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A crise no sistema carcerário brasileiro e a audiência de custódia como condição de possibilidade para a sua superação

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RIO GRANDE DO SUL

PATRÍCIA CRISTIANE BALLUS REKZIEGEL

A CRISE NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA A SUA SUPERAÇÃO

Santa Rosa (RS) 2019

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PATRÍCIA CRISTIANE BALLUS REKZIEGEL

A CRISE NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA A SUA SUPERAÇÃO

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS- Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: Dr. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth

Santa Rosa (RS) 2019

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Dedico este trabalho à minha família, principalmente meu filho Mateus e meu marido Raul pelo incentivo, apoio e compreensão pelos momentos em que dediquei atenção a este trabalho.

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AGRADECIMENTOS

À minha família, que inclui meus pais, irmão e irmã, mas principalmente ao meu marido Raul e ao meu filho Mateus, que sempre estiveram presentes, me apoiando e incentivando nos momentos mais difíceis e sendo referência de base para eu seguir firme e forte em busca de meus objetivos.

Ao meu orientador Maiquel, com quem eu tive o privilégio de conviver e ter um enorme aprendizado, tendo uma oportunidade de ver o mundo de uma outra maneira e sempre pude contar com sua dedicação, disponibilidade e seu enorme conhecimento.

Aos meus amigos e colegas, que como eu sabem a dificuldade e dedicação que este trabalho exige e sempre me apoiaram e incentivaram.

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“Ninguém conhece realmente uma nação até estar atrás das grades. Uma nação não deveria ser julgada pelo modo como trata os seus melhores cidadãos, mas sim como trata os piores”. Nelson Mandela

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise da crise do sistema carcerário brasileiro, a fim de propiciar uma investigação em busca da construção de alternativas à possibilidade de melhoria das condições do cárcere brasileiro contemporâneo a partir da realização das audiências de custódia. Estuda em que medida a realização das audiências de custódia podem contribuir para a melhoria das condições de vida em face da crise pela qual passa o sistema carcerário brasileiro na contemporaneidade e analisa o quadro de dificuldade vivenciada na contemporaneidade pelo sistema carcerário brasileiro, buscando compreender suas principais causas. Finaliza abordando a possibilidade de melhoria das condições de vida no cárcere brasileiro a partir da realização das audiências de custódia.

Palavras-Chave: Crise do sistema carcerário. Audiência de Custódia. Humanização do cárcere.

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ABSTRACT

The present conclusion work makes an analysis of the Brazilian prison system crisis, in order to provide an investigation seeking construction alternatives to the possibility of improving the Brazilian prison contemporary conditions through custody holding hearings. It studies the extent to which custody hearings can contribute to the living conditions improvement in the face of the crisis experienced by the Brazilian prison system in contemporary times and analyzes the difficulty situation experienced in the contemporary world by the Brazilian prison system, seeking to understand its main causes. It concludes by addressing the improving the Brazilian jail conditions possibility life from the accomplishment of custody hearings.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 A CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO: O DESCOMPASSO ENTRE A NORMATIZAÇÃO E A REALIDADE NO CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO BRASIL ... 10 1.1 A realidade do sistema carcerário brasileiro ... 10 1.2 O direito humano ao cumprimento de pena em estabelecimento adequado ... 18 1.3 A Lei de Execuções Penais, Código Penal e Constituição da República Federativa do Brasil e o respeito a direitos e as garantias fundamentais. ... 20

2 AS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA A MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE VIDA NO CÁRCERE BRASILEIRO .. 25 2.1 As audiências de custódia e sua definição normativa no Brasil ... 25 2.2 A resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça e o impacto da realização das audiências de custódia ... 30 2.3 A audiência de custódia como condição de possibilidade para a humanização do cárcere... 36

CONCLUSÃO ... 44

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca do sistema carcerário brasileiro, a fim de efetuar uma investigação em busca da construção de alternativas na melhoria das condições do atual cárcere brasileiro, principalmente a implementação das audiências de custódia como uma garantia de melhoria das condições de vida no cárcere, de uma forma mais humana.

Esse estudo é necessário face à crise em que se encontra o sistema carcerário brasileiro, com uma população carcerária cada vez maior, com unidades prisionais sem instalações adequadas, e garantias de dignidade à pessoa presa, sem contar o crescente número de pessoas presas provisoriamente, que poderiam estar respondendo à um processo crime em liberdade.

Para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, tudo com o intuito de coletar várias informações e permitir um aprofundamento no estudo do cárcere brasileiro, o atual sistema penal e as audiências de custódia, em busca de mostrar a importância das medidas alternativas a crise do sistema carcerário e indicar novas possibilidades para a solução desse problema.

Primeiramente, no primeiro capítulo, foi feita uma abordagem do sistema penitenciário brasileiro contemporâneo, através de uma análise da atual realidade do deste, de que forma é aplicado o direito humano ao cumprimento de pena em estabelecimento adequado e a contribuição da Lei de Execuções Penais, Código Penal e Constituição da República Federativa do Brasil e no respeito a direitos e as garantias fundamentais da pessoa presa.

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No segundo capítulo é analisado o contexto da crise no cárcere brasileiro e a audiência de custódia como condição de possibilidade para a sua superação e também a melhoria das condições de vida no cárcere brasileiro. Também é feito estudo da definição normativa das audiências de custódia na legislação brasileira e a importância da resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça e o impacto da realização das audiências de custódia.

A partir desse estudo se verifica as causas da crise do sistema penitenciário brasileiro e que as audiências de custódia contribuem de forma significativa para a melhoria das más condições do sistema carcerário, no qual presos convivem diariamente.

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1 A CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO: O DESCOMPASSO ENTRE A NORMATIZAÇÃO E A REALIDADE NO CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE NO BRASIL

O atual sistema penitenciário do Brasil está repleto de problemas e enfrentando uma grande crise. Entre os diversos problemas está a superlotação, a falta de estrutura adequada, cumprimento de pena desumano pelo qual os presos passam e uma grande onda de rebeliões destes. O Estado está enfrentando dificuldades para conseguir amenizar essa crise.

Uma das maiores conquistas da humanidade foi a garantia dos direitos humanos e na Constituição Federal tem-se o princípio da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental do Estado democrático de direito. Infelizmente isso não é visto no atual sistema carcerário brasileiro.

Além da Constituição Federal, a Lei de Execução Penal e o Código Penal regulam o que estiver relacionado com penas e cumprimento de penas. O Estado é obrigado a seguir essas normatizações para proporcionar aos apenados um cumprimento digno da pena, com locais apropriados tanto para os presos como para as pessoas que ali trabalham.

Conforme essas primeiras colocações, esclarece-se que o presente capítulo tem por objetivo analisar a realidade do cárcere brasileiro, fazendo uma análise da Constituição Federal e demais legislações para averiguar como se dá o cumprimento das penas nesses estabelecimentos e se são respeitados os direitos humanos dos presos.

1.1 A realidade do sistema carcerário brasileiro

Falar sobre o sistema penitenciário leva a refletir sobre o que é esse sistema, quando surgiu, se é eficaz e se cumpre com a sua finalidade. O sistema penitenciário tem o propósito de local para cumprimento de pena a que foi imposta a

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algum indivíduo. A Lei de Execuções Penais nº 7.210 (BRASIL, 1984) traz em seu art. 1º: “a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.

Nas palavras de Renato Marcão (2009, p. 31):

Como atividade complexa que é, em todos os sentidos, a execução penal pressupõe um conjunto de deveres e direitos envolvendo o Estado e o condenado, de tal sorte que, além das obrigações legais inerentes ao seu particular estado, o condenado deve submeter-se a um conjunto de normas de execução da pena.

A Constituição Federal Brasileira de 1988 indica que é responsabilidade da União o direito penitenciário, juntamente com os Estados e o Distrito Federal. A Lei nº 7.210, (BRASIL, 1984) estabelece no art. 10 que “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”.

É responsabilidade do Estado o direito penitenciário, juntamente com o respeito à dignidade da pessoa humana, uma vez que ninguém deverá ser submetido a tratamento desumano. Isso inclui os presos e também os agentes penitenciários, a quem deve ser assegurado esse direito para que possam cumprir as suas funções.

Segundo Marcão (2009, p. 19), “preso, evidentemente, é aquele que se encontra recolhido em estabelecimento prisional, cautelarmente ou em razão de sentença penal condenatória com trânsito em julgado”.

Uma prisão, para existir, engloba, além do local, dos muros, das grades, a existência de pessoas, tanto os presos, como os funcionários que são essenciais para o bom funcionamento desse local. Fazem parte disso os agentes penitenciários, que são fundamentais para a segurança da prisão, fazendo a vigia dos presos, mantendo a ordem e a disciplina dos apenados. Para Dani Rudnicki (2019), “os agentes penitenciários são, portanto, os servidores públicos responsáveis pela administração de presídios e guarda de presos”.

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Em referência a essa temática tem-se o seguinte posicionamento:

Deve se considerar ainda que a administração de uma prisão diz respeito a gestão de seres humanos, de agentes penitenciários e pessoas presas, que as prisões não são apenas muros, cercas e prédios com grades e barras, mas locais nos quais pessoas convivem. (RUDNICKI, 2015, p.181).

Segundo estudo por Carlo Velho Masi (2019a), 7.000 pessoas estão em prisão domiciliar por falta de vagas nos regimes aberto e semiaberto do Estado do Rio Grande do Sul. Outrossim, há 12.300 mandados de prisão pendentes e existem 32 presídios com ocupação superior a 200%. Sem dúvidas um déficit muito alto de estabelecimentos e falta de vagas no sistema penitenciário gaúcho.

Conforme Hélen Freitas (2019),

a população prisional no país cresceu 575,2% desde 1990. Mantendo esse ritmo, em 2030 – ano em que as Nações Unidas

pactuara como base para as metas dos Objetivos de

Desenvolvimento Sustentável – teremos 1,9 milhão de adultos encarcerado. Para receber toda essa população, o brasil precisaria construir, nesse período, 5.780 novas unidades prisionais que serão somadas as 1.424 já existentes.

O sistema carcerário brasileiro está enfrentando condições precárias em seus estabelecimentos. Sofre com a superlotação, violência, falta de estrutura entre outros problemas. A realidade que as prisões atualmente enfrentam, é o grande aumento do número da população prisional, ao mesmo tempo em que os estabelecimentos não acompanham esse crescimento. O Estado tem grandes dificuldades em amenizar essa crise.

Diante disso, segue entendimento de Maria Fernanda Paci (2019):

Indubitavelmente, em todos os sentidos o sistema penitenciário brasileiro é enorme. O Brasil encarcera mais pessoas que qualquer outro país da América Latina e possui uma das maiores populações carcerárias do planeta. O nosso déficit carcerário está entre 100 mil vagas, sendo que o Brasil administra um dos dez maiores sistemas penais do mundo. Só o Estado de São Paulo encarcera mais de 67.786 detentos, ou seja, 39,83% dos presos.

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Segundo leciona Elisa Levien da Silva (2019), um dos maiores problemas para o sistema penitenciário brasileiro é a má distribuição das verbas, pois há penitenciárias com um bom padrão de funcionamento e há outras que nem mesmo possuem vagas suficientes para os apenados, tendo superlotação e pessoas vivendo em condições desumanas. Assim, torna-se difícil a reabilitação dos presos, uma vez que pessoas que convivem em ambientes de má qualidade e com pouca assistência ficam propensas a continuar na prática de crimes ou até mesmo praticar crimes mais graves que aquele que foi condenado.

Segue dados do Ministério da Justiça (2019):

É importante destacar que os diagnósticos elaborados pelo Departamento Penitenciário Nacional, não deixam dúvidas de que o Brasil vivencia uma tendência aumento das taxas de encarceramento em níveis preocupantes. O país já ultrapassou a marca de 622 mil pessoas privadas de liberdade em estabelecimentos penais, chegando a uma taxa de mais de 300 presos para cada 100 mil habitantes, enquanto a taxa mundial de aprisionamento situa-se no patamar de 144 presos por 100.000 habitantes (conforme dados da

ICPS – International Centre for Prison Studies). Com esse

contingente, o país é a quarta nação com maior número absoluto de presos no mundo, atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia.

Porém é possível ver que esses outros países nos últimos anos veem reduzindo o número de encarceramentos, diferente do Brasil que segue aumentando sua população prisional. Segundo dados do Ministério da Justiça (2017) 55,07% da população privada de liberdade têm até 29 anos, são negros 61,67% da população presa e apenas 9,5% concluíram o ensino médio, enquanto a média nacional gira em torno de 32%. Por isso é visível que o encarceramento desse grande grupo de pessoas não está sendo satisfatório no quesito de redução da criminalidade, ou na reabilitação dos apenados.

O Estado tem o dever de garantir o correto funcionamento das unidades prisionais do país, com políticas de gestões voltadas a segurança dessas unidades de forma a impedir que facções tenham acesso ao sistema penitenciário causando um caos ao provocar rebeliões dentro desses estabelecimentos.

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No que tange as unidades prisionais, o principal problema encontrado se refere à omissão do Estado. O Estado em geral não cumpre a sua função legal de custódia das pessoas presas, de modo que a ação da administração prisional é bastante limitada. Esse quadro reforça a ação de facções criminosas, gerando situações

como as rebeliões ocorridas recentemente em Manaus. (WERNECK,

2019).

Com essa omissão por parte do Estado surgem diversos tipos de problemas no sistema carcerário, como a superlotação, falta de estruturas adequadas dos estabelecimentos, o acesso à saúde e alimentação é precária e a falta de alcance da justiça com aqueles que estão aprisionados.

As consequências do encarceramento não são, como se pode pensar, problemas vividos individualmente pelas pessoas que foram presas, mas afetam a sociedade como um todo. Em primeiro lugar, o sistema prisional não é capaz de enfrentar aquilo a que supostamente se propõe, isto é, os índices de violência continuam altos apesar de o encarceramento no Brasil ter aumentado drasticamente nos últimos anos. (WERNECK, 2019).

Um país, cuja população prisional possui elevado número, demanda que haja um número alto de vagas para comportar todos esses presos. A solução inicial vista por muitos é a de aumentar as vagas do sistema penitenciário. De acordo com dados do Ministério da Justiça (2019), “para atender à demanda por vagas, o país precisaria aumentar em 50% o número de vagas existentes”.

Para Elisa Levien da Silva (2019),

a decadência do Sistema Penitenciário Brasileiro atinge não somente os apenados, mas também as pessoas que estão em contato direta e indiretamente com essa realidade carcerária. Por mais que o senso comum acredite que com o encarceramento dos delituosos tal questão será sanada, cada vez mais os próprios noticiários firmam que a ressocialização não é um fato concreto perante a sociedade atual.

Pensar que o encarceramento irá resolver o problema da criminalização é uma falsa ideia. Mesmo com um enorme índice de prisões, dados mostram que a violência no país não diminuiu o que leva a crer que esse não é o caminho correto para combater a criminalidade. Uma questão grave e que aumenta o número de

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encarceramento são os presos provisórios, que hoje são boa parte da população carcerária.

Percebe-se a falta de revisão da real necessidade da prisão provisória, onde muitos nem precisariam estar nessa situação e poderiam estar respondendo o processo em liberdade. A falta da audiência de custódia também é preocupante, já que os acusados ficam por muito tempo sem ser levados à autoridade competente a fim de resolver a situação em que se encontram e, em muitos casos, verifica-se desnecessária a prisão temporária.

Segundo dados do Ministério da Justiça (2019) a população prisional brasileira é de 622.202 presos e 40% desta população é composta por presos provisórios. Se houvesse um maior cuidado e atenção com esses casos e mais rapidez do sistema judiciário, muitos desses presos poderiam responder o processo em liberdade e assim colaboraria para diminuir a superlotação.

Em dezembro de 2014, 40% da população prisional brasileira era composta por presos provisórios. Embora existam muitos países com percentual maior de presos provisórios – o Brasil ocupa apenas a 38ª posição entre os países com mais de 10 milhões de habitantes – estamos falando de 40% de 600 mil pessoas. São quase 250 mil pessoas presas antes de serem julgadas em primeiro grau jurisdicional, sendo que há evidências de que uma grande parte delas poderia responder ao processo em liberdade. (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2019).

Muitos acreditam que prender as pessoas evitará que outras se transformem em criminosos, como uma forma de lição, prender para dar exemplo. As pessoas têm que sim pagar pelo crime que cometeram, essa não é a questão, mas sim de tratar o problema antes do crime ser cometido. Quem comete o crime sabe das leis do país, sabe que pode ser penalizado por isso, mas mesmo assim comete o delito, então algo de errado tem e é isso que se busca entender e mudar.

Complementa ainda Jurema Werneck (2019):

Em uma lógica simplista, o discurso público sobre segurança que fortalece a lógica da guerra alimenta um imaginário popular de que prender muito significaria reduzir a violência no país. Mas essa ideia

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não tem qualquer lastro na realidade. Os homicídios representam apenas 11% das causas de aprisionamento. Nunca se prendeu tanto no país e, no entanto, os crimes de maior potencial ofensivo (como homicídios) continuam aumentando. Em 2016, o Brasil registrou 61,6 mil mortes intencionais violentas, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A política de encarceramento em massa não impediu que 7 pessoas fossem assassinadas por hora em 2016. De acordo com o Código Penal é possível ver que todas as leis são pensadas para garantir a proteção e segurança de todos os seres humanos. Ainda há muito que se fazer na questão da segurança pública. Os órgãos responsáveis pela segurança pública precisam se dedicar mais para descobrir e tratar a real causa da superlotação do sistema penitenciário, do grande número de prisões e da alta taxa de criminalidade, para assim a sociedade ficar mais tranquila e segura.

O foco das políticas de segurança pública não é — e não foi nas

últimas décadas — a redução de homicídios. Os índices de

elucidação de homicídios são irrisórios diante da centralidade que o tema deveria ter nas estratégias de segurança dos governos. O foco prioritário na guerra às drogas impera como política míope que, de um lado, não reduz a violência letal no país e, de outro, coloca mais de 700 mil pessoas presas em condições desumanas e degradantes e sujeitas a tortura e maus-tratos. Por sua vez, 28% das pessoas em privação de liberdade cumprem penas por crimes relacionados ao tráfico de drogas. E, ao olhar para população prisional feminina, vemos que 62% das 42,3 mil mulheres privadas de liberdade respondem por tráfico de drogas. Essas mulheres compõem a quarta maior população feminina encarcerada do mundo e esse número vem crescendo a cada ano. Os dados também informam que negros e negras são a maioria das pessoas presas no Brasil. (WERNECK,

2019).

No Código Penal há varias tipificações de crimes, com suas especificidades e a pena a ser cumprida, nesse sentido conforme Ministério da Justiça (2019) pode ser ver em mais destaque os crimes contra o patrimônio, os crimes contra a pessoa e os relacionados às drogas, sendo esses responsáveis por 87% das prisões efetuadas.

Analisando-se os números estaduais, situação do estado de Rondônia parece uma das mais preocupantes: o estado apresenta a maior taxa de pessoas no sistema prisional por 100 mil habitantes, 3,3 vezes a taxa nacional. Já no que diz respeito ao déficit de vagas Amazonas e Pernambuco se destacam com ocupação de 259% e 237%, respectivamente. Amazonas e Pernambuco também apresentam proporção de presos provisórios acima da porcentagem nacional (23 e 11% maiores, respectivamente). Nesse indicador, os estados que mais se destacam são o de Tocantins, com 75% de

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presos provisórios e, no outro extremo, Santa Catarina, com apenas 26% de pessoas nessa situação. (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2019).

A pena de prisão, como penalidade para a criminalidade é muito utilizada no mundo, assim como no Brasil. No Rio Grande do Sul, não é diferente e os níveis de encarceramento vêm aumentando anualmente. Além disso, há uma maior necessidade por vagas no sistema prisional e o Rio Grande do Sul nesse patamar, segue a tendência do Brasil no que diz respeito à superlotação do sistema penitenciário.

Segundo Masi (2019a),

dados divulgados pelo TJRS demonstram que, nos últimos 20 anos, o número de presos no Estado saltou de 11 mil para 35,3 mil detentos. Apenas de 2013 a 2016 houve um aumento da taxa de encarceramento de 6,8%. Mantida a projeção, estima-se que até 2027 o Rio Grande Do Sul esteja com 60 mil presos e 90 mil em 2037.

A população carcerária do Rio Grande do Sul, segundo dados da Superintendência dos Serviços Penitenciários – SUSEPE, de novembro de 2017, é de: 35.790 homens, 2.021 Mulheres, em um total de: 37.811 presos. Maior prisão do Rio Grande do Sul, a Cadeia Pública de Porto Alegre, mais conhecida como Presídio Central, conforme dados da SUSEPE de Agosto de 2017 possui população carcerária de 4.705 presos e sua capacidade de engenharia é somente de 1.824 presos. (SUSEPE, 2019).

É um aumento considerável de detentos no Estado e, junto com isso o enorme déficit de vagas no sistema penitenciário. O encarceramento é utilizado para a punição e para garantir à sociedade segurança. Mas o que é possível ver é um alto custo social e financeiro e aumento da violência com a reincidência de alguns presos. Ficar em celas superlotadas, sem o mínimo de dignidade e assistência não fará com que o apenado seja reabilitado.

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1.2 O direito humano ao cumprimento de pena em estabelecimento adequado

Para Augusto Thompson (1998, p. 3), as metas da pena de prisão são a punição e a reabilitação, ao menos é assim que se espera que seja, mas não é isso que acontece na prática. Para Marcão (2009, p.1) a execução penal deve ter como objetivo a integração social do condenado, onde a pena deve ter o intuito de prevenção e humanização.

Como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito brasileiro, o princípio da dignidade da pessoa humana garante, com caráter obrigatório, o absoluto e irrestrito respeito à identidade e à integridade de todo ser humano, exige que todos sejam tratados com respeito, resguardados e tutelados; um atributo da pessoa, não podendo ser medido por um único fator, pois nela intervém a combinação de aspectos morais, econômicos, sociais e políticos, entre outros. O Estado tem como uma de suas finalidades oferecer condições para que as pessoas se tornem dignas. (SILVA, 2019). Assim, o que se espera da administração das prisões é que tenha ética e respeito com todas as pessoas envolvidas nessa unidade prisional, como presos, agentes penitenciários, demais funcionários e visitantes. De acordo com Raissa Hauenstein Barcellos (2016, p.21), “o estabelecimento penal conforme a sua natureza deve ter locais para seu cumprimento adequados à situação pessoal de cada detento, com lotação compatível com sua natureza e finalidade”.

Se a administração penitenciária não funcionar com ética, um local onde há um grupo com poder sobre o outro pode gerar com a falta de ética um abuso de poder por parte de um dos grupos. Um grupo é o dos presos e o outro dos servidores penitenciários. É muito importante ter uma boa relação entre esses dois grupos. Salienta Marcão (2009, p.32) que “a execução penal, no Estado Democrático e de Direito, deve observar estritamente os limites da lei e do necessário ao cumprimento da pena e da medida de segurança. Tudo o que excede aos limites contraria direitos”.

Os direitos do preso estão dispostos no artigo 41 da Lei de Execuções Penais:

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Art. 41 - Constituem direitos do preso: I - alimentação suficiente e vestuário;

II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - Previdência Social;

IV - constituição de pecúlio;

V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;

VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;

VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;

VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;

X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;

XI - chamamento nominal;

XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;

XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;

XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.

XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente.

No Direito Internacional a dignidade humana no cumprimento de penas está previsto na Declaração Universal de Direitos do Homem, de 1948. Ela prevê em seu art. 5º que ninguém será submetido à tortura, ou a pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante. Também nesse âmbito tem-se a Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura e, ainda nesse cenário, foi celebrada a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como o Pacto de São José da Costa Rica. No que diz respeito à dignidade humana do preso o Brasil tem vários tratados ratificados, mas ainda é possível perceber que não são cumpridos em boa parte dos estabelecimentos prisionais.

A esse respeito, o artigo 65 da Lei de Execuções Penais determina que a execução penal competirá ao juiz indicado na lei local de organização judiciária, e, na sua ausência, ao da sentença. Portanto, em geral, compete ao Juiz Estadual inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento (art. 66, VII), cabendo-lhe, ainda, interditar estabelecimento prisional que estiver funcionando em condições inadequadas ou com infringência aos dispositivos da LEP (art. 66, VIII). (PAIVA, BICHARA, 2019)

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Apesar do que diz a lei, até então o Estado não conseguiu melhorar e oferecer um ambiente propício para o cumprimento da pena. “Nesse sentido, é que os direitos humanos e a dignidade humana teriam a importante tarefa de serem limites ao poder de punir do Estado, servindo de baliza para o hiperencarceramento brasileiro”. (MURARO, 2019).

1.3 A Lei de Execuções Penais, Código Penal e Constituição da República Federativa do Brasil e o respeito a direitos e as garantias fundamentais.

Após trânsito em julgado de sentença, o processo passa para a execução. Na execução terá uma sentença cumprida, que poderá ser a pena privativa de liberdade, restritiva de direitos ou de multa.

Em referência a essa postura tem-se o seguinte posicionamento:

Adotado o sistema vicariante pelo legislador penal, e considerando que a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal, conforme anuncia o art. 1º da Lei de Execução Penal, constitui pressuposto da execução e a existência de sentença criminal que tenha aplicado pena, privativa de liberdade ou não, ou medida de segurança, consistente em tratamento ambulatorial ou internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico. (MARCÃO, 2009, p. 1).

Através da execução penal o Estado exerce seu direito de punir, com a intenção de justiça e também a reabilitação do condenado para inibir novos crimes. Cabe ressaltar que isso é o que a sociedade espera que aconteça.

Nesse sentido tem se o entendimento de Marcão (2009, p. 1):

A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Objetiva-se por meio da execução, punir e humanizar.

Para Barcellos (2016, p. 17), a Lei de Execuções Penais possui dois objetivos principais, que são correta aplicação da sentença criminal, dirigida à repressão e

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prevenção de crimes, e proporcionar situações para a ressocialização do detento. Acontece que esses objetivos tendem a não ser cumpridos, devido à carência de locais apropriados para o cumprimento da pena.

Por conseguinte, a violação dos preceitos normativos destinados a assegurar os direitos dos presos e a não observância da Lei das Execuções Penais que norteia o cumprimento da sentença penal, atrelados a outros fatores, contribuem para a falência do sistema prisional brasileiro. (BARCELLOS, 2016 p.18)

Nesse diapasão, o processo de execução penal, de maneira alguma pode atingir a dignidade humana do preso, dado que a Lei de Execuções Penais dispõe de direitos assegurados e garantidos na Constituição Federal. Quando ocorre a violação desses direitos juntos com outras condições há um auxílio para a crise do sistema carcerário.

O Estado não pode punir de forma arbitrária, uma vez que, encontra sua atuação limitada nos direitos já adquiridos aos detentos enquanto cidadãos, a medida que a perda temporária do direito de liberdade se refere tão somente a locomoção. Nesse viés foi criada em 1984 a Lei de Execuções Penais, que promoveu um avanço na Legislação assegurando direitos aos presos, principalmente ressocializando-os, proporcionando humanidade e racionalidade ao processo de aplicação da pena. (BARCELLOS, 2016 p.17).

Toda pessoa que comete um crime deve ter a sanção de acordo com a lei, somente ser punida pelo delito que cometeu. Esse direito é assegurado a todos. O Direito Penal deve de um lado aplicar a pena conforme o crime e de outro proporcionar garantias e não usar de tratamento abusivo com determinadas pessoas.

O processo, como instrumento para a realização do Direito Penal, deve realizar sua dupla função: de um lado, tornar viável a aplicação da pena, e, de outro, servir como efetivo instrumento de garantia dos direitos e liberdades individuais, assegurando os indivíduos contra os atos abusivos do Estado. Nesse sentido, o processo penal deve servir como instrumento de limitação da atividade estatal, estruturando-se de modo a garantir plena efetividade aos direitos individuais constitucionalmente previstos, como a presunção de inocência, contraditório, defesa, etc. (LOPES JR, 2005 p.37).

Os direitos humanos estão previstos na Constituição Federal. Eles são fundamentais, garantem a proteção no sentido que a norma penal deve respeitar a

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dignidade da pessoa humana. A lei é clara no sentido dos direitos humanos, da sua importância e do dever de serem cumpridos. Infelizmente o sistema penitenciário atualmente está violando esses direitos, deixando de lado o real intuito da pena que é a punição, mas principalmente a ressocialização do preso.

A Constituição Federal é expressa na defesa da dignidade humana, assim impondo limites na atuação do Estado como repressor. Assim dispõe no art.1º:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (BRASIL, 2019, grifo nosso).

Estão elencados, no art. 5º da Constituição Federal, vários direitos fundamentais no que diz respeito ao cumprimento de punições, no sentido da dignidade humana, como por exemplo, o inciso III que trata da: vedação a tratamento desumano ou degradante, inciso XLV: nenhuma pena passará da pessoa do condenado respeito à integridade física e moral do preso, inciso XLIX: julgamento por autoridade competente, inciso LIII: devido processo legal, inciso LIV: presunção de inocência, inciso LVIII: individualização das penas, inciso XLVI e inciso XLVII: a proibição de penas de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, banimento e cruéis.

Segundo Uliana Lemos de Paiva, Jahyr-Philippe Bichara (2019)

Essa é a perspectiva constitucional que deveria ser o norte dos estabelecimentos prisionais pátrios, porém, na prática, o que se assiste é a violação a cada um desses direitos; o violar diuturno da dignidade dos presos. E poucos parecem se importar com isso. E não se diga tais dispositivos se tratam de meras “normas programáticas”. Muito pelo contrário, são normas definidoras de direitos fundamentais, de eficácia imediata.

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O Estado é responsável pelo sistema penitenciário e tem a obrigação de garantir o princípio da dignidade da pessoa humana, com condições dignas de um ser humano no cumprimento das penas. O Brasil assumiu no âmbito internacional diversos dispositivos de direitos e garantias fundamentais que são reconhecidos na Constituição Federal, vinculando o Estado a essas obrigações.

De acordo com Ana Paula Favarin (2019):

Os Estados ao se tornarem signatários de tratados internacionais de direitos humanos e, neste particular, a Convenção Americana, geram para si um dever, qual seja, o de adequar sua legislação e jurisdição interna para que estas estejam em consonância com as normas externas e com a jurisprudência da Corte Interamericana. As normas violadoras ou potencialmente violadoras aos direitos humanos devem ser julgadas e devem estar sujeitas ao crivo do controle de convencionalidade. As diretrizes internacionais de proteção dos direitos humanos devem servir de parâmetro para analisar a convencionalidade das leis, o que deve ser realizado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e pelos juízes nacionais.

Acontece que uma parte da população associa os direitos humanos como privilégio para “bandidos”, o que é altamente equivocado, destruindo a real finalidade desses direitos e desmerecendo os defensores. O correto é a compreensão que todas as pessoas são seres humanos e por isso contam com direitos e não há como distinguir um grupo de outro, como se um fosse ter direitos e outro não simplesmente pelo fato de um dos grupos serem de pessoas que praticaram algum tipo de crime.

Ainda existem as pessoas com aquele velho ditado: “Bandido bom é bandido morto”. Isso assusta, porque em pleno século XXI, com tanto acesso a informação ainda terem pessoas que pensam assim. Os direitos humanos vêm cada vez mais sendo criticados e sendo atacados por pessoas que pensam de uma forma muito equivocada. Como já diz o nome, esses direitos são para todos os humanos, da pessoa que foi vítima de um crime até a que cometeu o crime.

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O processo penal deve passar pelo filtro constitucional e se democratizar. A democracia pode ser vista como um sistema político-cultural que valoriza o indivíduo frente ao Estado, e que se manifesta em todas as esferas dessa complexa relação Estado-indivíduo. Como consequência, opera-se uma democratização do processo penal, que se manifesta através do fortalecimento do sujeito passivo. O indivíduo submetido ao processo penal passa a ser valorizado juridicamente.

No mesmo sentido, palavras do autor:

Diante desse cenário de risco total em que o processo penal se insere, mais do que nunca devemos lutar por um sistema de garantias mínimas. Não é querer resgatar a ilusão de segurança, mas sim assumir os riscos e definir uma pauta mínima de garantias formais das quais não podemos abrir mão. É partir da premissa de que a garantia está na forma do instrumento jurídico e que, no processo penal, adquire contornos de limitação ao poder punitivo estatal e emancipador do débil submetido ao processo. (LOPES, 2005, p.66).

Portanto, necessária luta incessante pelas garantias dos presos, lutando por um sistema mais igualitário e humano, com o respeito à dignidade da pessoa presa.

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2 AS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA COMO CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE PARA A MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE VIDA NO CÁRCERE BRASILEIRO

Por uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça, através da Resolução nº 213/2015, as audiências de custódia começaram a ser implementadas no Brasil a partir de fevereiro de 2015, determinando que se uma pessoa for presa em flagrante, deverá ser apresentada a um juiz em até 24 horas.

Conforme o Conselho Nacional de Justiça, essa medida tem o objetivo de evitar prisões ilegais e identificar abusos ocorridos no momento da prisão, sendo garantido à pessoa presa o direito de ser ouvido em audiência e assim possibilitar à autoridade a identificação de possíveis ilegalidades ou ocorrências de tortura e maus tratos.

Considerando tudo o que foi exposto no primeiro capítulo e que há uma crise no sistema carcerário brasileiro, um descaso com diversas unidades prisionais, uma superlotação carcerária e diversos presos em situação de prisão irregular e até mesmo ilegal, as audiências de custódia surgem como uma das medidas para possibilitar a melhoria nas condições de vida no cárcere brasileiro.

Também cabe salientar que o CNJ busca com a resolução adequar o Código de Processo Penal Brasileiro ao que preveem os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, como forma de enfrentar os altos índices de encarceramento e superlotação do sistema penitenciário.

2.1 As audiências de custódia e sua definição normativa no Brasil

A audiência de custódia encontra respaldo no art. 7º da Convenção Americana de Direitos Humanos. Esse artigo dispõe: “toda pessoa detida ou retida

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deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”. Mesmo tendo o Brasil ratificado esse acordo em 1992, essa determinação foi desprezada por anos.

Tais audiências de apresentação estão previstas em pactos e tratados internacionais assinados pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São Jose da Costa Rica). Assim, notória a determinação da resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça ao lançar em 2015 o Projeto de Audiência de Custódia.

A Resolução adota a preponderância das normas resultantes dos tratados internacionais de direitos humanos. De acordo com o parágrafo 2.º do art. 5.º, da Constituição Federal de 1988, as garantias já explícitas não afastam as que forem resultado de princípios ou tratados internacionais que o Brasil tenha ratificado.

Art. 5º, §2º da CF: Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Levando em consideração o artigo mencionado, conclui-se que as normas advindas do direito internacional, através de Tratados firmados pelo Brasil, integram as normas internas do país. Assim, mesmo que a determinação da audiência de custódia há tempos já esteja prevista nas normas internacionais, a resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça, busca através dessa determinação implementar definitivamente essa prática no sistema penal brasileiro.

Nesse sentido, palavras de Carlo Velho Masi (2019b):

Em fevereiro de 2015, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Ministério da Justiça, o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e o Tribunal de Justiça de São Paulo, em cooperação técnica e conjugação de esforços, lançaram o “Projeto Audiência de Custódia”, que busca implementar em todo país a rápida apresentação do preso ao juiz para primeira análise da prisão ou da adoção de medidas alternativas e criar Centrais de Monitoração Eletrônica, Centrais Integradas de Alternativas Penais e Câmaras de Mediação Penal.

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A partir disso é notável o atraso em que o Brasil se encontra, no que diz respeito às audiências de custódia. Por isso a importância de criar a cultura da realização das audiências de custódia no sistema penal brasileiro e ser utilizada de maneira efetiva pelos juízes.

Segundo informativo da Rede Justiça Criminal, nas palavras de Maria Laura Canineu (2019):

A atual lei brasileira prevê o encaminhamento de cópia do auto de prisão em flagrante para que o juiz competente analise a legalidade e a necessidade da manutenção dessa prisão cautelar (art.306 do Código de Processo Penal). No entanto, essa previsão legislativa tem se mostrado insuficiente tanto para um efetivo controle judicial da legalidade e necessidade da prisão provisória quanto para verificar eventual prática de violência ou desrespeito aos direitos da pessoa presa. No contexto atual, o contato entre a pessoa presa e o juiz só se dará, em muitos casos, meses após sua prisão, no dia da sua audiência de instrução e julgamento. Por isso, a realização de uma audiência imediatamente após a prisão, que possibilite o encontro entre a pessoa presa e o juiz, é fundamental como mecanismo de prevenção e combate à tortura e para um efetivo controle judicial.

Conforme consta no Código de Processo Penal brasileiro, o interrogatório do réu foi transferido para a audiência de instrução, debates e julgamento, sendo somente esse o primeiro contato do preso em flagrante com a autoridade judiciária. Ocorre que, pode levar meses até essa audiência ser realizada e assim, o risco da ocorrência de maus-tratos é maior durante os dias seguintes à detenção.

Nessa perspectiva, também se tem evidenciado que o artigo 306 do Código do Processo Penal: “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”, estabelece a necessidade da imediata comunicação ao juiz de que alguém foi preso, bem como a posterior remessa do auto de prisão em flagrante para homologação ou relaxamento, mas isso não é suficiente para dar conta da demanda.

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mesmo não havendo previsão, no ordenamento processual penal brasileiro, da realização da audiência de custódia, a sua realização se impõe pela via do controle de convencionalidade das leis, considerando-se, para tanto, como já realçado na introdução, que o Brasil ratificou a Convenção Americana por meio do Decreto 678/1992.

Dessa forma, devido à voluntariedade na ratificação pelo Brasil dos tratados internacionais de direitos humanos, principalmente a Convenção Americana de Direitos Humanos, caso sejam violadas determinações, isto pode levar à responsabilização do país perante a Corte Internacional de Direitos Humanos. Demonstra a autora Canineu (2019), que países da América Latina, como Argentina, Chile, Colômbia e México, introduziram em suas legislações a Audiência de Custódia.

Seguindo com a análise, Canineu (2019) menciona que o Código de Processo Penal Brasileiro impõe que quando há uma prisão em flagrante e o indivíduo detido encontrar-se sob custódia policial, os documentos dessa prisão deverão ser levados até o conhecimento de um juiz em até 24 horas, porém percebe-se que são somente os documentos.

Art. 306. CPP: A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão,

será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

Nessa audiência serão analisados os autos da prisão e se há legalidade, ou a necessidade da prisão preventiva, ou medidas cautelares diversas da prisão. Tudo isso será com base tão somente nos documentos entregues pela polícia. De acordo com o art. 400 do CPP, a primeira audiência judicial da pessoa detida deverá ser realizada no prazo máximo de 60 dias, mas o período que começa a contar esse prazo não é especificado.

Art. 400, CPP: Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o

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disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado.

Na prática, isso muitas vezes significa que as pessoas podem permanecer detidas, com autorização judicial, por um longo período sem que tenham a oportunidade de ver um juiz. A única circunstância em que a polícia precisa levar imediatamente o preso perante o juiz, de acordo com o Código de Processo Penal, aplica-se ao caso da prática de crime inafiançável, não tendo o policial exibido o respectivo mandado judicial no momento da prisão (art. 287). Caso contrário, o detento também pode chegar a não ver um juiz por vários meses. (CANINEU, 2019).

Atualmente está em andamento no Senado Federal o Projeto de Lei do Senado nº 554/2011, que institui a aplicação das já referidas normas internacionais. Conforme informações do Senado Federal, a autoria desse projeto é do senador Antonio Carlos Valadares do PSB/SE. Esse projeto já foi aprovado pelo Plenário, e a situação atual é que foi remetido à Câmara dos |deputados desde 06/12/2016.

Ementa: Altera o § 1º do art. 306 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), para determinar o prazo de vinte e quatro horas para a apresentação do preso à autoridade judicial, após efetivada sua prisão em flagrante. Explicação da Ementa: Altera o §1º do artigo 306 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal) para dispor que no prazo máximo de vinte e quatro horas após a realização da prisão, o preso deverá ser conduzido à presença do juiz competente, juntamente com o auto de prisão em flagrante, acompanhado das oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. (SENADO FEDERAL, 2019).

Sem dúvidas, essa modificação no §1º do art. 306 do CPP, traria uma maior segurança jurídica no que diz respeito ao prazo para o preso ser conduzido perante um Juiz e uma efetiva aplicação do que está nos Tratados Internacionais e na Resolução nº 213 do CNJ. Pois infelizmente, mesmo tendo esses dois institutos, a audiência de custódia ainda é pouco utilizada pelo poder judiciário.

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2.2 A resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça e o impacto da realização das audiências de custódia

A Resolução nº 213 do Conselho Nacional de Justiça em sua Sessão Ordinária aprovou a Resolução nº 213, que trata da apresentação do preso em flagrante ou por mandado de prisão, à um juiz competente no prazo de 24 horas. Esta resolução entrou em vigor em 1º de fevereiro de 2016, a partir desse dia os Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais teriam o prazo de 90 dias para em todo o território nacional implementar as atribuições desta resolução. Para as pessoas presas anteriormente à implementação da audiência de custódia, também ficou garantido o prazo de 90 dias para a apresentação desses indivíduos.

Preconiza o art. 1º e § 1º desta resolução:

Art. 1º Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão. § 1º A comunicação da prisão em flagrante à autoridade judicial, que se dará por meio do encaminhamento do auto de prisão em flagrante, de acordo com as rotinas previstas em cada Estado da Federação, não supre a apresentação pessoal determinada no caput.

O parágrafo primeiro regulamenta a importância da apresentação do preso e não somente dos documentos, conforme consta no já referido art. 306 do CPP. A apresentação pessoal não é suprida pelo mero encaminhamento do auto em prisão em flagrante. Caso a prisão seja por delito de competência originária do Tribunal, o preso pode ser apresentado ao juiz que o Presidente da Corte ou o Relator do inquérito designar para esse fim. (MASI, 2019b).

A resolução leva em conta o “contingente desproporcional de pessoas presas”, informado por relatórios do CNJ e do INFOPEN; a previsão constitucional de que a prisão “é medida extrema que se aplica somente nos casos expressos em lei e quando a hipótese não comportar nenhuma das medidas cautelares alternativas”; as inovações introduzidas no CPP pela lei nº 12.403/2011, que “impuseram ao juiz a obrigação de converter em prisão preventiva a

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prisão em flagrante delito, somente quando apurada a impossibilidade de relaxamento ou concessão de liberdade provisória, com ou sem medida cautelar diversa da prisão”; e o potencial de a apresentação imediata do preso à autoridade judicial ser “o meio mais eficaz para prevenir e reprimir a prática de tortura no momento da prisão, assegurando, portanto, o direito à integridade física e psicológica das pessoas submetidas à custódia estatal”. (MASI, 2019b).

De acordo com o § 2º, autoridade judicial competente é:

§ 2º Entende-se por autoridade judicial competente aquela assim disposta pelas leis de organização judiciária locais, ou, salvo omissão, definida por ato normativo do Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça Militar, Tribunal Regional Federal, Tribunal Regional Eleitoral ou do Superior Tribunal Militar que instituir as audiências de apresentação, incluído o juiz plantonista.

Para Masi (2019b), o deslocamento da pessoa presa em flagrante delito, para a audiência ou para uma unidade prisional, no caso de prisão preventiva, será de responsabilidade da Secretaria de Administração Penitenciária ou da Secretaria de Segurança Pública, de acordo com os regramentos locais. Também o autor salienta que o mandado de prisão abrangerá a indicação de que a pessoa presa terá de ser apresentada perante um Juiz no prazo de 24 horas.

Além disso, essencial o §4º da Resolução:

§ 4º Estando a pessoa presa acometida de grave enfermidade, ou havendo circunstância comprovadamente excepcional que a impossibilite de ser apresentada ao juiz no prazo do caput, deverá ser assegurada a realização da audiência no local em que ela se encontre e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá ser providenciada a condução para a audiência de custódia e imediatamente após restabelecida sua condição de saúde ou de apresentação.

Essa determinação deixa clara a importância da pessoa presa estar diante de um juiz, independentemente do local, caso não possa se deslocar até a audiência, por exemplo no caso de estar internada no Hospital, ou por demais motivos, a audiência será realizada no local que a pessoa estiver, caso seja impossível esse deslocamento da autoridade judicial, a audiência ocorrerá logo após melhora na condição de saúde.

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Conforme o art. 4º da resolução e estudo do autor Masi (2019), a audiência de custódia será cumprida na presença do Ministério Público e do defensor público ou particular, é vedada a presença dos agentes policiais que efetuaram a prisão ou a investigação. “O advogado que for constituído até o término da lavratura do APF deverá ser notificado, pelos meios mais comuns, para que compareça ao ato”. (MASI, 2019b).

Art. 4º A audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído no momento da lavratura do flagrante. Parágrafo único. É vedada a presença dos agentes policiais responsáveis pela prisão ou pela investigação durante a audiência de custódia.

Ainda, através do art. 6º, ficou garantido ao preso, atendimento pelo advogado particular ou defensor público antes da audiência, em local reservado e apropriado, sem acompanhamento de agentes policiais e todos os trâmites da audiência serão explicados por um funcionário credenciado, tudo isso garantirá a confidencialidade do atendimento entre advogado e cliente e também informações imprescindíveis para a pessoa presa.

Art. 6º Antes da apresentação da pessoa presa ao juiz, será assegurado seu atendimento prévio e reservado por advogado por ela constituído ou defensor público, sem a presença de agentes policiais, sendo esclarecidos por funcionário credenciado os motivos, fundamentos e ritos que versam a audiência de custódia. Parágrafo único. Será reservado local apropriado visando a garantia da confidencialidade do atendimento prévio com advogado ou defensor público. (RESOLUÇÃO CNJ, 2019).

Além do mais, é garantido o esclarecimento à pessoa presa dos procedimentos que envolvem a audiência de custódia e o objetivo desta, conforme menciona MASI (2019b) e dispõe o art. 8º da referida Resolução:

Na audiência de custódia, a autoridade judicial esclarecerá ao preso qual a finalidade do ato; assegurará que não esteja algemado (salvo em casos de resistência, receio de fuga ou perigo à integridade física ou alheia, circunstância justificada por escrito); advertirá sobre o direito ao silêncio; indagará sobre a ciência e efetiva oportunização de exercer os direitos constitucionais inerentes a sua condição (especialmente consulta com defensor, atendimento médico e comunicação com familiares); indagará sobre as circunstâncias da prisão ou apreensão; perguntará “sobre o tratamento recebido em

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todos os locais por onde passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências cabíveis” (apuração da denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima); verificará se houve realização de exame de corpo de delito, determinando sua realização caso não tenha sido realizado, seja insuficiente, haja alegação de tortura ou maus tratos posterior, ou tenha desrespeitado a Recomendação CNJ 49/2014.

Art. 8º Na audiência de custódia, a autoridade judicial entrevistará a pessoa presa em flagrante, devendo:

I - esclarecer o que é a audiência de custódia, ressaltando as questões a serem analisadas pela autoridade judicial;

II - assegurar que a pessoa presa não esteja algemada, salvo em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, devendo a excepcionalidade ser justificada por escrito;

III - dar ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio;

IV - questionar se lhe foi dada ciência e efetiva oportunidade de exercício dos direitos constitucionais inerentes à sua condição, particularmente o direito de consultar-se com advogado ou defensor público, o de ser atendido por médico e o de comunicar-se com seus familiares;

V - indagar sobre as circunstâncias de sua prisão ou apreensão; VI - perguntar sobre o tratamento recebido em todos os locais por onde passou antes da apresentação à audiência, questionando sobre a ocorrência de tortura e maus tratos e adotando as providências cabíveis;

VII - verificar se houve a realização de exame de corpo de delito, determinando sua realização nos casos em que:

a) não tiver sido realizado;

b) os registros se mostrarem insuficientes;

c) a alegação de tortura e maus tratos referir-se a momento posterior ao exame realizado;

d) o exame tiver sido realizado na presença de agente policial, observando-se a Recomendação CNJ 49/2014 quanto à formulação de quesitos ao perito;

VIII - abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir prova para a investigação ou ação penal relativas aos fatos objeto do auto de prisão em flagrante;

IX - adotar as providências a seu cargo para sanar possíveis irregularidades;

X - averiguar, por perguntas e visualmente, hipóteses de gravidez, existência de filhos ou dependentes sob cuidados da pessoa presa em flagrante delito, histórico de doença grave, incluídos os transtornos mentais e a dependência química, para analisar o cabimento de encaminhamento assistencial e da concessão da liberdade provisória, sem ou com a imposição de medida cautelar.

Nessa perspectiva, segundo o autor Masi (2019b), o juiz não poderá formular perguntas que possam produzir algum tipo de prova, tanto para a investigação ou para a ação penal. Também o autor menciona a necessidade de encaminhamento

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assistencial e o cabimento da concessão de liberdade provisória, com ou sem imposição de medida cautelar e a averiguação de hipótese de gravidez, existência de filhos ou dependentes sob os cuidados do preso e histórico de doença grave.

Após proceder à oitiva, o juiz passará a palavra ao Ministério Público e, em seguida, à defesa técnica, para formulação de perguntas compatíveis com a natureza do ato, vedadas indagações sobre o mérito dos fatos. As partes poderão requerer o relaxamento da prisão em flagrante; a concessão da liberdade provisória, com ou sem aplicação de medida cautelar diversa; a decretação da prisão preventiva; e a adoção de “outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa”. (MASI, 2019b).

Através do Sistema de Audiência de Custódia (SISTAC), criado pela Resolução, toda apresentação da pessoa presa em flagrante será obrigatoriamente cadastrada no SISTAC, que é um sistema nacional, eletrônico e irá coletar dados produzidos na audiência.

Nesse sentido:

Art. 7º A apresentação da pessoa presa em flagrante delito à autoridade judicial competente será obrigatoriamente precedida de cadastro no Sistema de Audiência de Custódia (SISTAC).

§ 1º O SISTAC, sistema eletrônico de amplitude nacional, disponibilizado pelo CNJ, gratuitamente, para todas as unidades judiciais responsáveis pela realização da audiência de custódia, é destinado a facilitar a coleta dos dados produzidos na audiência e que decorram da apresentação de pessoa presa em flagrante delito a um juiz e tem por objetivos:

I - registrar formalmente o fluxo das audiências de custódia nos tribunais;

II - sistematizar os dados coletados durante a audiência de custódia, de forma a viabilizar o controle das informações produzidas, relativas às prisões em flagrante, às decisões judiciais e ao ingresso no sistema prisional;

III - produzir estatísticas sobre o número de pessoas presas em flagrante delito, de pessoas a quem foi concedida liberdade provisória, de medidas cautelares aplicadas com a indicação da respectiva modalidade, de denúncias relativas a tortura e maus tratos, entre outras;

IV - elaborar ata padronizada da audiência de custódia;

V - facilitar a consulta a assentamentos anteriores, com o objetivo de permitir a atualização do perfil das pessoas presas em flagrante

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delito a qualquer momento e a vinculação do cadastro de seus dados pessoais a novos atos processuais;

VI - permitir o registro de denúncias de torturas e maus tratos, para posterior encaminhamento para investigação;

VII - manter o registro dos encaminhamentos sociais, de caráter voluntário, recomendados pelo juiz ou indicados pela equipe técnica, bem como os de exame de corpo de delito, solicitados pelo juiz; VIII - analisar os efeitos, impactos e resultados da implementação da audiência de custódia. (RESOLUÇÃO CNJ, 2019).

Seguindo, é importante mencionar o art. 13 da resolução, que também garante a apresentação em 24 horas da pessoa presa por cumprimento de mandado, contendo nesse mandato a determinação para a pessoa presa sr imediatamente levada até à autoridade policial.

Art. 13. A apresentação à autoridade judicial no prazo de 24 horas também será assegurada às pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que couber, os procedimentos previstos nesta Resolução. Parágrafo único. Todos os mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local. (RESOLUÇÃO CNJ, 2019).

Em face do exposto, de acordo com Masi (2019b), “a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça traz um avanço considerável no trato do tema ao deixar claro o modo como o juiz deverá encarar a prisão e como deverá portar-se na audiência de custódia”.

No entender de Masi (2019b):

As medidas cautelares alternativas do art. 319 do CPP serão aplicadas de acordo com sua real adequação e necessidade ao caso, sendo estipulados prazos certos para cumprimento e reavaliação das mesmas. O acompanhamento dessas medidas ficará a cargo das Centrais Integradas de Alternativas Penais, estruturadas preferencialmente no âmbito do Poder Executivo estadual, às quais também cabe “a articulação com a rede de proteção social e a identificação das políticas e dos programas adequados a cada caso”. O juiz deverá, ainda, garantir aos presos em flagrante o direito à atenção médica e psicossocial, resguardada a natureza voluntária desses serviços.

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Nos casos em que o preso denunciar tortura ou maus tratos de agentes estatais, as informações serão registradas, sendo determinadas providências para apuração pela autoridade judicial. O funcionário que coletar os dados da pessoa presa também deverá coletar informações sobre a identificação dos supostos agressores; o local, a data e a hora dos fatos e sua descrição, com o método utilizado e a indicação das lesões, que serão registradas por foto ou vídeo; a identificação de testemunhas; a existência de registro das lesões sofridas; os encaminhamentos dados pela autoridade judicial para requisitar investigação dos relatos; a aplicação de medidas protetivas concedidas ao preso pela autoridade judicial, nos casos em que haja risco à vida ou à segurança da pessoa e de seus familiares ou a testemunhas do abuso.

2.3 A audiência de custódia como condição de possibilidade para a humanização do cárcere

O tema audiência de custódia aparenta ser algo novo no sistema penal brasileiro, mas esse tema já é abordado há mais tempo, principalmente após a Constituição Federal de 1988 e ratificações de Tratados Internacionais, mas é uma medida pouco utilizada no Judiciário brasileiro. Por esse motivo é necessário demonstrar a importância que é a implantação dessa medida no cenário penal brasileiro.

Nesse contexto, Aury Lopes Jr. e Caio Paiva (2019):

A denominada audiência de custódia consiste, basicamente, no direito de (todo) cidadão preso ser conduzido, sem demora, à presença de um juiz para que, nesta ocasião, (i) se faça cessar eventuais atos de maus tratos ou de tortura e, também, (ii) para que se promova um espaço democrático de discussão acerca da legalidade e da necessidade da prisão.

Assim sendo, Canineu (2019), explica que a realização da audiência de custódia, promove um aumento do poder e também da responsabilidade dos juízes, promotores e defensores para mudar a forma do sistema criminal brasileiro, com maneiras de melhorar a forma do sistema e passar a trabalhar com padrões de legalidade e eficiência, imprescindível para que a Justiça seja feita neste país.

Referências

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