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O ACESSO À INTERNET É UM DIREITO FUNDAMENTAL?

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Academic year: 2020

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Centro Universitário Brazcubas V4N1: Junho de 2020

O ACESSO À INTERNET É UM DIREITO FUNDAMENTAL?

Carlos Ogawa Colontonio1

RESUMO

O mundo contemporâneo não vive mais sem internet. O isolamento social provocado pela pandemia do último ano da segunda década do século XXI deixou ainda mais clara a necessidade e essencialidade da conexão das pessoas com a rede mundial de computadores para a realização da maior parte de suas atividades no dia a dia, como estudo, trabalho, negócios, comunicação e, até mesmo, atividades afetivas. Diante da essencialidade material do acesso à internet, indaga-se se tal instrumento deve ser considerado, pelo nosso ordenamento jurídico, como um direito fundamental, a ser protegido de forma preponderante pelos nossos institutos jurídicos. Os direitos fundamentais são históricos, e, por este motivo, admitem que o rol de direitos essenciais de determinada sociedade seja ampliado com a superveniência de novos direitos fundamentais, que são conquistados ou reconhecidos em cada momento histórico. Seria o caso do direito à internet? O direito ao acesso à internet já pode ser reconhecido como um direito fundamental ou depende de positivação no texto constitucional, a ser realizada através de uma Emenda Constitucional? Deste modo, o presente ensaio tem por objetivo oferecer uma proposta de resposta para esta pergunta, com base na revisão da literatura sobre os direitos fundamentais, assim como o estudo sobre a natureza dos direitos fundamentais e do que é o acesso à internet. Pretende-se responder se os direitos fundamentais dependem de positivação ou se podem ser reconhecidos de forma tácita, assim como se o acesso à internet é um direito fundamental ou não, e se depende de previsão literal na Constituição para ter tal status.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos Fundamentais; Acesso à internet; Proteção dos direitos fundamentais; Direito ao

acesso à internet; Direito Constitucional.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS; 3. OS DIREITOS

FUNDAMENTAIS NECESSITAM DE POSITIVAÇÃO?; 4. O ACESSO À INTERNET É UM DIREITO FUNDAMENTAL?; 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

1 INTRODUÇÃO

A rede mundial de computadores, também conhecida como Internet é a mais fantástica ferramenta para comunicação e acesso à informação que já tivemos na história da humanidade. Hoje negócios são realizados instantaneamente por celulares conectados, alunos visualizam a explicação ao vivo do professor sobre determinado ponto da matéria e até mesmo casais conseguem manter seu relacionamento afetivo a maior parte do tempo “online”.

1Procurador do Estado de São Paulo (PGE/SP), Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Braz Cubas (UBC)

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Atualmente estamos vivendo os efeitos de uma pandemia que obrigou a maior parte das pessoas ao isolamento social, com o confinamento em suas residências. Grande parte dos profissionais tiveram que adaptar suas carreiras ao home office do dia para a noite. Alunos continuaram o seu semestre letivo com aulas em portais e meios digitais. Avós e avôs passaram a se comunicar com seus pequenos netos somente a partir de chamadas de vídeo pela internet e famílias inteiras se reúnem apenas através das “lives”. A certeza que todos tinham da indispensabilidade da conexão à internet somente se reforçou ainda mais com a necessidade do distanciamento físico das pessoas e dos seus locais de trabalho, estudo e relacionamento.

Com esta certeza em mente, talvez seja o momento de (re)questionar sobre o local de acolhimento do acesso à internet em nosso ordenamento e sistema jurídico. A essencialidade da rede mundial de computadores na vida das pessoas é fundamento suficiente para entender que tal conexão é um direito fundamental? Qual a proteção que devemos dar para tal instrumento? Será que o direito deve tratar o acesso à internet, inclusive, como um direito?

O presente ensaio procura responder à questão acima, a partir da revisão da literatura sobre o assunto, assim como em projeto de Emenda à Constituição oferecida e apontamentos sobre a possível natureza instrumental do acesso à internet.

2 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Antes de analisar o objeto central deste ensaio, sobre a condição do acesso à internet como um Direito Fundamental, é necessário conceituar, mesmo que brevemente, os que seria tal instituto jurídico.

O próprio nomem iuris já dá um caminho inicial para a interpretação. Tratam-se de direitos, no sentido subjetivo, de faculdade (ou seja, ter direito a algo), e se tratam de direitos imprescindíveis, essenciais e basilares (estas palavras, geralmente, encontram-se como sinônimas de fundamental em alguns dicionários da língua portuguesa).

Por essencial se entende algo ou condição que é obrigatório para a existência e permanência de outra; de algo que constitua a parte necessária ou inerente de outra. Como já sabemos, e estudamos nos primeiros anos do ensino fundamental, a água, por exemplo, é essencial para a vida humana (e de diversos outros seres vivos).

Desta maneira, uma forma de se conceituar Direitos Fundamentais é como aquele grupo de direitos que são obrigatórios e necessários na “vida jurídica” dos sujeitos de direitos

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(ou seja, aqueles que podem titularizar direitos e serem obrigados por deveres), em especial as pessoas humanas.

O professor José Afonso da Silva, ao elaborar o conceito dos Direitos Fundamentais, faz a seguinte asserção (2011, p. 178):

No qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados.

São fundamentais, portanto, aqueles Direitos que a pessoa humana não pode viver ou sobreviver sem; Direitos tão necessários que, caso negados, a própria essência de existir enquanto “ser humano” seria afastado da pessoa, violando-se a sua própria dignidade enquanto pessoa humana. São Direitos que desde o mais justo dos heróis até o mais degenerado criminoso (se é possível avaliar as pessoas tão radicalmente desta maneira) são titulares, apenas pela condição de serem pessoas humanas.

Retornando às lições de José Afonso da Silva, um efetivo conceito de Direitos Fundamentais, do que foi dito, é que se tratam estes Direitos daquelas “prerrogativas e instituições que se concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas” (2011, p. 178).

Dizer que os Direitos Fundamentais são aqueles necessários, obrigatórios e essenciais para todas as pessoas humanas, todavia, não exaure a análise do instituto, uma vez que, apesar de ser uma avaliação sincera, não é suficiente para definir com retidão a substância do objeto em estudo.

Um segundo passo que pode ser tomado é o exame das características que a doutrina e a jurisprudência atribuem para os Direitos Fundamentais. A investigação das propriedades dessas prerrogativas essenciais pode fornecer novas “luzes” para o escopo deste ensaio.

É comum reflexões que indicam que os Direitos Fundamentais são universais e históricos, assim como inalienáveis, imprescritíveis e irrenunciáveis. Estes atributos, por ora, bastam para nossa abordagem.

São Direitos universais porque, como dito, se vinculam a um núcleo mínimo de proteção à dignidade humana, de forma que representam os direitos que todos os componentes de uma sociedade (um Estado político, no caso) titularizam, mesmo que de forma potencial, independentemente de quaisquer condições físicas, sociais, morais, etc. Já a noção de que são históricos parte da ideia de que “surgem e se desenvolvem conforme o momento histórico” (NOVELINO, 2017, p. 261), de forma que aquela noção de núcleo

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mínimo de proteção à dignidade humana não somente varia de época para época (o que é

fundamental no século XXI não poderia ser tão essencial, ou até mesmo inexistente, para a

pessoa humana que viveu no século XIX – ou vice-versa), como é produto dos fatos2 e

eventos sociais presentes naquela sociedade ou naquele grupo naquele momento histórico. Deste exame preliminar, há bons indícios que o acesso à internet seria um direito fundamental, afinal, é plausível defender que atualmente, no pórtico da terceira década do século XXI, não há pessoa que não necessite do acesso à rede internacional de computadores para exercer atividades básicas da sua vida, como estudar, buscar entretenimento, comprar e vendes bens, obter informações e se comunicar com sua rede de amigos, conhecidos, desconhecidos e inimigos. Aparentemente, seria uma boa tática de jogador apostar algumas moedas na resposta afirmativa para a pergunta do título desse estudo, uma vez que é difícil imaginar que a conexão em um mundo 2.0 (ou 3.0, ou 4.0) não seja essencial, universal e um produto da nossa história hodierna.

Contundo, antes de conclusões mais contundentes, vamos averiguar mais algumas características conferidas aos direitos mais essenciais. Os Direitos Fundamentais também são

inalienáveis, uma vez que que não estão na esfera de disponibilidade do seu titular, que não

poderá negociar, transferir, “alugar” ou deixa outra pessoa se assenhorar do seu direito. Não é possível, assim, que uma determinada pessoa disponha, em um contrato, por exemplo, que seu direito à honra será transferido para o outro contratante, que poderá se apoderar desta honra de fulano e empreender o que quiser com esta grandeza moral do indivíduo.

São, ainda, imprescritíveis, já que o não exercício de um Direito Fundamental durante longo período não é causa para que esta seja extinta pelo não uso. Em outras palavras, mesmo que uma pessoa não empregue medidas para defender um direito fundamental seu violado, ele poderá a qualquer momento se valer da tutela estatal para essa proteção, mesmo que a situação de violação perdure por anos, décadas ou, quiçá, séculos.

Por fim, são irrenunciáveis, no sentido de que uma pessoa não pode voluntariamente se privar de um Direito Fundamental, renunciando a sua titularidade, rejeitando ou abandonando a proteção jurídica do valor guardado pelo direito essencial. Um jovem não pode, verbi gratia, apenas comparecer em um cartório e lavrar uma escritura pública informando em seu bojo que não quer mais ter o direito fundamental à integridade física e que a partir daquele dia qualquer outra pessoa poderá fazer o que quiser com o seu

2 Aqui uma “licença poética”. Não estou usando rigorosamente o sentido de fato social conforme empregado por certas correntes sociológicas.

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corpo, sem necessidade de autorização prévia. Na verdade, ele poderá até elaborar este documento com tal conteúdo, mas esta declaração não produzirá efeitos no mundo jurídico, pelo menos em relação ao seu direito fundamental à integridade física, que continuará tão incólume como antes.

Com estas novas informações, algumas discrepâncias entre a ideia de acesso à internet, um serviço prestado por empresas privadas, na maioria dos países, serviço pago, inclusive, e a de um direito inalienável, imprescritível e irrenunciável podem aparecer. Será que, buscando uma vida alternativa, a experiente empresária que resolve abrir mão do seu regrado cotidiano para viver aventuras em uma ilha do Atlântico, isolada, não estaria, efetivamente, abrindo mão de ter acesso à rede mundial de computadores, sem que isso mitigasse a sua condição de pessoa humana digna?

Fechamos esse tópico inicial com a certeza que os Direitos Fundamentais representem um grupo mínimos de faculdade e prerrogativas essenciais para a dignidade humana, sendo certo que todos os humanos (dentro de determinada sociedade) titularizam tais direitos, não sendo viável sua alienação, renúncia ou revogação. Não podemos, contudo, ainda, afirmar categoricamente que o acesso à internet é um direito fundamental.

Assim, ainda restam dúvidas. Para se aproximar de um desfecho para o nosso estudo, teremos que transitar por mais dois pontos: (i) os Direitos Fundamentais devem ser positivados; e, (ii) o que é o acesso à internet e se podemos considerar tal acesso um Direito Fundamental. Vamos prosseguir.

3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NECESSITAM DE POSITIVAÇÃO?

O questionamento atual é se os Direitos Fundamentais precisam ser positivados. Por positivação se entende a inclusão do “direito” em norma que esteja expressamente gravada no texto da Constituição da República Federativa do Brasil, seja desde o seu texto originalmente promulgado ou com a inclusão literal através de uma Emenda à Constituição. Em outras palavras, devemos entender os Direitos Fundamentais como aqueles que estão previstos na lei maior ou há outros direitos essenciais para além da literalidade do texto constitucional?

Caso se entenda que os Direitos Fundamentais reclamam a positivação, podemos inferir duas conclusões. A primeira conclusão é que nós temos um critério de reconhecimento de Direitos Fundamentais. É Direito Fundamental aquele que está expressamente previsto no texto constitucional como direito fundamental, de forma direta (dentro de um capítulo de

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direitos individuais, por exemplo) ou de forma indireta (dentro de um capítulo sobre o sistema tributário, verbi gratia, mas trazendo o conteúdo claro de um direito essencial).

A segunda conclusão é que nós sempre teremos um número fechado de Direitos Fundamentais, numerus clausus, sendo indevido o uso de métodos de interpretação extensiva, expansiva, elastecida ou o uso da analogia com a finalidade de entrever outros direitos essenciais além daqueles dispostos literalmente na Constituição.

Casos este critério de reconhecimento seja o vencedor, o nosso estudo já pode encontrar uma solução. Não há no texto constitucional norma expressa no sentido de que o acesso à internet, ou mesmo o acesso à tecnologia de comunicação, ou algo próximo, seja um direito individual, social ou mesmo relevante.

Logo, o acesso à internet não é um Direito Fundamental, caso adotada a tese acima. Poderá ser, contudo, caso haja a positivação, com a inclusão literal no rol de Direitos Fundamentais. Há, inclusive, Proposta de Emenda à Constituição tramitando no Congresso Nacional para acrescentar ao artigo 5º, da CF/88, o inciso LXXIX, com a seguinte redação: é

assegurado a todos o acesso universal à internet3. Caso esta PEC seja aprovada, promulgada

e publicada, o acesso à internet, que hoje não seria um Direito Fundamental, passaria a ser, por expressa previsão no texto constitucional.

A tese da positivação obrigatória, contudo, não parece ser uma resposta suficiente a ponto de fechar o ensaio e definir nossa resposta final. Sendo os Direitos Fundamentais históricos e universais, dependeriam de um procedimento formal para se tornarem realidade? Dependeriam de um procedimento submetido ao alvitre político e à burocracia do trâmite solene?

Não se deve desmerecer a positivação dos Direitos Fundamentais. O advento de Constituições escritas foi um grande passo democrático e para o Estado de Direito, já que a literalidade foi uma forma significativa de reconhecimento da existência de direitos essenciais aos seres humanos e ligadas intimamente a dignidade da pessoa humana.

A questão da positivação constitucional até mesmo serve para se distinguir tecnicamente os Direitos Fundamentais dos Direitos Humanos, predominando dentre os doutrinadores que estes são os direitos estabelecidos e positivados nos tratados internacionais, enquanto aqueles são os direitos consagrados e positivados nas Constituições dos Estados

3 PEC 185/2015, de autoria da Deputada Renata Abreu, apresentada em 17/12/2015 e desarquivada em 19/02/2019, para continuidade do seu trâmite.

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políticos. Reduzir os Direitos Fundamentais ao rol expresso em uma Constituição, não parece ser a resposta mais inatacável.

O que fazer diante, somente para ilustrar, de uma hipotética constituição que, por algum motivo banal, como um erro formal, deixou de arrolar em seu elenco de direitos essenciais ao ser humanos os mais básicos direitos individuais? Deve-se apenas considerar que tais direitos não existem naquele Estado, apenas para não mitigar a assertiva da positividade obrigatória?

Ao se determinar que é possível a existência de Direitos Fundamentais não diretamente positivados, todavia, deve-se estabelecer então qual seria a fonte de tais direitos ou pelo menos qual o critério a ser utilizado para descobrir quais são estes direitos.

A primeira investida é invocar o direito natural. Os professores franceses Francis Hamon, Michel Troper e Georges Burdeau assim conceituam o direito natural (2005, p. 17):

(...)seria um direito que não seria produzido pela vontade humana, mas imanente à sua natureza (de onde provém o nome direito natural) ou produzido pela vontade de Deus. O direito natural existiria antes do direito positivo e se situaria acima deste. (...) O conteúdo desse direito natural (o que se prescreve) é simplesmente a justiça: os homens devem produzir um direito positivo que faça a justiça.

O direito natural é considerado, por parcela relevante da doutrina, como o fundamento dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais. Ao determinar o que deve ser feito, o jusnaturalismo demonstra também quais são as normas fundamentais que obrigam os seres humanos, independentemente da vontade política na positivação destas regras e princípios naturais. Em outras palavras, o direito natural não somente indica quais normas devem ser positivadas, mas demonstram quais são as normas fundamentais, de forma que, mesmo diante da omissão de um Estado em realizar os trâmites necessários para a textualização de dispositivos, os valores do direito natural são obrigatórios e já vinculam a todos.

Por um lado, o direito natural dá uma solução para os Estados que, por “esquecimento” ou por “má-fé”, deixam de positivar as normas de Direitos Fundamentais, afirmando categoricamente que estes direitos essenciais existem independentemente da vontade política daquele corpo estatal e devem ser respeitados.

Por outro lado, o jusnaturalismo se baseia no valor da justiça. Tal valor é importantíssimo e central na vida e no desenvolvimento do ser humano (quem desejaria “injustiças” para o sua dia-a-dia?), mas é de uma indeterminação conceitual considerável.

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Afinal, o que é Justiça? Diversas correntes, que se intitulavam jusnaturalistas (ou que receberam essa alcunha de pesquisadores não contemporâneos) davam diferentes respostas no sentido de qual seria o método, técnica ou arte para descobrir o qual era o arcabouço do direito natural. Alguns doutrinadores se valiam da teologia, dos textos religiosos e da ideia de Deus. Outros lançavam mão de noções próprias de razão humana e de lógica mental para, a partir de um exercício dedutivo (ou talvez indutivo) concluir sobre quais seriam as normas essenciais e naturais ao ser humano.

Tal indeterminismo leva a um relativismo e a um conjunto tão sortido de ilações sobre o que seria natural e essencial que é muito comum notar que algumas inferências são completamente antagônicas e contraditórias. Um exemplo contemporâneo é se as cotas universitárias são justas ou não (recorde-se que o valor base do jusnaturalismo é a justiça). Dentro de uma mesma sociedade existirão diversos grupos (ao menos dois), razoavelmente homogêneos, com respostas contrastantes sobre tal questão. Provavelmente alguns irão concluir que as cotas atendem perfeitamente ao valor da isonomia, enquanto outros terão certeza subjetiva de que tal expediente, na verdade, viola qualquer valor de igualdade ou equidade.

Logo, a justiça como critério para reconhecer quais são as normas de direitos fundamentais (e quais direitos são fundamentais) traz um grau de relativismo e indecisão que podemos ao mesmo tempo dizer que o acesso à internet é um direito fundamental e que o acesso à internet não é um direito fundamental, ao “sabor do cliente”, variando a resposta segundo a convicção ou opinião particular do interlocutor sobre o que é justo.

Outra abordagem é a procura por direitos fundamentais atípicos em nosso próprio sistema constitucional, ou seja, de direitos fundamentais que existem, estão em nosso ordenamento, mas sem positivação expressa e literal. Em outras palavras, não vamos encontrar um dispositivo (artigo, inciso, parágrafo, alínea) com a nomenclatura direta da prerrogativa essencial, de forma que teremos que, a partir da hermenêutica, identificar (alguns mencionam um processo de construção, muito mais de do que de mero reconhecimento) quais são estes direitos fundamentais e de onde eles retiram a sua existência.

Uma forma de lidar com a questão é considerar que a Constituição teria cláusulas de abertura para o reconhecimento de direitos fundamentais além da lista positivada que se encontra em seu bojo. Tal cláusula partiria de uma norma positivada no texto constitucional, permitindo, através dos diversos exercícios hermenêuticos, a descoberta de direitos que

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decorrem destas normas, que são essenciais, necessários e compatíveis e harmonizados com os princípios, objetivos e institutos da nossa ordem constitucional.

É plausível imaginar que a norma da Dignidade da Pessoa Humana, os fundamentos da República Brasileira, os objetivos fundamentais e os princípios das relações internacionais, encontrados nos primeiros quatro artigos da Lei Maior, assim como a separação dos Poderes e forma federativa de Estado, são ótimos alicerces para o hermeneuta iniciar o seu trabalho de descobrimento.

Nossa opinião, todavia, é que tais institutos constitucionais, basilares, ainda contam com uma grande “porosidade”, podendo ter uma multiplicidade de intepretações e significações, o que não impede, mas talvez não seja a fórmula mais direta para identificar direitos que sejam universais, isto é, que sejam titularizados por todos e, assim, que encontre pelo menos algum nível de ampla concordância na doutrina e na jurisprudência.

Tais direitos fundamentais implícitos podem ser classificados como aqueles em

sentido estrito ou stricto sensu, uma vez que são direitos essenciais genuinamente não

literatizados no texto constitucional, dependendo da análise crítica do conjunto de intérpretes para serem consolidados. Eduardo Rodrigues dos Santos apresenta alguns exemplos de direitos fundamentais decorrentes dos princípios constitucionais (2017, p. 247):

A começarmos pelos direitos fundamentais atípicos stricto sensu à resistência e à desobediência civil, direitos da pessoa humana de opor-se à ilegalidade, à inconstitucionalidade, à arbitrariedade, à imoralidade e à injustiça cometidas por parte do Estado, pode-se dizer que se tratam de direitos de natureza cível-política que tem por objetivo maior assegurar ao homem o direito de não aceitar as imposições estatais, mesmo que estabelecidas por Lei, quando apresentarem-se em desconformidade com a ordem jurídica vigente, com a ordem moral da sociedade e com a justiça. Afinal, se o Estado é meio para a consecução dos fins humanos, não pode agir o Estado contrariamente a esses fins, não pode agira o Estado de modo opressor e violador dos direitos do homem ou contrário à justiça, à moral e à lei.

No exemplo, acreditamos que o autor mencionado ampara os direitos fundamentais à resistência e à desobediência na dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III, CF/88), na construção de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, inciso I, CF/88), na promoção do bem de todos (art. 3º, inciso IV, CF/88), dentre outros fundamentos e objetivos.

Da mesma forma, a fim de desvendar o objeto principal do presente ensaio, é bem razoável definir que haveria um direito fundamental à internet, atípico de forma estrita, já que é patente que, por exemplo, que um aluno do ensino básico teria sua dignidade abalada caso não pudesse estudar devido à ausência do acesso à rede mundial de computadores no seu domicílio.

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De igual forma, o exercício da cidadania (art. 1º, inciso II, CF/88) depende da internet para ser efetivada, ainda mais tendo em vista que uma elevada parcela dos serviços eleitorais depende da internet para seu funcionamento. O desenvolvimento nacional (art. 3º, inciso II, CF/88) também depende dos avanços tecnológicos da comunicação computacional para ser observador na realidade.

Será que já temos a resposta? Seria o acesso à internet um direito fundamental atípico stricto sensu? Apesar de ser uma hipótese imaginável, acreditamos que há aqui complicação semelhante com a hipótese do direito natural.

Os fundamentos da República Federativa Brasileira (art. 1º, CF/88), os objetivos fundamentais (art. 3º) e os demais institutos, como a forma Federativa de Estado (art. 1º,

caput, Cf/88), e a livre iniciativa, dentre outros, trazem uma norma aberta, constando de

valores que são relevantes, mas que não são objetivos e de cognição unânime para os juristas e demais sujeitos alcançados pela norma.

Na verdade, os preceitos e princípios cardeais de nossa Constituição, como já demonstrado por diversas vezes, estão de tal forma dispostos que aceitam, inclusive, interpretações discrepantes sobre a mesma norma. A dignidade da pessoa humana pode ser tanto alicerce para uma tese de abolição das formas de prisão (uma vez que a pena de privação de liberdade pode atentar contra a dignidade do preso) como base para um movimento de “fortificação” das penas aplicadas (tendo em vista proteger a dignidade das possíveis vítimas de um ato criminoso grave).

O próprio exemplo trazido do direito fundamental à desobediência civil serve para demonstrar o grau de subjetivismo e indeterminismo. Será que respaldar a causa de pedir de uma petição de Mandado de Segurança preventivo em tal direito fundamental atípico trará grandes probabilidade de uma concessão de ordem de segurança para o impetrante? Os magistrados, diante do pedido de afastamento de uma obrigação legal com base tão somente neste direito fundamental atípico, irão reconhecer a sua existência e efetividade de forma unânime ou, ao menos, amplamente majoritária?

Desta forma, acreditamos que fundar o direito ao acesso à internet apenas em tais fundamentos, objetivos, princípios e institutos basilares não será uma resposta tão coesa, já que praticamente qualquer defesa de essencialidade de um direito ou interesse pode ser levemente alicerçado em tais normas basilares.

Uma outra forma de se conceber direitos fundamentais atípicos, não obstante, é concluir que existem direitos fundamentais que são tácitos, ou seja, que não estão expressos

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no texto constitucional, mas que decorrer e derivam de normas constitucionais expressas. Estes são os direitos fundamentais implícitos.

Uma das principais formas de direitos fundamentais implícitos são aqueles que decorrem dos direitos fundamentais explícitos, ou seja, que aqueles que estão contidos nestes; que são aspectos de um determinado direito fundamental expressamente previsto na Constituição. Do direito individual fundamental à liberdade, por exemplo, constante no caput do celebrado artigo 5º da Lei Maior, é possível extrair, como um de suas facetas, o direito fundamental à autonomia privada nos negócios jurídicos, assim com a liberdade contratual e a liberdade de contratar. Não há como se manter uma sociedade baseadas em contratos (os seres humanos ajustam contratos, e se submetem aos contratos já pactuados, todos os dias, do momento que acordam até o momento que vão dormir), em que a liberdade é uma prerrogativa essencial, sem extrair que uma das formas de ser garantir a liberdade é permitir a autodeterminação dos sujeitos nos negócios que realizam.

Igualmente, os processualistas fundam o direito fundamental implícito ao duplo grau de jurisdição nos direitos fundamentais expressos do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, no acesso à Justiça e, ainda, na organização do Poder Judiciário em diversas instâncias.

Seria o direito fundamental ao acesso à internet um direito fundamental atípico implícito? É possível asseverar que o direito à internet é uma faceta do direito à educação, uma vez que hoje o recurso da pesquisa na rede mundial, assim como as aulas e encontros no ambiente virtual se tornam cada vez mais precípuos. Da mesma forma, o acesso à internet poderia ser uma característica dos direitos fundamentais políticos, já que a cidadania, ainda mais em relação à informação sobre candidatos e governos e a fiscalização do Poder se torna quase que impossível sem a rede internacional de computadores.

O direito fundamental à livre manifestação do pensamento, no século XXI, é realizado prioritariamente com a internet. O advento dos processos judiciais eletrônicos, cujos atos dependem do acesso à rede mundial de computadores, demonstram que o aceso à justiça, hodiernamente, exige uma conexão de banda larga. O direito à petição caminha cada vez mais para se tornar um direito eletrônico de petição, uma vez que a quase totalidade dos órgãos públicos caminham para a informatização dos seus sistemas de recepção de protocolos. Há muitos outros exemplos no mesmo diapasão que deixaremos para a imaginação do leitor.

Seria, portanto o acesso à internet um direito fundamental implícito, decorrente de outro direito fundamental explícito? Seria o direito ao acesso à internet um aspecto de todos

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esses demais direitos essenciais (educação, políticos, acesso à justiça, petição, livre manifestação, etc.)? Uma análise mais detida traz uma indagação: O acesso à internet é indispensável para a realização de diversos direitos fundamentais expressos. Isso significaria, portanto, que o acesso à internet é atributo das estruturas e do núcleo essencial destes direitos fundamentais?

Para subsidiar ainda mais a indagação, devemos recordar que não é tão comum a doutrina (e a jurisprudência) aceitarem de forma firme a existência de um direito fundamental atípico implícito. O professor Eduardo Rodrigues dos Santos (2017, p. 229) afirma que há dificuldade na tarefa “de identificação dos direitos fundamentais atípico implícitos, sendo poucos os seus exemplos na literatura jurídica, mormente encontrados em manuais e comentários à Constituição, na maioria das vezes, em comentários a Constituições pretéritas”.

Estamos diante, portanto, de duas agruras para definir o direito ao acesso à internet como direito fundamental atípico implícito. Em primeiro lugar, porque não é tão claro de qual direito ou norma expressa o direito ao acesso à internet decorre. Aparentemente de diversas normas expressas. Seria assim um direito fundamental tão substancial que participa de todos os demais direitos fundamentais?

Em segundo lugar, não nos parece que os hermeneutas do nosso sistema jurídico são adeptos da fixação de direitos fundamentais implícitos. Como já dito alhures, direitos não positivados necessitam do reconhecimento de parcela considerável da doutrina, da jurisprudência e dos demais atores da dinâmica jurídica para ter efetividade prática e ser corroborada como uma norma pertencente ao nosso ordenamento.

Não obstante todas as dúvidas que ainda não foram definitivamente solucionadas, já há um arcabouço teórico satisfatório para oferecer uma proposta de resposta para o questionamento central de nosso estudo.

4 O ACESSO À INTERNET É UM DIREITO FUNDAMENTAL?

Iniciaremos com a hipótese mais simples, envolvendo a ideia de que um direito fundamental deve ser positivado na Constituição para assim ter este status. Neste caso, como já asseveramos anteriormente, não há dispositivo constitucional que literalmente e expressamente retrate o direito cuja existência perquirimos. Logo, a resposta para a questão central do ensaio seria negativa, no sentido de que não há direito essencial ao acesso à internet em nosso sistema jurídico. No mesmo diapasão, é possível entender que basta a simples

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inclusão, a partir de uma emenda constitucional, no texto da Lei Maior, para que o direito ao acesso à internet seja reconhecido como existente.

Mas, ao se admitir a possibilidade de direitos fundamentais não positivados, é possível reconhecer, mesmo sem um dispositivo explícito, o acesso à internet como direito fundamental? Na verdade, as teorias que trazem em seu bojo a possibilidade de direitos fundamentais implícitos, decorrentes ou derivados parecem fazer sentido e até serem aceitas sem maiores sequelas, uma vez que doutrinadores, juristas e atores jurídicos, vez ou outra, invocam direitos essenciais a despeito de dispositivo literal que fundamente a sua existência. Ao se aceitar a existência de direitos fundamentais não positivamos, podemos incluir o direito ao acesso à internet nesse rol?

A análise realizada anteriormente será útil para compor a nossa resposta. Como vimos, o uso da internet hoje em dia é algo corriqueiro e necessário para a vida de todas as pessoas. É cada vez mais difícil conceber uma existência sem o uso da rede mundial de computadores, uma vez que usamos tal tecnologia para negociar, para estudar, para conviver e se comunicar, para ter acesso à informação, para manifestar não apenas opiniões, mas até a própria vontade, sendo certo que hoje muitos atos jurídicos são realizados totalmente em meio digital.

Não é difícil imaginar que uma pessoa que não tenha acesso à internet terá um abalo em sua dignidade, inclusive impedindo que tal sujeito realize muitos dos atos comum da vida cotidiana, impossibilitando que ele desenvolva aptidões, exerça, por exemplo, seus direitos políticos e até mesmo tenha acesso à informação e à educação. Esta pessoa, alijada do mundo virtual contra a sua vontade, estaria em condição inferior ao demais indivíduos da sociedade, de forma que há uma clara quebra da isonomia e do direito à igualdade.

Vislumbra-se, assim, que o acesso à internet é hoje uma premência crucial na vida de qualquer pessoa, uma vez que é ferramenta imprescindível para que muitos direitos fundamentais pessoais ou sociais sejam satisfeitos e tenham seu núcleo cumprido. Ocorre que não podemos confundir o acesso à internet com os direitos fundamentais que ele protege, promove e propicia.

Os direitos fundamentais trazem valores, axiomas, padrões essenciais que, por serem fundamentais e inescapáveis da natureza de uma vida humana digna, devem ser preservados. Assim, o conteúdo dos direitos fundamentais são características elementares da natureza humana, como a vida, a saúde, a liberdade, a segurança, a honra, a imagem, a participação na

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política, a educação, o exercício de uma profissão e uma função na vida, a felicidade, a família.

O acesso à internet, por si só, não é um valor essencial da natureza humana. O acesso à rede de computadores, isoladamente, não é um valor ou um axioma de existência e por isso não pode ser considerado o conteúdo de um direito fundamental. O que pode causar espanto, contudo, é que esse ensaio, assim como a experiência vivida pelo próprio leitor, demonstra que não há vida digna sem o acesso à internet. Como é possível concluir que algo que é necessário não pode ser um direito fundamental?

Apesar de imprescindível para a vida contemporânea, o acesso à rede mundial de computadores não pode ser o conteúdo de um direito fundamental, repise-se, devido ao fato de não ser um valor essencial à natureza humana. Não é um valor, mas sim um instrumento!

Por este motivo, por ser um instrumento essencial na vida hodierna, que anteriormente, neste ensaio, ocorreu a confusão entre o acesso à internet e uma série de direitos fundamentais positivados. Na ocasião, foi aventada a hipótese de que o uso da internet seria uma faceta ou um aspecto desses direitos fundamentais. Na verdade, a internet não faz parte do núcleo essencial do direito à educação, dos direitos políticos, do direito à livre manifestação do pensamento, dentre outros.

Ocorre que a rede mundial de computadores, e todas as tecnologias atuais de comunicação eletrônica, são os instrumentos, dentre os mais efetivos e robustos, para a promoção, cumprimento e salvaguarda da maioria dos conteúdos dos direitos fundamentais no momento contemporâneo. O uso da internet, por exemplo, nesta toada, não é o direito à educação, mas sim um meio de realizar tal direito essencial.

Entretanto, o acesso e o uso da internet não se tornaram tão essenciais e universais que poderiam (ou deveriam) se tornar um direito fundamental? A resposta é negativa, porque, insistimos, a internet é um instrumento, uma ferramenta, não um valor essencial da natureza e da existência humana. Como uma ferramenta tecnológica, certamente a internet será substituída, talvez em um futuro nem tão remoto, por outra tecnologia que sequer podemos conceber com nossos conhecimentos atuais. Como toda tecnologia, ficará obsoleta e será substituída.

Podemos falar de instrumentos e ferramentas que ficam obsoletas, mas nunca poderemos falar de valores essenciais à natureza humana que serão apenas superados. Um exemplo são os direitos de primeira geração ou dimensão. Apesar da maioria dos doutrinadores apontarem que historicamente os direitos individuais foram os primeiros

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direitos fundamentais conquistados e reconhecidos, eles não se encontram atualmente revogados ou obsoletos, sendo que, inclusive são essenciais para o Estado Democrático de Direito contemporâneo.

Observa-se que, durante nossa história, diversas tecnologias foram essenciais para a proteção e promoção do conteúdo de direitos fundamentais. Assim como a internet atualmente é vital para a educação, para a comunicação e para a exposição do pensamento individual, o modelo de prensa de tipos móveis de Gutenberg foi crucial para a circulação e preservação das informações e da história por séculos, mas é tecnologia que aos poucos tem se tornado parte do passado, sendo que não há motivo para pensar que durante muitos anos existiu um “direito fundamental ao livro”, que se encontra em processo de extinção ou revogação. O livro foi (e ainda o é) um instrumento essencial para o direito à educação, assim como o acesso à internet vem se tornando.

Por outro lado, ainda dentro da ideia de que a internet é uma tecnologia, um instrumento, não é possível tratar o acesso à rede mundial de computadores como conteúdo de um direito fundamental por sua natureza indiferente. Da mesma maneira que o uso da rede mundial de computadores pode se dar na efetivação de um direito fundamental (educação, lazer, manifestação livre do pensamento), ele também pode ser realizado sem intuito nenhum ou até mesmo para a prática de crimes e demais atos ilícitos. Por ser apenas um recurso amoral, não há conteúdo valorativo.

Desta forma, a nossa resposta para a indagação central do ensaio é negativa. O acesso à internet não é um direito fundamental. Todavia, como já repetido de forma quase exaustiva, é um instrumento essencial para que um grande número de direitos fundamentais (quiçá, quase todos) sejam efetivados, observados e satisfeitos. Desta forma, apesar de ser mero apetrecho, o acesso à internet deve ser protegido e tutelado pelo ordenamento jurídico dentro das medidas de defesa dos direitos fundamentais. Ao ocorrer o amparo de uma prerrogativa essencial, de forma judicial ou extrajudicial, a ferramenta que garante o direito fundamental deve ser protegida igualmente, uma vez que é o meio pelo qual se propicia o fim, qual seja a realização do conteúdo essencial.

O acesso à internet, portanto, deve ser protegido e garantido, não como um fim em si mesmo, mas como forma de resguardar o conteúdo do direito à educação, à livre manifestação, à informação, ao acesso à justiça, à participação na vida política e todos os demais direitos fundamentais, positivados ou não positivados.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O acesso à internet não pode ser considerado um direito fundamental. A conexão com a rede mundial de computadores é essencial para a vida de todos, isso é indubitável, mas o acesso à internet não é um valor ou um axioma ligado à existência humana, e por isso não deve ser elevado ao status de um direito fundamental, pois, na verdade é apenas um instrumento ou um aparato que, bem utilizado, salvaguarda a existência e efetividade do conteúdo de direitos fundamentais.

Desta forma, como instrumento, o acesso à rede mundial de computadores é essencial para o cumprimento e realização do contido no direito à educação, no direito ao acesso à justiça, no direito à livre manifestação do pensamento, no direito à informação, no direito à petição, nos direitos políticos e diversos outros direitos subjetivos considerados como fundamentais em nosso ordenamento e sistema jurídico.

Concluímos, portanto, que apesar de não poder ser classificado como um direito fundamental, a proteção do acesso à internet pelo ordenamento jurídico deve ser feita de forma preponderante, uma vez que é o meio pelo qual diversos direitos essenciais são concretizados no dia a dia das pessoas.

Assim como as imagens da incineração dos livros em regimes políticos passados são utilizadas para a comprovação do teor ditatorial daqueles governos, uma vez que tais imagens eram muito mais do que apenas a gravura de papel sendo queimado, mas sim o retrato da opressão sobre diversos direitos, com a educação e a liberdade de expressão, a internet deve ser vista como um instrumento que não pode ser negado, sob pena do mesmo retrato, de mitigação ou eliminação de direitos fundamentais, ser reproduzido nas sociedades contemporâneas.

6 REFERÊNCIAS

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NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2017. 928p.

SANTOS, Eduardo Rodrigues dos. Direitos fundamentais atípicos. Salvador: JusPodivm, 2017. 320p.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 34ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. 928p.

SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: Conteúdo essencial, restrições e

Referências

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