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O PAPEL DOS MORFEMAS NO BLOQUEIO OU ALÇAMENTO DAS VOGAIS MÉDIAS

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Academic year: 2021

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O PAPEL DOS MORFEMAS NO BLOQUEIO OU

ALÇAMENTO DAS VOGAIS MÉDIAS

Juliana Camargo Zani – USP

Introdução

O objetivo do presente trabalho é verificar o papel do morfema no bloqueio e/ou alçamento

das vogais médias no português brasileiro. Para testar a presente hipótese, será utilizada a teoria

proposta por Lee(1995), que classifica os morfemas derivacionais em dois níveis lexicais.

Câmara Jr. (1970) descreve o sistema vocálico do português brasileiro como um sistema

com sete vogais em posição tônica (a, ɛ, e, i, ɔ, o, u) que se reduz a cinco vogais em posição

pré-tônica (a, e, i, o, u). Esta redução ocorre devido à perda do traço que distingue entre si as vogais

médias. Tal processo de perda de traços distintivos e, por conseguinte, a “elevação” da vogal média,

foi chamada por Câmara Jr. (1970) de neutralização.

A neutralização é um processo extremamente produtivo na língua, porém, existem casos em

que o sistema proposto por Câmara Jr. (1970) não ocorre. Os casos analisados são derivações nas

quais a vogal média baixa não é alçada a vogal média alta, mesmo em posição átona, como em (1):

1- a) caf[ɛ] - caf[ɛ]zinho

b) forr[ɔ] - forr[ɔ]zão

*forr[o]zão

c) mulh[ɛ]r - mulh[ɛ]rzona *mulh[e]rzona

Uma análise feita por Lee (1995) do português brasileiro propõe que o alçamento é

bloqueado quando na palavra derivada é acrescentado um morfema, pelo autor denominado de

formação produtiva, tal como o morfema de diminutivo [(caf[ɛ] - caf[ɛ]zinho)].

Essa explicação esclarece o que ocorre no exemplo (1a), porém não esclarece o que ocorre

no exemplo (1b). O autor propõe que há duas categorias de sufixos derivacionais na língua: a

primeira são os sufixos denominados por ele de sufixos de nível α, tal como os sufixos aria},

{-eiro}, {-eza}, {-ário} entre outros. Outra categoria proposta pelo autor são os sufixos de nível β, as

chamadas formações produtivas. Dentre sufixos denominados de formação produtiva, estão os

sufixos {-mente}, {-íssimo}, {-inho} e {-zinho}.

Segundo o autor, apenas os sufixos de nível β bloqueiam a neutralização vocálica das

vogais médias em posição átona, tal como demonstra o exemplo (2):

2- a) b[ɛ]la - b[ɛ]lamente

b)b[ɛ]lo - b[ɛ]líssimo

c) f[ɛ]sta -f[ɛ]stinha

d) forr[ɔ] - forr[ɔ]zinho

Diante da classificação apresentada por Lee (1995) serão verificadas as seguintes

hipóteses:

i)

O tipo de morfema acrescentado na derivação bloqueia ou permite o alçamento

vocálico?

(2)

ii)

Comparando-se os morfemas, há algum tipo de morfema que indique um resultado

maior?

iii)

Há alguma diferença quantitativa na porcentagem de bloqueio do alçamento

vocálico entre os sufixos de diminutivo?

Metodologia

Para testar as hipóteses foram gravados 112 substantivos derivados, por 20 informantes,

totalizando 2.240 palavras. Todos os informantes curvavam o ensino superior e a possuíam a faixa

etária de 20 anos.

O critério para a montagem do experimento foi derivar palavras que possuíam vogais

médio-baixas na raiz com sufixos classificados por Lee (1995) como sufixos de nível α e de nível β.

Neste experimento foram testados apenas os sufixos β {-inho} e {-zinho} já que foi restringida a

classe de palavras e sufixos testados: apenas palavras substantivas e sufixos que derivassem

substantivos criando substantivos. As palavras foram apresentadas isoladamente, em uma

apresentação montada no Power Point, a montagem do experimento consistiu na combinação de

palavras alvo e distratoras e os informantes tinham como tarefa lê-las da forma mais natural

possível, sem indicação ou avaliação de pronúncias corretas ou não.

Entre as palavras alvo do experimento foram inseridas palavras distratoras, algumas dessas

possuíam vogais médio-altas, tal como bebê e bolo, já outras palavras foram escolhidas de forma

aleatória, tal como cabelo e rato.

Resultados e Discussão

O primeiro resultado a ser mostrado é da comparação do que ocorre com bloqueio e

alçamento nos contextos em que ocorrem sufixos

α e β.

Os dados obtidos no experimento estão abaixo na Tabela 1:

Sufixos

Bloqueio

Alçamento

Total

42% (508)

58% (692)

1200(60*20)

79%(524)

21% (136)

660 (33*20)

Tabela 1: Comparação entre as porcentagens de bloqueio e alçamento nos sufixos α e β

Como é possível observar, os dados obtidos corroboram a teoria de Lee (1995), que propõe

que os sufixos chamados por ele de “formação produtiva” possuem a propriedade de bloquear o

alçamento vocálico das vogais médio-baixas, uma vez que podemos perceber, neste contexto

ocorreu 79% de bloqueio (cf. 3 a e b). No entanto, os resultados indicam que a aplicação desta

propriedade não ocorre em todos os casos já que ocorreu 21% de alçamento nestes contextos (cf. 3 c

e d).

3- a) f[ɛ]sta -f[ɛ]stinha

b) b[ɔ]la -b[ɔ]linha

c) alg[ɔ]z - alg[o]zinho

d) chancel[ɛ]r – chancel[e]r

Os exemplos 3 c e d) foram obtidos na produção de alguns informantes.

O que também chama a atenção nestes dados são os resultados obtidos nos contextos em

que ocorrem os sufixos α. Nestes contextos, a previsão seria a aplicação do processo de alçamento

(3)

em todos os contextos, ou uma diferença grande entre porcentagem de alçamento e bloqueio em

prol do alçamento vocálico. Porém, os resultados indicam uma diferença de apenas 12% entre a

aplicação dos dois processos, apesar da previsão de uma porcentagem maior de alçamento ser

obtida. Nos exemplos 4) abaixo estão alguns dados obtidos neste contexto:

4- a)forr[ɔ] -a)forr[ɔ]zão

b) abric[ɔ] – abric[o]teiro

c) caf[ɛ] -caf[ɛ]zão

d) s[ɛ]la – s[e]lim

Estes valores podem indicar que ou a aplicação destes processos é feita de maneira aleatória

neste contexto, ou que existe algum tipo de sufixo classificado como sufixo α que influencia neste

resultado.

Analisando mais detalhadamente os sufixos α, obtém-se os seguintes resultados:

Sufixos

Bloqueio

Alçamento

Total

-ÃO/ -ZÃO/-ONA /-ZONA

70%(477)

30% (203)

680 (34*20)

-EIRO/-EIRA

0,6% (1)

99,4%(159)

160 (8*20)

-IA/ -ARIA

1,6% (1)

98,4% (59)

60 (3*20)

-ADA

4%(3)

96%(77)

80 (4*20)

-IM/-ETA/-ILHA

20% (20)

80% (80)

100(5*20)

-ENTO

0% (0)

100% (20)

20 (1*20)

-AGEM/URA

0% (0)

100% (60)

60 (3*20)

Tabela 2: Porcentagem de bloqueio e alçamento dos sufixos α.

Os resultados da tabela acima descartam a possibilidade de aplicação dos processos de

alçamento e bloqueio nas vogais médio-baixas de forma aleatória, já que a maioria dos sufixos

possui uma grande porcentagem de alçamento, alguns obtendo uma porcentagem de 100% deste

processo.

Contudo a segunda possibilidade, a existência de algum sufixo de influencie no resultado, é

comprovada. Se for observado o comportamento dos sufixos aumentativos, pode-se afirmar que

estes apresentam uma tendência contrária à tendência esperada pelos sufixos classificados como α.

Nos sufixos aumentativos ocorrem 70% de bloqueio enquanto em outros contextos, como com os

sufixos {-agem} e {-ura} a porcentagem de alçamento chega a 100%. Se forem comparados os

resultados dos sufixos de nível β, com os resultados obtidos com os sufixos de aumentativo,

observa-se uma semelhança entre as porcentagens e as tendências.

Uma questão que emerge diante destes resultados é se há, dentro da classe dos sufixos

aumentativos, algum sufixo que exerça a influência nos resultados totais ou se esta tendência é

apresentada por todos os sufixos.

Analisando mais detalhadamente os sufixos aumentativos, têm-se os seguintes dados:

(4)

-ZÃO

77% (124)

23% (36)

160(8*20)

-ÃO

60% (109)

40% (71)

180(9*20)

-ZONA

95%(38)

5% (02)

40 (2*20)

-ONA

69% (206)

31% (94)

300(15*20)

Tabela 3: Porcentagem de bloqueio e alçamento dos sufixos aumentativos

Os dados da tabela acima indicam que o comportamento de bloquear o alçamento das

vogais médio-baixas ocorre em todos os sufixos. As porcentagens de bloqueio variaram entre 60% e

95%, porém este comportamento é mais acentuado nos sufixos iniciados por /z/ ({-zão} e {-zona}),

chegando o sufixo {-zona} obter 95% de bloqueio.

De acordo com os dados observados, os sufixos aumentativos possuem características

extremamente semelhantes as características apontadas por Lee (1995) dos sufixos chamados de

“formação produtiva”, contudo convém analisar mais detalhadamente o comportamento dos sufixos

β para poder realizar esta comparação.

Analisando detalhadamente os sufixos β obtêm-se os seguintes resultados:

Sufixos

Bloqueio

Alçamento

Total

-ZINHO

77% (231)

23% (69)

300 (15*20)

-INHO

81% (293)

19% (67)

360 (18*20)

Tabela 4: Porcentagem de bloqueio e alçamento dos sufixos diminutivos

Os resultados indicam que ambos os sufixos diminutivos apresentam uma forte tendência a

realizar o bloqueio do alçamento vocálico, porém, ao contrário dos resultados apresentados nos

dados dos sufixos aumentativos, a tendência de bloqueio se mostra mais acentuada com o sufixo

{-inho}.

Comparando os dados da Tabela 3 e 4, observa-se que todos os sufixos possuem a tendência

de bloquear o alçamento vocálico das vogais médio-baixas. As porcentagens de alçamento variaram

entre 60% e 95%. As tendências são mais acentuadas nos resultados com os morfemas inho},

{-zão} e {-zona}. Deve ser ressaltado que, apesar da semelhança de comportamento entre os sufixos

aumentativos, classificados como sufixos α, e os sufixos diminutivos, classificados como sufixos β,

não se pode afirmar que ambos pertencem à mesma classe, já que Lee (1995), em sua proposta

sobre os sufixos derivacionais de nível β, apresentou uma lista de características que justificam a

criação de uma classe de sufixos derivacionais em outro nível lexical, sendo que o bloqueio do

alçamento vocálico é apenas uma das características.

Considerações Finais

Os resultados obtidos no experimento indicam que o tipo de morfema acrescentado na

derivação influencia na ocorrência do bloqueio ou alçamento vocálico. Como foi visto, na maioria

dos contextos com sufixos α, ocorre o alçamento das vogais médio-baixas. Já com a maioria dos

sufixos β, ocorre o bloqueio do alçamento das vogais médio-baixas. Também foi observado que os

morfemas de aumentativo, classificados como morfemas α, possuem a propriedade de bloquear o

alçamento vocálico, tal como os sufixos de diminutivo.

Analisando mais detalhadamente os morfemas, foi visto que entre os sufixos de diminutivo

e aumentativo, existem alguns que possuem uma tendência mais acentuada de bloquear o alçamento

vocálico. Estes sufixos são os {-inho}, {-zão} e {-zona}.

Enfim, os resultados corroboram com a proposta de Lee (1995), demonstrando que, de

acordo com a classificação feita pelo autor, as formações produtivas bloqueiam a neutralização

vocálica no dialeto da cidade de São Paulo. A pesquisa demonstrou que o comportamento dos

(5)

sufixos indicadores de aumentativo é semelhante aos sufixos de diminutivo, um fato novo para esta

proposta.

Referências

Mattoso Câmara Jr., J. (1987) Estrutura da Língua Portuguesa.Petrópolis: Vozes.

Lee, S. (1995). Morfologia e fonologia lexical do português do Brasil . Tese de

doutoramento. Campinas: Unicamp.

Referências

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