular um novo papel para o Estado. M odernizar esse Estado de tal maneira que ele, deixando de ser a m ola da p ro p u ls ão do crescimento econômico brasileiro, mas não d o crescimento social, pudesse v iab ilizar um novo projeto no qual a iniciativa privada pudesse comandar o processo. E u m processo mais aberto dc inserção do Brasil no mundo. E n ão um processo tão fechado como foi aquele de substituição dc im portações e que vigorou de 1930 até fins da década de 70. Eu

acho que nesse momento o grande risco que nós estamos correndo é cm função de todas as dificuldades, em função do esfacelamento do Estado nacional adotarmos um modelo neoliberal que acabe por congelar a miséria brasileira. Que acabe po r deixar o setor da educação pública num a situação lastim ável. O setor dc saúde pública na própria falência. E acabe prejudicando, inclusive, o sistema financeiro público brasileiro. Que há algo muito importante sobre o qual eu queria dizer alguma coisa.

Os neoliberais acham que não há necessidade do Banco do Brasil. Acham que não há necessidade do BNDES. Acham que o mercado vai resolver isso tudo. Na hora de financiar a agricultura, na hora de financiar a longo prazo, na hora dc você investir em infra-estrutura quem tem aparecido é o BNDES, é o Banco do Brasil c alguns bancos estaduais. Isso não quer dizer que o Banco do Brasil e o BNDES e toda a corporação dc bancos estaduais e federais não devam melhorar a sua eficácia. Eu defendo um sistema financeiro p ú b lic o forte, ativo, presente, mas que melhore a sua eficácia c deixe de lad o o corporativism o. E q ue possa cumprir adequadamente e corrcto o programa de privatização. Na m in ha o p in iã o foi feito apressadamente, sem um projeto dc política industrial que pudesse adequar essa privatização a um projeto brasileiro. E cu concordo ple na m e nte com o R oberto Macedo, quando ele diz que não

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O novo Estado, gestão e governabilidade

adianta fazer estabilização se não soubermos para onde vamos. De que adianta um vento favorável se você não sabe a que porto você está se dirigindo, já dizia Sêneca na antigüidade. Então nós temos que ter u m programa de política in d u s t r ia l, u m p ro g ra m a de p o lític a so c ia l, u m p ro je to brasileiro, para que a gente possa direcionar os nossos esforços, o b tid a a estabilização, para a realização d o potencial desse país. Não apenas crescim ento e c o n ô m ic o c o m o houve, p o r exemplo, no regime militar. Mas, também, o crescimento social. Nesse ponto, ninguém substituiu o Estado. P orque a iniciativa privada não vai cuidar do grande exército de deserdados que tem no Brasil. O Brasil hoje tem 50, 60 m ilhões de deserdados. Se você não tiver políticas sociais c o m p e te n te s e q u e sejam direcionadas no sentido de trazer u m a existência m elhor a essa m ultid ão de brasileiros, não vai adiantar nada os programas de estabilização. E aí ó papel do Estado é preponderante para as suas políticas sociais, po lítica in d u s tria l, articular e in d u z ir u m a p o lític a e c o n ô m ic a que p e rm ita nos inserirm os com- petitivamente no m undo, como hoje apregoa o jargão liberal mas, principalmente, nos adequarmos para a te n de rm o s às enorm es necessidades do nosso mercado in te r n o q u e até h o je foram totalmente esquecidas.

E, para terminar, quando se fala em governabilidade é preciso dar ao Estado condições para que possa governar esse país tão cheio de contrastes, paradoxos e com um potencial tão grande e que se encontra n u m a situação tão miserável. Nesse p articular, algum as reformas são absolutamente indispensáveis. E não vejo como fazer isso sem uma revisão da C o n s titu iç ão . Esse assunto n ã o p o d e ser levado em ocionalm ente. G anhe quem ganhar as próximas eleições, se nós não fizermos algumas reformas estruturais no campo tributário, na previdência social, n o cam p o administrativo, no campo eleitoral, d ific ilm e n te a lg u m governo p o d e rá ter gestão, p o d e rá conseguir a governabilidade. Esta é um processo político. Tem que haver uma grande conscientização de todos os cidadãos. Q uer ele participe da política diretamente ou indiretamente como cidadão. Que nós temos que saber escolher os nossos representantes para que eles possam, na atribuição de suas funções, legislativas e executivas, com porem u m q u a d ro in s ­ titu c io n a l q ue devolva a governabilidade e que permita a gestão desse país.

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Roberlo N icolau Jeha

R e su m e n

NUEVO ESTADO, GESTIÓN Y GOBERNABILIDAD

Es necesario dar al Estado c o n d icio n e s para que pueda g obem ar esc país tan Ileno de contrastes, paradojas y con un po tencial tan grande y que se encuentra en una situación tan miserable. En ese caso, algunas reformas son absoutam ente indispensables. Y no veo cómo hacer eso sin una revisión de la Constitución.

Abstract

NEW STATE, ADMINISTRATION AND GOVERNABILITY

It is necessary to give the State conditions to govem this country, with so many contrasts, paradoxes and great p o te n tia l, besides finding itself in such miserable c o n d itio n . C o n cern in g the situ a tio n , certain changes are absolutely essential. I cannot see how this can be done w ithout revicwing the Contitution.

Texto baseado em palestra profe­ rida durante o Encontro Nacional: Função Pública, Estado e Socieda­ de, realizado na ENAP, Brasília/DF, em abril de 199-f.

Roberto N icolau Je h a é diretor prim eiro secretário da Federa­ ção das Indústrias do Estado de São Paulo.

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